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DE: ROBERTA EUCLYDES PEREIRA BORGES LEÃO COSTA

PARA: ILMA. SRA. DRA MARIA AMÉLIA SAMPAIO GÓES.


ASSUNTO: VISITAS À INSTITUIÇÃO DOM BOSCO

A Associação Ilheense de Assistência a Menores (A. I. A. M.) – CASAS


DOM BOSCO, situada na rodovia Ilhéus – Itabuna – km 9 atende atualmente a 23
crianças e adolescentes do sexo masculino que, por algum motivo num dado momentos
de suas vidas, não puderam mais se desenvolver no ambiente familiar.
A instituição tem como presidente, o Sr. Antônio Eduardo Citron e como
gerente administrativo o recém-chegado (há 20 dias) Sr. Jackson Figueiredo de Freitas,
além de outros profissionais que os auxiliam em todos os serviços que a instituição
oferece às crianças e adolescentes abrigados no local (professores, supervisores,
cuidadores, cozinheiros, auxiliares).
Quando pensamos em crianças e adolescentes impedidos de serem
criados no seio familiar, refletimos não só acerca dos prováveis motivos do
impedimento (falta de condições financeiras, abandono, abuso, maus-tratos, etc.), como
também as implicações que esta situação poderá lhes causar a curto, médio e longo
prazo.
O ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente - aprovado pela Lei
8.069/1990, de 13 de julho de 1990, contém 267 artigos, contemplando todos os
requisitos que, em tese, levaria a criança ao amparo total. Mas os obstáculos que
impedem o total cumprimento desses artigos são os mais variados.
Meu primeiro contato com a instituição ocorreu no dia 27 de março de
2008, numa quinta-feira à tarde. Inicialmente fui atendida por uma funcionária que me
levou até o Sr. Jackson, para que eu me apresentasse. (Sr. Citron não estava presente,
pois participava de um evento no Centro de Convenções de Ilhéus).
Sr. Jackson estava trabalhando no local há 20 dias e disse estar tentando
organizar todos os prontuários (dos abrigados e dos que já haviam se desligado da
instituição por algum motivo). Ele acabara de organizar os abrigados e assim, fiquei
sabendo que apenas dois dos seis jovens que eu iria ter contato naquele dia estavam
presentes (GABRIEL MENDES DO NASCIMENTO, 09 anos e 08 meses, filho de
Cosme Nascimento e Mirian da Conceição Mendes e RENALDO SANTOS
BARBOSA, 11 anos e 05 meses, filho de Ronaldo Alves Barbosa e Liliane Pereira dos
Santos).
Conversei com os dois separadamente onde procurei deixá-los o mais a
vontade possível, por se tratar do meu primeiro contato com eles.
Gabriel está abrigado no Instituto Dom Bosco desde agosto de 2006 e
durante nossa conversa disse gostar muito de morar ali, pois podia brincar, estudar, se
alimentar. Disse também gostar muito de assistir televisão, sendo seus programas
preferidos os desenhos, as novelas e os jornais.
No final do ano passado, pela primeira vez em todo esse tempo de
moradia na Dom Bosco, ele saiu para passar alguns dias na casa de uma amiga da
família. Ele saiu para passar o natal e retornou quase um mês depois. Muito raramente
recebe as visitas de “tia Gisélia” e “tia Conça”. Perguntei se tinha irmãos, ele disse que
tinha alguns que estavam espalhados por algumas cidades.
Indaguei a ele a respeito de sua saúde, de como se sentia naquele
momento, ele me disse estar bem (emocionalmente e fisicamente), e não estar
precisando de nada. Quando eu o convidei para um ‘bate-papo’ ele veio brincando,
como é natural para a sua faixa-etária. Quer ser astronauta e continuar a estudar quando
sair de lá.
Percebi Gabriel alegre, espontâneo e bastante comunicativo.
Renaldo (seu nome verdadeiro, e não Reinaldo) também chegou ao
instituto em agosto de 2006, de onde não saiu mais, a não ser para passeios organizados
pela própria instituição. Também disse gostar muito de estar ali. A atividade a qual mais
gosta é brincar de bicicleta (de um amigo, que atualmente está quebrada).
Nesse dia, Renaldo estava doente (gripado e com machucado superficial
no pé). Apesar disso, disse se sentir bem e não precisar de nada. Posteriormente, numa
conversa com Telmara (professora de banca) soube que nunca recebeu visita desde
quando chegou à instituição.
Tive a impressão de ser uma criança com nível um pouco maior de
sofrimento psíquico, pois sua introspecção transmitia algo que ultrapassava a maneira
tímida de ser de uma criança de doze anos.

RONALDO JOSÉ DA SILVA, ROBERTO LEMOS DOS SANTOS,


DELEANDRO SILVA MATOS e WENE RODRIGUES DOS SANTOS até o dia em
que estive pela última vez na instituição, não faziam mais parte do quadro de abrigados.

• RONALDO fugiu no ano passado da instituição. O fato foi comunicado ao


Conselho Tutelar, mas até o momento não obtiveram notícias do jovem.
• DELEANDRO fugiu da instituição há quase um ano. O fato foi comunicado ao
Conselho Tutelar, mas até o momento não obtiveram notícias do jovem.
OBS: Não foi localizado o prontuário do mesmo.
• ROBERTO foi reintegrado à família há quase dois anos e a Dom Bosco continua
assistindo ao jovem com cestas básicas e visitas periódicas de uma assistente
social. OBS: Endereço não informado
• WENE foi reintegrado à família através do Conselho Tutelar (Rua Etiópia, nº. 76
– Ulisses Guimarães, antigo bairro Uldorico Pinto – Teixeira de Freitas/BA)

Nesse primeiro momento pude perceber a importância da assistência


dedicada a esses jovens que foram privados de suas relações familiares. Apesar das
dificuldades como falta de recursos financeiros e de voluntários e até mesmo do preparo
para lidar com esses jovens, o resultado é satisfatório na medida em que todos eles têm
um lar (em comum), acesso à alimentação, estudo, atendimento médico e psicológico e
ao lazer.
Há um consenso entre diversos teóricos acerca do desenvolvimento
infantil, no que tange ao ambiente familiar e suas inter-relações. Nesse período é
importante o estabelecimento de um regime educacional apropriado e a construção de
um ambiente favorável, a começar pelo vínculo com a mãe.
Nos anos quarenta, o psiquiatra inglês John Bowlby, provocou uma
enorme controvérsia ao declarar que a falta de amor e de cuidados maternos na criação
de um indivíduo fazia com que este fosse incapaz de amar pelo resto de sua vida.. Diz
Bowlby: “o que acho essencial para a saúde mental é que o infante possa experimentar
uma relação contínua, cálida e íntima com sua mãe ou substituta materna permanente,
na qual, ambos possam encontrar satisfação e gozo”.
Bowlby diz também que a base para o desenvolvimento humano
adequado é uma sensação de confiança na disponibilidade das pessoas com quem
matemos os primeiros laços afetivos, a confiança que se desenvolve lentamente através
da infância e da adolescência. Essa disponibilidade consiste em uma resposta constante
às nossas necessidades afetivas, de carícias, compreensão, companhia, comunicação e
atenção.
A criança ou adolescente cujo lar não lhe ofereceu um sentimento de
segurança, busca-a fora de casa, recorrendo aos avós, tios e tias, amigos da família,
escola. Procura uma estabilidade externa, sem a qual poderá enlouquecer.
Conforme várias Escolas Psicológicas, aquilo que foi experimentado na
infância desempenha importante papel durante os anos da adolescência. A criança, cujas
necessidades de carinho e afeição foram satisfeitas, comumente tem os fundamentais
sentimentos de segurança que a capacitam a enfrentar o ‘stress’ da adolescência, com
um considerável grau de resistência. Se, através dos anos, foi ajudada a entender a si e
aos outros, a identificar seus alvos e valores, a resolver seus problemas e a ajustar-se às
mudanças, em si mesmo e no ambiente, estará bastante fortalecida para enfrentar as
tensões e pressões emocionais da adolescência.
O Programa ‘Retorno ao Lar’ é pertinente e muito necessário na medida
em que seu principal objetivo é a (re) inserção desses jovens no seio de sua família ou
de outra substituta, para que novos valores sejam introjetados a fim de lhes dar uma
melhor condição psíquica de sobreviver às exigências da sociedade.

Itabuna, 31 de março de 2008.

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Roberta Euclydes Pereira Borges Leão Costa
Estagiária de Psicologia do Ministério Público de Ilhéus

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