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2, 8-17

A surpresa da primavera

 O movimento poético dessa cena primaveril é cheio


de surpresas: “Uma voz!...Ei-lo...Ei-lo... Vê...”
 O Ritmo é levíssimo;
 Contrastes entre inverno e primavera, ausência e
presença;
 Obra prima lírica, marchetada de vocábulos raros:
“filhote de cervo” só o Ct possui; “parede” e “grades”
são termos que aparecem só aqui em toda a Bíblia;
“espreitar” é um verbo raro – só aqui e em Sl 33,14
– “gamo” em hebraico assemelha-se muito à palavra
com que indica a beleza.
Uma voz... O meu amado! (vv. 8-9)

 O amado está para chegar à casa da moça depois


de uma noite escura de afastamento, de silêncio e
de espera;
 Vinda da esposo é a libertação do horror do
abandono;
 A mulher está em casa: o inverno acabou; a
presença do amado coincide com a primavera: o
amor faz florescer a vida e o mundo;
 A mulher espreita aquele sinal tão desejado, procura
um só ruído, aquele de um passo conhecido, uma
voz que, entre todas, que faz acelerar o coração.
 O esposo superou toda aspereza do terreno, porque
sua meta era desejada acima de tudo;
 Alusão à Is 52,7-8;
 Ele espia pela grade da janela (musarabieh, para os
árabes);
 Seu afã na corrida, sua mobilidade o tornam
semelhante a um gamo ou a um cervato, animais
graciosos e muito caros ao simbolismo do Ct.
 No bando dos cervos, não são os adultos que
puxam a fila, mas os mais jovens, cujo passos ágeis
dão avanço ao grupo: é a celebração da juventude
Fala o meu amado e diz...(vv. 10-15)

As palavras do esposo são distribuídas em dois


movimentos:
 1º: (vv 10-13): terno convite à alegria e ao gozo da
primavera;
 Insistência do poeta na chuva, no inverno e no fim
deles, com vocábulos únicos na Bíblia, denotam a
impaciência e o tédio do amado: finalmente o céu se
tornou límpido: brilha de novo a luz do amor, o rosto
da sua mulher.
 Descrição da paisagem palestina na primavera, feita
com termos hebraicos sofisticados, de grande efeito
sonoro, poético e simbólico.
 A descrição das flores associa-se a auditiva dos
trabalhos agrícolas e dos cânticos dos pássaros;
 O trabalho agrícola é expresso por “cortar”, “podar”,
mas também “cantar”;
 Este termo tem a ver com o “podar” de Is 18,5;
 Outros autores, traduzindo por “cantar” pensam nas
canções que com a primavera ecoam de novo em
sintonia com o cortejo dos pássaros (Jr 7,34; 33,11;
16,9; 25,10; Lm 5,14-15);
 Recorda o arrulho da rola que na Palestina é sinal
da primavera como na Europa é a andorinha;
 A videira e a figueira são as árvores características
da agricultura mediterrânea: são símbolos de paz e
bem estar (IRs 5,5);

 Rabinos comparavam com freqüência a figueira e


seus frutos com a mulher, enquanto que o Talmude
a identifica com a árvore da ciência do bem e do
mal;
 Consagra o culto grego a Dionísio e a Demetra e
Buda é iluminado sob uma figueira.
 “Levanta-te, minha amada, formosa minha, e vem!”:
convite ao abandono total do amor; sair do próprio
mundo fechado e efundir na humanidade este
entusiasmo primaveril que o amor produz no
coração. Simplicidade, novidade, frescor são
qualidades surpreendentes do amor.
 2º momento (vv. 14-15): o esposo compara a amada
a um pompa selvagem que faz ninho nas fendas das
rochas ou nos vãos dos barrancos ou nos
esconderijos das torres;

 Também citado por Jeremias 48,28;


 A escolha deste animal é significativa, por seu
comportamento: ilustra a delicadeza dos
sentimentos dos dois enamorados:
 Fidelidade das pombas acompanhada de
demonstrações de afeto: macho leva comida à
fêmea, utiliza uma verdadeira coreografia de
inclinações, saltos, convites;
 Animal consagrado à deusa grega Afrodite, a
imagem de pombas eram representadas em
templos;
 Na bíblia, a pomba se torna quase emblema de
Israel (Os 7,11; 11,11; Sl 74,19), o que levou muitos
a interpretarem este versículo em chave nacional.
 A esposa é a pomba escondida no ninho
secreto e inatingível: o esposo suplica-lhe e
lhe revele o rosto e lhe faça ouvir sua voz: é
o seu único desejo: imagem de intimidade
que elimina separações e segredos;
 Simbolismo animal continua: pequenas raposas que
desmontam as vinhas floridas;

 São os filhotes dos chacais, ávidos por cachos de


uva em amadurecimento;.
 A vinha em flor é símbolo do corpo e do esplendor
da moça: ela é toda vida, frescor, florescência e
perfume;
 Contra ela pode atentar o mal (raposa-chacal –
animal impuro que devora os cadáveres).
 Contra a pureza do amor
desencadeia-se pois a força da
luxúria, da violência, do

ódio e, como numa vinha os


predadores fazem estragos,
assim o mal pode atentar contra
o esplendor do amor;
 A cena do Ct é atravessada por
uma faísca de medo; um fio de
tragédia se introduz na
serenidade dulcíssima da
primavera: todo amor tem seus
inimigos.
Antes que sopre a brisa do dia (vv. 16-17)

 Conclusão do monologo com estupenda estrofe


final, aberta com uma altíssima declaração de amor,
a mais bela dos Ct e entre as mais intensas da
literatura;
 Feuillet chamou-a de “a fórmula da pertença mútua”;
 No original, esta é uma sigla que resume toda a
mensagem do Ct: dodî lî wa anî lô.
 No AT, é a fórmula que se usa para indicar a relação
de aliança que media entre Deus e o povo: “O
Senhor será o teu Deus e tu serás um povo todo
seu” Dt 26, 17-18;
 Interpretação mística: cântico de núpcias entre Deus
e seu povo.
 Esposo: “aquele que apascenta o rebanho
entre os lírios” – como pastor que conduz o
rebanho em meio ao panorama de luz e de
cores;
 Pode-se traduzir também como “aquele que
se apascenta entre lírios” que expressa o
desejo apaixonado do homem em relação à
mulher, que cujo corpo é comparado a um
lírio no capítulo 2, 1-2;
 Ao entardecer, antes que sopre a doce brisa da
tarde e se alonguem as sombras, a mulher espera
que volte o seu amado, ágil e ligeiro como uma
gazela;

 A meta é atingir os “montes de Beter” – localidade


deliciosa;
 Como os “lírios” talvez se referissem ao corpo da
mulher, assim este “monte” se refere ao “monte de
Vênus” da mulher. Todo resto é exaltação do doce
corpo da esposa, do abraço e do amor;
 A união deve ser sempre reconstruída, porque as
ausências, os afastamentos e os silêncios podem
penetrar na vida do casal.
 O reencontro a tarde deve ser sempre surpresa,
dom, encontro esperado como o foi o primeiro;
 Espera apaixonada, intensa, fremente, voraz,
espera de amor verdadeiro e profundo.
 RAVASI, G. Cântico dos Cânticos. São Paulo:
Paulinas, 1988. Comentário Bíblico.
 STADELMANN, L. I. Cântico dos Cânticos. São
Paulo. Loyola, 1998. Bíblica.
 STORIOLO, I. BALANCIN, E. Como ler o cântico
dos cânticos: o amor é uma faísca de Deus. São
Paulo: Paulinas, 1991.
 PELLETIER, A. O Cântico dos Cânticos. São
Paulo: Paulus, 1995. Cadernos bíblicos.
 ZENGLER, Erich. Introdução ao Antigo
Testamento. São Paulo, Loyola, 2003.

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