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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS


DEPARTAMENTO DE DESENVOLVIMENTO, AGRICULTURA E SOCIEDADE
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO, AGRICULTURA E SOCIEDADE

Florestas Sociais – Uma Resposta à Destruição das Florestas Tropicais?

CLÁUDIA SILVA TEIXEIRA

Sob Orientação do Professor

JOSÉ AUGUSTO PÁDUA

Dissertação submetida como requisito parcial para


obtenção do grau de Mestre em Desenvolvimento,
Agricultura e Sociedade, Área de Concentração em
Sociedade e Agricultura.

Seropédica, Rio de Janeiro


Março de 2001
The old native man is showing the white fellow, who looks to be a sallow and
paunchy anthropologist, how to light a fire. They are squatting on the ground,
around a pile of kindling, and the old man's ten-year-old grandson is squatting
too, watching every move. The old man strikes the flint again and again but
cannot get the shavings going. Finally, the white man grunts, as if enough film
has been wasted, rummages in his pocket, pulls out a cigarette lighter and
reaches over without a word. Flick, the flame shoots out, the shavings are lit. The
boy looks up at the white man, then at his grandfather, then, eyes narrowed, back
to the white man. Freeze. An entirely new, undreamed of, and dominant power
has entered his life. And it comes from someone else's father or grandfather, not
from his own (Bevis 1995, citado por Thompson, 1999).

O velho nativo está mostrando ao homem branco, que parece ser um antropólogo
pálido e pançudo, como acender um fogo. Eles estão agachados no chão, em
volta de uma pilha de gravetos, e o neto de 10 anos do velho também está
agachado, prestando atenção em cada movimento. O velho risca as pedras
algumas vezes, mas não consegue acender o fogo. Finalmente, o homem branco
resmunga, como se já tivesse gasto filme suficiente, vasculha em seu bolso, puxa
um isqueiro e se estende, sem dizer uma palavra. Acende, a chama dispara, os
gravetos estão acesos. O menino ergue os olhos para o homem branco, depois
para o seu avô, em seguida os olhos se estreitam novamente em direção ao
homem branco. Fica imóvel. Um poder inteiramente novo e dominante, jamais
sonhado, entra na sua vida. E vem do pai ou avô de outro menino, não do dele.
(Bevis, 1995, citado por Thompson, 1999).
Dedico este trabalho a todos que confiam
no conhecimento como meio de
chegarmos a um convívio solidário e justo
para a maioria.
AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos do CPDA/UFRRJ, funcionários, colegas de turma, demais alunos


e professores, pela agradável convivência ao longo do curso.
Ao professor José Augusto Pádua, pela acolhida e incentivo à minha proposta de
pesquisa, pelas boas discussões em aula e pela tranqüila orientação. Aos professores
Roberto Moreira e Canrobert Costa Neto, que avaliaram meu projeto, dando grande
contribuição e incentivo e à prof. Maria José Carneiro, pelas valiosas aulas de metodologia.
Aos membros da banca, professores Henri Acselrad e Peter May, que muito
contribuiram para a elaboração deste trabalho, nas disciplinas cursadas e na avaliação do
resultado final.
Aos amigos, pacientes e solidários, que entenderam porque eu não fui aos shows, às
festas, aos lançamentos dos livros, aos encontros na praia.... Especialmente a Mônica Lepri,
pelo incentivo e pelo apoio na revisão dos capítulos e a André Cancela e Laura Rangel,
pelo fundamental suporte terapêutico.
Aos bons e “velhos” companheiros de trabalho nos projetos junto ao Laboratório de
Hidrologia da COPPE, pela amizade e estímulo.
À minha família, por tudo,... carinho, paciência com minha forçada reclusão a um
certo cômodo da casa nos últimos meses. Em especial a Thiago, pela compreensão nas
horas de sufoco, à minha irmã, pela ajuda no inglês e no contato com as instituições de
Londres, e a meus pais, que souberam me ensinar como é bom conviver com árvores,
florestas, rios, praias, montanhas... e da melhor maneira,... convivendo.
Agradeço ainda aos pesquisadores que, atenciosamente, responderam meus emails,
dando informações, indicações bibliográficas e esclarecimento de alguns pontos-chave: a
Alcir Ribeiro, Anor Fiorini, Antonio C. Diegues, Benno Pokorny, Brian Egan, Claudia
Mello, David Brown, Domingos Macedo, Eliane Ceccon, Eric Gomes, Jane Carter, Marcos
Oliveira, Marilyn Hoskins, Mark Poffenberger, Mark Robson, Paulo Amaral, Peter
Holmgren, Robert Chambers, Rodrigo Arce e Socorro Ferreira.
BIOGRAFIA SUCINTA

Cláudia Silva Teixeira, graduada em Engenharia Florestal, pela Universidade Federal Rural
do Rio de Janeiro, em 1982, com cursos de especialização em Planejamento Ambiental
(UFF, 1984), Sensoriamento Remoto Aplicado à Análise Ambiental (UNESP, 1985) e
Teoria e Práxis do Meio do Ambiente (ISER, 1994) e Mestrado em Desenvolvimento,
Agricultura e Sociedade (CPDA/UFRJ, 2001). Desde 1987 tem trabalhado em projetos de
planejamento e gestão socioambiental, com uma trajetória profissional diversificada quanto
aos tipos de estudos e projetos, sempre em equipes multidisciplinares, envolvendo
principalmente análise ambiental de projetos de engenharia, diagnósticos e prognósticos
socioambientais em áreas indígenas; diagnósticos, estudos e projetos para gerenciamento de
unidades de conservação; e programas/projetos de gestão de recursos hídricos, controle de
erosão e recuperação de mananciais. Principais trabalhos: de 1987 a 1991 fez parte da
equipe de meio ambiente da Internacional de Engenharia S/A, como responsável pelos
estudos de vegetação e uso do solo dos projetos de aproveitamento hidroelétrico realizados
pela empresa; entre 1992 e 1994 trabalhou para organizações não-governamentais (CEDI –
Programa Povos Indígenas no Brasil [hoje Instituto Socioambiental] e Núcleo de Cultura
Indígena) em estudos de impacto da exploração madeireira, de ocupação do entorno e de
manejo florestal sustentado em áreas indígenas na Amazônia; desde 1994 tem trabalhado,
como consultora do PNUD, IICA e UNESCO, em programas e projetos de planejamento e
gestão de recursos hídricos em bacias hidrográficas, especialmente em estudos e projetos
para controle de erosão e proteção de mananciais na bacia do rio Paraíba do Sul (MG, RJ e
SP), desenvolvidos no Laboratório de Hidrologia da COPPE/UFRJ.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...............................................................................................................................................11

CAPÍTULO 1 SITUAÇÃO DAS FLORESTAS TROPICAIS ..................................................................14


1.1 ESTIMATIVAS DE DISTRIBUIÇÃO ESPAÇO-TEMPO ................................................................................15
1.2 CAUSAS DO DECLÍNIO DAS FLORESTAS TROPICAIS..............................................................................30
1.2.1 Causas Diretas ..........................................................................................................................34
1.2.2 Causas Subjacentes ...................................................................................................................40
1.3 POLÍTICAS FLORESTAIS INTERNACIONAIS ............................................................................................53
1.3.1 Painel Intergovernamental sobre Florestas – Nações Unidas..................................................53
1.3.2 Política Florestal do Banco Mundial ........................................................................................59
1.3.3 Plano Estratégico Florestal da FAO.........................................................................................62
CAPÍTULO 2 FLORESTAS SOCIAIS – “ESTADO DA ARTE”............................................................65
2.1 PANORAMA GERAL ..............................................................................................................................66
2.1.1 Concepções e Definições...........................................................................................................66
2.1.2 Atuação Institucional Global e Regional ..................................................................................74
2.2. AS QUESTÕES ENVOLVIDAS ................................................................................................................80
2.2.1 Relações Institucionais – Participação e Descentralização......................................................80
2.2.2 Terra e Recursos Naturais – Usos, Direitos e Disputas............................................................87
2.2.3 Estratificação Social – Gênero .................................................................................................90
2.2.4 Produção de Árvores – Métodos, Normas, Subsistência e Mercado.........................................94
2.2.5 Sustentabilidade do Manejo Florestal.....................................................................................100
2.3 FLORESTAS SOCIAIS NO BRASIL.........................................................................................................105
CAPÍTULO 3 FLORESTAS SOCIAIS VERSUS DESMATAMENTO.................................................120
3.1 A HISTÓRICA (DES)IMPORTÂNCIA DAS FLORESTAS ..........................................................................121
3.2 FLORESTAS E “CAPITAL SIMBÓLICO” – VISÕES HEGEMÔNICAS E INTERESSES ANTAGÔNICOS..........125
3.3 CAMPO DE FORÇAS – FLORESTAS DE QUEM E PARA QUEM ...............................................................130
3.4 PERSPECTIVAS PARA FLORESTAS SOCIAIS .........................................................................................139
SÍNTESE........................................................................................................................................................150

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................................157

ANEXOS ........................................................................................................................................................168
QUADROS

Quadro 1.1 - Distribuição das florestas no mundo, segundo a FAO 18


Quadro 1.2 - Distribuição de florestas naturais e plantadas no mundo, segundo a FAO 19
Quadro 1.3 - Comparação de resultados obtidos pela FAO e pelo WRI 20
Quadro 1.4 - Área total de florestas no mundo - original, atual e intacta (“fronteiras
florestais”), segundo o World Resource Institute (WRI) 21
Quadro 1.5 - Distribuição das florestas tropicais no mundo, segundo a FAO 23
Quadro 1.6 - Variação na extensão de florestas tropicais no mundo entre 1980-90 e entre
1990-2000, com e sem plantações 24
Quadro 1.7 - Área de plantações arbóreas em regiões tropicais, em 2000 26
Quadro 1.8 - Países com maiores áreas de florestas naturais e maiores taxas de desmatamento 28
Quadro 1.9 - Países com as maiores extensões de florestas naturais, suas taxas anuais de
variação da cobertura florestal natural e área total de plantações arbóreas 29
Quadro 1.10 - Tendência ao longo do tempo das causas atribuídas aos desmatamentos,
expressa em número de estudos que citam as causas 31
Quadro 1.11 - Importantes agentes de desmatamento 33
Quadro 1.12 - Conclusões fundamentais sobre a execução das Propostas de Ação do IPF 56
Quadro 1.13 - Recomendações para a execução das Propostas de Ação do IPF 57
Quadro 2.1 - Comparação de funções entre florestais tradicionais e florestais sociais 85
Quadro 2.2 - ProManejo – Projeto de Apoio ao Manejo Florestal Sustentável na Amazônia 112
Quadro 2.3 - Características gerais dos projetos de manejo florestal comunitário na Amazônia 119

GRÁFICOS

Gráfico 1 – Situação das florestas no mundo e por região, segundo o WRI, 1997 169
Gráfico 2 – Países com maiores taxas de desmatamento no período 1990-2000 170

FIGURAS

Florestas do Mundo – Extraído e reduzido do mapa original da FAO 171


Detalhe do mapa anterior, incluindo a legenda, com destaque para a Am.do Sul 172
RESUMO

As florestas tropicais vêm sendo destruídas a uma velocidade sem precedentes. Extração
madeireira, expansão agropecuária, queimadas descontroladas e outras causas diretas dessa
destruição fazem parte de um contexto político, social e econômico historicamente
construído sob duas visões hegemônicas sobre as florestas: o eldorado, cuja riqueza em
recursos naturais deve ser explorada em nome do “desenvolvimento”, e o paraíso perdido,
que deve ser preservado da presença humana em “santuários de biodiversidade”. Ambas as
visões têm em comum o “paradigma do vazio selvagem”, que não reconhece os habitantes
das florestas tropicais e suas formas tradicionais de uso/manejo florestal. No cerne do
debate sobre sustentabilidade, um novo paradigma se contrapõe a essas visões e busca
reconhecer/validar esse conhecimento tradicional e estabelecer um diálogo com a ciência
ocidental. Pesquisadores, técnicos, instituições governamentais e não governamentais vêm
trabalhando, desde os anos 1970, em projetos de pesquisa e desenvolvimento em florestas
sociais, visando atender às necessidades básicas das populações rurais pobres e melhorar as
condições ambientais. Esta dissertação discute as perspectivas desse novo campo de p&d
frente aos fatores que determinam a destruição das florestas tropicais, considerando sua
historicidade e o capital simbólico acumulado por diferentes atores na luta por poder sobre
as florestas.
ABSTRACT

Tropical rain forests have been rapidly destroyed. Logging, expanding farming,
uncontrolled burning and other direct causes of forest destruction are part of a political,
social and economic context, historically contructed under two prevailing conceptions of
forests: the El Dorado, in which natural resources must be explored in the name of
“development”, and the Lost Eden, that must be preserved from human presence in
“biodiversity sanctuaries”. Both views have in common the “wild emptiness paradigm”,
which does not recognize the traditional dwellers of the forests and their own means of
resource management. In the heart of the debate on sustainability, a new paradigm emerges
to contest those views, which aims at recognizing/validating the traditional knowledge and
at establishing a dialogue with the Western science. Since the 1970’s, researchers,
technicians, and both governmental and non-governmental organizations have worked on
research and development projects on social forestry, in order to meet the basic needs of
rural poor people and to improve the environmental conditions. This work discusses the
perspectives of this new field of research and development vis-à-vis tropical forest
destruction, considering its historical context and the “symbolic capital” accumulated by
different actors in their struggle for power over the forests.
INTRODUÇÃO

Lidar com a complexidade dos fatores sociais e suas interações com os fatores ambientais é
o grande desafio que se coloca para os que buscam entender e promover a sustentabilidade
no uso dos recursos naturais. Um desafio que exige um diálogo entre as ciências humanas,
físicas e biológicas que ainda não se estabeleceu de fato. Como disse o sociólogo Mauro
Leonel (1998), ao analisar o tema da interdisciplinaridade, “apesar da grande demanda, não
tem havido um esforço adequado de análise e reflexão no campo do conhecimento
socioambiental”.

O CPDA é uma instituição onde se procura realizar esse diálogo e na qual encontrei
subsídios para minhas pretensões de dialogar com a sociologia. Ingressei no mestrado com
o propósito principal de pesquisar o tema florestas sociais. Minhas primeiras incursões na
bibliografia já indicavam que este novo campo de pesquisa & desenvolvimento traz a
possibilidade de discussão e compreensão de muitas questões para as quais não se encontra
respostas na ciência florestal convencional.

O interesse e os investimentos no campo de p&d em florestas sociais surgiram nos


anos 1970, quando verificou-se que as políticas internacionais de fomento à
industrialização como forma de apoiar o desenvolvimento nos países pobres não tinham
trazido os benefícios sócio-econômicos esperados às populações rurais. Ao contrário, as
demandas de madeira para as indústrias tinham acelerado a exploração e a destruição das
florestas nativas, de onde muitas comunidades rurais extraíam seu sustento. Em um cenário
de extensas áreas degradadas e populações rurais empobrecidas, novas atenções se voltaram
para projetos de recuperação ambiental e atendimento às necessidades básicas da população
rural, principalmente quanto ao consumo de lenha.

Assim, a partir de uma intenção inicial de melhorar as condições ambientais e


econômicas de populações rurais pobres, desenvolveu-se um novo campo de iniciativas em
pesquisas e em projetos de uso/manejo florestal, visando o plantio de árvores e o manejo de
florestas existentes com e para a população local. O campo de p&d em florestas sociais
envolve várias questões sociais, políticas, culturais,... em especial questões relativas a
direitos de posse e uso da terra e dos recursos naturais, disputas de poder sobre áreas de
12

florestas, processos de descentralização e participação social nas tomadas de decisão sobre


o setor florestal, sustentabilidade ambiental, econômica e social do manejo florestal, entre
outras questões que vão muito além das abordagens e dos paradigmas convencionais da
ciência florestal, forçando não só a uma atitude profissional interdisciplinar como
principalmente a uma profunda revisão das concepções a priori dos técnicos florestais e da
ciência ocidental que os formou.

O contexto socioambiental intrínseco ao campo de p&d em florestas sociais, com


seus propósitos e abordagens voltados para a melhoria de condições sociais e ambientais de
modo integrado, suscitou o objeto central dessa pesquisa, resumido na pergunta-título da
dissertação. A rápida destruição das florestas tropicais, verificada nas últimas três décadas,
é uma das principais questões em destaque nas preocupações mundiais sobre meio
ambiente. E a busca de meios de controle dos desmatamentos e de alternativas ao uso
predatório das florestas tem mobilizado diversos setores e atores da sociedade.

Nesta pesquisa, a partir de uma ampla revisão bibliográfica, são analisadas as


perspectivas de contribuição das iniciativas no campo de p&d em florestas sociais para a
redução das tendências atuais de destruição das florestas tropicais. O levantamento
bibliográfico foi feito em instituições de ensino, pesquisa e extensão, em ONGs
ambientalistas e em organizações internacionais e regionais de ajuda aos países “em
desenvolvimento”, boa parte via Internet.

A dissertação, organizada em três capítulos, se inicia com a descrição da situação


das florestas tropicais nas últimas décadas, abordando as causas diretas e subjacentes do
declínio das florestas tropicais em geral, bem como a mobilização internacional em torno
da definição e implantação de políticas florestais voltadas para a redução das altas taxas de
desmatamento e para a sustentabilidade do uso e manejo das florestas.

O segundo capítulo trata especificamente do campo de pesquisa & desenvolvimento


em florestas sociais, buscando identificar o “estado da arte” deste campo nos países
tropicais. São apresentadas as definições e concepções, as principais instituições de âmbito
internacional e regional que vêm se dedicando ao tema, as questões mais discutidas na
literatura como fatores críticos ou decisivos para a realização de projetos e, por fim, um
breve panorama sobre florestas sociais no Brasil. O tema é pouco conhecido e pouco
13

trabalhado em nosso país, que deveria ser um pioneiro nessas iniciativas, tendo em vista
abrigar a maior floresta tropical do mundo e também a maior taxa de desmatamento das
últimas décadas.

O terceiro e último capítulo apresenta um análise sobre as perspectivas do campo de


p&d em florestas sociais frente ao contexto atual de destruição das florestas tropicais. A
análise é feita a partir de um ensaio de reflexão sobre o espaço simbólico ocupado pelas
florestas no campo de forças das disputas sociais pelos recursos naturais. A abordagem
central desta reflexão baseia-se no conceito de capital simbólico do sociólogo francês
Pierre Bourdieu, aplicado às visões hegemônicas sobre as florestas, historicamente
construídas no desenvolvimento da civilização ocidental: a visão de eldorado, onde a
floresta representa um desafio a ser vencido em nome do desenvolvimento econômico; e a
visão de paraíso perdido, que deve ser protegido da influência humana. Ambas as visões
excluem os tradicionais habitantes das florestas, não reconhecendo seus direitos de uso e
manejo e expulsando-os para condições de pobreza e marginalização. Em um complexo
processo de disputa pelo “verde”, essas visões configuraram forte capital simbólico aos
interessados na exploração econômica predatória e/ou na preservação da floresta sem a
participação social, especialmente de seus habitantes tradicionais (e legítimos), no processo
de decisão sobre “de quem” é a floresta e “para quem” vão os recursos. Os recentes
movimentos de determinados atores da sociedade (em instituições governamentais e não-
governamentais) e dos chamados “povos da floresta” e outros movimentos sociais de base
vêm configurando mudanças significativas no campo de forças sobre as florestas, que
podem representar perspectivas favoráveis para o capital simbólico dos atores envolvidos
nas iniciativas em florestas sociais e no controle dos desmatamentos.

Espero que esta dissertação possa contribuir para o trabalho de pesquisadores e


executores de iniciativas voltadas para um manejo dos recursos florestais social e
ambientalmente responsável. As iniciativas em florestas sociais têm potencial para deter a
destruição das florestas tropicais e melhorar a condição de vida de comunidades rurais.
Existem muitas publicações interessantes a respeito, com estudos de caso em várias regiões
do mundo e há um vasto campo de investigações científicas, de realizações práticas, de
debates e de políticas públicas ainda por ser desenvolvido no Brasil.
14

CAPÍTULO 1

SITUAÇÃO DAS FLORESTAS TROPICAIS

As florestas vêm ocupando um ‘espaço’ cada vez maior no cenário das atenções
sobre a crise ambiental, que atingiu escala planetária nesta virada de milênio. As florestas
tropicais ocupam lugar de destaque nesse cenário, basicamente porque “contêm mais da
metade das espécies da biota mundial; a imensa riqueza da biodiversidade tropical é um
reservatório ainda pouco explorado de novos alimentos, produtos farmacêuticos, fibras,
substitutos do petróleo e outros produtos; e estão sendo destruídas tão rapidamente que
provavelmente desaparecerão no próximo século, levando com elas centenas de milhares de
espécies à extinção” (Wilson, 1997).

No entanto, apesar da gravidade com que se apresentam diversos problemas


ambientais de grande magnitude relacionados à destruição das florestas tropicais, como a
erosão dos solos, as inundações, as alterações climáticas, a perda da biodiversidade e a
degradação e escassez dos recursos hídricos, ainda é precário o conhecimento sobre a real
situação das florestas tropicais, tanto no que diz respeito às suas características ambientais
(estrutura, composição florística e faunística, funções ecológicas, etc.) quanto à avaliação
da extensão que ocupam e das taxas de desmatamento e, principalmente, na compreensão
das causas dessa destruição. A precariedade desse conhecimento se reflete na inconsistência
e inoperância das iniciativas de controle do desmatamento nas ricas e frágeis florestas
tropicais.

Este capítulo apresenta um panorama geral sobre as estimativas de distribuição das


florestas e taxas de desmatamento no mundo, seguido de uma análise das causas diretas e
subjacentes do avançado processo de declínio das florestas tropicais que vem ocorrendo nos
últimos anos. No último item são apresentadas ainda algumas iniciativas internacionais, nas
quais se observa que, tanto os esforços para aprimorar os instrumentos e métodos de
quantificação e avaliação da situação das florestas, como as análises sobre os fatores
15

subjacentes que determinam o processo de declínio, são parte de um contexto mundial de


mobilização política que se verifica em instituições governamentais e não-governamentais,
na tentativa de definir meios institucionais, políticos, técnicos, econômicos e sociais que
promovam a sustentabilidade no uso e manejo das florestas.

1.1 Estimativas de Distribuição Espaço-Tempo

O desenvolvimento da informática e do sensoriamento remoto vem fornecendo um


bom instrumental tecnológico para a realização de mapeamentos de vegetação e uso da
terra de áreas extensas. Imagens de satélite tomadas de todo o planeta com estreita
periodicidade tornam possível mapear áreas maiores e com mais freqüência do que com as
antigas fotografias aéreas, embora essas ainda apresentem melhor resolução1 e sejam
muitas vezes utilizadas como auxiliares na identificação dos “alvos” da imagem e na
redução do esforço de checagem de campo.

No entanto, qualquer método ou sistema de classificação e descrição dos ambientes


florestais determina limites com base em um amplo espectro de critérios, o que resulta em
diferentes descrições, estimativas e projeções de cenários para uma mesma situação. Desse
modo, a extensão e a classificação das fisionomias florestais pode variar enormemente de
uma fonte de informação para outra e mesmo dentro da mesma fonte, na medida em que as
técnicas e os critérios de levantamento dos dados vão sendo revistos e aprimorados.
Segundo Matthews et al. (2000), entre 1923 e 1985 foram feitos pelo menos 26 cálculos de
áreas florestadas no mundo, variando de 24 a 65 milhões de km².

Em escala global, as estimativas da FAO sobre a distribuição da cobertura florestal


mundial têm sido a principal referência. Em colaboração com outras instituições, como o
Programa da Nações Unidas Para o Meio Ambiente (PNUMA) e a Comissão Econômica
das Nações Unidas para a Europa (UN-ECE), a FAO procura realizar, a cada 10 anos, uma

1
“Em sensoriamento remoto, resolução é a habilidade para distinguir entre dois objetos muito próximos numa
imagem. Quando dois objetos estão mais próximos do que o limite de resolução, aparecerão como um único
objeto na imagem.” (Garcia, 1982).
16

caracterização geral dos recursos florestais. E, a cada dois anos, a instituição elabora um
documento intitulado “Situação Mundial das Florestas” (cuja sigla em inglês é SOFO),
apresentando e discutindo dados e fatos ocorridos quanto à situação das florestas em geral,
com destaque para os acontecimentos dos dois anos precedentes. O último SOFO (1999),
por exemplo, destaca o problema das queimadas que destruíram grandes extensões de
florestas tropicais em vários países nos anos de 1997 e 1998.

Apesar dos esforços empreendidos pela FAO no sentido de melhorar a qualidade


das informações, seus resultados têm sido criticados quanto à acuracidade dos dados, tendo
em vista que as estimativas são feitas a partir de dados secundários, produzidos nos países
(com diferentes datas, escalas e qualidades de informação) e de amostragens por
sensoriamento remoto, da ordem de 10% das áreas florestadas (Matthews et al., 2000).
Também há críticas quanto à inclusão das plantações de espécies arbóreas (como as
extensas monoculturas de eucaliptos e pinus) na classificação e no mapeamento da
categoria florestas (WRM, 2000). Por outro lado, a periodicidade e a abrangência planetária
dos levantamentos da FAO servem de referência básica às revisões críticas dos dados,
geralmente apoiadas em estudos regionais eventualmente mais apurados, ainda que sujeitos
às limitações que qualquer método de mapeamento apresenta. Nesta dissertação, portanto,
para efeito de caracterização espacial da cobertura florestal global, os dados da FAO foram
adotados como principal referência.

Em relação às florestas tropicais especificamente, encontra-se em desenvolvimento


um projeto de mapeamento das regiões tropicais, através de uma parceria entre a NASA e
as Universidades de Washington e Michigan (EUA), cujo objetivo principal é avaliar as
taxas de produção e consumo de carbono dos ecossistemas terrestres. Nesse projeto -
Landsat Pathfinder/Humid Tropical Forest Inventory Project, chamado de Pathfinder
(pioneiro) - estão sendo estimadas as taxas de desmatamento nas regiões da Amazônia,
África Central e Sudeste da Ásia, com base em imagens de satélite das décadas de 1970, 80
e 90. De acordo com o texto de apresentação do projeto, elaborado por D. L. Skole, do
Departamento de Geografia da Universidade de Michigan2, “as taxas de desmatamento das
florestas tropicais são desconhecidas, existem algumas poucas estimativas disponíveis e

2
consultado em janeiro/2001 via Internet, em www.bsrsi.msu.edu/overview/pathfinder1ft.htm
17

estas podem ter até mais de 50% de erro”. Alguns resultados parciais do Projeto Pathfinder
para a Amazônia Brasileira serão comentados mais adiante, neste item.

Os documentos mais recentes da FAO sobre a situação das florestas no mundo são
o SOFO 1999 e o FRA 2000 (FRA - Forest Resources Assessment). O FRA 2000, embora
já esteja disponível na Internet (na home page da FAO Forestry), deverá sofrer algumas
modificações até a sua apresentação oficial, que ocorrerá em 12 de março3, na próxima
reunião do Comitê sobre Florestas (COFO-FAO). No entanto, essas modificações não
deverão ser “dramáticas”, segundo informe do Diretor de Projeto do FRA-FAO, Peter
Holmgren (comunicado via e-mail, em 12/02/2001).

No FRA 2000, a FAO modificou os critérios de classificação das florestas utilizados


nos seus levantamentos precedentes e reavaliou os dados que foram divulgados para os
anos anteriores, considerando também os novos inventários nacionais realizados nos países
“em desenvolvimento” ao longo dos anos 1990. Para ser classificada como floresta, a área
mapeada deve ter um mínimo de 10% de cobertura arbórea (antes era de 20% para os países
industrializados e 10% para os demais) em uma unidade mínima de 0,5 hectare e as árvores
devem ter mais de 5 m de altura. Entre 10 e 40% de cobertura arbórea (dada pelo dossel -
copa das árvores) as florestas são classificadas como abertas (onde se incluem os cerrados
brasileiros e as savanas africanas) e acima de 40% de cobertura arbórea são classificadas
como fechadas (onde se incluem as florestas tropicais pluviais e os manguezais).

Esse critério de percentual de cobertura do dossel, embora amenize o problema da


compatibilização das diversas classificações fitofisionômicas existentes (mais de 650 tipos),
pode apresentar resultados muito diferentes, dependendo dos limites arbitrados para
classificar a área como floresta, além da influência de fatores como a base de dados
utilizada, o nível de informação de campo (“verdade terrestre”) e a unidade mínima de
mapeamento. Matthews et al. (2000: 15) comentam um mapeamento realizado na
Universidade de Maryland com base no critério de percentual de cobertura arbórea: usando
um limite de 10% de cobertura, a estimativa de área de floresta no mundo seria de mais de
60 milhões de km² e com um limite de 60% de cobertura arbórea essa área cairia para 17
milhões de km².

3
data de entrega desta dissertação aos membros da banca examinadora.
18

A mudança no percentual de cobertura do dossel e as revisões de dados secundários


dos anos 90 realizadas pela FAO resultaram em uma nova configuração de valores na
tabela de distribuição de florestas no mundo para o ano de 1990. No quadro 1.1, a seguir,
observa-se a diferença entre os dados apresentados anteriormente e os dados apresentados
hoje para o mesmo ano (de 1990), bem como os novos valores encontrados pela FAO para
2000 e a comparação entre as médias de alteração da cobertura florestal estimadas antes
para o período 1990-95 e estimadas hoje para o período 1990-2000 (com os novos valores
obtidos para 1990).

Não é possível compreender claramente se a queda na média total de desmatamento


no mundo, de 11,3 milhões de hectares/ano (período 1990-95) para 9,0 milhões ha/ano
(período 1990-2000) significa uma redução real nas taxas de desmatamento no período
1995-2000 ou é resultado das mudanças de critérios e da reavaliação de dados secundários,
ou ambas as coisas. Certamente que a mudança do limite mínimo de cobertura arbórea de
20% para 10% tornou os países industrializados mais “abastecidos” de florestas,
principalmente Austrália e Rússia que, do levantamento de 1995 para o de 2000 passaram a
“contar” com mais de 100 milhões de hectares de florestas, cada um.

Quadro 1.1: Distribuição das florestas no mundo, segundo a FAO


Florestas em Variação Florestas em Florestas em Variação
1990 1 1990 2 2000 2 1990-2000 2
Região 1990-95 1
Milhões ha Milhões ha/ano Milhões ha Milhões ha Milhões ha/ano
África 539 -3.7 703 650 -5.3
Ásia 518 -2.9 552 548 -0.4
Oceania 91 -0.1 202 201 -0.1
Europa (e Russia) 931 0.5 1.031 1.039 0.9
América Norte & Central 538 -0.3 555 549 -0.6
América do Sul 894 -4.8 910 874 -3.6
Total Mundial 3.511 -11.3 3.953 3.862 -9.0
1 2
Dados apresentados no SOFO 99 , com critérios anteriores; Dados apresentados no FRA 2000, com novos critérios.

A alteração nas taxas também incorpora o peso relativo à extensão de plantações


arbóreas. A extensão total de florestas apresentada cartograficamente pela FAO
compreende todos os tipos de florestas (segundo os critérios definidos), incluindo as áreas
de plantações arbóreas. Já nos dados tabelados é possível separar as áreas de “florestas
19

naturais” das áreas de “florestas plantadas”. No entanto, a área total de plantações arbóreas
identificada pela FAO é irrisória (inferior a 5%) frente ao total de florestas (quadro 1.2). A
Ásia é a única Região que se destaca em área plantada, com cerca de 116 milhões de
hectares (21% do total de florestas).

Quadro 1.2: Distribuição de florestas naturais e plantadas no mundo, segundo a FAO


Total de Total de Percentual de Total de Florestas
Região Florestas em Plantações em Área Plantada/ Naturais (*) em 2000
2000 2000 Total de
Florestas
000 ha 000 ha % 000 ha
África 649.904 8.075 1,2 641.829
Ásia 547.875 115.915 21,2 431.960
Oceania 201.157 2.848 1,4 198.309
Europa (e Rússia) 1.039.162 31.784 3,1 1.007.378
América Norte & Central 549.306 17.533 3,2 531.773
América do Sul 874.194 10.455 1,2 863.739
Total Mundial 3.861.605 186.609 4,8 3.674.996
Fonte: FAO - Forest Resources Assessment FRA 2000. (*) “Florestas Naturais” compreende ecossistemas de
fisionomia arbórea, mais ou menos alterados de sua condição primária, o que inclui ecossistemas florestais
manejados por povos indígenas ou não indígenas, extração seletiva de madeira e áreas em regeneração secundária
(capoeiras).

Em 1997, o World Resource Institute – WRI (ONG internacional com sede nos
EUA), apresentou resultados muito diferentes dos que a FAO encontrou. Apresentado
como “o primeiro levantamento científico das condições das florestas do mundo”, o estudo
intitulado Últimas Fronteiras Florestais – Ecossistemas e Economias no Limiar (WRI,
1997) estima que existam hoje cerca de 33,4 milhões de km² de florestas no mundo,
remanescentes de um total de 62,2 milhões de km² que cobriam a superfície terrestre a
cerca de 8.000 anos atrás.

No quadro 1.3 observa-se que os dados do WRI são significativamente distintos


daqueles encontrados pela FAO. A comparação só pode ser feita (e com restrições) entre os
dados de florestas remanescentes do WRI e os dados de florestas naturais da FAO, tendo
em vista que o WRI não incorpora plantações arbóreas na sua classificação de florestas (ao
contrário da FAO) e que ambas as categorias estão incorporando florestas secundárias e
áreas alteradas por cortes seletivos da floresta. Esse quadro demonstra quão diferentes
20

podem ser os resultados obtidos para períodos próximos, a partir de diferentes abordagens e
métodos de avaliação. Somente os resultados encontrados para a Ásia e para Europa/Rússia
não foram extremamente discrepantes entre as avaliações do WRI e da FAO.

Quadro 1.3: Comparação de resultados obtidos pela FAO e pelo WRI.


Área Original de Área Total de Florestas Diferença
Florestas Remanescente Naturais em 2000 Percentual
Região
(WRI) de Florestas em (FAO) WRI/FAO
1997 (WRI)
000 km² 000 km² 000 km² %
África 6.799 2.302 6.418 - 64,1
Ásia 15.132 4.275 4.320 - 1,0
Oceania 1.431 929 1.983 - 53,2
Europa (e Rússia) * 16.449 9.604 10.074 - 4,7
América Norte & Central 12.656 9.453 5.318 + 77,8
América do Sul 9.736 6.800 8.637 - 21,3
Total Mundial 62.203 33.363 36.750 - 9,2
Fontes: WRI – Fronteiras Florestais, 1997 e FAO - Forest Resources Assessment FRA 2000
* A FAO não separa Europa e Rússia; para o WRI, a Rússia ocupa a maior parte desse valor agregado (ver quadro 1.4)
OBS: 1 km² corresponde a 100 hectares.

Com uma abordagem mais voltada para as ameaças sobre a “integridade” dos
ecossistemas florestais, o estudo conduzido pelo WRI procurou avaliar a extensão do que se
poderia considerar florestas “intactas” entre as florestas remanescentes no mundo, ou seja,
as áreas de florestas que ainda não estão diretamente afetadas pela extração madeireira e
pelo avanço da ocupação agropecuária ou outras atividades impactantes. Essas áreas,
batizadas de “fronteiras florestais”, são consideradas “valiosas porque abrigam culturas
indígenas, protegem a biodiversidade global, mantêm ecossistemas, estocam carbono,
contribuem para o crescimento econômico local e nacional e provêm recursos para
recreação, ecoturismo, necessidades espirituais e estéticas” (WRI, 1997). O quadro 1.4
apresenta as estimativas de fronteiras florestais para todas as regiões do mundo,
comparadas percentualmente com as estimativas de florestas originais e remanescentes.
21

Quadro 1.4: Área total de florestas no mundo - original, atual e intacta (“fronteiras
florestais”), segundo o World Resource Institute (WRI).
Floresta
Remanescente Florestas Florestas
Floresta Floresta como % da Florestas Intactas como Intactas como %
Região Original Remanescente Floresta Intactas % da Floresta da Floresta
(000 Km2) (000 Km2) Original (000 Km2) Original Remanescente
África 6.799 2.302 34% 527 8% 23%
Ásia 15.132 4.275 28% 844 6% 20%
América do Norte
12.656 9.453 75% 3.909 31% 41%
e Amér. Central
América Central 1.779 970 55% 172 10% 18%
América do Norte 10.877 8.483 78% 3.737 34% 44%
América do Sul 9.736 6.800 70% 4.439 46% 65%
Rússia e Europa 16.449 9.604 58% 3.463 21% 36%
Europa 4.690 1.521 32% 14 0,3% 1%
Rússia 11.759 8.083 69% 3.448 29% 43%
Oceania (i) 1.431 929 65% 319 22% 34%
Mundo 62.203 33.363 54% 13.501 22% 40%
Nota: (i) Oceania consiste de Papua Nova Guiné, Austrália e Nova Zelândia
Fonte: WRI, 1997.

O WRI conclui portanto que, na condição de florestas intactas (fronteiras


florestais), restam somente 22% do que se estima tenha existido de florestas no mundo pré-
agrícola e cerca de 40% do total considerado hoje como florestas remanescentes. Nos
extremos dessa avaliação situam-se a Europa, onde praticamente não existem mais florestas
“originais-intactas”, e a América do Sul, com a maior extensão e o maior percentual de
fronteiras florestais, que se encontram em maior parte na Floresta Amazônica. O cenário
configurado pelo WRI sobre a situação das florestas está resumido a seguir e ilustrado no
gráfico 1 (em anexo).
22

Situação das Florestas no Mundo, avaliada pelo World Resource


Institute (WRI, 1997)

Quase a metade da cobertura florestal original do planeta já se


foi, grande parte destruída nas últimas três décadas.

Hoje, somente 1/5 da cobertura florestal original permanece em


áreas relativamente intactas - são as “fronteiras florestais”.

Três países – Rússia, Canadá e Brasil – abrigam quase 70% das


fronteiras florestais remanescentes no mundo.

Da cobertura florestal remanescente no mundo, 40% são


qualificadas como fronteiras florestais.

Setenta e seis (76) países avaliados neste estudo já perderam


completamente suas fronteiras florestais.

Onze países – incluindo Finlândia, Suécia, Vietnã, Guatemala e


Tailândia – estão prestes a perder suas fronteiras florestais.

Trinta e nove por cento (39%) das fronteiras florestais


remanescentes estão ameaçados pela exploração madeireira, pela
expansão agrícola e outras atividades humanas.

Metade das fronteiras florestais situa-se em regiões boreais, nas


inóspitas zonas do norte do Canadá, Rússia e Alaska, entre a
tundra e a floresta temperada (que só conta com 3% das
fronteiras florestais).

Fonte: WRI home page (http://www.wri.org/wri/ffi/lff-eng/findings.htm)


23

Ainda que as avaliações sobre a situação de florestas no mundo sejam de difícil


quantificação e classificação, variando muito em resultados obtidos por cada iniciativa
nesse sentido, não há dúvidas quanto à constante e rápida redução de florestas tropicais nas
últimas décadas. Segundo o WRI (1997), as florestas tropicais equatoriais permaneceram
amplamente preservadas até a chegada do século XX; entre 1960 e 1990 cerca de 450
milhões de hectares foram destruídos - 1/5 do total de florestas tropicais do mundo. A Ásia
perdeu cerca de 28% e a América Latina e a África cerca de 20% cada. Hoje se poderia
acrescentar mais 120 milhões de hectares neste déficit de florestas tropicais, perdidos na
década de 90 (quadro 1.5). De acordo com as estimativas apresentadas pela FAO no FRA
2000, as regiões tropicais apresentaram, no período 1990-2000, uma taxa de redução da
cobertura florestal cerca de 30% superior à taxa mundial - 12,1 milhões de hectares por ano
de redução - uma taxa consideravelmente alta; significa que, a cada minuto, 23 hectares de
florestas tropicais são destruídos no mundo.

Quadro 1.5: Distribuição das florestas tropicais no mundo, segundo a FAO


Florestas Florestas Redução Variação Variação Total de
Região Tropicais Tropicais florestas Anual de Anual Total Florestas
em em tropicais Florestas (tropicais e em 2000
1990 2000 1990-2000 Tropicais não tropicais)
1990-2000 1990-2000
000 ha 000 ha 000 ha 000 ha/ano 000 ha/ano 000 ha
África 687.288 634.342 - 52.946 -5.295 -5.264 649.904
Ásia 315.880 291.694 - 24.186 -2.419 -363 547.875
Oceania 36.350 35.132 - 1.218 -122 -83 201.157
América Norte & Central 88.301 78.721 - 9.580 -958 -570 549.306
América do Sul 856.449 822.718 - 33.731 -3.373 -3.628 874.194
Total Mundial (- Europa) * 1.984.268 1.862.607 - 121.661 -12.166 -9.045 2.822.436
Fonte: Dados apresentados no FRA 2000 (incluem as plantações arbóreas).
Obs: De acordo com a classificação da FAO, foram considerados como tropicais (e subtropicais) os países que se
encontram na faixa compreendida, aproximadamente, entre os trópicos de Cancer e Capricórnio, excluindo Austrália ao
sul e incluindo toda a Índia, Nepal, Butão e Bangladesh ao norte; * logicamente, toda a Europa está fora dessa
categoria.

De acordo com a avaliação da FAO, a África foi o continente que apresentou a mais
alta taxa de redução de cobertura florestal tropical no período 1990-2000, seguido da
América do Sul e depois da Ásia. Entre os países tropicais, o Brasil apresentou a maior
perda média de cobertura florestal total – 2,23 milhões ha/ano. O segundo país com a maior
perda de florestas tropicais foi a Indonésia – 1,31 milhão ha/ano. E o terceiro foi o Sudão,
com uma redução de 959 mil ha/ano. Dos países com maior extensão de florestas tropicais
(acima de 50 milhões de hectares), a Índia foi o único país que não apresentou redução na
cobertura florestal total no período 1990-2000.
24

No entanto, considerando-se que esses dados incluem as áreas de plantações


arbóreas, seria preciso desagregar os dados relativos às plantações de 1990 e de 2000 para
melhor avaliar a taxa de desmatamento das florestas nativas. Isso não seria possível com os
dados de 1990 revistos no FRA 2000 (que não apresenta os dados de área plantada em
1990, separados dos totais de florestas). No entanto, recorrendo-se às estimativas
apresentadas no FRA 1990, verifica-se que, excluindo as áreas de plantações apresentadas
para 1990 e 2000, as florestas tropicais naturais apresentariam a mesma taxa de
desmatamento que apresentaram no período 1980-90, como demonstra o quadro 1.6.

Quadro 1.6: Variação na extensão de florestas tropicais no mundo entre 1980-90 e entre
1990-2000, com e sem plantações.
Região Variação Tropical 1980-90 Variação Tropical 1990-2000 Variação Tropical 1990-2000
(sem plantações) (sem plantações) (com plantações)
000 ha/ano 000 ha/ano 000 ha/ano
África -4 101 - 5.564 -5.295
Ásia -3 922 - 5.632 -2.419
Oceania -131 - 133 -122
Europa (e Russia) - - -
América Norte & Central -1.202 - 1.039 -958
América do Sul -6.204 - 3.507 -3.373
Total Tropical -15.560 - 15.876 -12.166
Fonte: FAO - FRA1990 e FRA2000.

Portanto, excluindo-se as áreas de plantações dos totais de florestas apresentados


pela FAO, estariam sendo destruídos, a cada minuto, 30 hectares de florestas tropicais no
mundo. A taxa de desmatamento das florestas tropicais na Ásia seria muito maior no
período 1990-2000 do que aquela apresentada pelo FRA 2000 para o conjunto do que a
FAO classifica como florestas (naturais + plantações), passando o continente Asiático a
apresentar a maior taxa de desmatamento de florestas tropicais do mundo. A Índia, assim,
sem as plantações, passaria a ocupar o segundo lugar (depois do Brasil) entre os países que
sofreram as maiores perdas de florestas tropicais naturais entre 1990-2000, com uma
redução média de 1,9 milhão ha/ano. Na Indonésia, a taxa se elevaria para 1,7 milhão de
ha/ano. No Brasil não haveria alteração, tendo em vista que a área total de plantações,
segundo a FAO, não sofreu alteração significativa no período. A taxa média de
desmatamento no Brasil, além de ser a maior do mundo, já esteve 40% mais elevada no
25

período 1980-90 (perda de 3,67 milhões ha/ano), mais da metade da taxa total de
desmatamento da América do Sul naquela década.

A elevada taxa de desmatamento no Brasil deve-se à sistemática destruição da


Floresta Amazônica. Na avaliação do Projeto Pathfinder, o desmatamento da Amazônia
Brasileira no período 1978-86 teria sido de 1,8 milhão ha/ano, caindo para 1,4 milhão
ha/ano no período 1986-93. Os dados do governo brasileiro são mais elevados - o Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) avalia que a taxa média de desmatamento na
Amazônia Legal foi de 2,2 milhões ha/ano na década de 1980, caindo para 1,7 milhão
ha/ano na década de 1990. Até agosto de 1998, segundo o INPE, a Amazônia Brasileira
havia perdido mais de 55 milhões de hectares de cobertura florestal bruta, ou seja,
considerando-se somente as áreas onde houve corte raso da floresta, convertidas para uso
agropecuário. O INPE não considera as áreas sob exploração madeireira e atingidas por
incêndios. Segundo Nepstad et al. (1999), a extração de madeira na Amazônia afeta uma
área entre 1,0 e 1,5 milhão ha/ano de floresta nativa.

Observa-se, portanto, que as estimativas de desmatamento para os países tropicais


podem se apresentar muito diferenciadas quando se desagrega as áreas de plantações, o que
não parecia ser relevante no cenário global de florestas no mundo, estimado em 2000 pela
FAO, onde as plantações representam menos de 5% do total (quadro 1.2). A importância
de desagregar os dados sobre as plantações para avaliar a taxa de desmatamento apresentou
relevância especialmente na análise individualizada de determinados países. Esse confronto
de dados sobre florestas naturais e plantações arbóreas demonstra que a existência das
plantações (especialmente na Índia, onde predominam vastas monoculturas de eucaliptos)
não está contribuindo para reduzir as taxas de desmatamento das florestas naturais
tropicais, que são resultantes de um conjunto maior e mais complexo de fatores do que
apenas a demanda industrial de madeira (ver item 1.2).

As plantações arbóreas ocupam grandes áreas na maior parte dos países. Excluindo-
se a Europa, nas demais Regiões, o conjunto de países (tropicais e não tropicais) que têm
mais de 500 mil hectares de área total plantada responde por mais de 90% da área total de
plantações do mundo. Desse conjunto de países com mais de 500 mil ha de área plantada,
os países tropicais aparecem com 33% do total de área de plantações arbóreas no mundo. A
26

Índia, a Indonésia, a Tailândia e o Brasil são os que possuem as maiores áreas plantadas. Os
quatro países juntos somam 85% da área total de plantações dos países tropicais (somente a
Índia responde por mais da metade disso). Com relação às espécies plantadas nas regiões
tropicais, cerca de 28% da área total de plantações estão ocupados com diversas espécies de
folhosas, 21% com eucalipto, 13% com borracha (Hevea), 11% com acácia, 9% com pinus,
8% com tectona e 4,5% com outras coníferas. Esses percentuais variam de acordo com a
Região (quadro 1.7).

Quadro 1.7: Área de plantações arbóreas em regiões tropicais, em 2000.


Área total taxa Área de plantação por grupo de espécies
Região plantada anual Acacia Eucalipto Hevea Tectona Outras Pinus Outras Não
plantio (borracha) folhosas coníferas definido
000 ha 000 ha 000 ha 000 ha 000 ha 000 ha 000 ha 000 ha 000 ha 000 ha
África 4.818 134 182 875 573 195 818 691 280 1.204
Ásia 54.624 2.258 7.830 9.652 8.466 5.385 17.949 2.545 2.797 0
Oceania 263 15 8 33 20 7 101 73 10 10
Am Norte 1.295 113 0 198 52 76 383 406 88 92
Central
Am. Sul 6.890 248 0 3.718 183 18 240 2.611 98 23
Total 67.890 2.768 8.020 14.476 9.293 5.680 19.490 6.328 3.273 1.330
Tropical
Fonte: FAO – Forest Resource Assessment, FRA 2000.

Na África, os eucaliptos ocupam uma área um pouco maior que as demais espécies,
mas não é expressiva em relação à área total que a espécie ocupa no conjunto de países
tropicais. Na Ásia, as “outras folhosas” ocupam área de destaque, seguidas do eucalipto, da
borracha e da acácia (três espécies que ocupam grandes áreas). Na Região das Américas do
Norte e Central, os pinus ocupam a maior área, embora relativamente pequena.

É na América do Sul que se observa uma maior discrepância na distribuição das


plantações, com uma concentração quase absoluta de plantações de eucaliptos e pinus. O
Brasil responde por 81% da área total de eucaliptos e por 68% da área total de pinus entre
os países tropicais da América do Sul – são cerca de 3,0 milhões de hectares de eucaliptos e
1,8 milhão de hectares de pinus. O Chile (país não tropical) é o segundo plantador de pinus
da América do Sul, com 1,5 milhão ha.

O gênero florestal mais amplamente cultivado nos países tropicais – Eucalyptus spp
– ocupa cerca de 14,5 milhões de hectares, dos quais mais da metade (8,0 milhões de ha –
27

55%) estão na Índia, 21% no Brasil e o restante distribuído em menores áreas por diversos
países. A principal área de ocorrência natural do eucalipto é o continente Australiano, mas
foi largamente difundido nos trópicos, em vista de sua rapidez de crescimento, rusticidade e
diversidade de usos (madeira serrada, celulose, carvão, dormente, poste, etc.). Existem
diversas polêmicas quanto aos impactos ambientais e sociais das monoculturas exóticas,
principalmente as de eucaliptos, que serão brevemente comentadas em outros itens dessa
dissertação.

Em síntese, no cenário das estimativas de distribuição e variação temporal da


cobertura florestal tropical, apesar da diversidade de métodos e da imprecisão dos dados
existentes, observa-se que as taxas de desmatamento das florestas tropicais nos últimos
anos, além de terem sido as mais altas do mundo, são alarmantes e extremamente elevadas
nas poucas regiões que ainda dispõem de extensas áreas florestadas. Mantidas as taxas
atuais, alguns países tropicais perderão totalmente suas florestas naturais em poucos anos
(ver quadro 1.8). Mas, à medida que aumenta a infra-estrutura de ocupação das áreas
florestadas (estradas, cidades...), a tendência é aumentar a velocidade de desmatamento. As
plantações arbóreas estão muito aquém de compensar as perdas em área de florestas
naturais e menos ainda em biodiversidade, potencial de uso e funções ecossistêmicas, tendo
em vista que a maior parte da área total de plantações está ocupada por monoculturas
arbóreas, com menos de 10 espécies predominantes.

O gráfico 2 (em anexo) ilustra as proporções de taxas de desmatamento entre os


países listados no quadro 1.8 e o quadro 1.9 apresenta a situação dos países que detêm as
maiores extensões de florestas naturais, quanto às taxas de variação da cobertura florestal
no período 1990-2000 e as respectivas áreas de plantações arbóreas existentes em 2000. Em
anexo, a distribuição total de florestas no mundo em 2000 é apresentada em mapa reduzido
do original da FAO, com um destaque para a América do Sul, onde se encontra a maior
floresta tropical do mundo – a Amazônica.
28

Quadro 1.8: Países com maiores áreas de florestas naturais e maiores taxas de desmatamento.
PAÍSES TAXA ANUAL DE ÁREA TOTAL DE DEADLINE
DESMATAMENTO FLORESTAS NATURAIS
1990 – 2000 2000 EM ANOS (*)
(hectares / ano) (hectares)
1 Brasil - 2.234.550 527.499.500 236
2 Índia - 1.896.660 31.535.400 17
3 Indonésia - 1.686.950 95.115.500 56
4 Sudão - 1.002.652 60.986.482 61
5 Zâmbia - 853.620 31.170.800 37
6 Mianmar - 575.500 33.598.000 58
7 Tailândia - 551.500 9.842.000 18
8 Rep. Dem. Congo - 537.870 135.110.300 251
9 Nigéria - 452.610 12.823.900 28
10 Malásia - 403.750 17.542.500 43
11 Zimbabwe - 325.580 18.899.200 58
12 Argentina - 323.000 33.722.000 104
13 Peru - 314.400 64.575.000 205
14 Venezuela - 278.500 48.643.000 175
15 Irã (NT) - 220.530 5.014.700 23
Fonte: FAO, FRA 1990 e FRA 2000. (*) Número de anos para extermínio total das florestas, mantidas as taxas atuais
de desmatamento. (NT) – não tropical.
29

Quadro 1.9: Países com as maiores extensões de florestas naturais, suas taxas anuais de variação da
cobertura florestal natural e área total de plantações arbóreas
Regiões / Países Total Florestas Naturais Variação de cobertura Total de Plantações
2000 florestal 1990-2000 2000
000 ha 000 ha / ano 000 ha
Rep Dem do Congo 135.110 -538 97
Angola 69.615 -126 141
Sudão 60.986 -1.003 641
Tanzânia 38.676 -89 135
Zâmbia 31.171 -854 75
Moçambique 30.551 -66 50
Zimbabwe 18.899 -326 141
Nigéria 12.824 -453 693
Chad 12.678 -83 14
África do Sul (NT) 7.363 -67 1.554
Marrocos (NT) 2.491 -22 534
Argélia (NT) 1.427 3 718
ÁFRICA 641.830 -5.625 8.036
China (NT) 118.397 481 45.083
Indonésia 95.116 -1.687 9.871
Mianmar (ex-Birmânia) 33.598 -576 821
Índia 31.535 -1.897 32.578
Malásia 17.543 -404 1.750
Japão (NT) 13.399 ? 10.682
Tailândia 9.842 -552 4.920
Turquia (NT) 8.371 -163 1.854
Vietnã 8.108 28 1.711
Filipinas 5.036 -144 753
Irã (NT) 5.015 -221 2.284
Paquistão 1.381 -121 980
Bangladesh 709 -22 625
ÁSIA 426.242 -6.347 115.874
Austrália (NT) 157.037 -104 1.043
Papua Nova Guiné 30.511 -119 90
Nova Zelândia (NT) 6.404 -115 1.542
OCEANIA 198.315 -353 2.848
Canadá (NT) 244.571 - -
Estados Unidos (NT) 209.755 1.236 16.238
México 54.938 646 267
Cuba 1.867 -4 482
Costa Rica 1.790 31 178
AMÉRICA NORTE E CENTRAL 531.773 2.323 17.533
Brasil 527.500 -2.235 4.982
Peru 64.575 -314 640
Venezuela 48.643 -279 863
Argentina 33.722 -323 926
Chile 13.519 -121 2.017
Uruguai 670 4 622
AMÉRICA DO SUL 863.739 -3.946 10.455
Fonte: FAO, FRA 1990 e FRA 2000. NT – não tropical.
30

1.2 Causas do Declínio das Florestas Tropicais

Diversas causas são apontadas na literatura e em manifestos políticos a respeito da


destruição das florestas tropicais, desde causas históricas reincidentes e cada vez mais
eficientes quanto aos meios de destruição, até causas mais recentes no desenvolvimento da
sociedade industrial.

Pesquisadores do Departamento de Ecologia Humana da Universidade de Rutgers,


em New Jersey, Estados Unidos, realizaram um extenso levantamento bibliográfico sobre o
desmatamento das florestas tropicais, como subsídio ao desenvolvimento do FRA 2000
(Rudel et al., 2000). Os autores encontraram mais de 1.200 referências bibliográficas, das
quais selecionaram 825, excluindo aquelas que apenas citavam o problema “de passagem”,
outras que tinham versões mais recentes e as que eram “impossíveis de se obter”. Nas
análises dos artigos selecionados, feitas com uso de software estatístico, os autores
identificaram um conjunto de 20 causas atribuídas aos desmatamentos tropicais:

CAUSAS ATRIBUÍDAS AOS DESMATAMENTOS TROPICAIS, encontradas na literatura pesquisada por


Rudel et al. (2000):

1. Exploração madeireira 11. Forças de mercado internacionais


2. Pecuária 12. Políticas e subsídios governamentais
3. Expansão agrícola 13. Crescimento populacional
4. Pequena produção agrícola 14. Pobreza ou nível de renda
5. Lenha (uso doméstico) 15. Nível de educação
6. Construção de estradas (via férrea inclusive) 16. Condições legais de posse da terra
7. Extração mineral 17. Dívida externa
8. Desenvolvimento Hidroelétrico 18. Colonização
9. Processos Industriais 19. Urbanização
10. Guerra 20. Fogo

Analisando 563 artigos que apresentavam uma clara referência geográfica, Rudel et
al. (2000) concluíram que a literatura aponta a exploração madeireira como principal causa
de desmatamento no Sudeste da Ásia, enquanto que a demanda por lenha parece conduzir a
maior parte do processo de desmatamento nas regiões mais secas e populosas do Leste da
África e do Sul da Ásia. O crescimento populacional parece direcionar o desmatamento em
31

uma extensão maior na África e na Ásia, mais do que na América Latina, onde programas
de colonização, associados à construção de estradas e à expansão das fazendas de gado têm
aparentemente induzido os desmatamentos das florestas tropicais. A agricultura, em
pequena e larga escala, a expansão do mercado e as políticas públicas parecem agir com
igual intensidade em todas as regiões.

Rudel et al. (2000) verificaram que os fatores que condicionam os desmatamentos


nas regiões tropicais são citados na bibliografia com variações ao longo do tempo (quadro
1.10). Os autores concluem que um certo número de fatores parecem permanecer
essencialmente imutáveis – “Exploração madeireira, expansão das monoculturas agrícolas,
pequena agricultura, construção de estradas, crescimento populacional e demanda por lenha
foram freqüentemente citadas tanto em trabalhos dos anos 1990 quanto em trabalhos
anteriores aos anos 1980.” Em relação à América Latina, os autores identificaram uma
redução, ao longo do tempo, nas citações a respeito da expansão das fazendas de gado
sobre as florestas, o que eles consideram que possa estar refletindo o corte dos subsídio
para os projetos de colonização na Amazônia Brasileira ou pelo menos um “pálido”
interesse dos pesquisadores no assunto.

Quadro 1.10: Tendência ao longo do tempo das causas atribuídas aos desmatamentos,
expressa em número de estudos que citam as causas.
Causa Pré-1980 1980s 1990s Total
Pequena agricultura 56 193 150 399
Extração de madeira 41 149 123 313
Fazenda de gado 36 123 72 231
Colonização 37 122 67 226
População 27 105 83 215
Agricult. em larga escala 28 83 68 179
Expansão do mercado 17 79 81 177
Construção de Estradas 27 80 66 173
Extração de lenha 11 77 52 140
Dívida Externa 0 28 18 46
Total 88 335 268 691
Fonte: Rudel et al. (2000).

Como fatores mais recentes, a análise da literatura, realizada por Rudel et al. (2000)
identifica dois fatores relacionados à globalização que vêm crescendo em importância nos
32

estudos realizados nos anos 1990, que são: a) expansão dos mercados, com o crescimento
das populações urbanas, o desenvolvimento dos transportes e a busca por matéria-prima em
locais mais distantes; e b) o crescimento da dívida externa dos países em
desenvolvimento, que resultou em “acordos de ajuste estrutural”, levando a uma renovada
ênfase na expansão das culturas de exportação às expensas das florestas. Aos autores da
pesquisa bibliográfica resta a dúvida quanto à correlação entre os fatores apontados na
literatura e a real influência desses nos processos de desmatamento tropical (além das
ressalvas quanto à própria interpretação da equipe que pesquisou a literatura em questão),
dúvida esta que os autores entendem só poderia ser sanada com uma pesquisa mais apurada
nas regiões em que ocorrem os desmatamentos.

Os estudos mais recentes sobre a situação das florestas vêm evoluindo no sentido de
diferenciar as causas dos desmatamentos (ou, mais amplamente, do declínio das florestas)
em causas diretas e indiretas (ou subjacentes). As causas diretas são identificadas como
aquelas que se observam na ação de desmatamento, tais como a extração madeireira e a
expansão de fazendas de gado e de monoculturas agrícolas comerciais. Essas causas diretas
são influenciadas ou mesmo determinadas por outras causas – as subjacentes - tais como
pressões de mercado, crescimento populacional, dívida externa, políticas macroeconômicas,
etc., que muitas vezes se originam ou se localizam muito longe do local do desmatamento.

Uma distinção também é feita entre causas de desmatamento e seus agentes. Os


agentes são os indivíduos ou grupos de indivíduos, corporações, instituições,... que
“convertem diretamente terras florestadas em outros usos ou que intervêm na floresta sem
necessariamente causar o desmatamento, mas reduzindo substancialmente sua capacidade
produtiva” (Contreras-Hermosilla, 2000). Os agentes são considerados responsáveis pelas
causas diretas (quadro 1.11), mas não necessariamente “culpados” pelos desmatamentos.
Segundo Roper et al. (1999), pela não distinção entre agentes e causas, às vezes se coloca a
culpa erradamente em grupos que “estão apenas agindo de uma maneira economicamente
racional, dada a estrutura sócio-econômica e política na qual se encontram”.
33

Quadro 1.11: Importantes agentes de desmatamento.


Agentes Relações de desmatamento
Pequenos agricultores (lavoura de corte-e- cortam a floresta para cultivos de subsistência e venda no mercado
queima)
Grandes fazendeiros (agricultura comercial) cortam a floresta para introduzir plantas comerciais, algumas vezes
desalojando pequenos produtores, que, por sua vez, se movem para a
floresta
Criadores de gado cortam a floresta para cultivar pastagens, algumas vezes desalojando
pequenos produtores, que se movem para a floresta
Condutores de rebanho a intensificação da atividade de transporte do gado pode conduzir ao
desmatamento
Madeireiros retiram a madeira comercial, danificam o ecossistema, expulsam
populações nativas e abrem estradas que dão acesso a outros usuários da
terra
Plantadores de árvores comerciais cortam grande parte da floresta para estabelecer plantações que vão suprir
a indústria de celulose e papel
Coletores de lenha a intensificação da coleta de lenha pode levar ao desmatamento
Mineradores e industriais do petróleo estradas e linhas de sismógrafos provêm acesso a outros usuários da terra
e desmatamentos localizados relacionados a suas operações
Planejadores de projetos de colonização ou relocação de pessoas dentro de áreas florestadas, bem como projetos de
assentamento assentamento desalojam outras pessoas que se movem para a floresta
Agentes de desenvolvimento de novos acessos para outros usuários da terra com a construção de estradas
infraestrutura e ferrovias em áreas florestadas, inundações com barragens hidroelétricas
Fonte: Roper et al. (1999).

Existe na literatura um consenso de que o declínio das florestas não é o resultado de


uma ou outra causa isoladamente e sim de várias causas atuando em um processo
encadeado. A distinção e, principalmente, uma clara identificação das causas subjacentes
podem ser decisivas na definição e na escolha de políticas de combate ao desmatamento.
Contreras-Hermosilla cita, como exemplo, a questão da pobreza:

Os analistas que fizerem uma viagem curta para trás, na corrente de causalidade do
declínio das florestas, podem entender que a pobreza é uma causa subjacente.
Outros, olhando mais atrás ainda, poderiam argumentar que a verdadeira causa
subjacente está nas desiguais estruturas de poder político e econômico, que, por sua
vez, estão enraizadas nas bases da sociedade e, portanto, a pobreza não é outra coisa
senão o efeito de tais estruturas de poder. Para estes, a pobreza é o resultado de outra
causa subjacente que opera em um nível mais alto. (...) Os analistas que concluírem
que a pobreza é a causa subjacente aos desmatamentos tenderão a emitir prescrições
políticas para acelerar o crescimento da renda e o combate à pobreza. Mas os
pensadores que vejam o desmatamento como resultado de estruturas desiguais de
poder lançarão prescrições voltadas para mudanças nas relações sociais, econômicas
e políticas, necessárias para alterar o modo pelo qual diferentes grupos obtêm
controle sobre bens produtivos. Eles podem incluir mudanças radicais, tais como
reforma agrária e expropriação de bens produtivos. (Contreras-Hermosilla, 2000: 6).
34

Os principais aspectos destacados na literatura sobre as causas diretas e subjacentes


do declínio das florestas são apresentados a seguir.

1.2.1 Causas Diretas

a) Agricultura de “corte-e-queima”

Há uma expressiva ênfase na literatura quanto à destruição das florestas pelos


agricultores que praticam a lavoura de corte-e-queima, também conhecida como lavoura
itinerante. Para Roper et al. (1999), essa prática é considerada responsável por 2/3 de todo
o desflorestamento tropical, variando quanto ao tempo de rotação das culturas, quanto ao
tipo de produto e uso final (se para subsistência apenas ou para mercado, ou ambos), quanto
à distância da área urbana e quanto aos danos causados ao ecossistema florestal.

Cortar de 1 a 3 hectares da floresta, queimar a vegetação e cultivar a área com


milho, feijão, mandioca, etc., é uma prática muito antiga e considerada ambientalmente
sustentável nos moldes das comunidades tradicionais, ou seja, em condições de baixa
densidade populacional e razoável disponibilidade de terra e recursos, onde se pode deixar
que a floresta volte a crescer na área cultivada, após 3-5 anos de uso. O que hoje se chama
de agricultura de “corte-e-queima” é a mesma prática, porém realizada em condições
completamente diferentes de acesso à terra e aos recursos.

Em geral, os agricultores itinerantes estão entre os grupos mais pobres e


marginalizados de suas sociedades e têm pouca ou nenhuma influência sobre as decisões
políticas tomadas quanto ao uso da terra em seus países. Sem acesso a terra e recursos, os
pequenos agricultores tendem a ocupar terras mais distantes, geralmente áreas de fronteiras
florestais, até que sejam desalojados por novos e mais poderosos usuários da terra e tenham
novamente que se deslocar para terras mais distantes. Assim, são vistos como principais
culpados pelos desmatamentos quando, muitas vezes, estão sendo “usados” nas frentes de
ocupação agropecuária pelos maiores agentes de desmatamento.
35

b) Agricultura Comercial

Essa categoria refere-se às plantações agrícolas em larga-escala, geralmente


monoculturas e praticadas por grandes proprietários ou corporações. Podem ser causa direta
de desmatamento tanto pela aquisição de novas terras florestadas para convertê-las em uso
agrícola, como pela expulsão de pequenos produtores que passam a ocupar áreas
florestadas mais distantes. A agricultura comercial em larga-escala tem sido incentivada
pelos governos para culturas de exportação. No Brasil, a expansão da soja nas Regiões
Centro-Oeste e Norte tem sido a causa direta de extensos desmatamentos na Amazônia
Meridional, atingindo vastas áreas de cerrados e florestas de transição (regiões de alta
diversidade e endemismos).

A expansão agrícola em regiões tropicais tende a ser um rápido processo, tendo em


vista a baixa fertilidade em geral dos solos tropicais. Grandes proprietários e corporações
fazem uso de insumos químicos em grandes quantidades para compensar as rápidas perdas
de nutrientes do solo, resultantes da intensa ação de intemperismo do clima tropical. Mas a
tendência a médio e longo prazos é de redução da produtividade agrícola, principalmente
em áreas cultivadas com monoculturas de ciclo curto, como a soja. A expansão do
agribusiness em regiões de florestas tropicais tem relação direta com políticas nacionais de
colonização e assentamento rural e de favorecimento ao latifúndio – fatores identificados
no rol das causas subjacentes (item 1.2.2).

c) Pastagens e Criação de Gado

A implantação de fazendas de gado é considerada a principal causa direta de


desmatamento na América Latina. Tal como ocorre com a agricultura comercial, os
fazendeiros destroem as florestas pela derrubada da mata ou pela aquisição de áreas de
pequenos agricultores, semi-desmatadas para cultivo das roças, terminando de desmatá-las
e expulsando os pequenos para novas fronteiras florestais. Estima-se que a área total
utilizada com pastagens na América Central passou de 3,9 milhões de hectares em 1955
para 13,4 milhões de hectares em 1995 (Roper et al., 1999).

Na fronteira meridional da Amazônia Brasileira, com os projetos de colonização


iniciados nos anos 1970, centenas de criadores de gado do sul do país migraram para a
36

região e rapidamente derrubaram e queimaram extensas áreas de florestas para introdução


das pastagens. O processo de desmatamento ocorre, muitas vezes, como resultado da
cooperação entre madeireiros e fazendeiros para a abertura e manutenção de estradas e para
o corte das árvores e limpeza da área. A cultura sulista de formar pastagens para criação de
gado continua prevalecendo na expansão da ocupação de terras na região Amazônica.

d) Coleta de Lenha e Produção de Carvão

Assim como a agricultura de “corte-e-queima”, a coleta de lenha para o consumo


doméstico tem sido apontada como forte causa do declínio das florestas tropicais, embora
não existam dados confiáveis sobre as quantidades que são retiradas e consumidas e a
extensão de área atingida pela atividade. Outro aspecto importante é a diferenciação entre o
uso doméstico do uso industrial das florestas como fonte energética. Há um expressivo
consumo extrativista para a produção de carvão vegetal que alimenta as indústrias
siderúrgicas, metalúrgicas e outras, que, no entanto, não é normalmente diferenciado do
consumo doméstico de lenha de populações pobres nas estimativas de exploração.

Segundo Matthews et al. (2000), estima-se que cerca de 1,8 bilhão de metros
cúbicos de madeira sejam queimados anualmente como combustível, o que eqüivale a mais
da metade da quantidade de madeira explorada no mundo e corresponde a 15% em média
do consumo primário de energia dos países em desenvolvimento e mais de 80% do
consumo total de energia de alguns países da África e da Ásia. No entanto, de acordo com
esses autores, as florestas parecem suprir apenas 1/3 desse consumo energético; a maior
parte vem de bosques secundários, plantios comunitários, resíduos da indústria madeireira,
quintais e beiras de estradas. Pesquisas realizadas na África demonstram que grande parte
da lenha consumida pelos pobres das zonas rurais é proveniente de matas derrubadas para a
expansão agrícola (WRM, 2001: 3).

e) Exploração Madeireira

A extração de madeira em tora das florestas tropicais é considerada uma causa


direta de degradação florestal mas não de desmatamento (corte raso da floresta), tendo em
37

vista tratar-se de extração seletiva de algumas poucas espécies de interesse comercial. A


degradação é resultante da abertura de uma densa malha de estradas e trilhas para a retirada
das toras, dos danos causados a outras espécies durante o corte e a queda das árvores e do
modo imediatista e predatório pelo qual a extração é realizada (sem um manejo que permita
a regeneração natural e a conservação genética das espécies extraídas). Segundo Nepstdad
et al. (1999), a atividade madeireira na Amazônia mata ou danifica de 10 a 40% da
biomassa viva da floresta e aumenta a possibilidade de incêndios pela redução entre 14 e
50% do dossel, permitindo a entrada de luz do sol e, portanto, a redução de umidade e o
ressecamento da matéria orgânica acumulada no interior da floresta.

Nesse contexto, o desmatamento total tem sido uma conseqüência imediata da


extração de madeira em tora na área explorada pelas madeireiras. Após a retirada das
árvores de interesse comercial, a área é geralmente desmatada para a instalação de
pastagens ou culturas agrícolas.

A extração de madeira em tora tem ocorrido de forma ilegal em muitos países


tropicais e mesmo quando há acordos e contratos legais que restringem a atuação das
madeireiras, estes muitas vezes são desrespeitados, principalmente no que tange à presença
dos povos da floresta e seus direitos ancestrais de ocupação e uso do território.

Na Amazônia Brasileira, a exploração madeireira em geral e especialmente em


territórios indígenas, demarcados ou não, tem sido causa de degradação das florestas e
“porta de entrada” de outras ocupações. A estratégia de ação das madeireiras inclui a
corrupção de funcionários do governo e o aliciamento das comunidades indígenas com
oferta de bens materiais e dinheiro. Algumas comunidades indígenas chegam a fazer
acordos com as madeireiras para a “venda” da madeira de seus territórios. Outras
comunidades têm suas terras literalmente invadidas e exploradas pelas madeireiras, sem
receber nenhum “benefício” em troca. Com apoio de ONGs e de pesquisadores, algumas
comunidades indígenas têm procurado instaurar sistemas de manejo florestal sustentado
para aproveitamento econômico racional da madeira de suas florestas (ver itens 2.2.5 e 2.3).
38

f) Incêndios Florestais

Os incêndios florestais nas regiões tropicais são quase sempre iniciados por ação
humana, agravados por condições ambientais desfavoráveis. Nos recentes anos de
influência do fenômeno climático conhecido como El Niño, que provocou longos períodos
de estiagem, foram registrados grandes incêndios florestais, como o que ocorreu em
Roraima, no Brasil, em 1997. Nos anos de 1997 e 1998 os incêndios destruíram milhões de
hectares de florestas em várias regiões do mundo. Segundo Rowell e Moore (1999), os
incêndios atingiram cerca de 3,3 milhões de hectares no Brasil, dos quais mais da metade
no Estado de Roraima; no Sudeste da Ásia, várias regiões florestadas foram atingidas por
incêndios, o pior deles na Indonésia, onde estima-se tenham sido destruídos mais de 4,5
milhões de hectares de florestas; outras áreas florestadas também foram queimadas na
América Central, no México, EUA, Canadá e Rússia; no total, estima-se que, nos anos de
1997-98, ao menos 22 milhões de hectares de terras foram atingidos por incêndios, dos
quais 14 milhões em áreas de florestas, afetando ainda a saúde de mais de 130 milhões de
pessoas.

O uso do fogo para limpeza de terreno é uma prática antiga e geralmente de difícil
controle, especialmente em condições climáticas favoráveis à propagação de incêndios,
com estiagens prolongadas e ventos fortes. Como já visto, nas regiões de fronteiras
florestais a extração madeireira tem sido identificada como facilitadora da propagação de
incêndios, pela abertura de clareiras e produção de matéria orgânica seca proveniente da
vegetação morta e cortada.

g) Plantações Arbóreas Comerciais

Apesar das plantações arbóreas comerciais serem classificadas pela FAO como
florestas, muitas florestas nativas foram destruídas para dar lugar a extensas monoculturas
arbóreas que em nada se assemelham às florestas que existiam no lugar. Desde meados do
século XX, em muitos países “em desenvolvimento” vêm sendo implantadas monoculturas
arbóreas, principalmente para atender à demanda das indústrias de celulose e papel. No
Brasil, muitos ecossistemas florestais foram destruídos para este fim e ainda são. O projeto
Jari, na Amazônia, é dos mais fortes exemplos.
39

Em países da Ásia, o processo de desmatamento das florestas tropicais para dar


lugar às plantações parece ser contínuo. Na Indonésia, por exemplo, o crescimento do setor
de celulose e papel está baseado, desde os anos 1980, na destruição de vastas áreas de
florestas naturais – estimada em pelo menos 800.000 ha/ano; no Laos, florestas estão sendo
cortadas para um projeto de Plantação de Árvores Industriais, orçado em 11,2 milhões de
dólares (WRM, 2001: 8).

Roper et al. (1999) reconhecem que muitas áreas de florestas naturais heterogêneas
foram e ainda são cortadas para dar lugar às monoculturas de rápido crescimento para o
setor de celulose e papel, como no caso das plantações de Acacia para a crescente indústria
de celulose da Indonésia, mas relativizam a importância das plantações no processo de
desmatamento, considerando que a área anualmente ocupada com plantações nos 10 países
com as maiores taxas de desmatamento não é significativa porque representa menos de
10% da taxa anual de desmatamento desses países.

h) Exploração Mineral e Petrolífera

As atividades de mineração podem ter grande impacto sobre as florestas e o


ambiente em geral, como no caso da extração de ferro em Carajás, no Sul do Pará, que
também extrai grande quantidade de floresta nativa para o consumo energético dos altos
fornos, substituindo-as por monoculturas arbóreas. Os garimpos de ouro existentes em
várias regiões da Amazônia não chegam a atingir grandes áreas de florestas, seus impactos
ambientais são mais acentuados sobre as matas ciliares e sobre a qualidade das águas e dos
ecossistemas aquáticos. A exploração de petróleo destrói grandes faixas de florestas e abre
caminho para novas ocupações da terra. Ambas causam impactos sobre a segurança e a
qualidade de vida das populações locais.

i) Desenvolvimento de Infraestrutura

Nesse aspecto, a literatura destaca as atividades de construção de barragens para


geração de energia hidroelétrica e a construção de estradas, como a Transamazônica e as
estradas abertas pelos madeireiros. Ambas destroem grandes áreas florestadas e expulsam a
população local, que tende a procurar novas áreas florestadas para ocupação. Segundo
40

Contreras-Hermosilla (2000), podem ser desmatados entre 400 e 2000 hectares de floresta
para cada quilômetro de estrada construída.

As barragens hidroelétricas têm sido consideradas uma das principais causas diretas
e indiretas da perda de florestas e muitas delas têm resultado em amplos abusos aos direitos
humanos. Existem mais de 40.000 grandes barragens, cujos reservatórios cobrem um total
superior a 400 mil km². Muitos desses reservatórios inundaram milhares de hectares de
florestas tropicais, sem nem mesmo aproveitar a madeira (WRM, 2001). Segundo a
Comissão Mundial de Barragens, criada a cerca de 3 anos para avaliar os impactos sociais e
ambientais das barragens e estudar alternativas para o desenvolvimento dos recursos
hídricos e hidroenergéticos, quase metade dos rios do mundo tem ao menos uma grande
barragem e as estimativas mundiais apontam que entre 40 e 80 milhões de pessoas foram
deslocadas pelas barragens, das quais muitas não foram indenizadas ou mesmo
reconhecidas. Apesar da grande mobilização que surgiu nos últimos anos a respeito dos
impactos das barragens, projetos hidroelétricos ainda vêm sendo implantados sem
considerar os impactos ambientais e principalmente sociais que geram.

1.2.2 Causas Subjacentes

Nos últimos 5 anos, uma atenção especial e crescente tem sido dada às causas
subjacentes ao declínio das florestas. Em 1995, a Comissão das Nações Unidas Sobre
Desenvolvimento Sustentável estabeleceu um Painel Intergovernamental sobre Florestas
(IPF) voltado para um amplo leque de questões relacionadas às florestas, incluindo um
componente intitulado “Causas Subjacentes do Desmatamento e da Degradação Florestal”.
Desde então, várias instituições vêm se empenhando no estudo dessas causas em diversos
países e com enfoque principal sobre a situação das florestas tropicais. Esses estudos têm
formado parte importante do processo de discussão e delineamento de políticas de controle
dos desmatamentos.

A elaboração deste item teve como principais referências bibliográficas as seguintes


publicações: 1) o relatório resultante de um estudo integrado, no qual participam diversas
instituições, incluindo a FAO, o Banco Mundial, Governos Nacionais, Universidades,
41

ONGs e Organizações de Povos Indígenas. O relatório apresenta o resultado de mais de 40


estudos de caso em países do Norte e do Sul, sete workshops regionais, um workshop de
povos indígenas e um workshop global sobre as causas subjacentes (Verolme e Moussa,
1999); 2) um paper publicado pelo Centro Internacional de Pesquisa Florestal (CIFOR),
cujo autor é economista de recursos naturais do Banco Mundial (Contreras-Hermosilla,
2000); e 3) uma publicação da Rede de Assessores Florestais da Agência Canadense de
Desenvolvimento Internacional (CIDA) específica sobre o declínio das florestas tropicais
(Roper et al.,1999). Essas duas últimas publicações já foram referências para a elaboração
do item anterior.

Cada uma das três publicações enunciou de modo diverso as causas consideradas
subjacentes. Verolme e Moussa (1999) identificaram que, embora os casos estudados
tenham particularidades ambientais, políticas, culturais e sócio-econômicas, existe um
conjunto de causas comuns e freqüentemente citadas em todos eles, que se concentram nos
seguintes temas: Posse da Terra, Manejo dos Recursos e Participação; Comércio e
Consumo; Relações Econômicas e Fluxos Financeiros Internacionais; e Valoração dos
Bens e Serviços da Floresta.

Contreras-Hermosilla (2000) reuniu as causas subjacentes ao declínio das florestas


em quatro grupos: Falhas de Mercado, onde são consideradas questões sobre valoração de
bens e serviços da floresta; Intervenções Políticas Equivocadas, tais como determinados
subsídios ao desenvolvimento; Fraquezas de Governabilidade, onde são citadas questões
fundiárias, atividades ilegais e corrupção; e Causas Sócio-Econômicas e Políticas mais
amplas, tais como crescimento populacional e econômico.

Para Roper et al. (1999) as causas subjacentes (ou indiretas) se distinguem em


questões relacionadas a: Políticas Fiscais e de Desenvolvimento; Acesso à Terra e Direitos
de Uso; Pressões de Mercado; Subvalorização das Florestas Naturais; Instituições
Governamentais Fracas; e Fatores Sociais. Esses autores fazem ainda uma distinção entre
as causas subjacentes, destacando três aspectos - crescimento populacional, pobreza e
ganância por poder econômico e político - que, combinados, formam as “condições de
predisposição” ao declínio das florestas tropicais. Tais condições, segundo os autores, “são
aquelas criadas pela sociedade, às vezes intencionalmente, às vezes conseqüência da
42

natureza humana, que permeiam todos os aspectos da sociedade e não estão relacionadas
somente ao uso da terra.”

A apresentação deste item segue aproximadamente a forma apresentada por Roper


et al. (1999), autores que se referem exclusivamente ao problema das florestas tropicais,
incluindo considerações adicionais dos demais autores citados e outras referências pontuais.

a) Crescimento Populacional e Pobreza

Para Roper et al. (1999), “sem dúvida, uma das mais importantes condições que
predispõem ao desmatamento tropical e a muitas outras dificuldades para se alcançar o
desenvolvimento sustentável é o nosso crescimento populacional”. Os autores destacam
que no último século a humanidade passou de 2,5 para 6,0 bilhões de indivíduos, dos quais
75% vivem nos países “em desenvolvimento”, com cerca de 1,0 bilhão na pobreza absoluta.
Estima-se que a população que vive nas florestas (ou próxima) e dependente dos recursos
florestais é da ordem de 500 milhões de habitantes.

A população rural pobre é vista por Roper et al. (1999) como uma espécie de agente
“involuntário” de desmatamento, na medida em que tem poucas opções de não exercer
pressão sobre as florestas, ao contrário daqueles agentes motivados pela “ganância e pelo
poder”. Sem condições de acesso à terra, à tecnologia e outras oportunidades de geração de
renda (muitas vezes limitados pelo analfabetismo e subnutrição), os pobres procuram as
florestas como solução de curto prazo para seus problemas econômicos. Roper et al. (1999)
acreditam que pressões populacionais e um “predominante clima de pobreza rural” são
condições importantes que facilitam a ocorrência de desmatamentos.

Por outro lado, Contreras-Hermosilla (2000) argumenta que, “diante de evidências


disponíveis, não há uma ligação fundamental entre crescimento ou densidade populacional
causando sempre, necessariamente, o declínio das florestas.” Segundo o autor, embora
pareça existir uma relação direta entre crescimento populacional e desmatamentos, na
medida em que esse crescimento implique na necessidade de mais terras para produzir
alimento para as novas gerações, deve-se observar que existem outros fatores obscurecendo
essa ligação, como, por exemplo, o fato de que os madeireiros são os primeiros a tornar a
43

floresta acessível às pessoas que nela vão se assentar, tornando a densidade populacional e
o desmatamento resultados da atividade madeireira. Outro argumento é o de que, havendo
terras agricultáveis disponíveis e a possibilidade de uso de tecnologias que demandem mão-
de-obra intensiva, o crescimento populacional pode ser absorvido sem afetar as florestas.

Nos estudos de caso apresentados por Verolme e Moussa (1999) o crescimento


populacional e a pobreza aparecem como causas subjacentes aos desmatamentos, mas com
menos destaque do que recebiam “no passado”. Os autores comentam que os estudos de
caso de Michoacán (México) e do Nepal citam o desemprego local e a necessidade de lenha
como causas subjacentes ao desmatamento naquelas regiões, mas que foram identificadas
como conseqüência de políticas nacionais e internacionais que criam e aumentam a
exclusão social, resultando, por sua vez, em uso insustentável das florestas.

Nenhum dos autores, no entanto, se refere à questão da distribuição, ou seja, do


quanto de recursos florestais é consumido e quanto de área está sendo desmatada pela
população rural pobre (citada como a que exerce maior pressão sobre as florestas) para seu
próprio benefício. E, na medida em que diversos agentes e causas podem estar interagindo
simultaneamente para resultar em desmatamento, essa contabilidade torna-se difícil e com
riscos de ser tendenciosa.

Em termos de população global, os Relatórios de Desenvolvimento Humano (RDH)


da ONU têm demonstrado que o fosso entre ricos e pobres aumentou muito nas últimas
décadas. A desigualdade de renda ente os países mais ricos e os mais pobres, que era de 35
para 1 em 1950, subiu para 72 para 1 em 1992. No Brasil, a participação dos 20% mais
ricos na renda nacional é 25 vezes superior a dos 20% mais pobres. Os países
industrializados, em função de sua renda mais elevada e conseqüente nível de consumo, são
responsáveis por mais da metade do aumento da utilização de recursos naturais. O RDH de
1998 observa que “os países industrializados modernos são os consumidores dominantes,
mas a população dos países mais pobres do mundo paga, proporcionalmente, o preço mais
elevado - pela poluição e pela degradação das terras, das florestas, dos rios e dos oceanos
que constituem o seu sustento.”

Outra questão não muito bem esclarecida é o conceito de pobreza e as distinções


dentro do que se chama de “população rural pobre”. Na visão de Sachs (1996), a pobreza,
44

que é mensurada em função da renda per capita e referida ao padrão norte-americano, torna
iguais diferentes povos do mundo (como os Zapotec do México e os Tuareg da África)
definindo-os não de acordo com o que eles são e querem ser, mas de acordo com o que lhes
falta de um modo de vida que não é o seu. Com a expansão capitalista pelo mundo, o
conceito ocidental de pobreza vai se legitimando, na medida em que tira as populações
tradicionais de uma condição de frugalidade (condição isenta do frenesi da acumulação
material) e os coloca em uma condição de escassez - dos recursos de que antes dispunham e
dos bens que agora o sistema social vigente produz, legitima e induz à demanda.

b) Acesso à Terra e Direitos de Uso

Nesse aspecto, há pelo menos duas questões de grande importância que podem ser
causas subjacentes aos desmatamentos: a) o não reconhecimento dos direitos territoriais dos
povos da floresta, indígenas ou não indígenas, questão comum a várias regiões de florestas
tropicais dos países do Sul e até mesmo em países do Norte; e b) a situação fundiária
desigual e irregular, com muitos problemas de grilagem de terras, concentração de terras na
mão de poucos e violência e injustiça social na luta pelo acesso à terra e aos recursos.

O não reconhecimento dos direitos dos povos das florestas, por parte dos governos
dos países tropicais, tem sido freqüentemente apontado em estudos de caso e diversas
publicações sobre o tema, geralmente citado na base dos problemas e conflitos relativos à
invasão de seus territórios por outros usuários e mesmo pelos próprios governos quando
ignoram ou expulsam comunidades locais para instalar um assentamento ou para delimitar
uma unidade de conservação ou outro objetivo qualquer de “interesse nacional”, incluindo
aí o apoio ou a conivência com os invasores.

No último boletim emitido pelo Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais


(WRM, 2001) situações desse tipo são apresentadas, além de muitas outras constantemente
denunciadas pela ONG, como nos casos dos pigmeus Twa, que foram expulsos de seu
território tradicional para a criação do Parque Nacional Kahuzi-Biega na República
Democrática do Congo, e do povo Ogiek, uma minoria étnica que habita as florestas Mau
do Quenia, a 250 km a leste de Nairobe:
45

Os Twa, caçadores e coletores das florestas tropicais, estão diante de um horrível


futuro. Negado o acesso às terras de que dependem há milênios, eles vivem agora
como posseiros em campos miseráveis na periferia de vilarejos em torno do Parque.
Privados de direitos, compensação ou justiça e expostos à discriminação de outros
setores da sociedade, os Twa estão também sofrendo de má nutrição e doenças de
modo crescente e alarmante.
Os Ogiek, embora se considerem os guardiões das florestas Mau e as tenham
manejado de um modo sustentável, têm sido forçados a se defender contra as
arbitrariedades dos governos colonial e pós-colonial, resistindo às ameaças oficiais e
recorrendo à Côrte. As autoridades insistem em tentar expulsá-los da terra, alegando
que é uma “área protegida”, incluída no Decreto Florestal do país. O argumento é
falso por duas razões. Do ponto de vista legal, o Decreto Florestal estabelece que os
direitos territoriais dos povos indígenas devem ser protegidos. E, na verdade, o que o
governo está realmente fazendo é preparar o caminho para as poderosas companhias
madeireiras entrarem na floresta4 (WRM, 2001: 4-5).

Uma antiga luta de povos indígenas contra invasão de madeireiras e pela defesa de
seus direitos ancestrais sobre o território é o caso dos povos que habitam as florestas de
Sarawak, na Malásia. Sem reconhecimento de seus direitos e sem apoio do governo, eles
bloqueiam as estradas como forma de protesto à entrada das madeireiras, que não respeitam
acordos assinados entre as partes para limitar a exploração.

Além do não reconhecimento dos direitos tradicionais dos povos da floresta, a má


distribuição de terras em geral é também causa subjacente das pressões sobre as florestas
tropicais, na medida em que há grandes extensões de terras produtivas e também florestadas
nas mãos de poucos proprietários e a grande maioria de pequenos produtores sem terra,
arrendatários, meeiros, posseiros ou sem recursos para manter suas propriedades se vê
forçada a migrar constantemente para regiões mais distantes e geralmente ainda cobertas
por florestas.

No Brasil, a concentração de terras nas mãos de poucos grandes proprietários ou


corporações é das mais acentuadas do mundo e o programa governamental de reforma
agrária, longe ainda de resolver o problema dos sem-terra e das irregularidades e
discrepâncias da situação fundiária, tem se defrontado com protestos e conflitos causados

4
Sobre a situação das florestas Mau do Quenia, interesses do governo em programas de assentamento rural
têm sido apontados como a principal causa da redução das florestas a 10% de sua extensão original (Otani,
2000).
46

por realizar assentamentos de famílias em áreas florestadas. Segundo Viana (1997), a cada
ano, a Reforma Agrária expõe 1,5 milhão de florestas ao desmatamento e à degradação. “É
a política de baixo custo financeiro e alto custo ambiental, que, além de expor os assentados
a condições penosas de sobrevivência, constitui fonte de matéria-prima para a indústria
madeireira.” O Movimento dos Sem Terra (MST) tem apresentado, nesse sentido, uma
inusitada preocupação com as questões ambientais, no contexto das questões agrárias no
país, procurando assessoria técnica e parcerias para evitar danos ambientais e realizar um
manejo agroflorestal nos assentamentos.

c) Políticas de Desenvolvimento e Falhas de Governo

Muitas das causas diretas de desmatamento resultam de políticas setoriais de


desenvolvimento, como, por exemplo, subsídios governamentais para a expansão agrícola e
pecuária, que podem ser ainda incentivados através de metas políticas de implantação de
infra-estrutura viária, energia hidroelétrica e programas de colonização em áreas cobertas
com florestas, como aconteceu nos anos 1970 e 80 nas Regiões Centro-Oeste e Norte do
Brasil, quando o governo militar incentivou a migração para essas regiões, com
empréstimos do Banco Mundial, créditos agrícolas, redução de taxas e impostos, abertura
de estradas, etc.

Nos últimos anos, o governo brasileiro voltou a definir políticas de ocupação e


exploração econômica para a Amazônia. Segundo Viana (1997), o Governo de Fernando
Henrique Cardoso é o primeiro governo civil brasileiro, pós regime militar (1964-84) que
formulou e executa uma política de integração da região Amazônica (Amazônia Legal)
voltada não apenas para o mercado nacional mas também para o mercado global. Fazem
parte desse contexto: a) a política florestal baseada na exploração madeireira voltada para o
mercado internacional, que facilitou a entrada de madeireiras asiáticas na Amazônia; b) a
política de transferência incentivada de população, via programa de reforma agrária; c) a
política de incentivo à expansão da agricultura destinada à exportação, especialmente de
soja; d) a política mineral de abertura de novas concessões de exploração dos recursos
minerais; e) a abertura de novos eixos de transporte, como as hidrovias Madeira –
Amazonas, e a Araguaia – Tocantins; e f) o asfaltamento de rodovias como a Cuiabá (MT)
47

– Santarém (PA) e a Manaus (AM) – Boa Vista (RR), entre outras obras incluídas no
Programa de Governo “Brasil em Ação”. Todas essas políticas setoriais são causas
subjacentes para o declínio da floresta amazônica, principalmente pela falta de estudos e
critérios ambientais e de controle dos impactos diretos e indiretos das atividades.

Os acordos internacionais para pagamento da dívida externa têm resultado em re-


orientações políticas em muitos países “em desenvolvimento”, sob as diretrizes do Fundo
Monetário Internacional. No entender dos analistas das causas subjacentes ao
desmatamento, reformas econômicas para renegociação da dívida externa geram
desemprego, aumento da pobreza e da falta de opções de renda para muitos que vão
engrossar as fileiras dos “povos rurais pobres” e suas pressões sobre as florestas. Segundo
Roper et al. (1999), “programas de ajuste estrutural têm estimulado a expansão de culturas
de exportação que, por sua vez, levam à liquidação do capital florestal tanto pelo corte da
madeira como pela conversão de áreas florestadas em áreas de uso agrícola.”

Programas de colonização como o da Amazônia ou da Indonésia têm sido tratados


como projetos de “desenvolvimento”. No entanto, muitas vezes não passam de uma “saída”
para outros problemas. Terras florestadas, férteis ou não, têm sido válvula de escape de
muitas pressões sociais pelo uso da terra em muitos países. Conforme destaca Roper et al.
(1999), “para os governantes, tem sido politicamente menos doloroso ignorar o
desmatamento do que lidar com as difíceis questões de reforma agrária, criação de emprego
e controle populacional.”

Contreras-Hermosilla (2000) argumenta que certas políticas governamentais são


muitas vezes motivadas por pressão de determinados grupos com interesses diretos de
exploração da floresta ou de ocupação de uma determinada área, como no caso da decisão
política de planejar e implantar estradas e ferrovias. O autor cita que o tipo mais comum e
importante de subsídio governamental ao setor florestal é o de redução das taxas para o
setor madeireiro e que muitas florestas públicas nos trópicos estão sob contratos de
concessão e as várias companhias madeireiras procuram agressivamente por novos
contratos de concessão em países ricos em recursos florestais.

Na Indonésia, 70 milhões de hectares de florestas densas estão sob o controle de 650


contratos de concessão madeireira. A partir de 1967, o governo do ditador Suharto
48

“assentou o palco para os investimentos estrangeiros e o desenvolvimento capitalista”,


abrindo concessões a indústrias madeireiras estrangeiras, do Japão, Filipinas, EUA e
Europa (Peluso, 1995).

Segundo Bengwayan (1999), as florestas das Filipinas foram reduzidas de 16


milhões para 700 mil hectares por culpa das concessões do governo à exploração
madeireira e de uma fraca política conservacionista. Grandes áreas sob concessão, baixas
taxas sobre a exploração e contratos pouco rigorosos quanto à sustentabilidade no manejo
da floresta incentivam uma atividade madeireira predatória, com grande desperdício de
recursos.

O Sudeste da Ásia tem apresentado altas taxas de desmatamento nas últimas


décadas. Segundo Thompson (1999), no período 1980-90 a taxa anual chegou a atingir dois
milhões de hectares (ou 20.000 km²/ano), sendo que somente na Indonésia essa taxa foi de
1,3 milhão ha/ano. Segundo o autor, as principais causas dessa destruição são, em primeiro
lugar, a exploração madeireira comercial em larga escala, seguida da ocupação com
atividade agrícola e pecuária, com importante participação dos programas governamentais
de assentamento. Com base nos dados da FAO (distribuição de florestas, excluindo as
plantações), estima-se que no período 1990-2000 essas taxas subiram ainda mais, atingindo
a média de 3,5 milhões ha/ano no conjunto dos países do Sudeste Asiático5 e de 1,7 milhão
ha/ano somente na Indonésia.

De acordo com os analistas das causas de declínio das florestas, a condução de


políticas de desenvolvimento e subsídios setoriais que acabam por causar desmatamento e
degradação florestal têm por trás tanto as pressões externas (de ingerências da política
econômica global) como falhas políticas internas - incapacidade administrativa, falta de
compreensão mais ampla e profunda dos contextos sociais, ambientais, políticos,
econômicos, etc. - que levam a tomar decisões equivocadas porém até bem intencionadas,
e, no pior dos casos, motivações pessoais e corporativistas que abrem caminho para a
corrupção nas instituições de gestão dos interesses públicos. Conforme destaca Contreras-
Hermosilla (2000), grande parte da exploração madeireira é ilegal em muitos países e é

5
Esse conjunto compreende os seguintes países: Camboja, Filipinas, Indonésia, Laos, Malásia, Mianmar (ex-
Birmânia), Singapura, Tailândia e Vietnã.
49

conseqüência da corrupção. Para este autor, extração ilegal e corrupção são condições
facilitadas nos países tropicais pelo relativo isolamento em que se encontram as áreas em
exploração, pela falta de inventários precisos da madeira existente e pelo “substancial poder
de discrição” que têm os funcionários do governo.

A falta de capacitação e recursos humanos para dar conta de fiscalizar a atividade


madeireira e todas as outras atividades que degradam as florestas tropicais é uma situação
crônica na maioria dos países. Algumas parcerias institucionais às vezes melhoram algo
dessa falha institucional. Na Amazônia, por exemplo, a colaboração da ONG Greenpeace
com o IBAMA permitiu que um carregamento ilegal de madeira fosse apreendido, em maio
de 2000, no rio Juruá – mais de 270 toras de madeira, algumas medindo mais de 1,5 m de
diâmetro, estavam sendo transportadas com falsos documentos de autorização.

Dentre as falhas de governabilidade, cabe ainda um destaque ao problema das


normas legais nacionais que afetam direta ou indiretamente a situação das florestas. Uma
condição comum a muitos países é a legitimação oficial da propriedade privada através da
realização de “benfeitorias”, que se traduzem em desmatamento para uso agropecuário e
instalação das construções rurais como forma de garantir a posse da terra. Outro problema é
a própria legislação ambiental, geralmente formulada sem a necessária consideração das
dinâmicas sociais e das formas tradicionais de uso da terra, voltando-se exclusivamente
para a proteção dos ecossistemas, pretendendo transformar determinadas áreas em
protegidas “pelo só efeito da Lei”, sem que os setores responsáveis busquem planejar e
estruturar os meios de cumprimento das normas. Essas falhas no campo normativo acabam
por aumentar os riscos de desmatamento, como se está verificando hoje no Brasil, com a
mobilização política para modificar o Código Florestal de modo a reduzir
significativamente os percentuais de áreas destinadas a reserva legal. Vale lembrar que no
Código Florestal, as áreas destinadas a reserva legal são aquelas onde deve ser praticado o
manejo florestal sustentado e onde somente o corte raso é proibido.

d) Pressões e Falhas de Mercado

O “comportamento” do mercado como fator subjacente ao declínio das florestas é


abordado, na literatura consultada, com relação ao comércio internacional de produtos da
50

floresta ou bens produzidos às custas da retirada da floresta (as commodities agrícolas p.


ex.) e com relação à subvaloração dos produtos e serviços não-madeireiros da floresta.

Do ponto de vista macro-econômico, Dudley (1999) destaca, antes de tudo, o nível


crescente de consumo global (3% ao ano) e a discrepância desse consumo (20% da
população consome 85% dos recursos do mundo), “a despeito da convicção dos
economistas de que o crescimento econômico não precisa significar um maior uso dos
recursos.” Para o autor, a economia política global está estruturada para excluir as
“externalidades”, para não incorporar os custos e benefícios a longo prazo de todos os bens
e serviços. “Os mercados são voláteis e normalmente efêmeros, desencorajando
investimentos a longo prazo no uso prudente dos recursos e encorajando planejamentos de
curto prazo e táticas de ‘pegar e correr’ (grab it and run)”.

O aumento da concentração de poder e riqueza através do comércio global é um


aspecto importante colocado por Dudley (1999). “As corporações transnacionais estão
tendo um papel cada vez maior na economia global e hoje controlam 70% do comércio
internacional.” Essa economia global, comandada por grupos poderosos, influencia as
políticas nacionais no sentido da privatização e da desregulação sobre os produtos de
exportação, tornando difícil estabelecer restrições, tais como medidas tarifárias que
controlem o comércio de madeira e evitem a destruição das florestas.

Em uma economia global de curto prazo, estruturada para excluir as externalidades,


as possibilidades de valorização de bens e serviços da floresta não-madeireiros tornam-se
mais remotas. De acordo com a análise de Contreras-Hermosilla (2000), na medida em que
os desmatamentos e a degradação das florestas resultam geralmente de decisões tomadas
por agentes do setor privado (madeireiros, fazendeiros, etc.), a discrepância entre os valores
desses agentes privados e os valores da sociedade aparecem como uma causa subjacente ao
declínio das florestas.

Muitos serviços providos pelas florestas (bem como alguns custos do mal manejo
desses recursos) não têm preço no mercado e, portanto, não entram nas decisões
dos atores do setor privado. Por exemplo, um proprietário de uma floresta situada
no trecho de montante de uma bacia hidrográfica não recebe pagamento pelos
serviços que sua floresta provê a jusante para pescadores e fazendeiros. Esses
valores, incluindo a proteção do solo contra a erosão e a sedimentação de barragens
de irrigação ou geração de energia, podem ser substanciais para os usuários de
51

jusante. O proprietário da terra florestada também não recebe lucros comerciais


pela captura de carbono, pela manutenção de belezas cênicas ou pela preservação
da biodiversidade. Os proprietários das florestas têm pouco incentivo para levar em
conta esses benefícios e, portanto, a produção desse serviços ambientais será menor
do que se ele puder vendê-los, recebendo uma recompensa financeira. (Contreras-
Hermosilla, 2000: 8).

Contreras-Hermosilla (2000) cita algumas tentativas de valoração de bens e serviços


da floresta que não estão no mercado, cujos resultados são pouco animadores,
especialmente quanto à distância que estes valores ainda estariam dos valores dos produtos
da floresta que estão no mercado, principalmente a madeira. O autor destaca que o único
valor não-madeireiro que parece ter maior importância global é o de seqüestro de carbono,
que é estimado em função da quantidade de carbono fixado por área de floresta e expresso
em US$ por hectare. Em algumas estimativas apresentadas pelo autor, os valores de
carbono estocado chegam a ser maiores do que os valores de madeira comercial da mesma
floresta. É de se supor que esse mercado de carbono, bem como os critérios que possam
elevar o valor das florestas como fixadoras de carbono, tenderão a conquistar espaço no
campo de forças do cenário político-econômico mundial, dependendo do poder de
influência na tomada de decisões dos setores interessados em compensar emissões de
carbono para a atmosfera, através do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo.

Esse discurso em prol da valoração financeira de bens e serviços da floresta “em pé”
reflete um mundo dominado por valores econômicos, onde tudo tem que ser traduzido em
dinheiro para fazer sentido à sociedade e sua ótica predominantemente materialista. E é
nessa direção que está caminhando o debate em torno do reconhecimento de valores não-
madeireiros das florestas e com grande expectativa de que esse caminho torne possível
conter os desmatamentos. Belezas cênicas podem gerar retorno financeiro através do
ecoturismo, biodiversidade pode conquistar interesse no mercado farmacêutico, etc. Mais
difícil será valorar financeiramente e achar mercado para os valores espirituais, filosóficos
e religiosos, reivindicados por alguns, como em Papua Nova Guiné, onde o estudo de caso
identificou que a falta desses valores era uma das principais causas subjacentes aos
processo de exploração madeireira, mineral e agrícola, promovida pelas fortes pressões do
mercado externo (Verolme e Moussa, 1999).
52

Uma outra questão relativa ao mercado global de produtos da floresta é abordada


por Roper et al. (1999). Trata-se do balanço entre consumo interno e externo nos países que
têm as mais elevadas taxas de desmatamento. Analisando dados da FAO, os autores
argumentam que nesses países o consumo de produtos madeireiros é maior e tende a
crescer mais do que as pressões do mercado externo sobre os mesmos:

A demanda nacional por produtos da floresta dentro dos países onde o


desmatamento está ocorrendo é uma causa muito mais importante de
desmatamento do que a demanda por esses mesmos produtos no mercado
internacional. Essa generalização varia de região-a-região e de país-a-país dentro
de cada região. Deve-se notar que essa conclusão é contrária à opinião de muitas
ONGs para as quais é a insaciável demanda do Norte por madeira tropical que está
conduzindo os desmatamentos. (Roper et al., 1999: 6).

Segundo a análise de Roper et al. (1999), dos “10 mais” países desmatadores,
somente três exportam mais de 50% da madeira proveniente das florestas nativas -
Indonésia, Malásia e Mianmar, todos na Ásia, que exportam entre 50–60%. Nesses países,
“obviamente, o mercado externo é a principal força por trás da exploração madeireira e dos
desmatamentos”. Brasil, México e Tailândia não exportam mais de 10% do que produzem.
E nos demais países – Rep. Dem. do Congo, Bolívia, Venezuela e Sudão – as exportações
são insignificantes6.

O “poderoso e crescente” mercado de celulose e papel, baseado em maior parte nas


plantações arbóreas mono-específicas de rápido crescimento, também está atendendo mais
à demanda interna do que ao consumo internacional, segundo Roper et al. (1999).
Conforme os dados da FAO analisados pelos autores, Brasil e Indonésia são os maiores
exportadores de papel e papelão em quantidade total, mas não em percentual do que
produz. Em 1996, Brasil e Indonésia exportaram, cada um, a mesma quantidade – 1,2
toneladas métricas – representando, respectivamente, 21% e 28% do total de papel
produzido em cada país. Nos demais países desmatadores, as exportações foram inferiores a
10% do total produzido em cada país. No entanto, os autores se esqueceram de dizer que o
Brasil exporta a maior parte da celulose que produz (SBS, 2000).

6
Roper at al. (1999) utilizaram dados da FAO de 1995.
53

Mas, ainda que esses dados não sejam contestáveis e de fato a maior parte dos
produtos madeireiros esteja sendo consumida nos próprios países onde a madeira é
extraída, isso não significa que o problema do desmatamento é menor, porque o mais grave
é a forma predatória como vem ocorrendo a exploração desses produtos, seja para o
consumo externo ou interno. A demanda crescente de consumo nos países “em
desenvolvimento” é uma conseqüência natural e esperada da expansão do capitalismo em
todo o mundo. O sistema capitalista amplia o universo de carências humanas, pela
“ampliação quantitativa do consumo existente, pela extensão das carências existentes a um
círculo mais amplo e pela produção de novas carências e a criação de novos valores de
uso”, que, certamente, resultam em “exploração da natureza inteira” (Bensaïd, 1999).

1.3 Políticas Florestais Internacionais

A mobilização em torno do problema da degradação e do desmatamento das


florestas tem se voltado para a busca de solução do problema através de uma melhor
compreensão de suas causas e da definição de políticas globais, regionais e nacionais para
enfrentamento das causas identificadas. Diversas instituições e indivíduos têm contribuído
nesse sentido, em um esforço que tenta se estabelecer de forma cooperativa entre os
participantes da discussão e os tomadores de decisão. No panorama internacional,
destacam-se três importantes iniciativas, descritas a seguir:

1.3.1 Painel Intergovernamental sobre Florestas – Nações Unidas

O maior empenho internacional dos últimos anos para o tratamento das questões
sobre o uso e a degradação das florestas foi a criação do Painel Intergovernamental Sobre
Florestas (IPF), estabelecido em 1995 pela Comissão das Nações Unidas Sobre
Desenvolvimento Sustentável. Em fevereiro de 1997, o IPF produziu um relatório final
contendo um conjunto de 135 Propostas de Ação, formalmente endossadas em Junho de
1997 em Sessão Especial da Assembléia Geral das Nações Unidas (UNGASS) sobre a
implementação da Agenda 21. Em continuidade ao IPF, a UNGASS estabeleceu o Fórum
54

Intergovernamental sobre Florestas (IFF) para promover a implementação das Propostas de


Ação do Painel, monitorar tal implementação e encaminhar os assuntos pendentes através
do IPF. Nesta UNGASS, portanto, os governantes dos países participantes se
comprometeram a implementar as ações propostas no IPF. Essas propostas cobrem cinco
amplas categorias:

• Execução das decisões tomadas sobre florestas na Conferência Mundial Sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento (a Rio-92), incluindo os vínculos setoriais e intersetoriais;

• Cooperação internacional na assistência financeira e na transferência de tecnologia;

• Pesquisa científica, avaliação das florestas e desenvolvimento de critérios e indicadores


(C&I) para o manejo florestal sustentável (SFM);

• Comércio e meio ambiente relacionados com produtos e serviços da floresta; e

• Organizações internacionais e instituições e instrumentos multilaterais, incluindo


mecanismos legais adequados.

Em 1999, durante a terceira sessão do IFF, dezoito ONGs, incluindo Organizações


de Povos Indígenas (OPI) apresentaram uma declaração conjunta à plenária, onde, entre
outras coisas, se comprometiam a iniciar a vigilância e a análise da execução das Propostas
de Ação. Esta iniciativa não-governamental (intitulada “Keeping the Promise?”) constituiu,
em Julho de 1999, um comitê com representantes de oito regiões principais. O comitê
selecionou 22 países para as análises, concentrando-se nos que têm maior cobertura
florestal, importações ou exportações de madeira ou um poder político visível e influente
no debate mundial sobre a política florestal. Certamente, os países selecionados
participaram do IPF e concordaram com a execução das Propostas de Ação.7

De acordo com relatório emitido em Abril de 2000 (Verolme et al., 2000) as


conclusões do comitê de ONGs em relação ao andamento do IPF/IFF destacam os seguintes
aspectos:

7
Foram selecionados os seguintes países: Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador e Peru na América
Latina; Camarões e Gana na África; China, Índia, Indonésia, Japão e Malásia na Ásia; Austrália e Nova
Zelândia na Oceania; Alemanha, Finlândia, França e Federação Russa na Europa; e Canadá e Estados Unidos,
na América do Norte. Informações e relatórios do Keeping the Promise? estão disponíveis em
http://www.forestpolicy.org
55

a) Participação – como vem acontecendo em grande parte das formulações políticas mais
recentes, a participação de todos os interessados é enfaticamente ressaltada nas Propostas de
Ação do IPF e reconhecida como componente essencial para o manejo florestal sustentável.
Mas, embora se verifiquem avanços nesse sentido, ainda há muito que melhorar,
principalmente quanto à participação dos povos das florestas, das comunidades ou grupos
que vivem e dependem diretamente dos recursos florestais;

b) A execução das Propostas de Ação requer muito mais do que programas florestais
nacionais, ou seja, os governos dos países analisados apresentam seus programas de ação
como sendo abarcadores das propostas, mas estão muito aquém da abrangência e
complexidade das mesmas;

c) É necessário um reconhecimento muito maior dos valores múltiplos das florestas, ainda não
demonstrado nas iniciativas de gestão florestal dos países;

d) Os países negam as perdas e a degradação de suas florestas, não reconhecendo nem


atacando determinadas causas subjacentes que precisam ser enfrentadas;

e) Os critérios e indicadores (C&I) têm sido reconhecidos e valorizados como ferramentas


importantes para o manejo florestal sustentado, mas não são, por si só, uma indicação de
compromisso com este manejo;

f) As questões sobre posse da terra necessitam ter um maior reconhecimento, tanto em países
do Sul como do Norte;

g) Coordenação eficaz – uma coordenação eficaz do processo de implantação das Propostas de


Ação é certamente fundamental tendo em vista a complexidade e a abrangência das
Propostas, abrangendo questões desde o nível local ao nível global e incluindo aspectos e
setores que estão além do setor florestal; na avaliação do Comitê de ONGs, essa
coordenação é falha, tanto dentro de cada país, como entre os participantes internacionais.

As principais conclusões a que chegaram os representantes das ONGs que estão


monitorando o andamento do IPF/IFF, bem como suas recomendações estão reunidas nos
quadros 1.12 e 1.13, na página a seguir.
56

Quadro 1.12: Conclusões fundamentais sobre a execução das Propostas de


Ação do IPF
1. Ainda que vários países tenham dado passos iniciais, nenhum dos países incluídos
nesta análise cumpriu de forma adequada seu compromisso de executar as Propostas
de Ação do Painel Intergovernamental sobre Florestas (IPF) das Nações Unidas;

2. A maioria dos países não tem designado um local concreto ou agência responsável
dentro do governo para coordenar as atividades de execução do IPF;

3. Vários países parecem ter utilizado a ausência de delineamentos claros sobre


como executar as Propostas de Ação como motivo para não participar em nenhum
processo de avaliação, estabelecimento de prioridades, análises das lacunas e
execução;

4. Muitos governos declaram, normalmente sem haver realizado uma avaliação ou


análise das lacunas, que muitas propostas não se aplicam a seu país;

5. Os poucos países que avaliaram a pertinência das Propostas raras vezes realizaram
uma análise das lacunas comparando as políticas nacionais existentes com as
Propostas ou estabelecendo prioridades para áreas nas quais os esforços existentes
eram deficientes;

6. Muitos governos declaram que seus atuais programas florestais já constituem uma
execução adequada das Propostas do IPF, ou que a perda e a degradação das
florestas não são problemas graves em seus países, sem apresentar provas que
corroborem com essas declarações e, freqüentemente, frente a evidências em
contrário;

7. Desde que concordaram com as Propostas de Ação, vários países têm revisado
suas políticas e programas florestais para denotar uma compreensão melhorada dos
problemas e soluções, mas raras vezes o fazem explicitamente à luz do consenso
internacional expressado em acordos internacionais recentes, entre os quais as
Propostas de Ação;

8. Vários governos deram a entender que o caráter não prescritivo das Propostas de
Ação é razão, em parte, para sua falta de execução. Outros indicam a falta de
especificidade ou clareza das Propostas. Alguns não fizeram parte sequer das
deliberações do IPF;

9. Apesar da maioria dos países terem participado de algum tipo de processo de


consulta relacionado com a execução das Propostas, poucos têm iniciado um
processo de representação adequada e poucos têm tratado de buscar ativamente
consenso entre todos os interessados;

10. Nos informes dos países se coloca em destaque muitas iniciativas interessantes.
Sem dúvida, poucas dessas iniciativas parecem estar relacionadas explicitamente
com a execução das Propostas de Ação.
Fonte: Verolme et al. (2000).
57

Quadro 1.13: Recomendações para a execução das Propostas de Ação do IPF


1. Os chefes de estado e o governo dos países que se comprometeram a executar as
Propostas de Ação do IPF devem mostrar liderança política direta para assegurar a
execução nacional;

2. Os governos devem estabelecer mecanismos formais para permitir uma eficaz


execução, incluindo a identificação de locais centrais, partes responsáveis e
entidades governamentais, formulando procedimentos e calendários claros e
garantindo uma eficaz comunicação e coordenação entre departamentos;

3. Uma eficaz execução do IPF requer uma comparação objetiva dos programas
existentes frente as Propostas de Ação, incluindo uma análise das lacunas e uma
estrita coordenação com a execução das políticas e compromissos conexos. Devem
ser empreendidos esforços especiais para fazer participar neste trabalho os
interessados e para integrar as iniciativas de execução em todos os setores;

4. São requeridas melhorias importantes na forma como os governos fazem os


interessados participar no cumprimento dos compromissos normativos
internacionais. No mínimo, deverão estabelecer-se compromissos formais de
consulta e participação; deverão buscar-se e considerar-se todos os pontos de vista;
deverá disseminar-se amplamente a informação e reconhecer-se a participação
significativa como algo que requer mais do que uma simples consulta. Esforços
especiais devem ser feitos para que os povos indígenas e as comunidades locais
participem eficazmente.

5. Os governos deverão trabalhar com os interessados nacionais para elaborar um


informe detalhado sobre o progresso de sua execução das Propostas de Ação do IPF
e disponibilizar esse informe ao novo Fórum sobre Florestas das Nações Unidas
assim como à Comissão sobre Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, no
mais tardar até o ano 2002.

6. Deverão iniciar-se diálogos em cada país entre os interessados governamentais e


representantes para identificar as causas subjacentes da perda e da degradação das
florestas, promover uma compreensão dessas causas e formular programas para
abordá-las e eliminá-las. Esses diálogos deverão incluir a possível influência do país
sobre a perda e degradação florestais fora do país, assim como o papel das entidades
internacionais com as quais esteja associado o país.
Fonte: Verolme et al. (2000).
58

Com relação ao Brasil, um dos países analisados pelo Comitê das ONGs, os
resultados obtidos da avaliação do processo de implantação das Propostas de Ação do IPF
se resumem nos seguintes pontos principais:

• O Brasil não tem um local central ou um processo instituído para a execução das
Propostas de Ação e poucos interessados estão conscientes da pertinência das Propostas
como ponto de referência para a Política Florestal Nacional e o Programa Florestal
Nacional, que estão sendo elaborados;
• Os responsáveis pela formulação da Política Florestal Nacional no Ministério do Meio
Ambiente e no IBAMA não comparam as Propostas com iniciativas tais como o Projeto
Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais (PPG7) e o Programa Nacional de
Biodiversidade. As Propostas do IPF são desconhecidas no Brasil;
• Embora várias iniciativas estejam em andamento, como o combate aos incêndios
florestais e a criação das reservas extrativistas, não há um plano integral para combater
os desmatamentos. Além disso, há um vazio importante entre a formulação da política e
sua execução, refletido na limitada participação das organizações de base comunitária
no debate da política florestal.
• O Ministério das Relações Exteriores centraliza todas as negociações internacionais
sobre meio ambiente. O governo brasileiro mantém uma postura nas negociações
internacionais que evita a interconexão política e jurídica de questões através de
diferentes regimes.

De fato, diante da esperada repercussão e da grande importância dada às Propostas


de Ação elaboradas sob os auspícios e respaldadas pelas Nações Unidas, em uma iniciativa
tida como fundamental ao interesse global em evitar a continuidade de um estado
indesejável de declínio das florestas no mundo, o governo brasileiro não parece demonstrar
a devida atenção a essas Propostas de Ação, justamente no país com a maior taxa de
desmatamento do mundo. Embora a Política Nacional de Florestas inclua, entre suas
diretrizes, “estimular as articulações com o Ministério das Relações Exteriores, o processo
de cooperação internacional e o intercâmbio multilateral e bilateral com países e
organizações internacionais envolvidas nas questões florestais”, a única referência pública
ao IPF feita pelo Ministério do Meio Ambiente diz que:
59

No plano internacional, o Governo do Brasil reafirmou o princípio do uso sustentável


de seus bosques. No Painel Internacional de Bosques / Comissão de
Desenvolvimento Sustentável, defendeu a necessidade de que a discussão
internacional sobre os recursos florestais leve em conta os aspectos econômicos,
sociais e culturais relevantes para o uso sustentável, a par dos aspectos quantitativos
relacionados com a proteção do meio ambiente (redução do desflorestamento e
aumento da cobertura florestal). (www.mma.gov.br/florestas)

O empenho do Fórum das Nações Unidas sobre Florestas na implementação das


Propostas de Ação do IPF continua em andamento, com encontros, workshops e discussões
periódicas. Em abril de 2001, deverá ser discutida a criação de um Acordo Internacional
Sobre Florestas, no sentido de fomentar a participação e o comprometimento dos países
envolvidos. Ao mesmo tempo, as críticas das ONGs quanto à lentidão do processo são
constantes. No boletim de dezembro de 2000, o Movimento Mundial pelas Florestas
Tropicais (WRM) manifestava suas apreensões nesse sentido, alegando que as duas únicas
coisas que de fato aconteceram até agora foram conduzidas pelas ONGs, com o apoio de
poucos governantes, poucas pessoas do secretariado do IPF e alguns representantes de
organismos internacionais. O WRM refere-se ao estudo das causas subjacentes ao declínio
das florestas (Verolme e Mussa, 2000) e à iniciativa de avaliação do IPF junto aos 22 países
selecionados (Verolme et al., 2000). Essas iniciativas, no entanto, não foram citadas na
apresentação oficial do Fórum das Nações Unidas sobre Florestas, atualizada em
05/02/2001 no respectivo site das Nações Unidas (www.un.org/esa/sustdev/forests.htm).

1.3.2 Política Florestal do Banco Mundial

Outra iniciativa de âmbito internacional que se destaca é a revisão da política


florestal do Banco Mundial, um dos mais importantes atores desse contexto a nível global e
que tem um papel chave na condução de políticas nacionais de desenvolvimento e meio
ambiente. O processo de revisão da política florestal do Banco Mundial iniciou-se em 1998
e deverá ser concluído até o final de 2001. O Banco foi duramente criticado nos anos 1980
por financiar projetos de desenvolvimento em regiões de florestas tropicais, como a
Amazônia, que resultaram em destruição de florestas e outros problemas ambientais e
60

sociais. Por pressão de ONGs e mesmo por um processo interno de reavaliação, o Banco
Mundial já avançou positivamente em direção a uma atuação menos comprometedora, a
partir da Política Florestal de 1991. No entanto, muitas questões ainda estão mal resolvidas,
inclusive quanto à realização das metas definidas em 1991, o que acabou por determinar a
necessidade de nova reformulação da política florestal, bem como de outros setores do
Banco Mundial.

A revisão da política florestal do Banco (Forest Policy Implementation Review –


FPIR) tem sido um processo lento devido ao caráter mais participativo que se desenvolveu,
com a contribuição de diversos interessados no setor florestal. A FPIR está sendo
coordenada pelo Departamento de Avaliação de Operações (OED) – uma unidade dita
independente dentro do próprio Banco Mundial, que se reporta diretamente à Junta de
Diretores Executivos do Banco e que tem por função avaliar o que funciona e o que não
funciona nos empreendimentos do Banco junto aos países tomadores de empréstimo. Um
dos procedimentos do OED para a FPIR é a realização de estudos de caso de alguns países,
dentre eles o Brasil.

Apesar do caráter mais participativo desse processo de revisão da política florestal,


o Banco tem recebido críticas de ONGs quanto à transparência das discussões e à
disponibilização de documentos ao público. Há um certo temor de que o texto final do
processo de revisão seja encaminhado à Junta sem passar pelo “olhar” daqueles que têm
contribuído com sugestões e críticas (WRM, 2001:18).

Nos comentários enviados em 31/01/2001 ao Banco Mundial pelo Global Forest


Policy Project (umas das iniciativas não-governamentais à frente do Keeping the Promise?)
a respeito da última minuta emitida sobre a FPIR, as críticas à reformulação da política
florestal do Banco se concentraram na falta de consistência e clareza conceitual sobre
importantes aspectos, tais como o manejo florestal sustentável (SFM), que os críticos
consideram ser um termo ambíguo, mal compreendido e mal utilizado, sem consenso algum
quanto à sua definição. “O não esclarecimento do que o Banco entende como SFM pode
resultar no risco de comprometer milhões de dólares em projetos que acabem por ameaçar
mais ainda as reservas florestais do mundo.” O Global Forest Policy Project critica
também a ênfase dada pelo Banco à certificação florestal e sua concepção de que os
61

programas de certificação produzem SFMs como um resultado. Segundo a crítica, “a


certificação florestal pode estar baseada em padrões extremamente fracos e inadequados e
em procedimentos não-transparentes e não-democráticos, conduzindo assim ao manejo
florestal insustentável e à perda e degradação florestal, bem como pode estar baseado em
padrões firmes e em procedimentos abertos e democráticos”.

Outro importante aspecto destacado nesta crítica diz respeito à revisão da política de
1991 quanto à proibição de financiamento da atividade madeireira comercial - o Banco não
deixa claro se irá ou não revogar a proibição e como irá fazê-lo. No estudo de caso
realizado sobre o Brasil para a FPIR, o Banco Mundial destaca que representantes
brasileiros sugeriram que a revogação da referida proibição de financiar a atividade
madeireira comercial poderia trazer o apoio do Banco aos experimentos em manejo
florestal, contribuindo assim para a conservação das florestas do país. Embora o Brasil seja
um dos maiores tomadores de empréstimo junto ao Banco Mundial, a maior parte se destina
a outros setores (saneamento básico, p. ex.). Após a criticada participação do Banco
Mundial nos projetos de desenvolvimento para a Amazônia, como o POLONOROESTE
(Rondônia e Mato Grosso, anos 80), os financiamentos do Banco para o setor florestal
brasileiro foram substancialmente reduzidos a partir da sua política florestal revisada em
1991. Atualmente, em relação ao setor florestal, o Banco financia parte do PPG7 e participa
de uma recente aliança com a WWF para a implantação de projetos de reflorestamento
(citados como projetos de SFM) visando à conservação das florestas e ao seqüestro de
carbono.

Com relação à situação da Amazônia, especificamente, o Banco considera que


reformas na política florestal podem reduzir os desmatamentos, mas os retornos
econômicos de outros usos da terra, como a agricultura, são tão poderosos que a conversão
de terras florestadas para esse fim deverá continuar mesmo que a política florestal seja
modificada para melhorar a rentabilidade do manejo florestal. As pressões desse
“poderoso” setor agropecuário na região amazônica estão bem evidenciadas na questão da
revisão do Código Florestal Brasileiro, que vem preocupando muitos ambientalistas e a
sociedade em geral quanto ao destino da Floresta Amazônica, que tem recebido o mesmo
impacto destrutivo que reduziu a Mata Atlântica a menos de 8% de sua extensão original,
sendo que na Amazônia a velocidade da destruição é muito maior.
62

1.3.3 Plano Estratégico Florestal da FAO

No campo das iniciativa internacionais de política florestal é importante destacar


ainda o Plano Estratégico Florestal da FAO, resultado de um processo de consulta com os
Estados Membros da ONU, instituições e pessoas, que se iniciou em 1996 e foi concluído e
aprovado em 1999. O Plano orientará o programa da FAO e setores correlatos em um
horizonte de longo prazo (15 anos) e médio prazo (6 anos). O Plano é apresentado pela
FAO como um conjunto de diretrizes gerais nas quais se basearão os programas de trabalho
dos distintos departamentos, que deverão se desenvolver e se adaptar de acordo com as
circunstâncias (FAO, 2000). Os objetivos e os programas de médio prazo do Plano
Estratégico Florestal da FAO são:

1) Fortalecer a informação e as bases de dados sobre os recursos florestais e arbóreos –


como já visto (no item 1.1), o conhecimento quanto à situação das florestas e taxas de
alteração da cobertura florestal no mundo ainda é muito impreciso e a própria FAO
reconhece isso. Em um dos documentos preparatórios para a reunião do Comitê sobre
Florestas (que acontecerá de 12 a 16 de março de 2001), reconhecendo que, “a despeito
dos esforços empreendidos, os resultados do FRA 2000 indicam que as informações
sobre as florestas e a ciência florestal ainda não são suficientes para direcionar-se todas
as necessidades em nível global”, a FAO propõe melhorar o nível de informação através
da estruturação de um levantamento global das florestas (Global Forest Survey – GFS),
cuja metodologia envolveria intensas amostragens de campo. A disponibilização das
informações já está mais avançada, com softwares interativos de fácil consulta via
Internet;
2) Fortalecer as políticas florestais nacionais – inclui assistência para a formulação de
políticas e planejamentos estratégicos, análises das políticas florestais nacionais e
regionais e esforços para melhor compreensão dos aspectos jurídicos e institucionais e
os requisitos fiscais do manejo florestal sustentável. (a FAO participa das discussões
para a formulação da política florestal do IPF/IFF e do Banco Mundial);
3) Fortalecer os fundamentos técnicos da conservação e do desenvolvimento dos recursos
florestais, bem como do fomento e da utilização dos produtos florestais – um dos
principais segmentos desse objetivo é a continuidade do apoio à aplicação de critérios e
indicadores de manejo florestal sustentável. Inclui também o exame de medidas para a
conservação de recursos genéticos florestais, flora e fauna silvestre, apoio ao
melhoramento genético de árvores, condução de estudos sobre os efeitos ambientais,
sociais e econômicos das plantações, sobre atividades agroflorestais e de recuperação de
áreas degradadas (reflorestamento e florestamento) e quanto à utilização de produtos
florestais, uma atenção especial a sistemas de baixo impacto para extração de madeira,
63

considerando as técnicas apropriadas de elaboração, o fomento às oportunidades de


emprego e à infraestrutura, a comercialização dos produtos e a avaliação dos produtos
florestais não madeireiros;
4) Manter ou melhorar a saúde e o estado das florestas – o que inclui assistência técnica
na luta contra os incêndios florestais e nos aspectos de contaminação e mudanças
climáticas que afetam a saúde de florestas e árvores;
5) Fortalecer o marco institucional, jurídico e financeiro do setor florestal a nível
nacional – este objetivo inclui ajuda aos países para analisar, delinear e/ou revisar
estruturas normativas e organizativas que permitam atender às exigências nacionais e
internacionais e desenvolver a capacidade de gestão necessária para por em prática os
programas e políticas setoriais. Subentende-se que a FAO estará promovendo, por
exemplo, a implantação das Propostas de Ação do IPF/IFF e das diretrizes da política
florestal do Banco Mundial no nível nacional;
6) Impulsionar o debate e a colaboração sobre políticas florestais e questões técnicas nos
âmbitos internacional e regional – neste objetivo estão incluídos apoio administrativo,
técnico e normativo ao debate internacional sobre florestas, em especial ao Fórum
Intergovernamental sobre Florestas, bem como apoio técnico às Convenções sobre
Desertificação, Biodiversidade e Clima (incluindo o Protocolo de Kyoto);
7) Fortalecer as associações com outros grupos envolvidos nas atividades florestais -
isso envolve todas as composições que a FAO já realiza com instituições de pesquisa
internacionais e nacionais, com ONGs, setor privado, governos, bancos internacionais e
regionais e demais atores de interesse;
8) Conseguir maior igualdade social e econômica e aumentar o bem estar dos seres
humanos mediante o apoio às atividades florestais participativas e ao manejo
sustentável de florestas e árvores de zonas marginais – este é o objetivo mais
importante para o campo de interesse em florestas sociais (a estrutura institucional da
FAO e de outras instituições que trabalham neste campo encontra-se apresentada em
linhas gerais no item 2.1.2). Conforme o Plano Estratégico Florestal, “mediante o
programa de atividades florestais comunitárias e as tarefas de extensão florestal, a FAO
promoverá a adoção de enfoques participativos que permitam à população local e a
outras partes interessadas (especialmente as pessoas desfavorecidas) intervir no
planejamento e manejo florestal e obter benefícios adequados desta intervenção,
particularmente no que diz respeito à segurança alimentar. Se dará ênfase à criação de
um entorno normativo e institucional que propicie uma gestão local eficaz. Se
continuará fomentando a igualdade na partilha dos benefícios e na tomada de decisões,
especialmente para superar os problemas de desigualdade entre homens e mulheres.”
64

É importante tomar conhecimento, acompanhar e preferencialmente participar


(como indivíduo e, melhor ainda, como instituição ou grupo de pessoas que representam
alguma forma de interesse na questão das florestas) da elaboração e implantação dessas
políticas no âmbito internacional, não só porque elas afinal interferem de fato nos
acontecimentos regionais, nacionais e locais, tanto positiva como negativamente (de forma
intencional ou não), como porque faz parte de um processo de construção de uma sociedade
democrática estar consciente e participante das tomadas de decisão sobre questões que nos
afetam direta ou indiretamente, desde os primeiros momentos de reflexão e planejamento.

Políticas e práticas autoritárias historicamente conduzidas em muitos países “em


desenvolvimento” parecem causar um certo desinteresse ou descrédito por planos e
programas de ação; e, se isso acontece porque muitos planos e programas não se realizaram
ou foram desviados para outros propósitos, grande parte da frustração e conseqüente
desinteresse resulta da falta de uma participação mais ampla da sociedade na elaboração
dos mesmos. Conforme destaca Ferreira (1996), embora haja uma clara tendência nesses
planos internacionais (e também nacionais) de incorporar valores sociais, na prática ainda
há grande dificuldade de adequação às necessidades de cada setor da sociedade. Sem
participação ativa desses setores na elaboração dos planos, essa dificuldade continuará
existindo. Mas, certamente, esse cenário está mudando e a participação da sociedade nos
planos e decisões internacionais e nacionais vem aumentando em número, qualidade e em
alguma capacidade de intervir. Nas questões ambientais, o movimento de tomada de
consciência e de mobilização para reverter grandes problemas, como a destruição das
florestas, vem evoluindo, dos anos 1960 para cá, de uma postura reativa (de protestos e
denúncias) para uma postura ativa, saindo dos guetos das lamentações e visões
apocalípticas para o enfrentamento dos problemas com diversas armas, como as armas da
pesquisa, dos debates e das experimentações ambiental e socialmente responsáveis,
incluindo, é claro, as denúncias e os protestos. Um bom exemplo é a participação das
ONGs e Organizações de Povos Indígenas no Fórum Intergovernamental Sobre Florestas.
A questão das florestas está também sendo incluída na Aliança por um Mundo Responsável,
Plural e Solidário – uma rede informal (www.echo.org) formada por pessoas e instituições,
que, entre outras atividades de reflexão, está elaborando um Caderno de Propostas para o
Século XXI, dentre estes o Caderno de Propostas para a Gestão Sustentável das Florestas.
65

CAPÍTULO 2

FLORESTAS SOCIAIS – “ESTADO DA ARTE”

Esta caracterização do “estado da arte” em florestas sociais nas regiões tropicais está
essencialmente baseada em análise bibliográfica. O levantamento da bibliografia foi
iniciado a partir de instituições já conhecidas no Brasil, como a AS-PTA e o IPEF (ver item
2.1.2). O material encontrado nessas instituições trazia referências de instituições e autores
de fora do Brasil. Através de contatos por correio e buscas na Internet, foram obtidas
publicações e conhecidas diversas instituições envolvidas com o tema de estudo. A busca
na Internet foi feita inicialmente através do site www.altavista.com, ramificando-se deste
para diversas home pages de universidades, ONGs, institutos de pesquisa, etc. Dentre as
universidades, destacou-se o sistema de busca bibliográfica da Universidade de Minnesota -
com a mesma palavra chave (social forestry), foram listadas cerca de 3.000 referências
bibliográficas, de 1985 para cá, ano a ano.

A seleção dos artigos a serem obtidos baseou-se em cruzamentos entre referências


de diferentes fontes e estreitamento da busca com outras palavras-chaves, como a palavra
review, identificando autores e instituições principais (mais citados e mais conhecidas,
como a FAO). Houve contribuições bibliográficas também através de disciplinas realizadas
e outras fontes casuais. Várias publicações encontravam-se disponíveis nas próprias home
pages, em arquivos doc, pdf, html, etc. E outras publicações, por solicitação informal,
foram gentilmente enviadas por correio ou e-mail, pelas instituições ou pelos autores
diretamente.

Após ter consolidado um cenário geral sobre o tema florestas sociais com a análise
do material bibliográfico, algumas questões-chave ainda estavam meio obscuras,
especialmente quanto ao conceito e à importância relativa das questões envolvidas no tema.
Sobre a pergunta-título da dissertação, não foi encontrada nenhuma bibliografia específica,
66

que discutisse diretamente as perspectivas de que o desenvolvimento das iniciativas em


florestas sociais pudesse reduzir os desmatamentos tropicais. Como já havia identificado
alguns autores principais, selecionei 22 que tinham e-mails de contato e enviei uma
mensagem, igual para todos, explicando minha pesquisa e solicitando respostas curtas para
essas três questões – a) conceitos, b) questões mais críticas e c) florestas sociais versus
desmatamento. Metade retornou os e-mails: quatro estavam sem tempo de responder (em
viagem) e seis responderam sucinta e atenciosamente às minhas perguntas. As respostas
dos pesquisadores estão citadas ao longo do texto.

2.1 Panorama Geral

O que significa floresta social? Que abordagens e definições são apresentadas na


literatura disponível? Existe uma base conceitual teórica? O que se pretende com as
iniciativas de pesquisa & desenvolvimento em florestas sociais? Há consensos entre os
empreendedores neste campo de p&d quanto às concepções, aos objetivos e aos métodos?
Que pessoas e instituições se dedicam ao tema? Essas são, basicamente, as questões
abordadas neste item de introdução ao tema das florestas sociais.

2.1.1 Concepções e Definições

O termo florestas sociais8 vem sendo utilizado no Brasil (Mata, 1993, Castanho
Filho, 1993 e Queiroz, 1995) para traduzir a expressão original social forestry, criada em
1968 por Jack Westoby, na época um dos diretores da FAO. No entanto, a tradução mais
apropriada ao que se vem pretendendo como social forestry seria ciência florestal social ou
manejo florestal social, ou ainda manejo florestal comunitário, tendo em vista que o termo
community forestry (adotado pela FAO) vem sendo mais amplamente utilizado em vários
países.

Westoby utilizou a expressão social forestry para definir um objetivo basicamente


ambiental de “produzir um fluxo de benefícios de proteção e recreação para as
comunidades rurais” (Gulati, 1990). Em 1973-76, o Governo da Índia, preocupado com a

8
Ou também silvicultura social, menos utilizado.
67

crescente escassez de produtos florestais e aumento de áreas degradadas por contínuo uso e
mal uso da terra em longos períodos, adotou a expressão social forestry em seus objetivos
de realizar plantios de árvores para o atendimento às necessidades básicas da população
rural e a recuperação das áreas degradadas (Shah, 1985).

Porém, seja qual for o termo utilizado, nas publicações disponíveis (encontradas na
revisão bibliográfica para este estudo) não há propriamente um conceito teórico do que
venha a ser social forestry ou community forestry. Em alguns trabalhos de revisão ou
avaliação sobre o tema, o que se apresenta é um processo ainda ‘em construção’ de um
conceito de florestas sociais (sob um ou outro termo “guarda-chuva”), cuja base conceitual
está apoiada na teoria de sistemas (Alavalapati e Gill, 1991) e será comentada mais adiante,
neste item. Em geral, o que se encontra nas publicações sobre florestas sociais são metas
gerais e objetivos práticos (e meios para alcançá-los) que procuram estar voltados para o
benefício dos “locais”9, com a participação dos mesmos no manejo das florestas existentes
ou nos plantios de árvores, metas que vão sendo revistas na medida em que os resultados
das iniciativas em curso vão sendo obtidos e avaliados.

O programa governamental da Índia, primeiro a ser implantado sob a ‘alcunha’ de


social forestry, tinha inicialmente como metas: (1) suprir as áreas rurais de lenha; (2) suprir
pequenas madeireiras; (3) produzir forragem para o gado; (4) proteger campos agrícolas do
vento; e (5) satisfazer necessidades recreacionais. Em seguida, o “conceito” foi ampliado e
os projetos de florestas sociais passaram a compreender os seguintes objetivos
“estratégicos”: (a) encorajar o maior número de pessoas a plantar árvores; (b) promover
tipos de cultivos arbóreos que melhor atendam às necessidades de lenha, madeira e
forragem para consumo próprio dos pequenos produtores; (c) aumentar a renda e os
benefícios para os pobres através dos produtos provenientes das árvores; e (d) melhorar a
proteção ambiental (Cernea, 1992).

Hyde e Köhlin (2000) consideram que social forestry se refere à produção e ao uso
de lenha, forragem, frutas e sementes, látex, resina e vários outros produtos florestais não
madeireiros em geral, incluindo usos domésticos e trocas no mercado de madeiras de

9
Nesta dissertação, adotei essa expressão sintética - “os locais” - como referência às pessoas que são objeto
de interesse dos projetos de florestas sociais, normalmente citados na literatura como “a comunidade local”,
ou “a população local”, ou “os moradores” (villajers), ou “a comunidade alvo”.
68

construção, mas não incluindo produção industrial de madeira ou pequena produção para
além do mercado local. Para esses autores, o sucesso das iniciativas em florestas sociais
deve ser avaliado em termos de sua contribuição ao bem estar humano, em contraste com a
visão de que a cobertura florestal (e, portanto, a proteção florestal e o reflorestamento) é um
fim útil por si mesmo.

Essa concepção de uso exclusivamente local é a mesma demonstrada pela FAO, ao


definir community forestry como “qualquer situação que envolva intimamente a população
local em uma atividade florestal, abarcando um espectro de situações que vão desde
pequenas unidades de plantios florestais para as necessidades locais em madeira e outros
produtos, passando por crescimento de árvores em fazendas para prover renda e uso
doméstico, artesanato e pequenas indústrias de produtos florestais, até atividades de
construção das comunidades que habitam as florestas.” (FAO, 1978).

Arnold (1992), em um documento publicado pela FAO de avaliação de uma década


de projetos em community forestry, critica o uso do termo social forestry, considerando-o
restrito a uma noção de que os objetivos estão voltados para o “bem-estar” social, omitindo
o “sobrepujante critério econômico nas decisões dos produtores”. Já a visão de Gulati
(1990) sobre a diferença entre os dois termos recai na questão da participação social nos
projetos. Avaliando que o programa de social forestry do governo indiano estava
fracassando nesse sentido, o autor defende que o “conceito” community forestry estaria
mais voltado para o fortalecimento dessa participação. No entanto, é o mesmo Arnold
(1992) quem avalia que, dentre as falhas no desenvolvimento dos programas de community
forestry, está a falta de participação efetiva da comunidade no processo de elaboração e
realização dos projetos, “que tem sido dominado pelos planejadores e outros de fora”.

Apesar das defesas ao termo community forestry, raramente se encontra na


bibliografia alguma preocupação em definir o que seja “comunidade”. Segundo Johnson
(1997), comunidade é um termo com inúmeros significados, sociólogicos ou não, e entre os
sociólogos há tanto aqueles que consideram que comunidade inclui “um sentimento muito
forte de pertencimento e compromisso mútuo, baseado em uma cultura homogênea,
experiência em comum e acentuada interdependência”, como há os que caracterizam
comunidade como urbana ou rural, tradicional ou moderna, cujos grupos humanos de cada
69

uma não necessariamente compartilham dos mesmos “sentimentos de pertencimento” ou da


mesma cultura.

Embora, de fato, o termo comunidade seja usado de diversas maneiras e com


significados muito distintos, nem sempre expressando uma “comunhão” de visões de
mundo, condições sociais e atitudes entre os seus membros (como nos termos comunidade
científica, comunidade moderna e comunidade rural), para o tema em questão torna-se
fundamental uma compreensão clara do que seja a “comunidade alvo”. Cernea (1992)
demonstrou essa preocupação, ao criticar a falta de cuidado com os aspectos sociais da
maioria dos projetos de “social forestry”, começando pelo próprio entendimento de quem
são os atores sociais : “Em algumas publicações, do título às conclusões, se repete o termo
community forestry, centenas de vezes, como um mantra, sem preocupação alguma em
discutir que grupos sociais específicos, estratos ou classes compõem essa mítica
comunidade e o que conta de comportamento diferencial para os plantios de árvores.”

A única publicação encontrada sobre florestas sociais que se dedica a discutir o


conceito de comunidade é de uma instituição do Canadá: Duinker et al. (1994) fizeram uma
revisão das muitas definições para o termo comunidade e encontraram que existem cinco
amplos tipos de definição que caracterizam a comunidade sob aspectos isolados – ou por
localização geográfica, ou por identidade cultural, ou por sistema social, ou pelo tipo de
relacionamento (abordagem psicológica) ou ecológico (baseado em fontes de energia
necessárias para viver) – que, para os autores, não satisfazem como definição de uma coisa
tão complexa e que não pode ser vista como a mera soma desses aspectos; para os autores,
“a comunidade é essencialmente um povoado no qual as pessoas têm algum senso de lugar,
interesses e objetivos comuns e estão dispostas a cooperar ou trabalhar juntas para atingir
esses objetivos.”

Sob tal enfoque, Duinker et al. (1994) preferem utilizar o termo community forests
(e não forestry), explicando que, como o termo forestry “está ligado à profissão (de
florestal) e alude à ciência e à arte de manejo das florestas”, preferem discutir florestas
comunitárias – “florestas atuais e os arranjos comunitários para manejá-las”. Esses autores
criticam a definição da FAO, que consideram falha na colocação de três aspectos: (a) como
o tal “envolvimento íntimo” é ou pode ser estruturado? – quem tem a autoridade para a
70

tomada-de-decisão final?; (b) representação: quem está envolvido localmente e como são
selecionados?; e (c) igualdade: quem paga e quem recebe benefícios? Nesse sentido, os
autores consideram que a definição de florestas comunitárias deve reconhecer três
atributos: (a) quem decide; (b) quem é beneficiado; e (c) como são delimitados os objetivos
de manejo; e apresentam, enfim, sua própria definição de florestas comunitárias – “um
ecossistema dominado por árvores, manejado pela comunidade por múltiplos valores e
benefícios comunitários”.

Uma maior atenção com o entendimento do que seja a comunidade deveria,


portanto, ser uma premissa básica para a definição e o planejamento de projetos que se
intitulem voltados para o manejo florestal comunitário, tendo em vista que a falta desse
entendimento pode estar na raiz de um eventual fracasso nos resultados dos projetos.
Conforme destaca Cernea (1992), o pressuposto inicial de que as “comunidades” (ou
povoados) poderiam ser efetivos agentes para a implementação de community forestry é um
pressuposto sociologicamente ingênuo e demonstra uma falta de entendimento da estrutura
e da estratificação social.

É importante destacar, nesse contexto de definições imprecisas e conceitos “em


construção”, que social forestry ou community forestry são termos relacionados a um
momento histórico recente, dos últimos 20-30 anos, de investimentos em projetos de
pesquisa e desenvolvimento florestal, governamentais e/ou não-governamentais. Mas a
existência de ecossistemas florestais manejados por comunidades humanas remonta a
milhares de anos. E esta condição, embora muitas vezes seja ignorada pelos próprios
empreendedores de tais projetos, tem sido cada vez mais alvo de interesse no campo de
p&d em florestas sociais, como conseqüência de uma maior valorização da necessidade de
fortalecer e legitimar o conhecimento tradicional dos povos da floresta sobre o uso e o
manejo do seu ambiente.

Entre os pesquisadores consultados via e-mail, alguns entendem que o termo


community forestry seja mais utilizado nos projetos junto às comunidades tradicionais das
florestas (povos indígenas ou não indígenas), mas quase todos concordam que os termos
social forestry e community forestry são “intercambiáveis” ou se sobrepõe. Três
pesquisadores fizeram comentários sobre a influência negativa que as primeiras
71

experiências fracassadas na Índia trouxeram ao termo social forestry. Marilyn Hoskins10,


que não considera relevante a questão da diferença entre os termos, cita que o
Departamento Florestal da FAO definiu social forestry como “a ciência florestal
socialmente consciente”. O único pesquisador que marcou uma distinção absoluta entre os
dois termos está “do lado de cá” (na América do Sul): para o pesquisador peruano Rodrigo
Arce, que participa das pesquisas realizadas no Instituto del Bien Comum - IBC (ver item
2.3), “foresteria comunitária se refere às interações que existem entre as florestas e a
sociedade e foresteria social é a promoção do manejo florestal comunitário - a diferença
básica é que a primeira obedece mais à lógica da gestão local das florestas a partir das
próprias capacidades das pessoas e a segunda obedece à lógica de como tornar eficientes as
instituições para que possam promover o manejo comunitário das florestas.” Arce afirma
que isto tem grande repercussão nos enfoques, conceitos, metodologias,... e que há
diferenças entre técnicas de intervenção e formas como somos assimilados no
desenvolvimento da agenda local.

Portanto, dentro do que estamos chamando aqui de florestas sociais, há uma


variedade de concepções e definições, nas quais o que há em comum é, pelo menos, o fato
de envolver árvores e pessoas (preferencialmente em grupo/comunidade) que fazem ou que
(se espera) venham a fazer uso e algum manejo delas mais adequado ao atendimento de
suas necessidades básicas e à melhoria das condições ambientais. Nesse vasto campo de
possibilidades de interações pessoas-árvores-ambiente, alguns incluem, ainda, determinadas
situações de manejo de árvores ou bosques em áreas urbanas, plantios de árvores em
propriedades rurais individuais (fazenda florestal) para benefício próprio e os sistemas
agroflorestais (SAFs), que apresentam semelhanças quanto aos propósitos de bem-estar e
melhoria social, embora existam controvérsias quanto a serem vistos como iniciativas em
florestas sociais.

Em área urbana, no Brasil, vale a pena citar o projeto Mutirão Reflorestamento, uma
experiência carioca que vem se destacando e sendo adotada em outras regiões do país. O
trabalho é planejado, coordenado e executado por técnicos florestais da Prefeitura do Rio

10
Marilyn Hoskins coordenou o Forest, Trees and People Program da FAO e atualmente assessora a Aliança
Banco Mundial/WWF.
72

de Janeiro em favelas da cidade, onde são plantadas árvores para recuperação ambiental e
paisagística das encostas, com a participação das comunidades. Esse trabalho tem sido
reconhecido e premiado no país e no mundo e foi a única iniciativa ambiental brasileira
selecionada para integrar, em conjunto com 8 (oito) outras iniciativas, um documento da
Organização das Nações Unidas (ONU) sobre inovações ambientais em megacidades
("Environmental Innovation for Sustainable Mega-Cities: sharing approaches that work").
No entanto, nem mesmo os responsáveis pela iniciativa a denominam como um projeto de
florestas sociais.

Os sistemas agroflorestais (SAFs) são mais considerados como “parentes próximos”


das florestas sociais, por trabalhar com o componente arbóreo em sistemas de produção
agrícola ou em pastagens, principalmente quando fazem uso de abordagens participativas
junto aos “locais”. Alvim (1995), em uma revisão bibliográfica sobre os conceitos de
agrofloresta, chama a atenção para a distinção entre agrofloresta e os termos floresta social,
floresta comunitária e fazenda florestal. O autor considera que agroflorestas têm sido
desenvolvidas como uma interface entre agricultura e floresta e que a melhor distinção está
no fato de que “a agrofloresta enfatiza a associação interativa entre plantas lenhosas
perenes e culturas agronômicas e/ou animais para uso múltiplo e serviços. Os outros termos
se referem ao plantio e ao uso de árvores para produção de alimentos, combustíveis,
produtos farmacêuticos, forragem, madeira para construção e capital.” Este autor não
considera o componente participação em suas definições, fazendo apenas uma distinção
“técnica” entre os termos.

Carter (1999), embora reconheça uma ligação entre as áreas, não inclui agrofloresta
e fazenda florestal no conjunto das experiências classificadas pela autora como de “Manejo
Florestal Colaborativo (CFM)”, onde estão incluídos os termos ‘social forestry’ e
‘community forestry’, juntamente com desenvolvimento rural florestal, manejo florestal
integrado (JFM), manejo florestal compartilhado e manejo florestal participativo. Como
característica comum a essas abordagens, a autora cita a concordância de que a população
local é capaz de exercer um papel útil no manejo florestal e que sua habilitação de acesso
e/ou uso da floresta dá a ela o direito de participar em todas as decisões relativas à floresta.
73

Para Alavalapati e Gill (1991) os sistemas agroflorestais se referem apenas a um


conjunto de práticas de cultivo, que procuram consorciar espécies agrícolas ou de pastoreio
com espécies arbóreas e que podem ser usadas em iniciativas de florestas sociais, como
meio técnico de atingir seus objetivos. Esses autores consideram que social forestry é um
termo genérico utilizado para atividades florestais conduzidas com a participação ou o
envolvimento das pessoas e admitem que possam ser realizadas tanto em uma área coletiva
(comunidade, povoado, vila,...) como em uma propriedade individual (fazenda florestal).

Marilyn Hoskins (comunicação via e-mail), comenta que existe um forte debate em
relação a se uma iniciativa individual de manejo florestal ou agroflorestal poderia ser parte
integrante dos conceitos em florestas sociais. Em sua opinião, isto é possível e depende da
área onde está situado o indivíduo e se é importante desenvolver atividades de manejo
florestal social na propriedade individual. No entanto, Hoskins destaca que a participação
da comunidade deve ser ao menos de colaboração passiva nas iniciativas individuais, no
sentido de aumentar o “capital social positivo”, citando como exemplo uma situação em
que, se uma pessoa tem um pomar de frutas ou um viveiro de mudas, os vizinhos devem
colaborar para que crianças ou animais não danifiquem o pomar ou as mudas. Já no caso de
manejo comunitário tradicional de florestas já existentes, Hoskins considera que podem
existir sérias razões para apoiar e fortalecer as atividades de grupo (incluindo a ajuda para
manter de fora os “forasteiros”).

Observa-se, portanto, que, a partir de uma motivação inicial de melhorar as


condições sociais e ambientais de populações rurais pobres dependentes dos recursos das
florestas, vem se formando um grande leque de interesses e possibilidades, “abrigadas” sob
as iniciativas em florestas sociais. Os diferentes (e eventualmente divergentes) modos de
conceber florestas sociais indicam a necessidade de uma abordagem teórica que possibilite
circunscrever este campo de p&d em um conjunto de pressupostos básicos, evitando
contradições que acabem por ‘esvaziar’ o sentido e o propósito das inciativas, tal como vem
acontecendo com o termo “desenvolvimento sustentável”, ampla e antagonicamente
utilizado por diferentes atores sociais.

Alavalapati e Gill (1991) tentam realizar uma análise conceitual e teórica do que
seja social forestry. Entendendo que os denominadores comuns em todas as definições de
74

social forestry analisadas são “pessoas, suas necessidades e sua participação”, esses autores
propõem a seguinte definição: “Floresta social é uma atividade de cultivo, colheita e
processamento de árvores, exclusivamente ou em combinação com culturas agrícolas ou
forrageiras, individual ou comunitariamente, envolvendo as pessoas com o objetivo de
atender suas necessidades de subsistência, comerciais e ambientais.” Considerando que o
objeto de interesse da social forestry é multidisciplinar, esses autores entendem como
essencial que haja uma base teórica para a compreensão dos diversos aspectos envolvidos e
defendem que esta base esteja referida à teoria de sistemas - “a teoria de sistemas fornece
um modelo do mundo real e permite que suas variáveis interajam de modo realístico,
provendo um entendimento adequado do fenômeno em estudo”. Após analisar as
concepções de outros autores, propõem um modelo baseado na ecologia humana, que reúne
as diversas variáveis relativas a social forestry em quatro principais componentes –
população, organização social, tecnologia e ambiente – de tal maneira interligados, que
qualquer alteração em um deles repercutirá nos demais e no conjunto integrado.

No entanto, a contribuição de Alavalapati e Gill (1991) no sentido de estabelecer


bases teóricas para florestas sociais parecem ser ainda muito tímidas diante da
complexidade deste campo de p&d, especialmente quanto aos aspectos sociais que
determinam as condições de desenvolvimento das iniciativas. A teoria sistêmica é um
importante “pano de fundo”, porque respalda o caráter multi e interdisciplinar deste campo,
onde nada funciona isoladamente e o modo como cada parte se comporta afeta o todo na
sua busca por um equilíbrio dinâmico. Mas o tema em questão carece de uma análise
teórica mais profunda, que coloque sobre a mesa, e em confronto, teorias que procurem dar
conta de conceitos claros e bem construídos sobre participação, formas de organização
social e de divisão/apropriação dos recursos e do território, sustentabilidade socioambiental,
dentre outras questões fundamentais ao campo de p&d em florestas sociais, normalmente
apontadas e discutidas na literatura.

2.1.2 Atuação Institucional Global e Regional

Ao que parece, nessas duas-três décadas de projetos e pesquisas em florestas


sociais, os trabalhos desenvolvidos em ambientes de florestas tropicais se concentraram
75

inicialmente em alguns países nas Regiões da Ásia/Pacífico e da África, expandindo-se


depois para países das Américas Central e do Sul11.

O interesse por esse campo vem crescendo rapidamente, tal como o número de
publicações a respeito, grande parte em papers publicados em revistas, boletins e journals
patrocinados por instituições direta ou indiretamente envolvidas nos projetos. Neste item,
são listadas e descritas sucintamente as instituições às quais tive acesso na pesquisa
bibliográfica, que contribuem, direta ou indiretamente, para o campo de p&d em florestas
sociais.

Certamente que esse panorama institucional não esgota o amplo leque de


instituições que atuam neste campo, mas certamente indica as principais fontes de consulta
para os que queiram estar informados a respeito, podendo acessar outras instituições não
listadas neste documento, através dos respectivos links e referências contidas nas
instituições apresentadas. Como a maioria das instituições listadas vem disponibilizando
grande parte de seus trabalhos na Internet, não foram colocados endereços e telefones de
contato, apenas os sites, de onde podem ser obtidas outras formas de contato. Somente a
AS-PTA, que fica no Rio de Janeiro e não tem publicações disponibilizadas na Internet
aparece com endereço indicado.

Segue a lista das principais instituições identificadas, por ordem alfabética:

Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa (AS-PTA)

Organização não-governamental, com sede no Rio de Janeiro, que trabalha com


projetos de agroecologia, com abordagens em metodologias participativas. Dispõe de uma
vasta bibliografia na área de agroecologia, sistemas agroflorestais e algumas publicações
sobre florestas sociais. Em sua sede podem ser obtidas informações sobre outras
instituições afins no Brasil, como a Rede Brasileira Agroflorestal – REBRAF e o Centro de
Tecnologias Alternativas da Zona da Mata CTA-ZM.

11
Existem também muitos trabalhos sendo desenvolvidos em países da América do Norte e da Europa, mas
que não foram considerados, tendo em vista que o foco de interesse dessa dissertação está concentrado nas
regiões de florestas tropicais.
76

AS-PTA
Endereço: Rua da Candelária, 9 - 6º andar – 20021 – Centro – Rio de Janeiro
E-mail: aspta@ax.apc.org

Center for International Forestry Research (CIFOR)

A instituição desenvolve vários estudos sobre sustentabilidade florestal e vem


elaborando Critérios e Indicadores (C&I) para certificação de manejo florestal sustentável.
Informações e publicações no site http://www.cifor.cgiar.org

European Tropical Forest Research Network (ETFRN)

Instituição européia que visa promover interação entre organizações e pesquisadores


europeus e norte-americanos interessados em regiões de florestas tropicais. Informações,
links e publicações no site http://www.etfrn.org/etfrn/index

Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO)

A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura – FAO é uma


das instituição que tem atuado a mais tempo e de forma geograficamente mais ampla com
iniciativas em florestas sociais, promovendo pesquisas e projetos de intervenção, em
parcerias com agências de financiamento (Banco Mundial principalmente), governos,
universidades e ONGs. O trabalho da FAO nessa área é extenso e bem documentado -
várias publicações são distribuídas gratuitamente por correio e em arquivos disponíveis na
Internet (http://www.fao.org/forestry). A busca deve ser feita com a palavra-chave
community forestry.

A Unidade de Florestas Sociais (Community Forestry Unit – FAO) desenvolve o


Forest, Trees and People Program – FTPP, juntamente com o Departamento de Estudos
em Desenvolvimento Rural da Universidade Sueca de Ciências Agrícolas, em Uppsala,
Suécia. Existem Centros Regionais do FTPP na África, na Ásia e na América Latina e
todos podem ser acessados através do site http://www-trees.slu.se/.
77

O FTPP tem apoiado a formação de Redes de Ensino Rural para capacitação em


florestas sociais, junto a instituições como o Regional Community Forestry Training Center
(RECOFTC), um centro regional para atividades de ensino e pesquisa no Sudeste da Ásia,
sediado em Bangkok, Tailândia. Várias publicações, em tailandês e em inglês estão
disponíveis no site http://www.recoft.org.

O FTPP também apoia uma organização não-governamental voltada para as


atividades de luta por direitos, capacitação e organização de mulheres – a Women Acting
Together for Change (WATCH), com sede no Nepal. Informações sobre a instituição
podem ser acessadas em http://www-trees.slu.se/nepal/watchindex.

Fundação Ford

A Fundação Ford (http://www.fordfound.org) apoia vários projetos sociais em


várias regiões do mundo. No Brasil vem apoiando iniciativas em desenvolvimento
sustentável de instituições como o Instituto do Meio Ambiente e do Homem – IMAZON
(www.imazon.org), o Instituto Socioambiental – ISA (www.socioambiental.org) e as
Universidades Federais do Acre e do Pará, que trabalham com pesquisas e projetos de
manejo com comunidades tradicionais da Amazônia.

Institute of Development Studies (IDS) / University of Sussex, Brighton UK

Essa instituição trabalha com metodologias de diagnóstico rural participativo em


regiões de países tropicais. Há várias informações e publicações disponíveis em seu site:
http://www.ids.ac.uk

Instituto del Bién Comun (IBC)

Organização peruana sem fins lucrativos que desenvolve pesquisas sobre manejo
comunitário com populações tradicionais da Amazônia, em parceria com instituições
brasileiras, como o Instituto de Pesquisas da Amazônia (IPAM). Informações e
publicações do IBC no site http://www.biencomun-peru.org
78

International Association for the Study of Common Property (IASCP)

O IASCP é uma associação de pesquisadores sobre questões relativas à


propriedade comum que reúne mais de 2000 pessoas, entre cientistas políticos,
antropólogos, economistas, historiadores, e comunidades organizadas. Sua sede é na
Universidade de Indiana (EUA). Em seu site (http://www.indiana.edu/~iascp/about.html)
há muitos artigos e outras publicações disponíveis.

Na Universidade de Indiana também se encontra o International Forestry


Resources and Institutions (IFRI) que tem trabalhado, em colaboração com a FAO, com
pesquisas sobre manejo florestal comunitário em regiões tropicais (Bolívia, Equador, Índia,
Nepal, Uganda) - http://www.indiana.edu/~ifri/aboutifri.htm

International Institute for Environment and Development (IIED), London UK

Organização independente, sem fins lucrativos, que trabalha na promoção de


padrões sustentáveis de desenvolvimento. Desenvolve programas específicos para a área de
desenvolvimento rural e disponibiliza várias publicações no seu site: www.iied.org

International Network of Forests and Communities (INFC), Canada

Essa Rede foi criada, em outubro de 1998, com o objetivo de integrar instituições e
pessoas de todo o mundo que trabalham com manejo comunitário florestal. Além de
publicações, no site da Rede estão sendo organizadas informações sobre o assunto em cada
país, por região, tem links para diversas instituições por todo o mundo e uma lista de
discussão: http://www.forestsandcommunities.org

International Network on Ethnoforestry (Bophal, India)

Dispõe de uma extensa relação bibliográfica e várias publicações estão disponíveis


sobre pesquisas etnoflorestais. http://www.forestguru.com
79

Instituto de Pesquisas e Estudos Florestais (IPEF)

Com sede na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ) da


Universidade de São Paulo (USP), o IPEF dispõe de bibliografia sobre florestas sociais e
publica alguns artigos de interesse da área de manejo florestal comunitário.

Overseas Development Institute (ODI)

Esta organização não-governamental, além de desenvolver estudos e projetos para


comunidades pobres do Terceiro Mundo, mantém uma Rede de Desenvolvimento Rural
Florestal (Rural Develoment Forestry Network), que publica vários projetos de florestas
sociais em diversos países, geralmente em parceria com outras instituições. Todas as
publicações da RDFN/ODI estão disponíveis em inglês e espanhol, bem como seus projetos
e atividades, no site – fttp://www.odifpeg.org.uk/rdfn

Red Centroamericana de Información en Forestería Comunitaria

Coleta e distribui informações sobre manejo florestal comunitário. Está baseada na


Universidad Santa Maria La Antigua (USMA), no Panamá. Tem links para várias
instituições da América Central e publicações – http://www.sdnp.org.pa/~rfc

Red Interamericana Agricultura y Democracia (RIAD)

A RIAD trabalha na produção de conhecimentos úteis às organizações camponesas,


para elaboração de estratégias políticas relativas a problemas de posse da terra, produção e
comercialização, etc. Disponibiliza vários artigos sobre sistemas agroflorestais, organização
e manejo comunitário, entre outros, no site http://www.laneta.apc.org
80

2.2. As Questões Envolvidas

Na maior parte das publicações sobre projetos em florestas sociais encontra-se uma
discussão crítica a respeito do andamento e dos resultados obtidos, num processo constante
de avaliação interna (pelos próprios executores) ou feita por “observadores” externos –
geralmente consultores das instituições doadoras. Neste item, são apresentadas as questões
mais freqüentemente abordadas nessas publicações, com enfoque sobre as experiências e
avaliações realizadas em regiões de florestas tropicais, o que, invariavelmente, envolve
países do chamado Terceiro Mundo ou “em desenvolvimento”.

2.2.1 Relações Institucionais – Participação e Descentralização

As iniciativas em florestas sociais quase sempre envolvem parcerias entre agências


de governo, agências multilaterais, instituições de ensino, pesquisa e extensão, ONGs
internacionais e organizações sociais de base. As relações entre essas instituições e
principalmente dessas com a população alvo dos projetos é uma questão fundamental e que
tem sido discutida não só neste campo específico (de florestas sociais) como em todos os
campos de atuação e intervenção política e técnico-científica que envolvam os pressupostos
de descentralização e participação social.

Segundo Carter (1999), o termo participação pode significar um amplo espectro de


situações, “desde pouco mais do que coerção, ou um fluxo de informações de mão-única,
até uma genuína co-ação”. Arnold (1992), em sua avaliação dos primeiros 10 anos de
projetos em community forestry, apontava que, embora o conceito de participação tenha
criado raízes rapidamente, na realidade ainda estava sendo mais apregoado do que
praticado, tendo em vista que, mesmo os projetos concebidos com a preocupação de
“identificar necessidades, aspirações e possibilidades locais”, estavam sendo realizados
mais com base na visão dos planejadores e outros “de fora” do que “dos locais” e a
esperada participação local só iniciava quando o projeto já estava delineado. Arnold,
embora não faça uma correlação direta, cita outro aspecto (dentre os que ele considerou
como “lições” que começavam a emergir das primeiras avaliações dos projetos) que
certamente é subjacente ao problema da participação, que é a “complexidade dos sistemas
sociais e ambientais envolvidos”.
81

Lidar com esta complexidade, onde muitos aspectos de ordem “não-florestal” são
determinantes sobre o andamento dos projetos, demanda mudanças no modo convencional
de conduzir as intervenções. Uma rápida reflexão sobre esse termo – intervenção – já traz à
tona algumas questões importantes a serem consideradas nos propósitos de ajudar a
população local a resolver seus problemas de escassez de recursos e degradação ambiental,
desde que “intervir” pressupõe que os “interventores” tenham uma compreensão mais
profunda e abrangente sobre as causas e implicações dos problemas do que a população que
os vivencia e, mais ainda, que tenham o conhecimento, a experiência, os instrumentos e até
a sabedoria necessários para resolvê-los adequadamente. No entanto, não parece ser bem
esse o caso das iniciativas em florestas sociais, tendo em vista as inúmeras dificuldades,
relatadas na bibliografia, nos processos de elaboração e condução de projetos nesse campo,
reconhecendo-se que os ‘interventores’ ainda têm muito que aprender.

Essas dificuldades têm sido apontadas desde as críticas às primeiras inciativas em


florestas sociais e muitas ainda persistem nas inciativas mais recentes. Na avaliação de
Gulati (1990), o programa de florestas sociais na Índia, a despeito de seus nobres objetivos,
falhou em vários aspectos: em toda a sua extensão, o programa permanecia controlado pelo
governo, planejado e implementado por suas agências (os Departamentos Florestais) e
funcionários; a população rural considerava-se forçada e explorada pelas agências de
governo e seus contratados; um fraco relacionamento entre os técnicos e a população rural
resultou em fracasso na mobilização das pessoas para participar e proteger as florestas e
árvores por elas plantadas; e a população rural sentia-se excluída do processo de tomada de
decisão que afetava seus meios de sustento. Shiva e Bandyopadhyay (1991) citam ainda
que a organização do programa de florestas sociais na Índia estava ignorando
sistematicamente as formas tradicionais de participação social no manejo das florestas.

Carter et al. (1994), avaliando iniciativas de florestamento participativo no Sri


Lanka, apontam que os projetos eram elaborados sem consulta à população local e baseados
em objetivos de outros países, tais como dar prioridade à necessidade de lenha, o que não
era verdadeiro para a região. Os autores também criticam o papel das ONGs, que não
reconheciam o conhecimento local (em um país com tradição agroflorestal), trazendo
objetivos e metas pré-determinadas por seus consultores e financiadores.
82

Para Chambers (1993), a questão está na necessidade de se romper com uma postura
profissional “normal”, cujos valores, modos de pensar, métodos e comportamentos, estáveis
e conservadores, estão ligados a estruturas “centro-periferia”, a posturas “top-down” de
poder e conhecimento, reproduzidas através do ensino e defendidas pela especialização;
“tais valores são voltados para os primeiros, são urbanos, industriais, de alta tecnologia,
masculinos, quantificadores e preocupados com coisas e com necessidades e interesses dos
ricos”. Ao contrário, o “novo profissionalismo” proposto por Chambers reverte os valores,
papéis e relações de poder do profissionalismo “normal”, colocando “o povo primeiro, e o
povo pobre antes de tudo”. 12

O slogan desse novo paradigma profissional - “putting the last first” - colocar os
últimos, os pobres, em primeiro lugar nos programas de desenvolvimento, embora possa
soar como um “apelo aos sentimentos humanitários dos planejadores”, conforme comenta
Cernea (1985), tem permeado um processo em construção de abordagens, métodos e
técnicas interdisciplinares e participativas, tanto em projetos de florestas sociais como em
outros tipos de projetos para áreas rurais (e também urbanas). Grande parte das concepções
político-metodológicas desse contexto baseia-se no pensamento e no trabalho do educador
brasileiro Paulo Freire (1921-1997), conhecido em muitos países:

O trabalho e os escritos de Paulo Freire, cuja pedagogia do oprimido habilita o povo


pobre a olhar criticamente o seu mundo, a romper com sua ‘cultura do silêncio’ e a
tomar controle de seu próprio destino, tem sido uma inspiração para aqueles que têm
buscado métodos de pesquisa nos quais os povos rurais sejam atores mais do que
objetos de observação e fontes de dados (Chambers, 1983: 73).

Na condição de técnicos de governo, de agência financiadora/doadora ou de ONG


executora, os profissionais (sejam florestais, agrônomos, economistas, sociólogos, etc.) que
conduzem os projetos de florestas sociais parecem ter, portanto, um grande desafio a
encarar. A estrutura acadêmica convencional que formou esses técnicos está sendo
profundamente questionada. Conforme destaca Messerschmidt (1995), o novo paradigma
não implica meramente em novas idéias ou modelos a seguir, mas também desafia as

12
Nessa mudança de “paradigma profissional” também caberia esclarecer o conceito de pobreza que mobiliza
esses esforços de ajuda internacional e participação, tal como nas considerações de que a pobreza é uma
causa subjacente do declínio das florestas tropicais (ver item 1.2.2, letra a).
83

premissas fundamentais do conhecimento a priori e implica numa mudança na visão de


mundo dos profissionais. Paulo Freire (1986), ao apontar o caráter político da atividade
científica, coloca que “A quem sirvo com a minha ciência?” é uma pergunta que
constantemente devemos fazer.

As críticas geralmente feitas à atuação dos profissionais florestais estão referidas a


um questionamento mais amplo sobre o positivismo e as tendências reducionistas da
ciência ocidental. Segundo Sellamna (1999), o modelo de transferência de tecnologia é
considerado pelos críticos das ciências agrárias a pedra fundamental da ciência positivista.
E o próprio termo extensionismo traz esse modelo como base. Na medida em que o modelo
reducionista de transferência de tecnologia é unidirecional, de “mão-única” e de “cima-
para-baixo” (top-down), os detentores do conhecimento técnico-científico (da ciência
“normal”) consideram-se os que sabem o que é bom para a terra e para os produtores rurais
e, ainda que imbuídos das melhores intenções de dar assistência aos produtores, não
costumam levar em conta os seus saberes próprios, adquiridos ao longo de décadas de
vivência, experimentação, erros e acertos,... tampouco as condições internas ou externas
(onde a ação científica participa) que conduzem à exaustão dos recursos naturais e à
degradação ambiental.

As discussões e iniciativas em torno de modificar esse velho paradigma para uma


nova atitude profissional, de respeito ao “saber e à voz local”, vêm se dando no exercício
dos diagnósticos participativos, tendo em vista que a eficiência esperada dos projetos de
florestas sociais depende basicamente de um bom conhecimento dos problemas existentes,
suas causas e circunstâncias, históricas e atuais, através de um processo interativo, entre
profissionais e “locais”, de levantamento e discussão dos problemas e possíveis soluções.
Os métodos e abordagens de diagnósticos participativos são vários e as dificuldades de se
avançar no novo paradigma ainda são grandes (Dunn, 1994 e Messerschmidt, 1995). E,
conforme destaca Young (1996), “os resultados dependerão menos do método adotado do
que da atitude do profissional e da confiança mútua entre pesquisador e pesquisado, o que
só se constrói através de uma cooperação de longo prazo, rumo a uma meta compartilhada
de manejo florestal sustentável”.
84

As mudanças de paradigmas vêm naturalmente resultando em revisão do processo


de formação profissional, onde se procura modificar os currículos acadêmicos e realizar
cursos de capacitação (o que se reflete no modo de condução dos diagnósticos
participativos). O Programa FTP da FAO (Forests, Trees and People Program), por
exemplo, tem elaborado manuais para apoio ao trabalho dos profissionais e das instituições
regionais e locais de treinamento em community forestry, tais como RECOFTC e WATCH,
bem como instituições formais de ensino universitário. Universidades de países do Norte e
do Sul vêm repensando seus currículos e desenvolvendo parcerias com outras instituições
para melhorar a formação e a atuação dos profissionais florestais.

Burch (1988), ao arbitrar uma distinção entre a silvicultura convencional e a


silvicultura social – “para melhor comparação e melhor entendimento das diferentes
estruturas e funções requeridas para as práticas de florestamento dirigidas à maximização
de lucros de poucas espécies comerciais e aquelas dirigidas ao sustento e à melhoria das
comunidades” – destaca aspectos relativos ao trabalho do profissional florestal social, que
formam um conjunto de parâmetros ‘ideais’ de atuação do profissional responsável por um
projeto de floresta social. No quadro 2.1, a seguir, o autor destaca cinco comparações
principais entre a atuação de um profissional florestal convencional e um florestal social.
Observa-se neste quadro que, enquanto o convencional conduz seu trabalho de um modo
estritamente técnico-executivo e em beneficio da maximização dos lucros da empresa, o
florestal social deve conduzir sua atuação interagindo os aspectos técnicos da produção
com os aspectos sociais e com uma atitude mais aberta com relação ao seu “saber formal”,
mantendo-se em “permanente estado de aprendizagem”.

Young (1996) vem ao encontro da concepção profissional de Burch (1988), ao


colocar que um dos principais componentes de social forestry e uma das principais razões
porque difere das abordagens mais tradicionais de manejo florestal está no processo de
aprendizagem de mão-dupla. Young destaca que, antes de tudo, o profissional florestal
deve reconhecer a importância do conhecimento local e, “a partir desse conhecimento,
ajudar as pessoas a encontrar suas próprias soluções aos problemas de manejo dos recursos,
sustentabilidade e redução da pobreza.”
85

Quadro 2.1: Comparação entre Florestais Tradicionais e Florestais Sociais


FUNÇÃO FLORESTAL CONVENCIONAL FLORESTAL SOCIAL
Manejo Maneja extensas paisagens contínuas, Maneja informação sobre a estrutura e a
maximizando a produção de biomassa função do ecossistema florestado,
para lucro econômico. Assegura que parte características das espécies, suprimento
do lucro excedente seja revertido no de sementes, custos e benefícios
processo produtivo; potenciais de várias estratégias de
intervenção;
Planejamento Desenvolve planos detalhados de como Mapeia as conexões entre capacidade
funciona o ciclo das plantações, regimes dos recursos, infraestrutura,
de corte, espécies desejáveis, cronograma oportunidades e restrições institucionais
de rotação, etc.; e tendências de mercado ou benefícios
desejados a população atendida;
Implementação Supervisiona uma grande força de Facilita as relações entre benefícios
trabalho de técnicos, madeireiros, desejáveis a indivíduos, proprietários ou
plantadores, controladores de doenças e comunidades e os meios institucionais,
insetos, controladores de incêndio, infraestruturais e ecológicos de
engenheiros de estrada e outros. Os meios realização. Os meios de controle são a
de controle são os incentivos econômicos persuasão e a demonstração;
e a autoridade burocrática;
Monitoramento Tem indicadores padronizados de qual Está em permanente estado de
melhor procedimento de corte, plantio, aprendizagem e adaptação ao inesperado
produção de lucro e quem é responsável e não-planejado. Certos valores ou
pelo sucesso ou fracasso no cumprimento técnicas tradicionais ou alguma técnica
de seus objetivos pré-determinados; descoberta acidentalmente pode ser mais
efetiva no sucesso do plantio ou da
distribuição. Como a distância entre a
prática e o praticante é curta, os ajustes
necessários não causam impacto ao
sistema inteiro.
Avaliação Examina os balanços entre custo de Examina o quanto a população atendida
produção e taxa de retorno, que está apta a aumentar os ganhos de
estratégias de investimento serão benefícios desejados sem recorrer a
necessárias para minimizar os custos e intervenções de profissionais. Outras
maximizar os lucros futuros. O número questões serão consideradas: se a
de hectares replantado e a eficiência distribuição de benefícios alcançou a
comparativa das várias estratégias de pop. alvo e que fatores afetaram o
plantio serão examinados. cumprimento ou a falha na distribuição.
Também se dará considerável atenção a
se a capacidade e a sustentabilidade do
ecossistema foi aumentada ou se os
padrões iniciais de degradação estão
impedidos ou diminuídos.
Fonte: Burch Jr (1988).
86

Apesar desses esforços, avaliações recentes ainda consideram que os contextos


participativos estão muito aquém do que se poderia chamar de “meios de empoderamento
da população rural pobre”. Em uma recente publicação do FTPP, enfocando
especificamente o tema da participação, vários autores apontam para uma “falha conceitual,
no contexto de ajuda ao desenvolvimento”, onde a “participação” tem resultado em “nós
(governo/projeto) fazemos e eles (a comunidade) participam”. Dentre esses autores, Van
Dan (2000: 13) coloca em questão a “obsessiva” atenção com metodologias participativas
que, ao final, tendem a restringir a participação a um “processo funcional requerido para o
sucesso do projeto, mais do que um direito político inato de cidadania”; ou seja, existe um
espaço criado para a participação da população alvo pelos planejadores dos projetos, que
são os que definem, centralizam e controlam os objetivos e rumos do projeto. A atitude
convencional dos profissionais florestais – “colocar as árvores primeiro” – está muitas
vezes na base desse enfoque utilitário da participação local (Shephered, 1985).

A experiência na Ásia talvez seja a mais documentada por pesquisadores e


praticantes de florestas sociais, como um “laboratório” pioneiro de iniciativas em
descentralização e participação social no manejo florestal, especialmente na Índia, desde o
programa de florestas sociais, que abrangeu extensas áreas e diversas comunidades rurais.
Hobley (1996:15) comenta que, desde os anos 1970, programas de social and community
forestry na Índia e no Nepal têm tentado transformar as relações entre uma poderosa
burocracia de Estado e a população local diretamente dependente dos recursos florestais.
As avaliações mais recentes apontam ainda grandes dificuldades nesta tentativa. Lele
(2000), em uma análise política do programa de manejo florestal integrado (Joint Forest
Management - JFM) na Índia, sucessor do criticado programa de florestas sociais, afirma
que as comunidades não estão sendo envolvidas de fato no planejamento e uso dos recursos
naturais e que, na prática, a motivação do Estado na aceitação de um manejo integrado está
na possibilidade de evitar uma crise fiscal, repassando custos para os usuários dos recursos.
Comentando sobre a limitada influência de outros atores nessa relação estado-população,
Lele (2000) sugere ainda que, a longo prazo, as ONGs e os acadêmicos fariam melhor
pressionando o braço político do Estado, que precisa ser convencido dos ganhos eleitorais
da descentralização.
87

Por outro lado, o processo de experimentação/realização em florestas sociais tem


sido dinâmico e muitas publicações denotam uma grande atenção a necessidade de
constante avaliação dos resultados e discussão de novos rumos. É o que se percebe nos
comentários de Veer et al. (1997) sobre as apresentações e discussões do Seminário
realizado na Tailândia com o objetivo de avaliar o andamento das iniciativas em florestas
sociais na Região Ásia-Pacífico. Além das falhas que precisam ser discutidas e corrigidas,
os autores destacam resultados positivos das experiências apresentadas no seminário, onde
se observa um caminhar-se de florestas sociais para florestais em direção a florestas
sociais para as comunidades, bem como de uma direção dada pelos “de fora” para as
iniciativas da comunidade, entre outras abordagens que estão focadas na busca de modos
mais participativos e descentralizados nas iniciativas em florestas sociais.

2.2.2 Terra e Recursos Naturais – Usos, Direitos e Disputas


Grande parte dos problemas apontados na literatura quanto às dificuldades e à
distância entre “teoria e prática” dos projetos em florestas sociais (e seus pressupostos de
participação) tem a ver com as questões pertinentes a disputas e conflitos sobre a posse e
os direitos de uso da terra e/ou dos recursos florestais nas áreas de atuação dos projetos.
“No coração do manejo florestal participativo reside a luta pela propriedade das terras
florestadas” (Hobley, 1996: 7).

Em muitos países, o Estado é detentor das terras florestadas, não reconhece direitos
tradicionais dos antigos habitantes das florestas e, nos projetos de florestas sociais, tende a
centralizar o poder de decisão e estabelecimento de regras dos acordos (‘contratos’) com as
comunidades para o manejo das áreas de projeto - acordos que normalmente não concedem
(ou não reconhecem) direitos claros e permanentes para os “locais” e às vezes fortalecem
mais ainda o controle governamental sobre a terra.

Onibon (2000) exemplifica os problemas de centralização do Estado e seu controle


sobre os direitos das comunidades com uma situação de projeto em Benin, África:

“Após quatro anos de exercícios participativos, o projeto chega à conclusão de que a


legitimidade do plano de manejo recai sobre o fato de se reconhecer a
responsabilidade da comunidade. Chegando a essa conclusão, o projeto então
trabalhou para o estabelecimento de uma instituição comunitária para o manejo dos
88

recursos na bacia hidrográfica, esbarrando na questão de que falta ao sistema legal


do país meios para reconhecer o status legal de tal instituição. O problema
permanece inalterado, porque qualquer iniciativa comunitária para, por exemplo,
estabelecer regras e sanções, é novamente ilegal.” (Onibon, 2000:5)

Castro (1997) relata o desenvolvimento do projeto de florestas sociais de


Bangladesh, entre 1989 e 1994, com recursos do Banco Asiático de Desenvolvimento e do
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), mostrando como as “boas
intenções dos planejadores” foram atravessadas por sua falta de atenção com o contexto
social e político, especialmente com relação à história dos conflitos sobre a posse da terra
entre os “locais” e os técnicos florestais do governo. Os participantes locais dos projetos
(muitos semi-analfabetos) assinavam um acordo pré-impresso, com cláusulas que
garantiam o controle centralizado no Estado de terras sobre as quais os habitantes possuíam
documentos antigos de processos reivindicatórios de posse que não eram reconhecidos pelo
governo.

No Sri Lanka, em uma iniciativa de reflorestamento participativo avaliada por


Carter et al. (1994), as condições de posse da terra tornaram-se fator de impedimento, dado
que os projetos eram desenvolvidos em terras públicas mediante acordos de arrendamento
que não eram devidamente cumpridos pelo governo, gerando desconfiança nas pessoas
envolvidas, que sentiam-se traídas e utilizadas apenas como mão-de-obra gratuita.

Em países da África, Ásia e América Latina, inclusive o Brasil, é comum o fato de


que o direito à posse da terra só recebe reconhecimento oficial quando a floresta é
derrubada e a terra cultivada ou preparada para o pastoreio por alguns anos (Shepherd,
1985; Diegues, 1992; Rocheleau e Ross, 1995 e Watson et al., 1998). Essa condição não só
estimula os desmatamentos com o objetivo de garantir a posse da terra, como denuncia a
falta de reconhecimento e respeito pelos habitantes nativos das florestas e,
conseqüentemente, por suas formas de manejo comunal do ambiente. Em paralelo, a
criação de áreas protegidas por lei (Reservas, Parques Nacionais e outras UCs) e de normas
legais de proteção florestal aumentou a restrição de uso da terra para os já marginalizados
camponeses e indígenas e, em muitos casos, facilitou atitudes de violência, suborno e
corrupção por parte de funcionários dos governos responsáveis pela fiscalização, contra a
89

população rural desprestigiada (pobres, sem-terras, pequenos produtores, etc.) e a favor de


pessoas ou grupos poderosos.

Os conflitos sobre acesso a terras florestadas se acentuaram de modo geral nos


países tropicais “em desenvolvimento” desde que as pressões da expansão dos mercados
sobre os recursos naturais começaram a aumentar e a intensificar a erosão das relações
internas de distribuição, uso e manejo dos ambientes florestais nas sociedades rurais (mais
precisamente dos povos da floresta). Essas relações eram (e ainda são em muitas regiões)
pautadas pelos regimes de manejo da propriedade comum. Segundo Richards (1997), as
regras de manejo comunal envolvem um misto de livre acesso e acesso restrito (privado, de
certo modo) dos grupos locais de usuários. Para este autor, os CPMRs (common property
management regimes) podem ser distinguidos em dois grupos: os CPMRs indígenas
estabelecidos a mais tempo e os CPMRs criados mais recentemente, como no caso dos
seringueiros da Amazônia. Richards considera que, por confundir CPMRs com o livre
acesso aos recursos, a teoria de Hardin tem contribuído para as políticas de privatização dos
recursos (para indivíduos) e/ou para o controle estatal dos recursos de propriedade comum.

Conhecida como “tragédia dos comuns”, a teoria de Hardin (1968) diz que recursos
utilizados em comum estão condenados à sobre-exploração, na medida em que, com livre
acesso aos recursos em uma área de uso comum, cada usuário tenderá a aumentar
indefinidamente sua produção levando à ruína de todos. O exemplo de Hardin era o de um
pasto onde cada pastor iria sempre aumentar seu rebanho. Para Shiva e Bandyopadhyay
(1991), a inevitabilidade da ruína provém de duas suposições: a) Cada pastor trabalha em
seu próprio interesse, sem considerar-se como parte da comunidade e sem avaliar os custos
sociais de sua atitude; b) A produção é predominantemente para troca no mercado e,
portanto, não limitada pela manutenção do recurso. No entanto, conforme os autores, essas
pressuposições não valem para todas as situações sócio-históricas: “É importante
reconhecer que a consideração dos benefícios sem a consideração dos custos não tem sido
sempre a força propulsora das sociedades humanas. Em vastos setores das sociedades rurais
dos países do Terceiro Mundo, o princípio da cooperação, visando a manter recursos
naturais, ainda predomina, mais do que a competição para explorá-los.”
90

Alguns autores apontam que o não reconhecimento dos direitos tradicionalmente


adquiridos sobre a terra e os recursos naturais dos povos indígenas e/ou não-indígenas,
estabelecidos a mais ou menos tempo em um dado local, é intencional e parte de uma
estratégia de favorecimento às elites locais e aos interesses da exploração comercial em
grande escala, como no caso da Indonésia, analisado por Peluso (1995) e Thompson
(1999): segundo Peluso, o Estado reconhece direitos de uso de determinadas espécies, mas
não de territórios inteiros e utiliza esse ‘expediente’ para conceder direitos de exploração a
corporações e não à população local (esses direitos incluem as concessões à exploração
madeireira e a conversão de florestas em monocultivos de árvores). Thompson cita que, em
1989, o Ministro de Gerenciamento Florestal declarou abertamente que, “na Indonésia, as
florestas pertencem ao Estado e não ao povo... eles não têm direito à compensação”.

Certamente que esse contexto de privatização da terra e dos recursos, de política e


legislação centralizadora dos Estados e seu fraco reconhecimento dos direitos reivindicados
pelos povos da floresta e população rural pobre ocorre em geral na Ásia, na África e na
América Latina, onde o cenário de má distribuição da terra (com grande concentração de
latifúndios e grande número de trabalhadores rurais sem-terra ou restritos a terras
marginais) é bem conhecido em todo o mundo. O problema com os projetos de florestas
sociais, citado na literatura, refere-se aos erros de avaliação da realidade local e de
condução dos projetos frente a essas questões, principalmente pelo fato de que a condução
dos projetos é muitas vezes controlada pelos funcionários dos departamentos florestais dos
Estados centralizadores.

Sob condições de incerteza quanto à posse e aos direitos de uso da terra e dos
recursos, a desejada participação local nos projetos tende a ficar extremamente fragilizada,
especialmente tendo em vista o longo tempo de maturação das árvores e, portanto, do
aproveitamento, doméstico ou comercial, de seus produtos. “A posse das árvores sem a
posse da terra se torna gradualmente uma impossibilidade” (Shepherd, 1985).

2.2.3 Estratificação Social – Gênero

Existem vários aspectos relativos à distribuição de poder, prestígio, recursos e


responsabilidades dentro e entre grupos sociais, que podem tomar especial importância no
91

contexto de elaboração e implantação dos projetos em florestas sociais. Na bibliografia


consultada, no entanto, o aspecto mais destacado e discutido é o que diz respeito à situação
das mulheres, em especial à divisão do trabalho e ao poder de decisão dentro da
comunidade.

Avaliações e estudos de caso em geral relatam que as mulheres trabalham pesado


por muitas horas do dia nas tarefas de sobrevivência da família, ocupando-se acima de tudo
com o crescimento, a colheita e a transformação dos alimento e com o suprimento de lenha
e água, mas não têm o mesmo poder de decisão que os homens, mesmo quando são
“chefes-de-família”- o que acontece em pelo menos 1/3 das casas (Shephered, 1985):

As mulheres estão duplamente em desvantagem. Primeiro, elas são quase sempre


relativamente pobres. Elas têm todas as desvantagens que os homens pobres
vivenciam – frágeis diretos sobre a terra, uma fraca voz política e pouco acesso a
benefícios como ajuda extensionista e créditos. Como colocou uma mulher do
Quênia, elas podem ser não mais do que “inquilinas nas terras dos seus maridos”.
Além disso, a esfera econômica das mulheres é distinta da dos homens. Em teoria, as
esferas são complementares – agricultura para mulheres e criação de animais para os
homens, coleta para mulheres e caça para os homens, economia de subsistência para
as mulheres e economia de mercado para os homens. Mas, na prática, existe uma
tensão entre essas economias sobrepostas mas não congruentes, para a esfera
masculina sempre gerar mais riqueza, mais prestígio e mais lazer. (Shephered, 1985:
10).

O que acontece muitas vezes é que os planejadores e condutores de projetos de


florestas sociais subestimam ou avaliam mal o papel da mulher no grupo, suas atividades
produtivas e sua capacidade de trabalho, de compreensão e decisão. E não é raro que as
características dos projetos favoreçam o poder masculino já dominante, principalmente se
os “de fora” trazem valores igualmente ‘masculinos’ em seus comportamentos.

Passados 13 anos da primeira iniciativa governamental de realizar um programa de


florestas sociais no Sri Lanka – iniciado em 1982, como Projeto de Manejo Florestal
Comunitário, financiado pelo Banco Asiático de Desenvolvimento – a avaliação era de que
a participação local tinha sido fraca e que “o complexo de superioridade” dos profissionais
florestais era evidente na sua tentativa de atender necessidades de lenha sem consultar as
mulheres, que eram as responsáveis pelo suprimento de energia da comunidade. Os
florestais decidiram o que, como e onde plantar, à revelia do conhecimento acumulado
92

pelas mulheres sobre o uso e o manejo das árvores; além disso, seus interlocutores com a
comunidade eram os homens (Wickramasinghe, 1999).

Um processo semelhante é relatado por Rocheleau e Ross (1995). Os


empreendedores do projeto escolheram plantar uma determinada espécie (a australiana
Acácia mangium) para a produção de madeira, sem considerar o conhecimento e as
habilidades das mulheres e ainda fortalecendo a posição de domínio masculino na
comunidade:

Um tipo de conflito é exemplificado pelas mulheres cujas ambições de plantar


madeira são impedidas pela falta de acesso ou controle sobre a terra e pela falta de
interesse ou oposição ativa de seus maridos. Nos encontros de grupo, muitas
mulheres manifestaram seu interesse em plantar Acacia e outras árvores madeireiras,
mas que não poderiam por falta de direitos claros sobre a posse até mesmo do
quintal, e menos ainda de outras áreas do terreno aptas para plantação de madeira.
Ao contrário, muitos maridos plantam Acácias, freqüentemente sem consultar as
mulheres, em suas áreas de jardins ou de cultivo da família. Essas mulheres
expressaram ceticismo a respeito da produção de madeira: “Nós já vimos isso antes...
amendoim, tabaco, agora essa Acácia, todas tomam nossas áreas de cultivo e
reduzem o alimento.” Elas dariam preferência, e não se oporiam, a árvores mais
aptas ao cultivo integrado.
Alguns dados indicam que 2/3 das mulheres plantam árvores desde a infância e
muitas delas manejam a produção e a venda dos produtos. No entanto, as mulheres
têm mais experiência com frutíferas ou espécies como café, cacau e outras para a
proteção e a fertilidade dos solos. Embora o cultivo de frutas e outras perenes exija
mais cuidados, existe um senso comum compartilhado entre o “staff” do projeto e os
participantes masculinos de que as árvores madeireiras requerem habilidades,
sentidos e força de homem. Construções ideológicas de conhecimento e autoridade
de gênero têm influenciado a distribuição dos benefícios da produção madeireira.
(Rocheleau e Ross, 1995: 414-15).

Just e Murray (1996) citam os relatos de disputas por terras e árvores em uma região
de Uganda, onde o reconhecimento oficial da posse da terra é muitas vezes relacionado à
presença de árvores, e quanto mais velha for a árvore maior a chance do plantador ter
assegurado o direito legal sobre a terra13. Por essa razão, mudas plantadas por mulheres
participantes de um projeto agroflorestal foram arrancadas pelos homens. Os autores citam
que essa e outras atitudes dos homens são entendidas pelas mulheres como ciúmes e que os

13
Essa condição difere da maioria dos países do Terceiro Mundo, onde, ao contrário, é a retirada das árvores
e a realização de “benfeitorias” (construções, pastagens ou lavouras) o que garante o direito de posse da terra.
93

homens não suportam ver as mulheres, mesmo suas esposas, obterem sucesso e ganharem
mais do que eles.

Na Índia, entre as dificuldades apontadas no desenvolvimento do programa de


Manejo Florestal Integrado (JFM - Joint Forest Management), a desigualdade entre gêneros
é considerada uma questão em destaque, como uma das questões relativas ao contexto não
necessariamente democrático e igualitário dos manejos florestais “comunitários”:

A despeito das mulheres serem as principais coletoras e usuárias dos produtos


florestais na Índia, as instruções do JFM especificam poucos mecanismos
institucionais para garantir a participação ativa das mulheres na determinação das
prioridades de manejo florestal ou da igualdade dos direitos na partilha dos
benefícios. (Sarin, 1997: 20)

Ao mesmo tempo que acirram as disputas e os conflitos existentes entre homens e


mulheres, os projetos de florestas sociais também podem criar espaços que facilitem o
movimento de transformação para uma condição de maior reconhecimento dos direitos e
capacidades femininas. Segundo Watson et al. (1996), existe hoje uma crescente
consciência da interdependência entre as mulheres e as florestas; “as mulheres são as
primeiras usuárias dos produtos não-comerciais das árvores e florestas, estando assim na
posição de entender a importância da saúde do seu ambiente e de implementar métodos de
conservação”.

Nesse sentido, as mulheres começam a encontrar espaços de expressão para suas


reivindicações e queixas contra as condições de desigualdade, discriminação e violência
sofridas em seus lares e suas localidades, através de organizações de base e de grupos
internacionais que vêm sendo criados no contexto das iniciativas em florestas sociais, tais
como a WATCH (Women Acting Together for Change), criada no âmbito do FTTP-FAO.

No contexto das questões de produção e consumo de energia, foi criada uma


organização não-governamental especificamente voltada para as mulheres. Em 1995, a
partir da Conferência Mundial sobre Mulheres, um grupo informal deu início à Rede
Internacional sobre Mulheres e Energia Sustentável, intitulada ENERGIA, que hoje conta
com um total de 800 participantes de várias regiões do mundo. A organização tem por
94

objetivo o fortalecimento do papel da mulher no desenvolvimento de fontes sustentáveis de


energia, através da troca de informação, treinamento, pesquisa, defesa jurídica e ação.

2.2.4 Produção de Árvores – Métodos, Normas, Subsistência e Mercado

Em suas primeiras iniciativas, os projetos de florestas sociais tinham como meta


principal o atendimento às necessidades básicas da população rural quanto aos produtos das
florestas, principalmente quanto ao suprimento doméstico de energia (lenha). Em ‘tese’, o
objetivo era a produção de árvores para necessidades de subsistência (consumo próprio).
No entanto, as relações de mercado já estavam no dia-a-dia das populações “alvo” dos
projetos e a ‘desvirtuação’ da meta inicial, de fomento à autonomia local no suprimento
doméstico de produtos florestais, para a produção de meios de geração de renda, foi uma
conseqüência “natural”.

Esse embate entre consumo doméstico e produção comercial envolve a definição


das espécies a plantar e dos sistemas de manejo dos plantios, que, por sua vez, têm relação
direta com um certo confronto entre as tendências da formação técnica dos profissionais
florestais e o conhecimento tradicional ou “empírico”, as preferências e escolhas dos
usuários locais, tudo isso em um campo de forças onde interesses de mercado local,
regional e internacional lutam por espaço e apoio político e social.

O enfoque técnico convencional da formação acadêmica dos profissionais florestais


concentra-se em dois campos de atuação, que são: a monocultura em larga escala de
espécies arbóreas para o consumo industrial de madeira, especialmente para as indústrias de
celulose/papel e siderurgia; e a proteção de florestas nativas, com tudo que envolve isso no
campo da pesquisa e da administração (ecologia, biodiversidade, parques e reservas, flora e
fauna, etc.). Aparentemente dicotômicos, esses campos de atuação podem ter em comum a
exclusão social, quando grandes empresas de silvicultura “unidirecional” ocupam áreas de
produção de alimentos e até de florestas nativas e quando as políticas e normas de proteção
florestal não consideram os humanos que tradicionalmente habitam e manejam as
florestas14.

14
Esta questão é amplamente discutida no capítulo 3.
95

Nos últimos anos, esse enfoque convencional da ciência florestal tem sido criticado
e revisto, especialmente através das iniciativas em florestas sociais. No entanto, ainda
predomina nos técnicos florestais a tendência ao cultivo de espécies que atendem ao
mercado do “grande capital”, mesmo quando seus objetivos estão direcionados para as
necessidades básicas da população local. No caso do programa de florestas sociais da Índia,
a opção pelo plantio de eucaliptos, visando “em tese” produzir uma espécie arbórea de
rápido crescimento para o consumo doméstico de lenha, recebeu duras críticas. Shiva e
Bandyopadhyay (1991) consideraram o programa um “mero mecanismo de expansão da
silvicultura unidimensional sobre terras agrícolas de produção de alimentos”. Esses autores
apontam que a organização do programa, ao invés de produzir e fornecer mudas de espécies
nativas que as comunidades tradicionalmente sabiam manejar e aproveitar, deram
prioridade ao eucalipto, favorecendo com isso a demanda de mercado mais do que das
necessidades básicas das comunidades. Segundo Saxena (1990), os plantios de eucaliptos
no programa de florestas sociais da Índia não atenderam às necessidades básicas das
comunidades e também não geraram renda para os produtores, devido à saturação do
mercado e conseqüente queda de preços, além de problemas com atravessadores e com a
legislação do país.

Tornou-se cada vez mais evidente o erro em dar ênfase à produção de eucaliptos (ou
melhor, à monocultura), o que aconteceu não somente na Índia, mas também em outros
programas de florestas sociais em países da Ásia e da África. No Brasil, embora não tenha
se configurado como um programa de florestas sociais, houve igualmente uma política no
setor florestal que visava o plantio de pequenos lotes de eucaliptos em terras de pequenos e
médios proprietários rurais (Queiroz, 1995), com características semelhantes ao que
ocorreu na Índia e outros países quanto à ênfase na monocultura e mais a favor de um
mercado específico do que da satisfação das necessidades locais. Essa política florestal deu
ênfase ao fomento florestal para que pequenos e médios proprietários se transformassem em
“fazendeiros florestais”, na verdade “plantadores de eucalipto” - mais ou menos como fez o
programa governamental da Índia. Ainda hoje, a extensão florestal no Brasil segue, em
geral, essa mesma política. Mesmo que uma parte (menor) da produção possa ser utilizada
pelo produtor em suas necessidades domésticas (lenha, moirões, etc.), o problema maior
está na dependência fixada em um tipo de mercado (e, muitas vezes, em um único
96

comprador), que determina as “regras do jogo”, mudando o enfoque quanto ao “público


alvo” a ser atendido em suas necessidades – que deixa de ser a população rural pobre para
ser a grande indústria de celulose ou metalúrgica, etc. – o que contradiz os conceitos e
propósitos das iniciativas em florestas sociais.

As críticas à monocultura adotada nos programas de florestas sociais apontam para


a desvantagem dessa opção em relação às vantagens de um policultivo, mais adequado ao
atendimento das “poli-necessidades” das comunidades e das variações de mercado:

Cultivos de árvores como eucalyptus, que produz somente um produto, como poste
ou polpa, podem ser problemáticos por serem potencialmente vulneráveis às
flutuações de mercado e portanto flutuações de renda. (...) Árvores com múltiplos
usos e sistemas multi-espécies estão mais aptos a contribuir para uma economia
doméstica mista de mercado/subsistência. (Arnold, 1992: p.15)

Shiva e Bandyopadhyay (1991) comparam a produção de biomassa e a variedade de


produtos que podem ser aproveitados de espécies nativas e de eucalipto. Os autores
destacam que sementes e frutos são também importantes produtos da biomassa das árvores
e que nunca são avaliados por florestais, que buscam apenas troncos e madeira:

Árvores frutíferas tais como a jaca, o jaman, a manga, o tamarindo, etc., têm sido
componentes importantes das formas nativas de manejo florestal, tal como praticadas
através dos séculos, na Índia. Depois de um breve período de gestação, as frutíferas
fornecem safras anuais de biomassa comestível, em bases sustentáveis e renováveis.
Os tamarindeiros dão frutos por mais de dois séculos. Outras árvores, tais como
neem, pongamia e sal, fornecem colheitas anuais de sementes que produzem
valiosos óleos não comestíveis. Esses diversos rendimentos de biomassa fornecem
fonte importante de sobrevivência para milhões de pessoas, tribais ou rurais. O coco,
por exemplo, além de fornecer fruto e óleo, fornece folhas para cobrir cabanas e
sustenta a grande indústria de tamil (fibra de coco) no país. (Shiva e
Bandyopadhyay, 1991: 57-8).

Em projetos de florestas sociais, a escolha das espécies, locais e métodos de manejo


dos cultivos, bem como do uso final dos produtos (se doméstico e/ou comercial), depende,
antes de tudo, do interesse dos moradores, da população ou comunidade “alvo” dos
projetos. De acordo com Peluso et al. (1994) essas definições surgem, para os florestais e
promotores dos projetos em geral, a partir do conhecimento das formas de uso e manejo da
97

população local, entre outros fatores que devem ser investigados em um processo de
diagnóstico participativo.

Hyde e Köhlin (2000) acreditam que o interesse pelo plantio de árvores e, portanto,
a probabilidade de sucesso em projetos de florestas sociais, depende da importância que os
produtos florestais tenham na vida das famílias ou comunidades, como parte da renda, do
orçamento ou do trabalho e consumo doméstico. Esses autores entendem que informações
sobre mercado devem ser sempre consideradas em projetos de florestas sociais, mesmo nos
casos de subsistência familiar ou comunitária, tendo em vista que decisões sobre consumo e
produção de bens têm a ver com oportunidades de substituição da força de trabalho e/ou de
produtos da floresta no mercado, em função das condições de escassez e variação de preços
dos produtos.

A desatenção com a importância dos produtos para a economia dos “locais” pode
contribuir para a inviabilidade do projeto e todo o investimento alocado poderá se perder de
seu objetivo. Não é raro, inclusive, que recursos financeiros de instituições doadoras para
projetos de florestas sociais sejam perdidos ou alocados em outras atividades, por falta de
um bom planejamento sócio-econômico e verdadeiramente participativo. Smith (1994), ao
analisar os resultados de um projeto na Bolívia, observa que os “incentivos” econômicos
acabam sendo uma forma de “suborno” para que as comunidades “participem” do plantio
de árvores e que, após a retirada dos recursos externos, a tendência é de abandono do
projeto, porque as pessoas só estavam mesmo interessadas na infraestrutura que veio como
“suborno” – estradas, postos de saúde, escolas, etc. Para Sonko e Camara (1999), a
participação não pode evoluir se os incentivos são dados para “comprar a boa vontade e a
motivação das pessoas”. Esses autores destacam que a experiência no Gâmbia tem
demonstrado que o uso desajeitado de incentivos causa mais problemas do que os resolve,
no mínimo por induzir paternalismo, criar conflitos e desvalorizar os objetivos de manejo
dos recursos.

Outro aspecto importante, sempre destacado na literatura, que pode determinar uma
“falta de entusiasmo” pelo plantio de árvores, refere-se à questão da conduta política e legal
do Estado quanto aos direitos sobre o corte e o uso dos produtos florestais, tal como os
direitos de posse da terra, já discutidos. Shepherd (1985: 15) cita que “em países onde,
98

legalmente, todas as árvores pertencem ao estado e não podem ser cortadas sem sua
permissão, os moradores racionalmente recusar-se-ão a plantar árvores até que a lei seja
revogada.” É o caso da Índia, conforme descreveu Saxena:

Na maioria dos estados as pessoas só podem cortar árvores após um laborioso


processo para conseguir uma permissão de um oficial local designado. Existem três
conjuntos de leis solapando a autoridade dos produtores: eles não podem cortar
árvores sem permissão, a permissão é requerida para o transporte e algumas árvores
só podem ser vendidas para o Departamento Florestal (Saxena, 1990: 27).

Na prática, essas restrições, muitas vezes fruto de uma política conservacionista


obtusa e de oportunismos clientelistas, resultam em desinteresse pelo plantio de árvores e
estímulo à corrupção, como no caso analisado por Rocheleau e Ross (1995), na República
Dominicana, onde a proibição do corte de árvores e a ação violenta e corrupta dos agentes
oficiais foi sentida pelos “de fora” empenhados em promover um projeto de floresta social,
através do desinteresse da população local pelo plantio de árvores.

No Brasil verifica-se uma situação semelhante, onde a formulação e a aplicação das


leis de proteção ao verde complicam a retirada de produtos de manejo florestal sustentado,
não reconhecem formas tradicionais de uso e manejo das terras florestadas e são comuns o
clientelismo e a corrupção na fiscalização ambiental, causando muitas vezes grandes danos
e perdas irreparáveis aos mais pobres e desfavorecidos. Nas regiões de domínio da Mata
Atlântica esses problemas se acentuaram após a promulgação do Decreto 750/93, que
protege áreas de regeneração inclusive (as chamadas capoeiras), áreas que muitas vezes são
de pousio no sistema de corte-e-queima para cultivo, amplamente utilizado por pequenos
agricultores.

Em um estudo de caso15 realizado na região de Nova Friburgo, Estado do Rio de


Janeiro, observou-se o forte impacto social da fiscalização ambiental baseada no Decreto
750, onde a repressão ao corte das áreas em pousio, pela proibição de corte de áreas “em
estágio médio de regeneração” prevista no Decreto, tem sido brutal sobre os pequenos
agricultores do distrito de Lumiar, região de importantes remanescentes de Mata Atlântica e

15
Estudo de caso realizado como prática da disciplina Tópicos Especiais em Sistema Agroalimentar e
Desenvolvimento Sustentável, no 2º semestre de 1999, no CPDA/UFRJ, prof. resp. Peter May.
99

de forte interesse ecoturístico. Em seus angustiados depoimentos, os agricultores declaram


estar sendo tratados como criminosos e marginais pela polícia florestal. Muitos foram
multados, outros subornados e outros agredidos violentamente. Com medo da repressão, o
resultado esperado com o Decreto de “proteção ambiental” tem se invertido, na medida em
que os agricultores tendem a limpar a área antes do tempo ideal de pousio.

Os problemas relativos à legislação ambiental começaram a ser sentidos nos últimos


anos pelos empreendedores dos projetos agroflorestais em regiões de Mata Atlântica. Em
1996 foi realizado um Seminário exclusivamente sobre esse tema (REBRAF et al., 1996),
onde participaram representantes de ONGs envolvidas em tais projetos e representantes de
órgãos públicos responsáveis pelo planejamento e pela fiscalização ambiental, chegando-se
a um consenso de que tanto o Código Florestal Brasileiro como o Decreto 750 continham
falhas graves que atingiam diretamente as possibilidades de desenvolvimento das propostas
agroflorestais. As conclusões do seminário foram encaminhadas para as instâncias de
decisão do poder público, na expectativa de que as mesmas sejam apreciadas nos processos
de revisão e de regulamentação das leis, que seguem seu lento curso.

Recentemente instituído, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC


(Lei Nº 9.985, 18/07/2000) apresenta avanços significativos na legislação conservacionista
do país, criando mecanismos de participação da sociedade civil na gestão das UCs e
criando e incorporando novas categorias de áreas protegidas que incluem as populações
tradicionais e seus modos de uso e manejo dos recursos, como no caso das Reservas
Extrativistas (RESEX), resultado das lutas dos seringueiros da Amazônia por
reconhecimento e legitimidade de seu modo de vida e atividade econômica, que implica na
manutenção da floresta “em pé”.

Com a criação de novas RESEX, além do látex, outros produtos de extração vegetal
estão sendo alvo de interesse e de organização dos povos das florestas na Amazônia, para o
desenvolvimento de formas de aproveitamento econômico sustentável, inclusive a extração
de madeira. No entanto, estejam ou não em áreas protegidas (nas categorias de Uso
Sustentável, definidas no SNUC), a relação com o mercado é uma questão crucial para os
projetos de florestas sociais e ainda são muito incipientes os conhecimentos técnicos e as
discussões e formulações de normas e mecanismos que garantam de fato a sustentabilidade
100

da atividade econômica. Em geral, as forças de mercado, especialmente nos países “do


Sul”, são imediatistas e pressionam na direção de uma exploração predatória dos recursos
da floresta. O que se tem verificado é que a produção resultante do trabalho das pequenas
comunidades, baseado em manejo sustentado, não atinge quantidade e regularidade
suficientes para se tornar “atrativa” a potenciais mercados.

2.2.5 Sustentabilidade do Manejo Florestal

Tal como ocorre com participação, há várias noções do que seja sustentabilidade e,
geralmente, essas noções variam extremamente quanto aos enfoques e aos contextos
políticos, sociais, econômicos, ambientais, etc. A partir do Relatório Brundtland16, que
definiu desenvolvimento sustentável como “aquele que atende às necessidades do presente
sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias
necessidades, (...) sobretudo as necessidades essenciais dos pobres do mundo, que devem
receber a máxima prioridade”, um amplo debate sobre o tema tem se desenvolvido em
todo mundo, no sentido de aprimorar essa definição, especificando melhor seus termos.

No campo das pesquisas e experimentações em manejo florestal, observa-se um


crescente aumento de publicações abordando esse tema nos últimos anos, juntamente com a
mobilização internacional no sentido de definir critérios e indicadores de sustentabilidade
nas atividades de manejo florestal. Desde a Conferência Mundial Sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento (a Rio-92), mais de uma centena de países em várias regiões do mundo
tem participado do processo de elaboração de critérios e indicadores (Prabhu et al., 1998).

Os esforços para definir critérios e indicadores (C&I) para o manejo florestal vêm se
traduzindo em um crescente número de instituições e empresas certificadoras de produtos
florestais, credenciadas pelo Forest Stewardship Council (FSC), organização internacional
formada para o monitoramento da certificação de produtos florestais. De acordo com o
FSC, a certificação deve estar baseada em um conjunto de C&I que conferem se o manejo
florestal é ambientalmente apropriado, socialmente benéfico e economicamente viável. A

16
documento intitulado Nosso Futuro Comum, elaborado em 1987 pela Comissão Mundial sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento, criada pela ONU e presidida por Gro Harlem Brundtland, ex-ministra de Meio
Ambiente da Noruega e, na época, líder do Partido Trabalhista Norueguês.
101

certificação, espera-se, deve garantir aos consumidores e à opinião pública em geral que os
produtos certificados, e logicamente os produtores em questão, têm a necessária
legitimidade ecológica para estar no mercado (e, inclusive, o selo de certificação justifica o
preço mais elevado que normalmente esses produtos atingem, tendo em vista a mão-de-
obra, os cuidados, o tempo, etc. necessários para atingir os três aspectos da certificação). A
maior parte das instituições certificadoras têm como alvo as empresas que exploram
madeira de florestas naturais em escala comercial.

No Brasil, a única instituição responsável pela certificação florestal é o Instituto de


Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (IMAFLORA), através do seu Programa de
Certificação Socioambiental Florestal (PCF), que visa a: “avaliar, monitorar e certificar
operações florestais que promovem um manejo florestal socialmente justo e
ambientalmente adequado de suas propriedades, seguindo os princípios e critérios do
Conselho Mundial de Florestas (Forest Stewardship Council - FSC) e com a orientação e
metodologia da Rede SmartWood de Certificação (Programa Credenciado pelo FSC). O
Programa atinge florestas plantadas e naturais em grande e pequenas propriedades, com
produtos madeireiros e não madeireiros (ex. bromélias, castanha do pará e borracha)”. Na
home page do IMAFLORA (www.imaflora.org), de onde foram obtidas essas informações,
encontram-se os critérios adotados para a certificação e a lista das empresas que já foram
certificadas pela instituição no Brasil.

O Centro Internacional para Pesquisa Florestal (CIFOR - Center for International


Forestry Research), que está concluindo uma série de manuais de critérios e indicadores,
vem testando seus métodos em várias regiões do mundo - a Amazônia Brasileira foi a mais
recente e o documento com os resultados obtidos ainda está por ser concluído (informações
colhidas em www.cifor.cgiar.org). Mais do que critérios e indicadores, o CIFOR definiu
também princípios que sustentam os critérios e verificadores dos indicadores, formando
quatro níveis hierárquicos em um eixo vertical para quatro áreas principais de interesse,
distribuídas no eixo horizontal da tabela de C&I, que são as áreas de política, ecologia,
social e produção de bens e serviços (CIFOR, 1999).

Os manuais do CIFOR começam a despertar interesse de instituições que trabalham


com florestas sociais, como o RECOFTC (1999) e é provável que aumente o número de
102

pesquisas e experimentações nesse campo. O CIFOR considera que seu “modelo genérico”
de C&I é apenas uma “plataforma de partida” para que os interessados possam formular
conjuntos de C&I para as especificidades locais. A instituição desenvolve um programa (o
software CIMAT) para que os usuários do modelo genérico possam fazer adaptações às
condições locais.

Prabhu et al. (1999), coordenadores dos estudos de C&I do CIFOR, avaliaram que
os critérios ecológicos estavam sendo mais fáceis de aplicar do que os critérios sociais, na
medida em que estes últimos requerem um profundo entendimento da área, além dos
limites imediatos da unidade de manejo florestal. Segundo Poschen (2000), a formulação de
critérios e indicadores de sustentabilidade florestal, desde seu início, tem sofrido de uma
tendência para as questões ambientais e os interesses econômicos; os aspectos sociais têm
sido cobertos de modo variado e freqüentemente insatisfatório. Prabhu et al. (1999)
acrescentam que, além das questões sociais, há necessidade de trabalhar melhor as questões
relativas à biodiversidade, ao desenvolvimento de C&I para as plantações e aos meios de
unir informações do nível local ao nacional.

Observa-se que, apesar das incertezas existentes quanto ao que seja


‘desenvolvimento sustentável’ e do processo ainda em construção dos métodos de
avaliação da sustentabilidade do manejo florestal (através dos C&Is), muitas empresas já
receberam seus certificados pelo mundo afora e tantas outras estão em processo de
certificação. No Brasil, até jan/2001, havia 45 empresas que utilizam produtos florestais
certificadas pelo Imaflora/Smartwood (ver www.imaflora.org.br).

No contexto das iniciativas em florestas sociais, segundo Carter (1996: 7), na


melhor hipótese, para que as operações florestais sejam participativas e sustentáveis é
necessário que:

• A população local esteja comprometida a manter os recursos florestais, tenha um papel


ativo nas decisões de manejo florestal e tenha (ou esteja desenvolvendo) os
instrumentos necessários para isso;
• Os direitos de uso da floresta estejam assegurados e idealmente (mas não sempre)
conferidos aos “locais” por eles mesmos;
• A colheita dos produtos florestais seja em níveis que não prejudiquem o potencial dos
recursos e possam ser mantidos indefinidamente;
103

• Os aspectos econômicos da produção sejam cuidadosamente avaliados e pareçam


viáveis em um futuro previsível, com uma distribuição justa dos benefícios obtidos para
a população local.
• Estruturas institucionais apoiem a abordagem participativa no manejo florestal. Isso é
necessário tanto ao nível local (p. ex. comitês de manejo florestal que representem
apropriadamente a população local) como ao nível nacional (membros dos
departamentos florestais comprometidos, políticas e legislação governamental
apropriadas, etc.).”

Carter (1996) destaca que, na maioria das situações, um ou mais desses critérios
será encontrado apenas parcialmente. No entanto, todos deveriam ser considerados e
direcionados, tanto quanto possível, em um plano de manejo florestal detalhado. Tal plano,
que, obviamente, deverá ser elaborado juntamente com a população “alvo” (através de
métodos de diagnóstico participativo), deverá conter uma descrição detalhada da floresta
existente, os objetivos do manejo e os meios para atingi-los. Com relação à produção para o
mercado, a autora adverte quanto à importância da certificação florestal, o que “em
princípio, aumenta os lucros para o produtor e provê incentivos para continuar a produção
sustentável”.

Segundo Irvine (2000), até outubro de 2000, um total de 30 (trinta)


empreendimentos em florestas sociais estavam certificados por quatro das seis
certificadoras credenciadas pelo FSC. Esses empreendimentos representavam 17% do
número total de certificações obtidas pelo setor florestal e apenas 2% da área total
abrangida; mais de 80% da área florestal certificada até 2000 (aproximadamente 18 milhões
de hectares) estavam sob controle de empreendimentos industriais de larga-escala. Irvine
destaca que os produtores em larga-escala estão mais aptos a fornecer as quantidades e
qualidades exigidas pelo “emergente mercado verde”. Esses produtores estão também mais
aptos a arcar com os custos do processo de certificação, que exigem investimentos
significativos para se adequar aos critérios ambientais e sociais exigidos pelos
certificadores.

Os empreendedores em florestas sociais estão lutando pela certificação através de


parcerias e apoios externos de ONGs e, em alguns casos, empresas ajudam a pagar pela
certificação para garantir o suprimento de matéria prima (como o carvão, p. ex.). No
104

entanto, Irvine (2000) avalia que ONGs e empresas que apoiam comunidades no manejo
florestal fracassaram nesse apoio, ao assumir que acessar os mercados internacionais era a
solução, quando talvez fosse mais eficiente restringir a comercialização a mercados locais e
regionais e atingir níveis mais ou menos constantes de produção em um tempo mais
adequado aos ritmos da comunidade. Como a certificação florestal foi iniciada, nos anos
1990, com o propósito principal de forçar um controle maior sobre o comércio
internacional de madeira, a inserção de iniciativas de manejo florestal comunitário nesse
processo de certificação está em contradição com a concepção de que florestas sociais
devem priorizar o consumo próprio e se restringir a mercados locais (ver item 2.1).

A ênfase em acessar mercados internacionais, valorizando o aproveitamento da


madeira em detrimento dos produtos não-madeireiros das florestas (de mais difícil
aceitação no mercado) coloca as comunidades sob a pressão da concorrência desleal com as
indústrias madeireiras de grande porte, a exploração e o comércio ilegal de madeira. Sem
que haja um controle efetivo sobre o mercado ilegal e predatório de madeira, dificilmente
os produtos do manejo florestal comunitário terão espaço no mercado.

Por outro lado, Kruedener (2000) argumenta que a certificação contribui para o
reconhecimento e a notoriedade das comunidades que manejam florestas, citando por
exemplo o caso dos “ejidos”, em Quintana Roo (México), para os quais a atenção
internacional tem ajudado a estremecer o criticismo de ambientalistas urbanos sobre os
impactos ecológicos do manejo florestal comunitário, bem como ajuda no reconhecimento
legal dos direitos tradicionais de ocupação e uso das terras florestadas, como no caso de
uma comunidade indígena na Bolívia.

Tendo em vista que as questões envolvidas nos projetos de florestas sociais, que
determinariam a sustentabilidade dos mesmo de acordo com os critérios básicos apontados
por Carter (1996), ainda se encontram em processo de discussão, com muitas questões
envolvendo participação e descentralização, direitos de uso e manejo da terra e dos
recursos, condições técnicas e econômicas de plantio, manejo e comercialização dos
produtos, entre outras, muitos aspectos deverão ser ainda investigados, esclarecidos e
discutidos para que possa chegar a algum consenso a respeito de sustentabilidade nas
iniciativas em florestas sociais.
105

De acordo com a maior parte da literatura estudada e com as avaliações sucintas


feitas pelos profissionais consultados via e-mail, observa-se que dificilmente um único
aspecto, dentre as questões envolvidas nos projetos de florestas sociais, pode funcionar
sozinho para dar conta da sustentabilidade de iniciativas em florestas sociais. As questões
estão interrelacionadas e são, portanto, interdependentes. A identificação de C&I para
certificar tais iniciativas poderá ser um meio eficaz de ‘provocar’ o encaminhamento de
soluções para os entraves mais freqüentemente identificados, na medida em que considerem
a interdependência entre os fatores de ordem institucional, econômica, técnica, cultural,...
que definem as possibilidades de manejo florestal comunitário sustentado. E, nesse aspecto,
mais uma vez o problema da participação dos interessados surge como questão: segundo
Irvine (2000), a efetiva participação local no desenvolvimento de padrões de certificação
ainda é problemática em muitos países; grupos comunitários e outros atores sociais se
deparam não apenas com os custos da participação, como também com os custos de
oportunidade que permitam pessoas-chave se integrarem aos fóruns de discussão de tais
padrões.

2.3 Florestas Sociais no Brasil

As iniciativas em florestas sociais no Brasil parecem ser bem mais recentes, menos
numerosas e menos divulgadas, principalmente para fora do país. E, exceto por duas
dissertações de Mestrado que sugerem a adoção de “florestas sociais” para atender às
demandas de lenha, não foi encontrada nenhuma publicação sobre pesquisa ou
desenvolvimento de “florestas sociais” (utilizando esse termo). Tampouco se identifica um
movimento regularmente apoiado ou conduzido por iniciativas internacionais, como ocorre
em diversos países, onde instituições como a FAO e a RDFN/ODI participam
freqüentemente da realização de projetos em florestas sociais. Recentemente, começaram a
ser empreendidas e divulgadas algumas iniciativas de “manejo florestal comunitário” na
Região Amazônica.

O uso da expressão florestas sociais foi identificado em algumas poucas iniciativas


de planos e políticas florestais, além das referidas dissertações (que serão comentadas mais
adiante). A referência mais antiga encontrada na literatura está no Projeto FLORAM
106

(1990), elaborado pelo Instituto de Estudos Avançados - IEA/USP. O Projeto FLORAM é


resultante das primeiras discussões internacionais sobre problemas climáticos. Em um
congresso sobre “Clima e Desenvolvimento” ocorrido em 1988, na Alemanha, sugeriu-se
informalmente que o Brasil produzisse florestas para fixar carbono. De conversas entre
cientistas, acabou surgindo na USP a iniciativa de elaborar um plano de reflorestamento
para todo o país, que se consolidou no Projeto FLORAM, elaborado pelo IEA, sob a
coordenação de Aziz Ab’Sáber. Visando a “reversão do efeito estufa”, o projeto propõe
ocupar uma área de 201.480 km² com plantios florestais industriais (72%), reflorestamentos
mistos (14%) e florestamento corretivo (14%). O Projeto sugere florestas sociais para
pequenas propriedades rurais, em algumas situações.

Os recentes delineamentos das políticas florestais estaduais vêm incorporando


diretrizes voltadas para o manejo florestal sustentado, bem como preocupações ambientais
e sociais no uso dos recursos florestais, e algumas políticas chegam a incluir o termo
florestas sociais. A Política Florestal do Estado de Minas Gerais (Lei n.º 10.561, de 27 de
dezembro de 1991), por exemplo, inclui florestas sociais entre as categorias de Unidade de
Conservação, conforme definido no artigo 10 (o grifo na expressão florestas sociais é meu):

Consideram-se unidades de conservação as áreas declaradas e definidas pelo poder


público, como parques nacionais, estaduais ou municipais, reservas biológicas,
estações ecológicas, florestas nacionais, estaduais ou municipais, áreas de proteção
ambiental, florestas sociais e outras categorias, a serem definidas pelo poder
público. Parágrafo 1º - As unidades de conservação são classificadas em categorias
de uso direto e indireto; Parágrafo 2º - o Poder Executivo estabelecerá critérios
quanto às formas de utilização dos recursos naturais das categorias de uso direto,
considerados os princípios ecológicos e conservacionistas, nas categorias de
manejo, tais como: I) florestas estaduais e municipais; II) áreas de proteção
ambiental; III) florestas sociais e IV) outras definidas pelo poder público. (Lei
Estadual 10.561/91 – MG, artigo 10).

A Política Florestal mineira cria, no artigo 21, a conta “Recursos Especiais a


Aplicar”, destinada a arrecadar recursos dos usuários de produtos florestais que não
disponham de produção própria, a serem aplicados: 50% em recomposição florestal e
formação de florestas sociais e 50% em desapropriação e implantação de unidades de
conservação estaduais e municipais.
107

Desse modo, entende-se que florestas sociais é ambiguamente uma categoria de UC


e de uso/manejo florestal reconhecida pelo Governo do Estado de Minas Gerais e parte
integrante de sua Política Florestal. No entanto, decorridos quase 10 anos da publicação da
Lei, o Poder Executivo do Estado parece não ter ainda incorporado de fato esta categoria
em sua condução da Política Florestal. O Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais
não tem nenhum programa de ação ou pesquisa que se intitule de florestas sociais
(tampouco nenhuma UC) embora esteja investindo em recuperação e manejo de bacias
hidrográficas e procurando diversificar um pouco as atividades de produção de mudas e
plantio junto aos produtores rurais (fomento florestal), tradicionalmente voltadas para a
produção de eucaliptos. É considerável o porte do setor industrial que consome carvão
vegetal em Minas Gerais e o IEF-MG dá assistência a empresas e proprietários rurais em
plantios de eucaliptos para este fim. Mas, embora tenha aumentado significativamente a
produção de carvão vegetal via silvicultura, o Estado ainda é o maior extrator de carvão
vegetal de matas nativas do país, responsável pela metade da extração nacional. A extração
de lenha em matas nativas de Minas Gerais também é muito alta. Segundo dados do IBGE,
no período 1990-97, foram extraídos 69,3 milhões m³ de lenha das matas de Minas,
representando 75% do total extraído na Região Sudeste e 17 milhões m³ a mais do que foi
extraído em toda a Região Centro-Oeste, no mesmo período. E, apesar do volume anual de
lenha extraída das matas de Minas Gerais ter diminuído em mais da metade, de 1990 para
1997, o valor ainda é bastante elevado – cerca de 5,2 milhões m³ em 1997 – colocando
Minas como o terceiro maior extrator de lenha entre todos os estados do país.

Lembrando que a motivação inicial do programa de florestas sociais do governo da


Índia, na década de 1970, era o consumo doméstico de lenha, essa mesma demanda no
Estado de Minas Gerais (e no Brasil como um todo – a Bahia, maior consumidor, extrai 3
vezes mais lenha de matas nativas do que Minas Gerais) poderia ter estimulado a realização
de projetos semelhantes17. É possível que parte das realizações do IEF-MG tenha suprido
essa demanda (não há dados atuais disponíveis), mas certamente não se configurou em
iniciativas de pesquisa e desenvolvimento em florestas sociais. A prioridade dada ao

17
Naquela década, 70% da população brasileira distribuída nas áreas rurais e nas periferias urbanas de baixa
renda dependiam da lenha para consumo doméstico. Em 1985, a lenha representava 93% do consumo
residencial rural de combustível em Minas Gerais (Mata, 1993).
108

eucalipto para o setor industrial de Minas Gerais (e de outros estados brasileiros) se reflete
na condução das pesquisas universitárias, em grande maioria demandadas e patrocinadas
pelas empresas do setor, ficando as necessidades da população rural pobre relegadas a
segundo plano.

Mata (1993), em dissertação de Mestrado defendida na Universidade Federal de


Viçosa, analisou o consumo de lenha em Minas Gerais, através das condições sócio-
econômicas da população rural e urbana que depende da lenha para consumo doméstico,
recomendando, ao final, a implantação de programas de florestas sociais para atender à
demanda por lenha nas comunidades rurais pobres e sem posse da terra, destacando que o
Pró-Floresta (programa estadual de reflorestamento em pequena escala) é dirigido somente
aos pequenos proprietários (não contempla os não-proprietários). Em sua revisão do
assunto, Mata (1993) não cita nenhuma iniciativa de florestas sociais no estado mineiro,
nem no país. Focado no caso de um determinado distrito, onde realizou levantamentos de
campo, o autor coloca sua proposta de implantação de florestas sociais nos seguintes
termos:

O elevado número de famílias sem título de propriedade de imóvel rural caracteriza


o fator terra como importante insumo para a viabilidade do sistema. Neste sentido,
propõe-se que a terra seja adquirida mediante a cooperação entre a administração
municipal e outras instituições públicas ou privadas interessadas no programa. A
mão-de-obra envolvida na implantação, na manutenção e na exploração seria
cedida por uma associação de moradores sem-lenha. As mudas e outros insumos
seriam fornecidos pela empresa, nos moldes dos programas de fomento florestal já
existentes junto aos pequenos produtores rurais. (Mata, 1993: 103)

Observa-se que o modo como o tema das florestas sociais é tratado por Mata (1993)
tem forte relação com o que Chambers (1995) chama de profissional “normal”. Embora
esteja objetivando o atendimento de necessidades da população carente, o autor priorizou
seu estudo nas questões quantitativas, utilizando métodos estatísticos e questionários
formais para levantamentos e análise de dados sócio-econômicos da população local. Suas
propostas para a implantação de florestas sociais não incluem idéias, sugestões e modos de
diagnosticar os problemas vividos pela própria “comunidade alvo” de seu estudo.

Um estudo semelhante foi realizado para o Estado do Rio de Janeiro, também como
pesquisa de Mestrado, defendida na Escola de Engenharia da Universidade Federal do Rio
109

de Janeiro (Queiroz, 1995), onde a “experiência brasileira em florestas sociais” é situada


nos programas federal e estaduais de fomento florestal em pequenas propriedades rurais,
que se desenvolveram nos anos 1980 após as queixas de que os subsídios fiscais dos
governos militares aplicados ao setor florestal até então eram dirigidos apenas aos grandes
proprietários (só aprovava plantios acima de 1.000 hectares). Tais projetos de fomento têm
sido utilizados em grande parte como forma de extensão das áreas de plantio de eucalipto e
pinus para atender às indústrias consumidoras de carvão vegetal e celulose, semelhante ao
que aconteceu com o programa de florestas sociais da Índia, conforme já comentado em
item anterior.

Queiroz (1995) identifica no estado fluminense uma demanda residencial anual de


lenha suficiente para consumir 10.000 hectares por ano de área plantada (com eucalipto),
que poderia ser suprida por “florestas sociais” - através de extensão rural, com
fornecimento gratuito de insumos e medidas complementares, como desregulamentação e
redefinições em relação a licenças de cortes das árvores plantadas e maior controle da
exploração de florestas nativas. O autor também identifica como entraves para o
estabelecimento de produção de árvores em “propriedades não-industriais” a falta de
conhecimento técnico, especialmente para espécies nativas, e uma certa “resistência
cultural” por parte dos produtores rurais do Estado, que não apresentam, em geral, tradição
na produção de árvores. Queiroz entende que esses entraves deveriam ser resolvidos por um
eficiente sistema de extensão florestal, uma responsabilidade dos órgãos estaduais
EMATER e IEF, que, no entanto, “apresentam os mais básicos problemas de estruturação,
com falta de veículos de transporte, mão-de-obra técnica insuficiente e sem treinamento e
escassos recursos financeiros.”

Castanho Filho (1993) defendeu o “incentivo a florestas sociais” no programa


florestal do Estado de São Paulo como forma de gerar emprego. Diz ele: “Como o
problema central hoje em dia, a nível mundial, é o desemprego, projetos que possibilitem a
absorção de mão-de-obra precisam ser incentivados. Esse é o caso das florestas sociais.”
Embora afirme que “o inovador nesse projeto é o envolvimento e a participação de parcelas
da população”, Castanho Filho considera como atores interessados os empresários, o
Estado e a comunidade cientifica. Os trabalhadores rurais ficariam provavelmente restritos
à condição de “mão-de-obra” dos empreendimentos de “florestas sociais”, com empregos
110

garantidos (ainda que flutuantes, de acordo com os cronogramas definidos pelos


empresários), mas sem participação efetiva no processo de decisão sobre os projetos.

Nota-se, portanto, que as iniciativas de políticas públicas e pesquisa científica para


florestas sociais são muito acanhadas e passam “ao largo” do nível de experimentação e
debate que há sobre o tema em outros países. Conforme coloca Kengen (2000), enquanto as
tendências internacionais para o setor florestal (vistas nas políticas e diretrizes da FAO e do
Banco Mundial, p. ex.), nas últimas duas décadas, se voltavam para o enfoque social, de
“colocar as pessoas antes das árvores”, o Brasil se manteve predominantemente na postura
de atendimento às necessidades da indústria, sem orientar investimentos para programas de
florestas sociais, como fizeram a Índia, a China, a Indonésia, o Nepal e tantos outros na
Ásia, na África e também na América Latina.

No cenário atual da política florestal do país, observa-se que a Política Nacional de


Florestas, que, conforme apresentada pelo Ministério do Meio Ambiente, encontra-se em
fase inicial de implementação, “sendo necessária uma ampla discussão com a sociedade”,
não faz menção aos termos “florestas sociais” ou “manejo florestal comunitário”, mas se
propõe, entre outras coisas, a “apoiar o desenvolvimento da silvicultura, do extrativismo e
das populações tradicionais”, bem como inclui as ONGs ambientalistas e sociais entre as
parcerias citadas. Desenvolvimento sustentável e parcerias são premissas da Política
Nacional de Florestas (PNF) e o governo federal está buscando realizar essas premissas nos
primeiros programas em andamento. Conforme estrutura prevista no Plano Plurianual-PPA
2000-2003, foram definidos três programas: Florestas Sustentáveis (SUSTENTAR);
Expansão da Base Florestal (FLORESTAR); e Prevenção e Combate a Desmatamentos,
Queimadas e Incêndios Florestais (FLORESCER). Os dois primeiros incluem ações junto
às ONGs e comunidades locais.

O “Programa de Expansão da Base Florestal Plantada e Manejada – FLORESTAR”


tem por objetivo aumentar a oferta de produtos e subprodutos florestais, oriundos de áreas
plantadas e manejadas; com orçamento de R$ 61,13 milhões, sua meta é plantar 10.000
ha/ano e as ações previstas são:

• Estudo para o desenvolvimento florestal sustentável por bioma;


• Fomento a projetos de tecnologia florestal (pequeno e médio produtor);
111

• Estudo para implementação de projetos florestais (linhas de financiamento);


• Fomento a projetos de reflorestamento (Fazendeiro Florestal).
• Reposição florestal (IBAMA - vistorias);
• Fomento a projetos de extensão florestal (FNMA);
• P & D em conservação e uso de florestas e agroflorestas (EMBRAPA).

O “Programa Florestas Sustentáveis – SUSTENTAR” tem por objetivo “promover o


uso sustentável dos recursos florestais, conciliando a exploração com a necessidade de
conservação”. Com orçamento de R$ 66,83 milhões, tem como meta: atingir 11,5 milhões
ha de área manejada até 2003 em áreas privadas, manter 13,5 milhões de ha de Florestas
Nacionais (FLONAs) e produzir 33,3 milhões de m³ de “madeira controlada”. As ações
previstas são:

• Manejo em florestas tropicais (PPG7);


• Plano de Desenvolvimento Sustentável da Mata Atlântica;
• Controle da comercialização e do transporte de produtos florestais;
• Concessão de áreas florestais para o manejo sustentável;
• Apoio às populações tradicionais em reservas extrativistas;
• Monitoramento e acompanhamento dos planos de manejo sustentável;
• Plano para o ordenamento e manejo dos recursos florestais por bioma.

O Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil (PPG7) é


considerado pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) “o mais importante programa já
desenvolvido para a proteção e manejo sustentável das florestas tropicais brasileiras”. O
PPG7 foi proposto na reunião do Grupo dos Sete países industrializados (G7), em Houston,
Texas, em 1990, sendo aprovado pelo G7 e pela Comissão Européia em dezembro de 1991.
O Programa tem como objetivos:

Demonstrar que o desenvolvimento econômico sustentável e a conservação das


florestas podem ser alcançados simultaneamente; preservar a biodiversidade das
florestas tropicais; reduzir a emissão global de gases que produzem efeito estufa e
estabelecer um exemplo de cooperação internacional entre países, para a solução de
problemas ambientais de escala global (www.mma.gov.br, fev/2001).
112

Dentre os projetos apoiados pelo PPG7, situa-se o “ProManejo – Projeto de Apoio


ao Manejo Sustentável na Amazônia”, apresentado pelo Ministério do Meio Ambiente com
o texto destacado no quadro 2.2, a seguir.

Quadro 2.2: ProManejo - Projeto de Apoio ao Manejo Florestal Sustentável na Amazônia


Sabemos que a exploração florestal, para produção de madeira na Amazônia, pode ser realizadas de forma a
causar baixos impactos ambientais. A promoção do manejo florestal sustentável depende de políticas públicas
adequadas, mecanismos e instrumentos de controle e monitoramento eficazes, capacitação de recursos
humanos e fomento de iniciativas promissoras realizadas por diferentes atores.
Mas... O que é Manejo Florestal?
É o planejamento, controle e ordenamento da florestal para a obtenção de benefícios econômicos e sociais,
respeitando-se os mecanismos de sustentação ecológica da floresta.
Como está o Manejo Florestal na Amazônia?
O problema central é que grande parte da exploração madeireira na região amazônica é de origem predatória.
Estima-se que apenas uma pequena parte da produção seja originária de áreas submetidas ao manejo
florestal. Dada a crescente demanda nacional e internacional de madeiras, e a ameaça que isto representa
para a conservação das florestas da região, é de fundamental importância que se promova o manejo florestal
como parte integrante de uma estratégia de desenvolvimento sustentável.
O ProManejo iniciou-se em 1999, e tem duração prevista de 5 anos.
São nossos objetivos...
• Contribuir para que os produtos madeireiros da região sejam oriundos de unidades de produção
onde se pratique o manejo florestal de baixo impacto.
• Gerar experiências – piloto que contribuam para o aprendizado dos diversos segmentos envolvidos
com a questão florestal.
Para colaborar com a solução da problemática da exploração madeireira na Amazônia, o Promanejo possui 4
componentes... é desta maneira que desenvolvemos nossas ações...
Dada a falta de políticas públicas adequadas e de sistema de estímulos ao manejo florestal, trabalhamos:
• Componente I – Análise Estratégicas para Subsidiar a Formulção de Políticas Públicas
Este componente possui forte ligação com o Programa Nacional de Florestas, do MMA/sbf/DIFLOR
Dada a falta de experiências de bom manejo florestal, trabalhamos:
• Componente II – Apoio e Promoção de Iniciativas Promissoras de Manejo em Diferentes Sistemas
de Produção Florestal
Devido as dificuldades e complexidade do controle e monitoramento da exploração madeireira, na Amazônia,
temos:
• Componente III – Desenvolvimento e Teste de um Sistema Piloto de Controle e Monitoramento das
Atividades Madeireiras
Estas atividades serão realizadas com o IPAAM e a SECTAM, contando ainda com a participação do
IMAZON.
Dada a importância do envolvimento das comunidades nas discussões visando alcançar a melhoria da sua
qualidade de vida, uso adequado dos recursos naturais e gestão de uma floresta pública, trablhamos:
• Componente IV – Apoio ao Manejo de Recursos Florestais na Floresta Nacional do Tapajós
Quem Financia?
É financiado pelo Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais, com fundos do Governo Alemão,
Governo Britânico, Rain Forest Trust do Banco Mundial e contrapartida do Governo Brasileiro.
São nossos parceiros
Organizações Estaduais de Meio Ambiente (OEMA);
Organizações não-governamentais;
Setor privado,
Grupos comunitários e indígenas.
fonte: fttp://www.mma.gov.br/port/sbf/pnf/ppg7.html
113

O ProManejo tem apoiado iniciativas de manejo florestal comunitário na Amazônia.


Em recente publicação, realizada pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia
(IMAZON) e pelo Laboratório Sócio-Econômico do Tocantins, com apoio da Agência
Alemã de Cooperação Técnica (GTZ) e do Instituto Internacional de Educação do Brasil
(IIEB), tais iniciativas, entre outras, são apresentadas e discutidas no contexto da
exploração madeireira na Amazônia. Todas as iniciativas analisadas estão voltadas para a
produção de madeira sob manejo florestal sustentado (Amaral e Amaral Neto, 2000).
Segundo os autores, atualmente, os diversos habitantes da região (índios, comunidades
tradicionais, extrativistas e colonos) participam de alguma forma da atividade madeireira.
No entanto, essa participação é restrita basicamente à venda de árvores em pé aos
madeireiros – uma relação de “comércio” caracterizada por condições de negociação
bastante desfavoráveis às comunidades. Nos últimos anos, uma mobilização mais
expressiva em torno do problema da exploração e da destruição da floresta amazônica vem
resultando em iniciativas concretas de valorização do manejo sustentado dos recursos
florestais e da participação das comunidades tradicionais nesse manejo. A própria
publicação citada é fruto dessa mobilização, foi elaborada a partir de informações colhidas
durante as Oficinas de Manejo Florestal Comunitário na Amazônia. Essas oficinas, que
aconteceram em 1998 (em Porto Dias – Acre) e em 1999 (em Marabá – Pará), reuniram
representantes de projetos, governo e ONGs para discutir a viabilidade de uma nova
proposta de conservação dos recursos florestais através do manejo comunitário.

De acordo com as análises de Amaral e Amaral Neto (2000), desde o primeiro


projeto de manejo florestal comunitário (iniciado em 1993), considera-se que essas
iniciativas são um avanço em direção ao manejo florestal sustentável na Amazônia. No
entanto, apesar do grande potencial para serem bem sucedidos, os projetos apresentam
ainda muitas dificuldades e desafios, que foram ressaltados pelos autores nos seguintes
pontos:

• Na primeira Oficina realizada, em 1998, avaliou-se que, em geral, existe um


baixo nível de organização social das comunidades envolvidas, baixo nível de
capacitação técnica e de gerenciamento e conflitos de agendas entre as ONGs e
as fundações financiadoras. Constatou-se também a necessidade de maior
atuação do governo em parceria com as ONGs. Na segunda Oficina, a
participação foi mais ampla, incluindo representantes do governo e potenciais
compradores de madeira;
114

• Aspectos internos aos projetos - os projetos apresentaram poucos avanços. O seu


principal desafio está na elaboração e regularização dos planos de manejo.
Apesar da aprovação da Instrução Normativa de regulamentação do manejo em
pequena escala (Instrução Normativa n.º 4, 28/12/98), a burocracia e a falta de
conhecimento dos técnicos do IBAMA impedem a agilidade da aprovação dos
planos de manejo. Outro aspecto apresentado como obstáculo para aprovação
dos planos de manejo foi a irregularidade da situação fundiária na maioria das
áreas a serem manejadas. Além disso, a demora na liberação dos recursos
financeiros tem gerado conflitos entre as agendas das ONGs e das comunidades;
• Aspectos relacionados ao governo - os projetos mostraram aos representantes do
Ibama a necessidade de uma participação mais efetiva desse órgão como seu
parceiro, ao invés de ele representar uma barreira ao progresso das iniciativas.
De fato, o IBAMA tem um papel-chave para que as iniciativas possam lograr
êxito. Os técnicos do órgão devem ser capacitados sobre as especificações do
manejo florestal comunitário, e o processo deve ser simplificado para que os
planos de manejo em trâmite possam ser apreciados e aprovados dentro dos
prazos previstos na legislação. Quanto ao ProManejo, foi solicitada a contratação
de um técnico para acompanhar os projetos e facilitar o intercâmbio entre as
iniciativas;
• Aspectos relacionados aos compradores - Existe um potencial interesse dos
compradores em adquirir a produção dos projetos. Os principais obstáculos ao
negócio são: escala de produção (os compradores necessitam de madeiras
específicas em quantidades incompatíveis com a produção dos projetos);
qualidade da madeira (as exigências dos compradores quanto às dimensões
especificadas e índices de umidade são incompatíveis com a capacidade de
qualidade dos projetos); e acesso aos compradores (para a grande maioria dos
projetos, o acesso aos compradores é difícil e os custos de transporte são
inviáveis para atingir os mercados do Sul e Sudeste do País). As alternativas
apresentadas aos projetos seriam a busca pela certificação e a organização em
grupos para manter uma constância de produção e reduzir os custos de transação.

Em relação aos aspectos internos aos projetos, Amaral e Amaral Neto (2000)
destacam ainda uma questão vista como limitante, que se refere ao nível de participação
dos membros da comunidade nos projetos, o que afeta a distribuição dos lucros com a
venda dos produtos, podendo causar problemas sociais na dinâmica de acesso e uso dos
recursos comuns. A questão do regime de propriedade comunitária é também destacada:

Embora apresentem vantagens, como o maior ordenamento no uso do solo, melhor


planejamento dos recursos naturais, valorização dos recursos florestais, aumento da
eficiência no combate ao fogo, etc., essas formas comunais de acesso a espaços e
recursos naturais na região têm sido substituídas por formas de apropriação
dominantes, sejam privadas ou públicas (Amaral e Amaral Neto, 2000:19).
115

Assim como aparecem as questões fundiárias, de direitos e posses sobre a terra e os


recursos (tão comumente citadas em projetos de florestas sociais nos países do Sul) também
aparecem as questões de poder político/econômico. Amaral e Amaral Neto (2000) destacam
como os pequenos produtores são boicotados pelos empresários do setor madeireiro, que,
para preservar seus interesses, ocupam posições nos poderes executivo e legislativo local e
regional. Nesse contexto, somente as parcerias e os suportes nacionais e internacionais
poderão impulsionar o andamento dos projetos de manejo florestal comunitário.
Atualmente, segundo os autores, existem 14 projetos planejados ou em andamento na
Amazônia, voltados somente para a extração de madeira (ver quadro 2.3). A maior parte
das terras dos projetos não tem situação fundiária regularizada, o que prejudica a aprovação
dos planos de manejo junto ao IBAMA. Dentre esses projetos, observam-se dois
envolvendo áreas indígenas, que já foram invadidas por madeireiros em busca de mogno
principalmente e onde os índios, com apoio de ONGs ambientalistas, pretendem continuar
obtendo dinheiro da venda de madeira, antes proveniente da exploração ilegal das
madeireiras e agora fruto de plano de manejo sustentado.

Apesar das muitas dificuldades e deficiências ainda enfrentadas por essas iniciativas
e do risco que pode haver de sobre-exploração da madeira além do previsto nos planos de
manejo, por pressões externas (mercado, políticas, etc.) e internas (como o enfraquecimento
do “espírito comunitário” da população local envolvida nos projetos), observa-se uma
tendência de crescente mobilização de base para atingir metas de sustentabilidade no uso e
manejo das florestas da Amazônia, com a consolidação de parcerias entre instituições,
aumento de recursos financeiros para pesquisas e experimentações.

Além das iniciativas de manejo florestal comunitário para o aproveitamento da


madeira na Região Amazônica, outras iniciativas de manejo de produtos não-madeireiros
vêm sendo desenvolvidas em comunidades tradicionais da região. A luta dos seringueiros
por seus direitos de uso e manejo das florestas e na resistência ao avanço da ocupação
agropecuária é a iniciativa no Brasil de maior destaque internacional, pelo seu caráter de
luta por direitos humanos e conservação ambiental nascida na própria comunidade de
seringueiros, com destaque para a história de Chico Mendes. Um importante resultado
dessa luta e que contribuiu para mobilizar uma mudança nacional quanto à existência das
116

populações tradicionais em áreas protegidas foi a criação de Reservas Extrativas como


categoria de Unidade de Conservação. Conforme já comentado, o recententemente
instituído (ainda não regulamentado) Sistema Nacional de Unidades de Conservação
(SNUC) consolida essa categoria, entre outras que incorporam as comunidades nativas ao
processo de gestão das áreas protegidas.

Outra forma bastante conhecida de manejo comunitário da floresta e de luta pelo


direito à terra e por melhores condições sociais é o caso das quebradeiras de coco de babaçú
no Maranhão e Tocantins. A organização das mulheres em torno dos direitos de uso e
manejo dos babaçuais impulsionou e fortaleceu os Sindicatos Rurais e o processo de
reforma agrária na região.

Na Amazônia, destaca-se ainda uma iniciativa não-governamental que envolve


parcerias de instituições do Brasil e do Peru. Trata-se do Instituto do Bem Comum
(Instituto del Bien Comun – IBC), “uma associação civil sem fins lucrativos cuja
preocupação central é a gestão ótima do bem comum. O IBC apresenta três linhas de ação:
Manejo Comunitário de Recursos Naturais (ACRI), Rios Andinos-Amazônicos (AARAM)
e Mapeamento Comunitário (SICNA). Do lado brasileiro, participam o Instituto de
Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) e o Woods Hole Research Center, que trabalha
com pesquisa e educação, especialmente em Reservas Extrativistas. O IBC está
desenvolvendo estudos de caso para avaliação das condições de manejo das comunidades
locais.

De acordo com uma das publicações do Instituto del Bien Comun, cerca de metade
das florestas e a maior parte dos lagos da Amazônia são ocupados, utilizados e em certo
grau controlados por comunidades de povos indígenas, seringueiros, ribeirinhos e pequenos
agricultores economicamente marginalizados. “O bem-estar dessas pessoas – e dos
ecossistemas de florestas e várzeas onde vivem – dependerá do surgimento e da
consolidação de modelos de manejo e conservação dos recursos naturais de base
comunitária, que são viáveis a longo prazo e capazes de reduzir os impactos das atividades
humanas sobre os recursos para níveis sustentáveis” (Smith, 2000). Segundo o autor, a
pesquisa que está sendo realizada sobre gestão comunitária é orientada por três questões
fundamentais: 1) Que pré-condições são necessárias para iniciar um manejo de base
117

comunitária dos recursos que esteja apto a começar a funcionar em um curto prazo; 2) Uma
vez iniciado, que fatores condicionam a habilidade do Grupo de Usuários para manter um
sistema de manejo comunitário de modo a produzir resultados positivos no curto prazo; 3)
Que fatores condicionam a habilidade do Grupo de Usuários para manter um sistema de
manejo comunitário de modo a resistir e produzir resultados positivos a longo prazo?

A questão do tempo parece permear grande parte das reflexões e avaliações no


campo das iniciativas em florestas sociais. E certamente que essa questão está estreitamente
relacionada ao retorno econômico das atividades de produção do grupo. Talvez por isso, os
projetos em sistemas agroflorestais tenham despertado maior interesse no Brasil e estão
sendo desenvolvidos em várias regiões do país, especialmente na Amazônia, por diferentes
atores sociais e diferentes concepções e contextos. O problema do tempo de crescimento
das espécies versus tempo de retorno econômico talvez seja um fator menos limitante nas
iniciativas em SAFs, onde as culturas agrícolas, de ciclo curto principalmente, podem
trazem um retorno de capital investido mais rápido do que as espécies arbóreas,
principalmente para produtos madeireiros. O maior interesse pelos SAFs também deve-se
ao menor impacto cultural, na medida em que os produtores rurais mantém seu “pé” na
lavoura, como atividade principal, introduzindo as árvores quase como “complementos”, no
princípio, até que o sistema possa se desenvolver para um patamar de maior diversidade.

No entanto, problemas de outra ordem, como a questão fundiária, acabam se


tornando limitantes, já que pequenos produtores dispõe de pouca terra e poucos recursos
para se arriscar em experiências que não se sabe ao certo que resultados podem dar. Essa
situação tem sido relatada nos trabalhos do Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da
Mata de Minas Gerais (CTA-ZM, 1998) com pequenos produtores da região, onde as
recentes experimentações com SAFs em áreas de produção de café apresentam bons
resultados em termos de controle de erosão e melhoria das condições ambientais em geral,
mas a produtividade do café no consórcio com espécies florestais ainda é duvidosa e o
aproveitamento da madeira, mesmo que somente para uso doméstico, é uma perspectiva a
“longo prazo”, se comparado com o ciclo do café e mais ainda com culturas anuais, como
milho e feijão.
118

Com pouca disponibilidade de terra e de recursos para cultivar, os pequenos


produtores preferem disponibilizar as piores terras para as experimentações em SAFs,
deixando as áreas mais férteis para a agricultura convencional, o que torna ainda mais lento
o processo de desenvolvimento e o nível de produtividade do sistema consorciado lavoura
+ árvores. Nessas circunstâncias, o risco de abandonar o projeto ou concentrar esforços em
pesquisas técnicas (na seleção das espécies, por exemplo) é maior do que a possibilidade de
enfrentamento da questão fundiária, da falta de política agrícola e florestal eficientes, etc.

Tendo em vista as inúmeras iniciativas em SAFs no Brasil, não foi possível realizar
um levantamento mais consistente desse campo de pesquisa e experimentação. Mas,
embora exista um crescente interesse no assunto, ainda não se pode falar em expressiva
participação dos SAFs no consumo de produtos agrícolas e florestais. As informações
obtidas indicam que os SAFs não estão sendo adotados necessariamente em um contexto de
gestão comunitária participativa. Existem iniciativas em SAFs tanto por parte de
empresários dos setores florestal e agropecuário como de instituições de pesquisa, ONGs
ambientalistas e pequenos produtores. Esse contexto justifica o entendimento de
Alavalapati e Gill (1991), de que os SAFs são apenas técnicas de cultivo consorciado de
espécies agrícolas e florestais e que podem ser utilizadas (ou não) em iniciativas de
florestas sociais, como parte importante de um conjunto maior de questões que envolvem
essas iniciativas.

Uma grande contribuição que se pode esperar dos SAFs está nas pesquisas e
experimentações de sistemas de produção de alimentos e de bens e serviços florestais,
consorciados, que podem apontar para melhores condições de uso da terra nas frágeis
condições ambientais dos solos tropicais. Viana et al. (1997) fazem um apanhado geral
sobre sistemas agroflorestais, incluindo conceitos, técnicas, expectativas, problemas e
exemplos de experiências no Brasil, com destaques para a urgência de maior investimento
em pesquisas etno/agroflorestais, no sentido de melhor aproveitamento do conhecimento
das populações tradicionais (índios, seringueiros, ribeirinhos, caiçaras, etc.).
119

Quadro 2.3. Características gerais dos projetos de manejo florestal comunitário na Amazônia.
Projetos/Enti Local e ano Tipos de Área de Método de Situação Situação Situação de
dade (atores do início florestas abrangência silvicultura legal da legal do financiam.
envolvidos) manejadas do projeto terra plano de (anos de
manejo apoio)
Mamirauá – Tefé Florestas de 260.000 ha exploração Reserva aprovado Atual
S.M.C. Amazonas várzea seletiva Estadual de CNPQ, DFID,
(ribeirinhos) 1996 manual Desenvolv. ProManejo
sustentável (5 anos)
Rio Cautário Cautário Floresta de 964 ha/ano exploração Reserva aprovado Atual
– OSR Rondônia terra firme seletiva Estadual WWF e PPG7-
(extrativista) 1995 mecanizada e Extrativista PDA (4 anos)
manual
Porto de Moz Porto de Moz Floresta de 13.700 ha exploração Área em em Aguardando
– LAET Pará terra firme seletiva processo de elaboração Comunidade
(ribeirinhos) 1995 estuário mecanizada demarcação Européia
(3 anos)
Kayapós – CI Redenção Floresta de 250.000 ha exploração Reserva em Atual
(índios) Pará terra firme seletiva demarcada elaboração Conservation
1997 manual International,
aguardando
ProManejo
Flona Santarém Floresta de 76.683 ha exploração Floresta a ser Aguardando
Tapajós – Pará terra firme seletiva Nacional elaborado ProManejo
PSA 1996 mecanizada
(ribeirinhos)
LASAT Marabá Floresta de 340 ha em exploração Área de aprovado Atual
(agricultores) Pará 1993 terra firme três seletiva ocupação de PPG7-PDA (2
comunidades mecanizada pequenos anos)
EMBRAPA Pedro Floresta de 440 ha exploração Projeto de aprovado Atual
(agricultores) Peixoto terra firme seletiva com colonização EMBRAPA
Acre 1995 tração animal oficial PDA
CTA Porto Dias Floresta de 3.000 ha exploração Projeto de aprovado Atual
(extrativista) Acre terra firme seletiva assentam. PPG7-PDA
1995 mecanizada e extrativista Aguardando
com tração Com Européia
animal (2 anos)
Arapiuns – Santarém Floresta de a ser definido exploração área de a ser Aguardando
Ipam Pará terra firme seletiva ocupação elaborado Comunidade
(agricultores) 1996 mecanizada Européia
Xikrins – ISA Parauapebas Floresta de 40.000 ha exploração Reserva aprovado Atual - Cia.
(índios) Pará terra firme seletiva Indígena Vale Rio Doce
1995 mecanizada e PPG7-PDA
Aguardando
ProManejo
Boa Vista dos Boa Vista dos Floresta de 5.000 ha exploração Áera de em Financiado
Ramos – Ramos terra firme seletiva ocupação elaboração ELF, Loteria
IMAFLORA Amazonas mecanizada Inglesa
(riberinhos) 1998 Fund Ford
FASE Gurupá Floresta de 860.000 ha exploração Área em Financiado
Gurupa Pará terra firme seletiva comunitária tramitação ICCO
(agricultores) 1994 mecanizada em proc. de
legalização
Uruará Uruará Floresta de 12.000 ha exploração Projeto de em Financiado
Fundação Pará terra firme seletiva colonização elaboração PDA/MMA
(agricultores) 1999 mecanizada oficial
reserva legal
FUNTAC Bujari Floresta de 1.070 ha exploração Reserva aprovado Financiado
(extrativistas)Acre terra firme seletiva Estadual ITTO
1989 mecanizada Antimary
Fonte: Amaral e Amaral Neto (2000).
120

CAPÍTULO 3

FLORESTAS SOCIAIS VERSUS DESMATAMENTO

Tendo em vista a situação geral de declínio das florestas tropicais, constantemente


ameaçadas por diversos interesses imediatistas de exploração econômica, o que se poderia
esperar para as iniciativas no campo de pesquisa & desenvolvimento em florestas sociais?
Teriam essas iniciativas potencial para reverter o cenário atual de avanço da exploração
madeireira predatória e dos desmatamentos em grande escala?

Neste capítulo, essa questão é discutida através de uma abordagem sobre o espaço
simbólico ocupado pelas florestas no campo de forças das disputas sociais pelos recursos
naturais. Pode-se dizer que nenhum ambiente natural é tão representativo das idéias sobre
degradação e conservação ambiental como a floresta; talvez por estar associada a outros
recursos essenciais (além das espécies da flora e da fauna), como o ar e a água, bem como a
muitos impactos de grande magnitude decorrentes dos desmatamentos, como a erosão dos
solos, as enchentes e as secas. Quando se pensa no verde (discursos verdes, partidos
verdes,...) a imagem mais próxima é geralmente a das florestas, não é a imagem do verde
dos campos cerrados, dos pampas, dos pantanais, das restingas, dos manguezais ou
qualquer outro ecossistema.

Partindo de uma abordagem histórica do impacto das civilizações sobre a natureza


em geral e as florestas em particular, o forte simbolismo das árvores e florestas nas
sociedades humanas é discutido neste capítulo como um indicador de processos sociais de
disputas e relações de poder que determinam os modos predominantes de uso e manejo das
florestas. Modos esses que estão na base das questões relativas à degradação das florestas,
tanto quanto nas possibilidades de sucesso ou fracasso das iniciativas em florestas sociais.
Fechando este capítulo (e a própria dissertação), algumas considerações e posicionamentos
de pesquisadores consultados, em publicações e via e-mail, contribuem para uma análise
conclusiva sobre a pergunta-título desta dissertação.
121

3.1 A Histórica (Des)Importância das Florestas

Basta um breve olhar sobre o modo como alguns importantes historiadores das
últimas décadas situam os impactos da ação humana no planeta, para se configurar um
certo ‘mal estar’ e uma impressão de que os Homo sapiens - nós e nossos antepassados -
nunca soubemos muito bem como lidar com a natureza, ou, em outras palavras, com a base
material de nossa existência. Em relação aos demais seres vivos (flora e fauna), as
observações, especulações e afirmações de historiadores, muitas vezes taxativas, levariam a
história da humanidade a uma provável condenação unânime em um eventual tribunal
ecológico do Universo que julgasse a capacidade dos humanos de sobreviver no planeta e
de conviver com os diversos animais e plantas que aqui encontraram.

Alfred Crosby, ao discorrer sobre as migrações do Homo sapiens a cerca de 40 mil


anos atrás para a Austrália e depois para a América do Norte, especula sobre uma possível
participação dos humanos na extinção de algumas espécies:

É provável que os humanos só tenham ultrapassado a borda sul da calota gelada da


América do Norte bem depois da chegada de outros humanos à Austrália, mas, no
Novo Mundo, como na Austrália, parece ter havido uma coincidência entre a
chegada dos humanos caçadores de caça pesada e a extinção de muitas espécies de
grandes mamíferos: mamutes, mastodontes, grandes preguiças rasteiras, búfalos
gigantes e cavalos, por exemplo. (Crosby, 1993)

Warren Dean (1996) também levanta hipóteses sobre a participação humana na


extinção de animais e outros impactos da “primeira leva de invasores” no continente
americano, tais como a hipótese de que “na América do Sul, como em qualquer outro
geomassa por ocasião da primeira invasão humana, o desaparecimento de uma série de
espécies pode ser atribuído à matança excessiva das caçadas.” O uso do fogo por antigos
caçadores-coletores para “tocar sua presa” é discutido por W. Dean como um provável
impacto ambiental de grande magnitude.

Jean Dorst, um dos mais contundentes críticos da atuação humana na Terra,


considera que a “aparição do homem” no planeta teria a mesma significação dos grandes
cataclismos na escala de tempo geológico. Para esse autor,
122

O impacto do homem nos equilíbrios biológicos data da sua aparição sobre a Terra.
(...) O homem primitivo já dispunha de um instrumento cujo poder imenso não era
proporcional ao seu pequeno grau de tecnicismo: o fogo. (...) Em certas zonas da
África e da América, os autóctones já haviam cometido estragos consideráveis antes
da chegada dos Europeus. (...) Pode-se admitir que o equilíbrio biológico natural
entre o homem e a natureza desapareceu do mundo muito rapidamente, na melhor
das hipóteses logo que o caçador se transformou em pastor e, sobretudo, em
agricultor. (Dorst, 1973)

O historiador inglês Keith Thomas (1988) é outro autor que se refere a um passado
remoto para justificar a destruição das florestas: “desde os tempos mesolíticos, o progresso
humano dependeu de arrancar e destruir as árvores com que a maior parte da Terra estava
coberta.”.

Avançando na história dos impactos da humanidade no planeta, para além dessas


considerações sobre uma possível atitude predatória dos primeiros Homo sapiens,
observam-se interpretações de dados históricos que apontam os sinais de uma relação de
uso das florestas (tida hoje como) imprevidente e de exclusão desde os primórdios da
civilização. John Perlin, em História das Florestas, relata inúmeras situações de
desmatamento e exploração da madeira desde o Velho Mundo, mostrando a importância
dos mesmos no florescimento e queda das civilizações e suas grandes migrações. As
seguintes passagens sobre a Grécia e o Império Romano são exemplos contundentes:

Estudos de amostras de pólen e de perfis de solo e antigos documentos registram a


destruição sofrida pelas florestas do Peloponeso causada pelo crescimento
econômico e populacional sem precedentes. O rápido declínio das florestas
messenianas devido à ação humana obrigou os lenhadores a se mudarem para o
centro da península no século XIII a.C. (...) Os desastres naturais parecem ter-se
tornado mais comuns no Peloponeso durante o último período da Idade do Bronze
como resultado do desmatamento. Dos declives sem árvores, acima da planície de
Argos, descia com grande intensidade uma enorme quantidade de terra e água na
estação das chuvas. (...) Roma financiou seu desenvolvimento em larga escala com a
prata extraída de minério espanhol. Porém, isso só foi conseguido com uma grande
perda das regiões florestais ibéricas - as fornalhas da fundição de prata consumiram
mais de 500 milhões de árvores em seus 400 anos de atividade; os lenhadores
tiveram que desmatar uma área superior a 18.000 km². (Perlin, 1992, p. 63, 64 e
133).
123

Para Dean (1996), a história florestal corretamente entendida é, em todo o planeta,


uma história de exploração e destruição. Embora essa afirmação pareça genérica e
taxativa, observa-se que a importância da madeira no desenvolvimento das civilizações,
especialmente como combustível e material de construção, nunca foi reconhecida ao ponto
de se cultivar árvores para manter estoques permanentes de suprimento contínuo às
crescentes necessidades desse recurso. De acordo com os relatos de Perlin (1992) sobre
iniciativas silviculturais ao longo da história das civilizações, o cultivo de árvores nunca
logrou resultados satisfatórios para o provimento das demandas existentes, desde pelo
menos quando se começou a consumir madeira para fundir metais e construir cidades.
Apesar da escassez de madeira chegar a ser crítica em muitos momentos, privilegiava-se a
busca de madeira em outras regiões (às custas de invasões, saques e guerras), em
detrimento do cultivo de árvores na própria região, motivados também pelo interesse em
conquistar novas terras.

À medida que o “modelo civilizador” europeu se desenvolveu e se expandiu pelo


mundo, o consumo de madeira aumentou, bem como a possibilidade de suprimento a partir
das florestas “virgens” do Novo Mundo, protelando-se assim o necessário cultivo de
árvores e florestas para a manutenção das espécies e dos bens e serviços florestais. A
destruição das florestas, não só pela extração da madeira mas também para a expansão da
agricultura e das pastagens, acentuou-se significativamente a partir do século XV, com o
desenvolvimento das condições técnicas, políticas e comerciais que deram base à
Revolução Industrial - momento histórico a partir do qual surge a maior parte dos impactos
da relação sociedade-natureza.

Nos tempos Tudor e Stuart18 as matas continuaram a dar lugar primeiramente a


pastagem e cultivo, mas também ao atendimento da crescente demanda de material
de construção e combustível industrial, seja para a manufatura do ferro, o fervimento
do sal ou a produção de vidro e cerâmica. A extinção de parques, o cercamento para
fins agropecuários de áreas antes reservadas à caça, a apropriação privada de terras
comunais, a administração pouco rigorosa de florestas reais e a inexorável redução
de seu tamanho: tudo isso significou a eliminação de florestas e de árvores. (Thomas,
1988: 231)
Após as primeiras viagens ao redor do mundo, os europeus descobriram rapidamente
a imensidão das riquezas das outras zonas do globo, até então inexploradas.

18
Dinastias Tudor (1485-1603) e Stuart (1603-1714).
124

Simultaneamente, desenvolvia-se uma civilização técnica preparando a verdadeira


revolução industrial dos séculos posteriores. Os recursos naturais de todo o planeta
foram então saqueados para o benefício imediato dos pioneiros ou em proveito das
nações colonizadoras, que praticavam uma economia de exportação. A evolução que
demorou séculos a se produzir na Europa e na Ásia foi condensada, por vezes, em
apenas algumas décadas na América e na África. A uma evolução lenta opõe-se uma
verdadeira explosão devastadora. (Dorst, 1973).

Essa “explosão devastadora” sobre as florestas tropicais cresceu mais ainda no


século XX e especialmente a partir dos anos 1970. Ao final daquela década, a FAO
estimava que a taxa de desmatamento das florestas tropicais era de 76.000 km²/ano
(Wilson, 1997). No período 1980-90 essa taxa subiu para 150.500 km²/ano, mantendo-se
um pouco acima dessa média durante a última década (1990-2000), conforme os dados
analisados no capítulo 1.

Apesar da substituição da madeira por outros recursos, principalmente como


combustível, as florestas continuam sendo destruídas pelas mesmas razões e a maior parte
da demanda industrial de madeira ainda é suprida pela exploração de florestas naturais -
estima-se que atualmente as plantações florestais respondam por apenas 30% do consumo
mundial de produtos florestais industriais (FAO, 1999) e, como já citado anteriormente,
resumem-se a monoculturas de espécies arbóreas e não propriamente a ecossistemas
florestais.

A partir da Revolução Industrial, não só a demanda por madeira e por terras


aumentou consideravelmente, como a lógica própria à forma social vigente - o capitalismo -
dificulta a produção de árvores, tendo em vista que as metas de retorno econômico do
investimento têm um horizonte de prazo em geral muito menor do que o tempo necessário
para o desenvolvimento das árvores, ou seja, “a temporalidade econômica está divorciada
da temporalidade ecológica” - expressão usada por Bensaïd (1999), ao discutir a “querela
entre a ecologia e a economia”, que ele considera como “divórcio entre duas
temporalidades heterogêneas: uma temporalidade econômica, ritmada pela produção do
capital e da força de trabalho; e uma temporalidade ecológica, regida pela estocagem e o
dispêndio de energia, que é também tempo estocado.”
125

Não é objeto desta dissertação a discussão dos efeitos do sistema capitalista sobre as
florestas, mas a questão da produção de árvores como matéria-prima de bens de consumo
na sociedade capitalista (para madeira, celulose/papel, carvão vegetal, lenha, óleos, etc.)
traz em seu cerne os modos como esse sistema considera e incorpora a temporalidade
ecológica das espécies arbóreas e dos ecossistemas florestais dentro de suas metas
determinadas pela temporalidade econômica. Para “ajustar” ambas as temporalidades, os
produtores de árvores em grande escala buscam meios de reduzir a primeira ao máximo,
investindo em produtividade de espécies de rápido crescimento, e recorrem a subsídios e
apoios político-adminstrativos, entre outros meios, para diminuir os custos de produção e
otimizar os lucros com a venda dos produtos no mercado, especialmente no mercado
internacional.

Essas breves considerações sobre o histórico descompasso existente entre


uso e produção dos recursos florestais alertam que o problema da destruição das florestas
tropicais traz raízes profundas e tem implicações mais complexas do que se percebe na
discussão da crise ambiental atual. As iniciativas de controlar os desmatamentos e preservar
as florestas não devem prescindir da compreensão desse processo histórico, tanto no
contexto global como nas situações e especificidades regionais e locais, sob o risco de se
estabelecer conclusões e metas de ação equivocadas, que podem até resultar em mais
degradação.

3.2 Florestas e “Capital Simbólico” – Visões Hegemônicas e Interesses Antagônicos

Analisando a história da relação civilização-florestas, a literatura nos revela que o


simbolismo das florestas remonta a tempos e a civilizações muito antigas, muito anteriores
às recentes manifestações conservacionistas da sociedade ocidental. De um modo
aparentemente contraditório, na medida em que as paisagens são “humanizadas”, as
florestas são vistas tanto como um ambiente selvagem, hostil, perigoso, sombrio,
inóspito,... como um ambiente romantizado, espiritual, místico, de inspiração artística,
morada dos deuses,... Como diz René Dubos, “o medo do ambiente selvagem começou a
declinar provavelmente tão logo estradas seguras trouxeram a certeza de que lugares
126

confortáveis poderiam ser alcançados em caso de necessidade”; (...) “ambientes


humanizados dão-nos confiança porque a Natureza foi reduzida à escala humana” (Dubos,
1981).

Segundo Thomas (1988), a destruição dos ambientes selvagens simbolizava para


muitos o triunfo da civilização: “As florestas tinham sido sinônimo de rusticidade e perigo,
como nos lembra o termo selvagem (relativo a silva - selva); os primeiros homens
preferiam o campo aberto às florestas por sua segurança: era possível ver o que se
aproximava e defender-se com antecedência.”

As florestas “virgens” do Novo Mundo causaram um misto de deslumbramento e


horror/temor aos europeus civilizados. Spix e Martius estão entre os naturalistas europeus
que viajaram pelo Brasil no início do século XIX e que, vindos de suas ‘paisagens
humanizadas’, descreveram em ricos detalhes a beleza e o fascínio das plantas e animais
das florestas tropicais ao mesmo tempo em que reclamavam dos incômodos e medos
causados pela “hostilidade” do ambiente, deixando claro que, junto à admiração científica
ou filosófica pela natureza, traziam as pegadas do mundo civilizado, condenando o Novo
Mundo à mesma relação de domínio/exploração/destruição das florestas:

Quando o povo deitar abaixo as matas, esgotar pantanais, romper estradas por toda a
parte, fundar vilas e cidades, e, assim, pouco a pouco, triunfar da luxuriante
vegetação e dos bichos daninhos, então todos os elementos da atividade humana
virão ao seu encontro e o recompensarão plenamente. (Spix e Martius, 1938)

Warren Dean, apesar de toda a sua preocupação com a destruição da Mata Atlântica,
revela a mesma ambigüidade entre o êxtase com a exuberância e os incômodos com a
hostilidade da floresta tropical que se observa na maioria dos relatos dos cientistas que se
embrenharam pelo Brasil no século XIX, como Spix e Martius. Dean (1996), ao mesmo
tempo que diz “Nenhuma pintura ou foto – que não passam de meras obras – consegue
captar a presença envolvente, misteriosa, da floresta, sua solidez plástica”, também afirma
que “a floresta tropical é um lugar inóspito para o homem” e que “embora nicho de nossos
ancestrais simiescos no passado, há muito fomos expulsos desse paraíso”. O autor segue
em um minucioso discurso sobre os incômodos com cipós, trepadeiras, espinhos, “legiões”
de carrapatos, pernilongos, mosquitos,... “micróbios letais”,... habitantes “solitários e
127

fantasmagóricos” do chão da floresta, pássaros “taciturnos”,... revelando-se semelhante aos


“primeiros homens” de que fala Thomas quanto à preferência por locais abertos: “Em meio
a esse caos, a esses escombros, a esses perigos, espiamos lá em cima a luz distante que se
filtra palidamente através da folhagem. É uma visão frustrante, ao contrário da vista
ampla do horizonte que desfrutamos no cerrado.” Para W. Dean, nem mesmo os
“moradores da floresta” vivem propriamente na floresta – “abrem uma clareira ampla de
terra batida, larga o bastante para evitar o perigo de quedas de árvores e formar uma terra
de ninguém onde insetos nocivos e répteis predadores possam ser avistados e eliminados.”

Observa-se, portanto, de acordo com relatos e interpretações de historiadores, que o


distanciamento e a proteção criada no mundo civilizado (desde as primeiras civilizações)
conduziu a uma visão de medo e fascínio da (que se tornou) desconhecida floresta. Perlin
(1992), ao descrever a destruição das florestas na Antiga Roma, no primeiro século d.C,
cita que “os homens de letras estavam mais aptos a observar a beleza das árvores agora que
havia um número muito pequeno delas. Muitos consideravam os bosques e arvoredos
lugares ideais para escrever. O encanto de um ambiente silvestre produzia, segundo esse
ponto de vista, pensamentos sublimes e inspiração maior.” A mesma observação é feita por
Thomas (1988), ao descrever a relação dos ingleses com o “mundo natural”, na Inglaterra
do século XVIII: “À medida que as áreas de mata diminuíram, elas deixaram de atemorizar
para se tornarem valiosa fonte de deleite e inspiração.”

Desse modo, tanto na Roma Antiga como na Inglaterra descrita por Thomas (1988)
e provavelmente na maior parte do mundo civilizado, essa visão idílica e poética sobre
árvores e bosques é característica de habitantes urbanos. Conforme destaca René Dubos:

“A valorização do ambiente selvagem não foi devida aos indivíduos que moravam
no campo e aí tinham que ganhar a vida. Deveu-se antes aos habitantes da cidade,
quando perceberam que a vida humana havia sido empobrecida pelo divórcio com a
Natureza. Pessoas cultas queriam experimentar o ambiente selvagem não por amor a
ele, mas como forma de enriquecimento emocional e intelectual.” (Dubos, 1981: 26)

No entanto, mais do que pessoas cultas preocupadas com enriquecimento emocional


e intelectual, nas sociedades urbanizadas existiam (e continuam existindo) pessoas e grupos
sociais preocupados, sim, com conquistas e enriquecimento material e, permeando as
128

visões simbólicas sobre florestas e árvores, há um campo de disputas por terras e recursos
das florestas que sempre esteve presente no desenvolvimento das civilizações.

É interessante observar essa perspectiva de conflito19 pelo uso da terra e recursos


naturais especialmente focada e simbolizada nas florestas e árvores da Inglaterra do século
XV ao XVIII, período onde as formas de ‘apropriação técnica, social e cultural do mundo
material’20 se desenvolvem em uma direção de acirramento de impactos socioambientais,
na passagem do sistema feudal para o sistema capitalista. Os impactos e conflitos sociais
relacionados às florestas foram dos mais imediatos e significativos:

Os séculos XVII e XVIII presenciaram muitas disputas amargas entre os habitantes


das matas e os funcionários da Coroa e grandes proprietários de terra, que
procuravam impor um controle mais eficiente sobre os recursos e moradores das
áreas florestais. Reivindicações conflitantes levavam à hostilidade e ao
desentendimento mútuos; (Thomas, 1988: 233).

A História conta que a Inglaterra teve a “primazia” de iniciar a Revolução Industrial


principalmente porque dispunha da mais poderosa esquadra do mundo (que lhe garantia o
comércio externo) e possuía ricas jazidas de ferro e carvão mineral, situadas próximas aos
centros industriais (Aquino et al., 1997). O que os livros de História não contam,
geralmente, é que a madeira estava presente na base de sustento dessa riqueza - a madeira
utilizada na construção civil e naval (o carvalho, principalmente) e a madeira que produziu
por muitos anos o carvão vegetal necessário aos fornos industriais. E mesmo quando o
carvão mineral substituiu o vegetal, permitindo à Inglaterra “entrar com os dois pés na
Idade do Ferro”, a madeira ainda estava presente, nos dormentes das ferrovias, nos esteios

19
O conceito de perspectiva de conflito supõe que “a vida social é moldada por grupos e indivíduos que lutam
entre si por recursos e recompensas várias, resultando em distribuições peculiares de riqueza, poder e
prestígio” (Johnson, 1995).
20
Segundo Acselrad (2000), “as formas técnicas descrevem, sem dúvida, o momento mais direto pelo qual os
atores sociais transformam o meio biofísico. Tais técnicas não representam simples respostas às restrições do
meio, não sendo, portanto, determinadas unilateralmente pelas condições geofisiográficas do meio. São, ao
contrário, integralmente condicionadas pelas formas sociais e culturais, ou seja, pelas opções de sociedade e
pelos modelos culturais prevalecentes. Aquilo que as sociedades fazem com seu meio material não resume-se
a satisfazer carências, superar restrições materiais, mas consiste também em projetar no mundo diferentes
significados – construir paisagens, democratizar ou segregar espaços, padronizar ou diversificar territórios
sociais, etc.”
129

das minas de carvão, nas carretas e nos navios que transportavam o minério, etc. (Perlin,
1992).

Portanto, o interesse dos ingleses ‘dominantes’ pelas florestas só poderia crescer e


se legitimar simbolicamente, desde a Idade Média (quando a Coroa tratou de reservar os
espaços florestados para campos de caça – as florestas reais)21 e mais tarde, quando se
criaram os parques particulares de cervos (um importante símbolo de posição social) e
determinadas árvores, como o “sempiterno” carvalho (símbolo nacional), passaram a se
constituir em uma espécie de monumento de família, um convite à imortalidade pessoal:
“derrubar tal monumento significava extinguir o nome de quem plantava”. Daí que, do
outro lado social, “não era surpreendente que os revoltosos do campo, como os moradores
das terras comunais da Floresta de Windsor, no início da dinastia hanoveriana22,
eventualmente cortassem árvores ornamentais com o fito de agredir seus proprietários.”
(Thomas, 1988: 260-263).

Assim, os historiadores e os poetas que descrevem a floresta como “terrível”,


“sombria”, “deserta”, “desabitada”, “assolada por feras”,... e, em outro momento, como
ambiente “sublime e inspirador”, não estão expressando o modo de ver e conviver com a
floresta próprio dos povos que as habitam, tidos como os “moradores irracionais e
ignorantes dos bosques e das florestas, que contrastavam com os habitantes civis e racionais
das cidades”.

A partir desses elementos históricos (exemplificados no caso da Inglaterra, mas que


aparecem em geral nas sociedades civilizadas), as visões de ambiente hostil e selvagem
sobre as florestas e de monumento pessoal sobre bosques e determinadas árvores em
particular (cultivadas ou não), bem como toda a retórica romantizada sobre o valor sublime
das florestas, poderiam ser compreendidas como o que Pierre Bourdieu chama de
“violência simbólica”, exercida por aqueles que acumularam suficiente capital simbólico

21
Inclusive, a origem do termo “floresta” é referida a áreas de bosques reservadas ao uso dos reis ou daqueles
favorecidos com uma carta real – a palavra forest vem do latim foris = de fora e forestare = negar acesso
(Stieglitz, 1999).
22
Dinastia de Hanover - de 1714 em diante, mudando para Casa de Windsor no início do século XX.
130

para nomear o mundo, impondo e ‘oficializando’ suas representações23. Segundo Bourdieu


(1994), “na luta por fazer uma visão do mundo universalmente conhecida e reconhecida, a
balança do poder depende do capital simbólico acumulado por aqueles que tem como
objetivo a imposição de várias visões em disputa e, em muito, ao fato de que essas visões
estejam enraizadas na realidade.”

Tendo em conta a fundamental importância econômica das florestas e árvores, desde


os primórdios da civilização, tanto para uso doméstico como na produção de bens
industriais, e, ainda, a crescente necessidade de espaço para outras formas de uso da terra,
parece soar muito natural a “sempiterna” existência de uma real necessidade de poder, em
uma desigual condição de luta, sobre uma real condição material a ser disputada: a
existência ou a eliminação da floresta (e seus recursos associados). Nesse sentido, a
representatividade e o simbolismo do verde das florestas nas preocupações atuais com o
meio ambiente se explica pela historicidade e atualidade dos conflitos nas sociedades
humanas em sua relação com as florestas, onde tem mais chances de vencer a disputa pelos
recursos aquele que fortalece seu poder “capitalizando” o espaço simbólico das árvores e
florestas para seus interesses, pessoais ou coletivos.

3.3 Campo de Forças – Florestas de Quem e para Quem

No espaço simbólico historicamente configurado sobre árvores/florestas, a visão


desenvolvimentista, tal como a visão conservacionista, na sociedade ocidental, parecem
trazer a marca da exclusão social que caracterizava os interesses de preservação das
florestas dos ‘lordes ingleses’. As florestas tropicais (ainda não humanizadas como a
maioria das florestas do Norte) foram vitimadas por duas visões excludentes e “arrogantes”,
conforme coloca Hecht (1993), ao analisar a situação da Amazônia (“que é tanto uma
floresta de árvores como uma floresta de símbolos”): as visões de paraíso perdido e “seu
primo” o eldorado. Embora com objetivos distintos - uma para preservar e outra para
desenvolver - ambas são visões semelhantes quanto ao vazio (demográfico) da floresta

23
Capital simbólico seria o conjunto de distinções (econômicas, culturais, políticas, etc.) acumuladas por um
determinado grupo no espaço social (ou campo de forças), onde se dão as disputas de poder (Bourdieu,
1994).
131

selvagem; e os impactos dessas visões sobre populações locais foram similares e


envolveram vastos processos de expropriação da terra.

Na visão conservacionista, pode-se notar sinais de violência simbólica em muitas


abordagens feitas em nome da ‘biodiversidade’, do ‘desenvolvimento sustentável’, do
‘seqüestro de carbono’ e outros slogans do que alguns críticos chamam de “verdejamento
dos discursos sobre desenvolvimento” e que vem mudando ou definindo a atitude de
empresas, governos, organizações não-governamentais e até mesmo de movimentos sociais
de luta pela posse e uso da terra, como nas lutas por demarcação das áreas indígenas, dos
atingidos por barragens e dos seringueiros na Amazônia. Schmink e Wood (1992) citam
que Osmarino Rodrigues, sucessor de Chico Mendes como líder do movimento dos
seringueiros, observou que “o uso do discurso verde abriu suas paisagens, suas formas de
sustento e seu dia-a-dia ao exame, a normas e intervenções dos ambientalistas nacionais e
globais” (Rocheleau e Ross 1995).

A criação de Parques Nacionais e demais Unidades de Conservação foi e ainda está


fortemente calcada no “paradigma do vazio selvagem”, onde se delimitam “espaços
especiais para espécies especiais, como habitats primitivos destituídos de humanos”
(Rocheleau e Ross, 1995). Muitas populações locais, cujo manejo tradicional do ambiente é
muitas vezes o responsável pela preservação da floresta, são expulsas de seus territórios e
empurradas para condições mais restritas de uso, passando a exercer de fato, e por força das
circunstâncias, uma ação predatória sobre os recursos naturais.

O paradigma do vazio selvagem ainda é hegemônico, tanto quanto o modelo


civilizador da sociedade ocidental, que tende à explorar e excluir as florestas (ou protegê-
las em ‘santuários de biodiversidade’) e junto com elas os seus habitantes nativos. Porém,
nos últimos anos vem surgindo uma atenção maior sobre os habitantes das florestas, na
medida em que os mesmos reivindicam e conquistam (com ou sem ajuda externa) respeito
às suas culturas, aos seus direitos sobre os territórios tradicionalmente ocupados e de
participação nos processos decisórios sobre o ambiente que habitam.

Esse movimento é ainda incipiente e encontra resistência em muitos setores, não só


naqueles que desejam explorar/extrair as florestas (madeireiros, pecuaristas, etc.), mas
também na mobilização internacional em torno da conservação das florestas, onde muitas
132

dificuldades existem entre intenção e gesto, predominando ainda uma tendência a enfatizar
a pobreza e o crescimento populacional como causas principais dos desmatamentos nas
regiões tropicais. Conforme já discutido no item 1.2.2, essa tendência está atrelada a uma
concepção superficial do problema dos desmatamentos, que se fixa nas causas diretas (ou
aparentes), menosprezando as causas subjacentes, especialmente as questões relativas à
distribuição de terras e recursos, às políticas macro-econômicas que incentivam os
interesses de lucros a curto prazo e às políticas locais de favorecimento a esses interesses.

Culpar os pobres do mundo pelos desmatamentos e pela degradação ambiental pode


ser uma forma de violência simbólica, principalmente na medida em que essa concepção
nega aos pobres o que Pulido (1996) define como legitimidade ecológica, conferida a
“grupos considerados ambientalmente válidos, cujo compromisso com a preservação está
fora de suspeita”. Muitas agências e políticas internacionais de ajuda aos pobres do mundo
sentem-se, desse modo, ‘autorizadas’ a impor sua visão de mundo, levando aos pobres as
melhores intenções de transformar seu “modo predatório de sobrevivência” em um “manejo
racional dos recursos naturais”. Pelo menos dois erros podem ser cometidos nessas
situações - o de estar desrespeitando as visões de mundo e os modos locais de lidar com o
ambiente e com as pressões internas e externas à comunidade e o de estar concentrando
esforços em uma suposta “causa” que pode ser somente uma conseqüência das verdadeiras
causas (subjacentes) do desmatamento – resultando em fracasso nas intenções de ajudar os
pobres e de preservar as florestas.

Criticando a pouca eficácia de programas de florestas sociais na Indonésia,


Thompson (1999) enfatiza que as florestas não são degradadas porque os povos das
florestas estão empobrecidos e sim que os povos das florestas estão empobrecidos pela
degradação de suas florestas e outros recursos pelo capital, com a ajuda de políticas
governamentais. “Em uma perversa ironia, o instrumento de empobrecimento dos povos da
floresta, o desmatamento, é a eles atribuído.”

Nesse contexto, muitas iniciativas para conter os desmatamentos e melhorar as


condições de vida das populações pobres do Terceiro Mundo têm sido criticadas, na medida
em que os diversos interesses envolvidos nos discursos verdes não necessariamente se
133

complementam e muitas vezes acabam por facilitar ou fortalecer as tensões e conflitos


sociais já existentes sobre o uso e o manejo da terra e dos recursos florestais.

Rocheleau e Ross (1995) discutem essa questão analisando o papel das árvores
como símbolos e instrumentos de luta material e ideológica dentro e entre agências de
Estado, ONGs e movimentos da população rural no caso de um projeto de floresta social na
República Dominicana. Colocando como um desafio à ecologia política a necessidade de
“criticar e propor alternativas ao excesso de iniciativas de manejo florestal e agroflorestal
que têm sido abrigadas na cortina discursiva das árvores como símbolos da bondade verde”,
as autoras entendem que a questão crucial não é tanto fazer ou não fazer manejo florestal ou
que árvores plantar, mas sim “de quem é a decisão, entre quais opções e sob que termos, em
um determinado local e a um dado momento na história.” Essa abordagem traz o foco da
atenção para as relações de poder entre os interessados nos recursos florestais, colocando
em questão o que está por trás da “bondade verde” em iniciativas de manejo florestal social.

No cenário das disputas pelas florestas, identificam-se, a “grosso modo”, dois


grupos principais de interessados. De um lado, grupos “de fora” que levam à destruição das
florestas com interesses econômicos imediatistas (como madeireiros, fazendeiros,
mineradores, etc.) e governantes nacionais/locais que favorecem a esses grupos com a
estrutura institucional que manipulam. E, de outro lado, ONGs ambientalistas e
movimentos sociais de base que lutam pela conservação das florestas, mas com distintos
objetivos. Estes últimos geralmente dispõem de menor capital simbólico do que os
primeiros. E, entre os dois lados, existem diversos atores que contribuem mais ou menos
para ambos os interesses, que são os políticos, os representantes de agências multilaterais
de desenvolvimento, os profissionais a serviço de governos, de empresas interessadas nos
recursos florestais ou a serviço de instituições de pesquisa/extensão e de ONGs
ambientalistas e ONGs que apoiam comunidades rurais.

Na busca por adquirir capital simbólico no campo de forças sobre as florestas, as


alianças entre ONGs ambientalistas e organizações de povos das florestas e as ações
empreendidas por ambos têm sido vistas como a força propulsora da luta contra os
desmatamentos, diante de muita “cena”, muito discurso e pouca ação efetiva dos
governantes (WRM, 2000). Por um lado, essas alianças podem ser muito promissoras e
134

profícuas, principalmente se os atores envolvidos tiverem clareza sobre as causas


verdadeiras dos desmatamentos e as respectivas responsabilidades, tanto sobre o que gerou
o problema como o que pode ser a solução. Por outro lado, a histórica desigualdade de
poder no campo de forças sobre os recursos naturais determina a esses atores um grande
desafio à capacidade de compreensão das questões envolvidas no referido campo e de
organização interna para agir e articular-se com potenciais parceiros, bem como ao desejo
verdadeiro (algo a ver com auto-estima e dignidade?) de abrir espaços e mudar a situação
de vítimas e de excluídos para a de voz ativa, a despeito de qualquer situação de confronto
que tenham que lidar (vale lembrar, muitas perdas de vidas e de bens, no lado mais fraco,
ocorrem nessas lutas). Jeanrenaud e Jeanrenaud (1996) concluem que as alianças entre
grupos pró-comunidades locais e ONGs ambientalistas representam uma espécie de
“casamento de conveniência”, mas que ajuda a criar espaços para ambos os grupos, política
e economicamente marginalizados, e que o sucesso da conservação da biodiversidade no
século 21 dependerá de uma mudança de um “passado elitista do conservacionismo” para o
apoio às necessidades e aspirações locais.

Esse cenário de diversos atores e fatores relacionados ao campo de forças sobre as


florestas, denota uma complexidade intrínseca à dinâmica socioambiental, evidenciando
que, nas iniciativas de aliviar a pobreza e conservar as florestas, há um multifacetado jogo
de “perde e ganha” entre os envolvidos, significando que as avaliações sobre o andamento e
os resultados dessas iniciativas não podem deixar de relativizar os aspectos sociais,
econômicos, culturais, políticos, etc., sob uma perspectiva histórica inclusive, no sentido de
evitar conclusões apressadas, tendenciosas, unilaterais e restritas a “simples dicotomias”,
tais como conservação x desenvolvimento, espécies exóticas x nativas, subsistência x
comercialização, ricos x pobres.

No caso dos programas de florestas sociais na Indonésia, enquanto Thompson


(1999) critica a pouca eficiência dos mesmos, “que raramente passam do estágio de
projetos-pilotos”, diante da voracidade das indústrias madeireiras, favorecidas pelos
governos locais, que não demonstram respeito aos direitos dos povos das florestas, Peluso
(1995) e Stockdale e Ambrose (1996) destacam a importância das técnicas de mapeamento
alternativo, ou “contra-mapeamento”, no potencial de empoderamento da população local e
portanto de sua capacidade de reivindicar direitos sobre o território e fazer frente à
135

exploração madeireira e à intervenção do estado. O “contra-mapa” é um dos recursos


utilizados pelas ONGs que conduzem os projetos, onde os moradores da região “alvo”
realizam técnicas de mapeamento participativo, incluindo o uso de sistemas de informação
geográfica (SIGs), passando a representar espacialmente suas concepções de ocupação e
divisão do território, que são certamente diferentes dos mapeamentos florestais oficiais,
onde os habitantes das florestas são excluídos e os ecossistemas são interpretados sob
outras classificações de “recursos naturais” que não aquelas do manejo tradicional local.

No caso analisado por Rocheleau e Ross (1995), na República Dominicana, a


relação do Estado com a população local não difere da que foi vista na Indonésia (e,
certamente, é uma relação comum a diversos países do Sul). Os produtores rurais da região
“alvo” do projeto viam as árvores como “inimigos verdes”, devido a uma condição antiga
de discriminação social por parte do serviço florestal do estado, que, através de
mecanismos regulatórios criados “em nome do verde”, proibiam os pequenos produtores de
cortar árvores, mas concediam permissões aos “grandes” e às elites locais. A ação violenta
e corrupta dos agentes oficiais (com casos relatados de assassinato de camponês por
resistência à ação de suborno e à fiscalização) criou um clima de desconfiança e cinismo
por parte da população local, prejudicando sua adesão ao projeto proposto pela ONG. No
entanto, uma autorização especial negociada entre a ONG e o governo permitiu aos
participantes do projeto o corte das “árvores do projeto”. Embora essa solução tenha
deixado de fora árvores que não são “do projeto”, alguns recorrem às “árvores do projeto”
como uma espécie de “garantia verde”, evitando às vezes de serem presos por limpeza do
terreno e corte de outras árvores. E ainda, no jogo de “perde e ganha”, a existência do
projeto fortaleceu antigas reivindicações pela terra, ao mesmo tempo que acirrou outros
conflitos sociais existentes, tal como a discriminação quanto à participação das mulheres
nas tomadas de decisão sobre espécies e espaços de uso (ver item 2.2.3).

Um caso interessante de ser enfocado nesse contexto de conflitos socioambientais


sobre as florestas, tendo em vista tratar-se de uma situação em um país “do Norte” e não em
um dos “pobres países do Sul”, é o caso de Clayoquot Sound, na costa oeste da Ilha de
Vancouver, Canadá, uma das três regiões do mundo onde ainda existe floresta pluvial
temperada (Canadá, Alaska e Chile). A disputa em torno da preservação ou exploração da
floresta, caracterizada como “o conflito ambiental mais importante dos últimos vinte anos
136

no Canadá” (Rojas, 1997), envolve “confrontações ideológicas” entre ambientalistas,


população indígena, empresas madeireiras e governos, em um longo processo de
negociações que está longe de consolidar os direitos exclusivos dos nativos, historicamente
reivindicados, de posse e uso do território. A exploração madeireira, iniciada em 1955, a
partir de uma concessão do governo, foi “negociada” em 1997, na forma de uma nova
“Joint Venture” entre empresa madeireira e comunidades indígenas (que controlam 51% da
corporação) onde a exploração (realizada a “corte raso”) está limitada a 40 mil metros
cúbicos por ano. No início do ano 2000, a UNESCO designou à região a categoria de
Reserva da Biosfera, o que “não muda o tipo de desenvolvimento, atividade madeireira,
mineração ou pesca que tem ocorrido em Clayoquot, mas dá algum incentivo moral e
financeiro para desenvolver práticas sustentáveis na região” (ENS, 2000). Ou seja, provê
algum capital simbólico para os povos nativos da região, que parecem ter tantas
dificuldades em sua luta por direitos quanto os nativos de regiões de florestas tropicais dos
países do Sul.

O aspecto cultural tem sido um importante instrumento das lutas por direitos sociais
e ambientais de povos indígenas. Conforme Acselrad (2000), os fatos culturais são parte do
processo de construção do mundo, dando-lhes sentidos e ordenamentos, comandando atos e
práticas diversas a partir de categorias mentais, esquemas de percepção e representações
coletivas diferenciadas.” Moore (1996), referido às idéias de Gramsci, destaca que: “Os
padrões históricos de acesso e de exclusão aos recursos moldam entendimentos culturais
sobre direitos, relações de propriedade e titulação. (...) As lutas por terra e por recursos
ambientais são simultaneamente lutas por significados culturais. Por sua vez, esses
significados competitivos influenciam o uso da terra e dos recursos.”

No entanto, Pulido (1996), discutindo o processo pelo qual um grupo hispânico do


Novo México (os Ganados del Valle) utilizou argumentos culturalistas para obter
legitimidade ecológica, coloca ‘duas faces da mesma moeda’. Ou seja: ao mesmo tempo em
que tais argumentos promoveram meios para desafiar certas instituições e práticas que eram
de outro modo inatacáveis, tais como a propriedade privada (“um subtexto para as
reivindicações de Ganados era a afirmação da propriedade comunal da terra”), a autora
alerta quanto aos riscos de essencialismo cultural no que caracteriza como busca de
legitimidade ecológica através de “heranças culturais romantizadas”. Por um lado, o
137

culturalismo “oferece uma estrutura discursiva contra-hegemônica que é essencial para o


sucesso de qualquer luta oposicional e caminho alternativo de desenvolvimento”. Por outro
lado, “o essencialismo cultural pode obscurecer as dinâmicas de poder dominante, como
lutas entre ricos e pobres, entre proprietários e arrendatários, reificando assim as diferenças
culturais.” Segundo a autora, em vez de examinar como e porque as várias constelações de
riqueza e poder resultam em diferentes práticas ambientais, o essencialismo cultural tende a
ver variações nas práticas ambientais como originadas em diferenças étnicas ou culturais.

Por fim, é interessante observar a questão do seqüestro de carbono nessa


complexidade intrínseca ao campo de forças sobre árvores/florestas. Nos encontramos hoje
diante de uma situação que, para alguns, vem se configurando como mais uma estratégia de
grupos que detêm maior capital simbólico para manter seus ganhos e repassar os prejuízos
aos menos capitalizados, tendo em vista que os mais ricos, industrializados, responsáveis
pelas maiores emissões de CO2 (principal gás do efeito estufa) na atmosfera estão tentando
atenuar ou “se livrar” da responsabilidade de reduzir as emissões (conforme determinado
no Protocolo de Kyoto), através de investimentos em plantios florestais (sumidouros de
carbono) nos países do Sul, como uma espécie de compensação pelas emissões, parte do
chamado Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), criado pelo Protocolo. Além de
não haver bases científicas confiáveis para se garantir que as plantações vão funcionar de
fato como “sumidouros” de carbono, há uma tendência a usar esse argumento para a
expansão de monoculturas em larga escala de espécies como eucalipto e pinus (que, pelo
seu rápido crescimento, fixariam carbono em menor tempo), em muitos casos substituindo
as florestas naturais, favorecendo o setor industrial, de papel e celulose principalmente.
Além disso, indústrias que, através dos investimentos nos plantios, adquiram bônus no
“mercado de carbono” que permitam manter ou reduzir parcialmente suas emissões tóxicas,
continuariam causando impactos sociais e ambientais no raio de influência de sua planta
(Lohmann, 2000).

Os impactos sociais e ambientais das monoculturas em larga escala de eucaliptos e


pinus já vêm causando polêmicas há alguns anos e as empresas plantadoras têm sido alvo
de críticas e protestos de organizações ambientalistas e sociais em várias partes do mundo.
O Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais (World Rainforest Movement - WRM),
por exemplo, é uma organização não-governamental que coordena uma forte campanha
138

contra as referidas plantações arbóreas. Entre as principais críticas feitas ao setor de


celulose e papel, está a grande quantidade de subsídios que as empresas recebem dos
governos para se instalar. Segundo Carrere e Lohmann (1996), sem subvenções, créditos
baratos e outros subsídios, as indústrias de celulose e as plantações que as abastecem nunca
poderiam ser colocadas em produção. O tempo relativamente longo de crescimento das
plantações arbóreas “explica” grande parte desse investimento (temporalidade econômica
versus temporalidade ecológica).

Por outro lado, a oportunidade de realizar projetos de produção/conservação


florestal com recursos designados para seqüestro de carbono tem sido vista com grande
expectativa por muitas instituições e grupos sociais interessados na conservação das
florestas tropicais e no manejo florestal sustentado, acreditando que sob esse “guarda-
chuva” as possibilidades de redução dos desmatamentos e de recuperação de áreas
degradadas poderão aumentar, servindo inclusive como um meio de estimular o uso de
produtos madeireiros de vida longa (mais de 25 anos) para móveis e material de construção
(Klink e Moreira, 2000). O uso que se fará de técnicas, de políticas e de mecanismos legais
e econômicos para esse fim dependerá muito das relações de poder entre os interessados.

É, portanto, esse contexto - onde árvores e florestas são recursos essenciais e objetos
de interesses conflitantes e onde os investimentos necessários para gerar/manter uma
produção contínua de produtos florestais, na temporalidade do sistema capitalista, são
elevados o suficiente para dificultar um equilíbrio de forças no campo das disputas por terra
e recursos florestais, o que fortalece o poder dos que já detêm maior capital simbólico
(principalmente capital econômico e político) – é esse contexto que precisa ser considerado
ao se tentar compreender o que significam e como interagem os diversos interesses atuais
sobre florestas e árvores, especialmente nos países do Sul, onde se concentra a maior parte
do que ainda resta de florestas naturais e de povos da floresta, para os quais o capital
simbólico ainda está muito aquém do necessário no campo de forças das tomadas de
decisão sobre ´de quem’ são as florestas e ‘para quem’ vão os recursos.
139

3.4 Perspectivas para Florestas Sociais

Diante desse campo de forças sobre as florestas, se coloca a questão-título desta


dissertação: Até que ponto as iniciativas de pesquisa & desenvolvimento em florestas
sociais poderiam “responder” à velocidade de destruição das florestas tropicais?
Certamente, na medida em que essas iniciativas possam “responder” às causas dessa
destruição, contribuindo para eliminá-las ou reduzir seus efeitos.

Como já visto, há uma tendência a se caracterizar a pobreza como causa principal da


destruição das florestas tropicais. Nessa concepção, deveríamos então crer que o problema
esteja sendo enfrentado em seu cerne e que a solução esteja naturalmente encaminhada (a,
pelo menos, duas décadas), na medida em que as iniciativas em florestas sociais têm a
população rural pobre como alvo e a sustentabilidade do manejo florestal como diretriz
básica. Isto era o que acreditava a FAO e outras instituições pioneiras nas iniciativas. Mas,
o que as avaliações do andamento desses projetos têm revelado é que muitos fatores que
levam populações rurais à condição de pobreza e, muitas vezes, a exercer pressão sobre os
recursos naturais, têm demonstrado ser muito mais preponderantes não só como causas da
destruição das florestas, mas igualmente como fatores de entrave ao sucesso das iniciativas
em florestas sociais. Destacam-se, entre esses fatores, aqueles relativos às estruturas de
governo que favorecem a determinados interesses comerciais, do mercado internacional
principalmente, em detrimento das necessidades das populações pobres, especialmente no
que tange aos direitos legais sobre as terras florestadas e sobre os produtos das florestas.

A irrefutável importância da atuação dos governos nacionais e locais permeia


grande parte da discussão sobre o problema da destruição das florestas e sobre o andamento
dos projetos em florestas sociais. Resguardadas as peculiaridades culturais e sociais de cada
país, observa-se um processo histórico comum a muitas regiões de florestas tropicais, onde
o papel dos governos é questão central. Esse processo pode ser caracterizado por três
períodos principais, tal como descreve Sanyang (1999): um “passado distante”, um
“passado não tão distante” e o “presente”. O “passado distante” refere-se à época em que
“as florestas eram protegidas culturalmente”, ou seja, quando as comunidades gerenciavam
os recursos florestais segundo seus regimes de manejo da propriedade comum, onde havia
regras culturalmente estabelecidas de “posse”, direitos de uso e poderes de decisão sobre as
140

atividades de manejo e a distribuição dos recursos, que levavam em conta o benefício


coletivo24. O “passado não tão distante”, que geralmente corresponde ao período colonial
em diante, caracteriza-se pela forte intervenção do Estado sobre as áreas de florestas,
impondo condições, normas e força policial inclusive, favorecendo à exploração econômica
por agentes externos, o que não só alijou as populações de seus habitats e dos processos de
decisão sobre o uso dos recursos, como, em muitos casos, colocou-as como mão-de-obra
barata ou escrava, quando não expulsou-as de seus territórios tradicionais25. A rápida
degradação das florestas e as injustiças e graves problemas sociais e ambientais resultantes
dessa intervenção têm encontrado nos últimos anos – no “presente” – reações e
mobilizações locais e internacionais em favor de governos verdadeiramente democráticos e
de medidas de redução da pobreza e de controle dos desmatamentos.

De certo modo, esses três períodos históricos se sobrepõem no mundo e há regiões


que ainda se encontram como “guetos” de um “passado distante” e outras onde ainda
prevalece um Estado autoritário, intervencionista e a serviço de interesses econômicos
minoritários, acima do bem estar da população. Entre as regiões de florestas tropicais que
estão vivendo um presente de forte mobilização por melhores condições socioambientais,
situa-se o Gâmbia, na África, onde mudanças significativas na relação governo-população
estão ocorrendo em favor do manejo florestal comunitário e são reveladas em relatos como
o de Sanyang (1999) e outros que participaram do Workshop sobre Florestas Sociais na
África, realizado naquele país. Sonko e Camara (1999) afirmam que a experiência no
Gâmbia tem demonstrado que os desafios do manejo florestal sustentável podem ser
alcançados se o governo tiver a vontade de “empoderar” a população rural, tornando-a
proprietária de suas florestas. Segundo esses autores, nos últimos 10 anos, a mobilização
em prol do manejo florestal comunitário levou a uma revisão das estruturas institucionais
do país, culminando em uma nova política florestal e uma nova legislação, que passaram a
incorporar as possibilidades de participação social nas florestas do Estado. Seguindo um
procedimento em três fases, a comunidade passa, ao final do processo, a ser proprietária da

24
Sanyang (1999) exemplifica esse passado distante com a prática de queima da vegetação rasteira, que só era
realizada alguns dias antes da estação chuvosa e após comunicar previamente os vizinhos e tomar as medidas
necessárias para proteção da floresta em torno da área a ser queimada.
25
O que também inclui a expulsão de áreas destinadas pelos governos para a proteção ambiental (como
Parques, Reservas, etc.), no contexto das visões de vazio selvagem, discutidas anteriormente neste capítulo.
141

área requerida para manejo, contando com ajuda técnica do governo e apoio da GTZ. Em
1991, havia apenas três vilarejos envolvidos no manejo florestal comunitário, em uma área
de 563 ha. Em 1999, já eram 450 vilarejos envolvidos, cobrindo uma área de 18.400 ha.
Esse resultado em área ainda é modesto em relação à área total de florestas do país
(representa menos de 5%), mas significa um grande salto no interesse das comunidades e
na mudança de atitude do governo em relação à descentralização de poder sobre as áreas
florestadas, o que pode sinalizar um futuro promissor para outras áreas do país.

Não é comum encontrar na bibliografia sobre florestas sociais dados quantitativos


de área manejada e produção obtida. E, do que existe de florestas nos países tropicais,
pouco se pode registrar de área com uso/manejo sustentável, de modo comunitário ou não.
Segundo Salleh (1997), menos de um décimo das florestas tropicais estão sendo manejados
em “bases sustentáveis”, o que para o autor significa “manejar a floresta de modo a não
reduzir irreversivelmente o seu potencial para produzir todos os produtos colhidos
regularmente”. Na apresentação dos resultados das iniciativas em florestas sociais, os
autores têm dado mais ênfase às mudanças estruturais, legais e sociais, em termos de
participação e organização comunitária e melhorias nas condições de acesso aos recursos,
do que a resultados quantitativos, como área manejada ou produção florestal. Além disso,
resultados quantitativos, que ainda são modestos em relação à demanda de produtos
florestais locais, não expressam uma condição comum de contextos, escopos e métodos de
desenvolvimento dos projetos, que podem apresentar nuances e particularidades muito
distintas e resultados sociais, econômicos e ambientais de difícil comparação entre si.
Sonko e Camara (1999) destacam que o manejo florestal comunitário não deveria ser
avaliado em termos de compensação material ou monetária de curto-prazo, mas sim pelo
desenvolvimento de um genuíno senso de propriedade. Segundo os autores, no Gâmbia, “o
senso de propriedade dos participantes tem criado uma relação verdadeiramente forte entre
os habitantes e suas florestas” (talvez como um resgate do “passado distante”).

Embora ainda sejam numericamente modestas, acredita-se no potencial


transformador das iniciativas em florestas sociais sobre os modos de uso e manejo das
florestas tropicais. Em outro Workshop, realizado para avaliar o andamento das iniciativas
em community forestry na Região Ásia-Pacífico, destaca-se o crescente interesse nessas
iniciativas e as perspectivas que estão surgindo de capacidade de mobilização e organização
142

social para que as comunidades exerçam de fato o controle sobre as florestas e recebam os
benefícios do manejo de seus recursos (Veer et al., 1997). Na medida em que essas
comunidades identifiquem no manejo sustentado dos recursos florestais a melhor forma de
garantir sobrevivência e autonomia frente às pressões da economia de mercado, maiores
serão as chances de que as florestas sejam protegidas da exploração predatória. Sonko e
Camara (1999) consideram que o manejo florestal comunitário é “a chave” para a proteção
e a utilização racional das florestas.

No caso do nosso país, “campeão” mundial em destruição de florestas tropicais,


Amaral e Amaral Neto (2000) acreditam que a proliferação de iniciativas de manejo
florestal comunitário em pontos estratégicos da Amazônia pode ter efeito “catalisador” para
mudança das práticas atuais de exploração dos recursos florestais, o que, vislumbram os
autores, seria bastante promissor para as expectativas de redução da elevada taxa anual de
desmatamento na Amazônia.

Segundo Carter (1999), existem evidências suficientes para indicar que as


abordagens em florestas sociais (ou Manejo Florestal Colaborativo, conforme classifica a
autora) podem resultar na melhoria das funções dos ecossistemas e na qualidade e
quantidade de florestas e produtos florestais. Carter acredita que “garantir que a população
local esteja informada de seus direitos ou apoiá-la em seus esforços para obter a
propriedade ou direitos de usufruto da floresta legalmente reconhecidos pode ser um
primeiro passo importante nas abordagens em florestas sociais.” As palavras de abertura
dos Anais do Workshop realizado no Gâmbia, em 1999, corroboram com tais convicções:

Experiências em vários países têm demonstrado que, quando as comunidades têm


responsabilidades e direitos sobre o manejo dos recursos florestais e recebem os
benefícios advindos desses recursos, as taxas de degradação são substancialmente
reduzidas e em muitos casos a cobertura florestal melhora visivelmente. (Danso,
Reeb e Warner, 1999: iii).

As considerações feitas pelos pesquisadores consultados via e-mail também indicam


que há potencial para que as iniciativas em florestas sociais contribuam para reduzir as
taxas de desmatamento, desde que em conjunto com outras iniciativas que tratem das
questões relativas à posse da terra, às “falhas” do mercado, à corrupção no setor florestal, à
143

má gestão dos governos, entre outras causas subjacentes aos desmatamentos e que afetam
os meios de empoderamento da população local. Os pesquisadores consultados destacaram
três questões principais para que as iniciativas em florestas sociais sejam bem sucedidas: a)
direitos formais de uso e propriedade; b) apoio do Estado e c) participação efetiva da
população local; questões consideradas ainda pouco desenvolvidas, apesar dos ganhos.

A questão da posse da terra ou da garantia legal de direitos de uso da floresta parece


ser a mais forte e decisiva para o desenvolvimento das iniciativas em florestas sociais.
Robert Chambers (comunicação via e-mail), que trabalha com metodologias de diagnóstico
participativo, acredita que a questão dos direitos de usufruto da terra é a mais crítica para o
sucesso dos projetos em florestas sociais. Marilyn Hoskins (comunicação via e-mail) cita
exemplos de alguns ganhos importantes nesse sentido: na Indonésia, políticas foram
modificadas de modo a dar direitos de posse da terra às pessoas que possam demonstrar que
suas práticas agroflorestais tradicionais são sustentáveis; na Bolívia, uma comunidade
indígena participou de atividades de pesquisa que documentaram seus usos da terra e
puderam tomar vantagem de uma lei existente – foi a primeira comunidade indígena do país
a obter a propriedade de seus territórios florestais tradicionais; nas Filipinas têm ocorrido
grandes melhorias nas condições legais para os povos que dependem das florestas, através
de esforços de projetos em florestas sociais e apoio de ONGs. M. Hoskins comenta ainda
que há muitos exemplos de mobilização de grupos comunitários em vários países (inclusive
no Brasil) que, se estão organizados e têm redes e alianças poderosas o suficiente (o que
significa dizer: se adquirem capital simbólico), podem criar o potencial para a
governabilidade local e os benefícios relacionados às florestas.

Uma dos aspectos relativos às iniciativas em florestas sociais que pode contribuir
para “fazer frente” ao processo de destruição das florestas tropicais diz respeito à mudança
de enfoque sobre as condições socioambientais das áreas “alvo” dos projetos. Carter (1999)
cita que o foco das atividades em florestas sociais tem se movido de uma assistência à
população local em programas de plantio de árvores (normalmente baseada em uma
concepção paternalista, tal como a necessidade de ensinar às pessoas a plantar árvores),
para um apoio mais colaborativo ao manejo sustentável das florestas naturais, com uma
ênfase mais voltada para os usos múltiplos dos recursos madeireiros e não madeireiros do
que na proteção ou regeneração da floresta, inclusive porque pode ser mais fácil obter renda
144

a partir de ambientes ainda florestados e que podem ser manejados nesse sentido do que de
plantações em áreas desflorestadas e degradadas. No entanto, essa abordagem implica em
lidar com pelo menos uma questão crucial em relação ao mercado: o risco da inserção das
comunidades das florestas na economia de mercado, especialmente diante das pressões da
exploração predatória de madeira.

A inserção de comunidades tradicionais das florestas na economia de mercado


parece ser um rumo sem volta, na medida em que a sociedade envolvente se aproxima das
áreas manejadas por essas comunidades, trazendo junto seus valores e seu capital simbólico
hegemônico. A mobilização consciente dos setores da sociedade voltados para a defesa das
florestas e dos povos que tradicionalmente as habitam busca amenizar os impactos das
pressões de uma economia de mercado predatória, através de estudos e propostas de um
manejo de usos múltiplos capaz de gerar renda e manter a cultura dos povos das florestas,
bem como o equilíbrio ecológico. Por enquanto, no entanto, é difícil (ou impossível)
afirmar que essas iniciativas trarão o retorno esperado. E há quem as considere danosas
para as culturas que ainda se baseiam nos regimes de manejo comunitário, como Rodrigo
Arce (comunicação via e-mail):

“Forçar as comunidades locais a ingressar na economia de mercado cria uma


grande tensão. Muitos megaprojetos florestais têm fracassado porque não entendem
a economia do dom que muitas comunidades têm manejado, ainda que existam
resquícios deste mecanismo de redistribuição e reciprocidade. Consciente (ou
inconscientemente?) muitas instituições nacionais e internacionais cumprem um
papel de consolidação da economia de mercado e conceitos como propriedade e
rivalidade vão ganhando mais força e destruindo sistemas de manejo de florestas
que não necessariamente se articulam com o mercado.”

Esse movimento direcionado para os povos das florestas demanda, portanto, a


necessidade de maior atenção e conhecimento sobre os regimes de manejo da propriedade
comum e do estabelecimento de meios institucionais que possam garantir essa condição. O
caso das Reservas Extrativistas (Resex) na Amazônia é muito citado na literatura como
exemplo de solução legal encontrada para garantir o manejo comunitário da floresta e,
portanto, a sustentabilidade desse manejo e a manutenção da floresta. No entanto, não basta
reconhecer direitos de uso e estabelecer categorias legais. É preciso criar os instrumentos
145

para garantir as condições de sustentabilidade sócio-econômica e ambiental no processo de


manejo da floresta para consumo próprio e/ou para comercialização dos produtos.

Com o reconhecimento legal das áreas de manejo comunitário e outras medidas


normativas e estruturais para garantir sustentabilidade do manejo e mercado “justo” aos
produtos obtidos pelas comunidades, talvez seja possível amenizar, ou até eliminar em
alguns casos, as ameaças dos interesses econômicos “poderosos” e devastadores das
florestas. Conforme palavras de Mark Poffenberger (comunicação via e-mail), “a mais
desanimadora realidade é que, na medida em que as florestas detenham alto valor
comercial, mais elementos poderosos na sociedade (especialmente nos países em
desenvolvimento, onde a sociedade civil tem menos influência política) são motivados a
explorar esse valor comercial.” É o que se verifica, por exemplo, na questão da exploração
madeireira na Amazônia, principalmente nas áreas de ocorrência de mogno. Madeireiros
inescrupulosos, agindo ilegalmente, facilmente seduzem índios e outros habitantes das
florestas a vender-lhes a madeira existente nas suas florestas. Estes, por falta de alternativas
para obter o dinheiro que precisam para algumas necessidades básicas já incorporadas ao
seu modo de vida, acabam por ceder às pressões dos exploradores. A inoperância dos
governos e a ação corrupta de “elementos poderosos” contribui para a continuidade dessas
situações. Mark Poffenberger, no entanto, destaca que a mobilização social contra esse
sistema está trazendo resultados positivos, como na Tailândia e nas Filipinas, no Sudeste da
Ásia (sua área de atuação), onde essa mobilização tem forçado os governos a impor
proibições à exploração madeireira ou ao menos a reduzir as taxas de extração comercial.

Todas as opiniões, observações e análises verificadas na literatura e nas


comunicações via e-mail dos pesquisadores consultados para essa dissertação conduzem a
uma conclusão básica com relação às perspectivas das iniciativas em florestas sociais,
frente ao processo de destruição das florestas tropicais. Tendo como “pano de fundo” a
visão sistêmica defendida por Alavalapati e Gill (1991), em sua análise conceitual e teórica
sobre social forestry, conclui-se que o sucesso dessas iniciativas depende de um conjunto
de ações bem planejadas, de cunho técnico, institucional e sócio-econômico, interagindo de
acordo com as condições ambientais, sociais e políticas específicas de cada área “alvo” dos
projetos. Ou seja, esforços concentrados em aspectos isolados, que não levam em conta a
complexidade de fatores em que estão inseridos, têm pouca ou nenhuma chance de dar
146

certo. Na prática, poucas serão as possibilidades de sucesso de algum projeto de floresta


social que considere somente aspectos técnicos e gerenciais do manejo, sem considerar
fatores sociais determinantes, tais como as relações internas e externas da comunidade
“alvo” (como seus membros se relacionam entre si, com o ambiente e com os demais
atores?), o modo como recebem e participam da iniciativa, as condições relativas aos
direitos de uso e propriedade da terra e dos recursos florestais, as pressões do mercado
sobre o ambiente e sobre os recursos de interesse da comunidade e as estruturas de governo
que dizem respeito ao setor florestal.

Dentro de uma visão sistêmica do contexto em que se insere uma iniciativa em


floresta social, o peso dado pelas relações de poder entre os atores deste contexto é fator
determinante sobre o desenvolvimento da iniciativa26. E o sucesso dependerá de uma clara
compreensão, por parte daqueles diretamente envolvidos na elaboração e execução do
projeto, sobre a dinâmica das relações e o capital simbólico de cada um desses atores no
campo de forças sobre os recursos florestais, e como essa dinâmica afeta as condições
ambientais, sociais e econômicas relativas ao projeto, especialmente em áreas de florestas
com grande valor comercial. Conforme discutido no item 2.2.1, essa questão implica em
profundas mudanças de atitude e formas de ver o mundo dos profissionais envolvidos no
projeto, no sentido de promover a consolidação de processos de descentralização,
democratização e participação efetiva dos “excluídos” e “despossuídos” no planejamento e
na execução do projeto.

Ainda considerando a visão sistêmica e o campo de forças, a possibilidade de que


iniciativas em florestas sociais “respondam” à destruição das florestas tropicais, dependerá
também do processo de mobilização de grupos sociais organizados e de representantes de
setores estratégicos da sociedade (como políticos e técnicos tomadores de decisão sobre
políticas públicas para o setor florestal) voltados para o tratamento das questões relativas ao
declínio das florestas tropicais e à sustentabilidade do manejo florestal. Se inserem, nesse

26
Considerando, entre esses atores, aqueles diretamente envolvidos no projeto - a população local, os técnicos
do governo, os técnicos de agências de desenvolvimento, os pesquisadores e empreendedores de instituições
governamentais ou não-governamentais - e aqueles envolvidos nos interesses de mercado sobre as florestas –
madeireiros, fazendeiros, mineradores, governantes, políticos, etc.
147

aspecto, as alianças entre organizações ambientalistas e movimentos sociais e suas


participações na elaboração e implementação de políticas florestais internacionais (ver item
1.3) ou locais. Essa mobilização tem potencial para forçar mudanças legais e estruturais que
contribuam tanto para a conservação das florestas como para o manejo florestal social ou
comunitário.

O debate atual sobre desenvolvimento sustentável, a atenção mundial sobre a


situação das florestas tropicais e o “estado da arte” das iniciativas em florestas sociais
indicam que a principal questão em cena diz respeito ao “caráter” do setor florestal que se
configura nesta virada de milênio, considerando a dinâmica evolutiva dos “modelos”
dominantes de desenvolvimento da sociedade. Conforme descreve Hobley (1996), o setor
florestal, como um seguidor das estratégias de desenvolvimento, sempre “vagou atrás das
mudanças de humor das políticas de desenvolvimento”. Nos anos 1960, essas políticas,
definidas e apoiadas pelo Banco Mundial e agências de ajuda aos países “sub-
desenvolvidos”, como a FAO e o PNUD, se voltaram pesadamente para a industrialização e
o setor florestal foi amplamente envolvido nessa direção, com aumento da extração de
madeira em matas nativas e com a expansão dos plantios de eucaliptos e outras
monoculturas, para atender às demandas de carvão e celulose das indústrias. No final dos
anos 1970, os “apoiadores” do desenvolvimento foram levados a perceber e admitir que as
políticas de industrialização e modernização no setor florestal estavam promovendo muito
pouco desenvolvimento sócio-econômico nos países mais “pobres e sub-desenvolvidos”.

Diante de um crescente processo de degradação das florestas e de empobrecimento


das populações rurais nos países tropicais, tomados de assalto pelo modelo de
desenvolvimento industrial dos países do Norte, que demanda grandes quantidades de
recursos naturais, as agências de desenvolvimento resolveram então mudar o enfoque de
sua política florestal na “missão” de ajuda aos países do Sul. Foi quando Jack Westoby,
antes um defensor da política de industrialização florestal para esses países, se manifestou
desapontado com os resultados dessa política e “elucidou um novo papel social para a
ciência florestal, uma forma de manejo florestal que se tornou conhecida como social
forestry” (Hobley, 1996: 5).
148

Mas, ainda que as agências multilaterais de desenvolvimento (pressionadas ou não


por ONGs ambientalistas), tenham feito uma espécie de “mea-culpa” pelos males sociais e
ambientais causados aos países do Sul (como fez o Banco Mundial, ao reduzir os
financiamentos para o setor florestal brasileiro, após as críticas às políticas de colonização
da Amazônia que resultaram em grandes desmatamentos), o modelo industrial de
desenvolvimento abriu caminho para as atividades de exploração predatória das florestas
tropicais e ajudou a formar, nos países em desenvolvimento, uma ciência florestal
fortemente direcionada para os interesses do “grande capital”, em detrimento de populações
rurais, muitas vezes excluídas do acesso aos recursos florestais e prejudicadas em suas
formas tradicionais de uso e manejo desses recursos para o sustento doméstico.

Portanto, o que está em cena nesta virada de milênio para o setor florestal nos países
tropicais é o questionamento e a demanda por revisão das estruturas institucionais, das
políticas públicas, da legislação e, fundamentalmente, do papel dos profissionais desse
setor, em um momento histórico que reclama por eqüidade social e sustentabilidade
ambiental. Lembrando Paulo Freire, “a quem sirvo com a minha ciência?” é a pergunta
que cabe a esses profissionais em todos os campos de ação da ciência florestal e é parte de
uma necessidade global inerente às evidências de insustentabilidade do modelo dominante
de desenvolvimento. Conforme alerta Pádua (1999), “o que se faz necessário é superar a
ideologia convencional do desenvolvimento em favor de um debate ético-político sobre o
desenvolvimento enquanto direito das sociedades à melhoria das suas condições de vida em
um contexto de eqüidade e sustentabilidade planetárias.”

Nas conclusões sobre as apresentações e discussões realizadas na Tailândia (Veer et


al., 1997) a necessidade de uma nova profissão e a disputa pelos recursos florestais foram
consideradas duas questões subjacentes à temática do Seminário. Um dos palestrantes (Jeff
Campbell) afirmou que o desenvolvimento de florestas sociais requer a emergência de uma
nova profissão, equipada com novas disciplinas e um corpo organizado de conhecimento.
Para Marilyn Hoskins, outra palestrante, discutindo o problema da descentralização de
poder do Estado sobre as florestas, a questão que surge é “o quanto disso envolve uma
mudança de paradigma por parte dos florestais, rumo a um aumento de confiança na
capacidade das comunidades para manejar sustentavelmente os recursos, e o quanto de
interesse investido permanecerá como uma barreira a essa mudança”.
149

Enfim, a certeza maior que há sobre as perspectivas para as iniciativas em florestas


sociais, frente à destruição das florestas tropicais (e toda a complexidade histórica das
causas dessa destruição), é que este campo de p&d ainda é novo e, embora os resultados
obtidos apontem grande potencial de realização, as experiências em curso são muito
recentes para se obter avaliações definitivas sobre sucesso ou fracasso. Assim como as
árvores precisam de tempo para se desenvolver plenamente, essas experiências e as pessoas
envolvidas nelas precisam de um tempo “sem pressa” de maturação de idéias, conceitos,
experimentações, interações sociais, técnicas e políticas, etc.. Talvez o tempo ideal para
essa maturação seja maior do que a velocidade de destruição das florestas tropicais possa
permitir de disponibilidade de florestas e de mobilização dos empreendedores neste campo.
Mas parece ser somente assim, respeitando a sua temporalidade, que essas iniciativas
poderão demonstrar e realizar plenamente todo o seu potencial de contribuição para a
sustentabilidade das florestas, em todos os sentidos.
150

SÍNTESE

O desenvolvimento das civilizações, baseado na utilização da madeira e na


conversão das terras florestadas em outras paisagens, resultou em significativa redução de
florestas no mundo. Muitos historiadores especulam que o Homo sapiens pode ter causado
alterações em grande escala nos ecossistemas antes mesmo da invenção da agricultura,
especialmente pelo uso do fogo nas antigas sociedades de caçadores-coletores, podendo
inclusive ter levado à extinção espécies de grandes mamíferos, como mamutes,
mastodontes e grandes preguiças rasteiras.

As estimativas mais recentes indicam que metade da cobertura florestal original do


planeta (período pré-agrícola) já está perdida e grande parte foi destruídas nas três últimas
décadas. Da cobertura florestal atual, menos da metade (40%) encontra-se em melhor
estado de conservação – são as fronteiras florestais – grande parte habitada por povos da
floresta (comunidades indígenas e outras populações tradicionais, como seringueiros e
ribeirinhos da Amazônia). Quase 70% das fronteiras florestais remanescentes no mundo
situam-se em três países – Rússia, Canadá e Brasil – mais da metade em regiões boreais,
entre a tundra e a floresta temperada.

A maior parte das florestas remanescentes do planeta está degradada em sua


estrutura e composição de espécies pelas atividades humanas, principalmente pela
exploração madeireira, principal ameaça às últimas fronteiras florestais. As florestas
tropicais vêm sofrendo as mais drásticas reduções, com taxas anuais de desmatamento sem
precedentes. De acordo com dados da FAO, estima-se que, a cada minuto, 30 hectares de
florestas tropicais são destruídos no mundo. O Brasil é o país que tem apresentado as
maiores taxas de redução da cobertura florestal nas últimas duas décadas: entre 1980-1990
foram perdidos, em média, 36.700 km²/ano, caindo para 22.300 km²/ano no período 1990-
2000, mas ainda superior aos demais países. Cerca de 80% da taxa anual de desmatamento
(corte raso da floresta) no país foram registrados oficialmente na Amazônia Legal – 17 mil
km²/ano. Mas, os danos reais à Floresta Amazônica são ainda maiores: estudos sobre os
151

impactos da exploração madeireira na Amazônia (o que inclui abertura de estradas,


clareiras, redução de umidade no sub-bosque facilitando queimadas, etc.) indicam que a
extensão de área de floresta degradada por essa atividade é da ordem de 10 – 15 mil
km²/ano.

A exploração madeireira em florestas tropicais destruiu grandes áreas de fronteiras


florestais no Sudeste da Ásia, especialmente na Indonésia (terceiro país com maior taxa de
desmatamento. depois do Brasil e da Índia) e na Malásia. Grandes empresas madeireiras
que atuaram na Ásia estão ocupando agora imensas áreas da Amazônia. Em todas as
regiões onde as madeireiras atuam, grande parte da exploração é ilegal, predatória e abre
caminho para a ocupação agropecuária, que acaba o “serviço” de destruição da floresta. Os
povos da floresta são expulsos de seus territórios tradicionalmente manejados e os governos
são incapazes de controlar a atividade, omissos ou coniventes. A corrupção nos sistemas de
administração pública do setor florestal é um dos fatores agravantes do desmatamento em
vários países tropicais.

Grande parte do uso predatório e do mau gerenciamento das florestas está


relacionada a visões simbólicas, historicamente construídas nas sociedades civilizadas,
sobre árvores e florestas. À medida que cidades e campos de cultivo e pastoreio crescem, as
visões de ambiente selvagem, inóspito, hostil e perigoso sobre as florestas “virgens” tomam
conta do imaginário social. Ao mesmo tempo, o apartar-se da Natureza em ambientes
humanizados e seguros formou visões idílicas, romantizadas e paradisíacas sobre as
florestas e especialmente sobre os bosques e as árvores cultivadas nos campos próximos às
cidades. O medo do ambiente selvagem pôde ser controlado e o acesso seguro por boas
estradas, garantindo o retorno fácil ao conforto da cidade, passou a permitir passeios
românticos e poéticos em “contato com a Natureza”.

Porém, mais que tudo, essas visões simbólicas representam relações sociais de
disputa pelo uso das terras e dos valiosos recursos florestais. O modelo civilizatório se
desenvolveu ‘vendo’ as florestas naturais (especialmente as do Novo Mundo) como fonte
inesgotável de recursos (o eldorado) e como fonte de ‘deleite espiritual’ (o paraíso
perdido). Ambas as visões excluem os naturais habitantes das florestas. As populações
‘selvagens’, os pobres, marginalizados e excluídos do convívio e dos desfrutes nas áreas
152

urbanizadas viviam e ainda vivem isolados, dentro ou próximo das florestas, e sem direitos
reconhecidos sobre os territórios florestados, de onde o mundo civilizado sempre extraiu
madeira para aquecimento, construções, fornos industriais e outras demandas de um
crescente consumo de recursos naturais (a madeira sempre esteve presente na base de
sustento das civilizações e foi o principal combustível utilizado desde a Idade do Bronze até
a “recente” descoberta dos combustíveis fósseis e do carvão mineral).

Grande parte das populações rurais dos países “em desenvolvimento” depende da
lenha extraída das florestas para seu consumo doméstico, bem como depende das práticas
de cultivo agrícola denominadas itinerantes ou de corte-e-queima, onde pequenas áreas de
floresta (0,5 a 3,0 ha) são cortadas, queimadas e cultivadas com milho, mandioca, feijão,
etc. Após 2-3 anos de cultivo, a área é deixada em pousio para que a floresta cresça
novamente, recuperando a vitalidade do ecossistema e mantendo a possibilidade da área
voltar a ser cultivada. O processo de regeneração da floresta nessa área de pousio pode ser
relativamente conduzido pela comunidade, na medida em que a capoeira que vai se
formando pode ser ainda utilizada por muitos anos, com espécies frutíferas, apícolas e
também madeireiras (para construção de casas, embarcações, instrumentos vários, etc.). A
intensidade de uso e manejo dessas áreas depende de muitos aspectos ambientais, culturais
e sociais da dinâmica de ocupação e migração dos povos das florestas. Muitos estudos
etnobotânicos vêm registrando essas práticas em comunidades indígenas de várias partes do
mundo.

Com o avanço das atividades do “mundo civilizado” sobre as fronteiras florestais,


essa dinâmica social e os regimes de manejo comunitário da floresta vêm sendo
profundamente afetados. Ao que parece, esse processo de confronto entre “civilizados” e
“primitivos” vem se dando há centenas de anos (ou milênios?), com os primeiros vencendo,
mais cedo ou mais tarde, os segundos. Estes, quando não exterminados (como nos grandes
massacres e genocídios praticados nas migrações européias para as Américas a partir do
século XV), são incorporados à maioria de excluídos do, social e ambientalmente injusto,
modelo consumista do mundo civilizado.

A violência simbólica contida nas visões da floresta como paraíso perdido e


eldorado evidencia-se em duas condutas principais em relação aos ambientes de florestas
153

tropicais, que reproduzem as atitudes históricas de não reconhecimento e de exclusão dos


povos da floresta e seus regimes de manejo comunal. Ambas as visões compartilham da
idéia de vazio selvagem e tratam as florestas como se nelas não existissem habitantes
humanos, com conhecimentos e culturas próprias. Assim, a visão de paraíso perdido
permeou grande parte do movimento conservacionista que nasceu nos EUA e se espalhou
pelo mundo. Parques Nacionais, Reservas Biológicas e muitas outras Unidades de
Conservação foram instituídas com essa visão. Muitas comunidades tradicionais foram
expulsas de seus territórios para que “a Natureza fosse preservada”. E, ao mesmo tempo, o
lado oposto da mesma moeda, segue avançando em busca das riquezas dos eldorados
tropicais, igualmente expulsando e marginalizando os povos das florestas e certamente com
muito mais violência e danos do que as atitudes excludentes das iniciativas
conservacionistas.

Nesse contexto, as populações que habitam e dependem dos recursos das florestas
nos países “em desenvolvimento” passaram a ser consideradas as principais responsáveis
pela destruição das florestas tropicais. O crescimento populacional, a fome, a pobreza e a
falta de recursos financeiros e tecnológicos dos ‘pobres rurais’ têm sido argumentos para
justificar que essas populações, “sem outra opção”, avançam regularmente sobre as
fronteiras florestais. Desse modo, equivocadamente, atribui-se aos pobres do Terceiro
Mundo a culpa pelos desmatamentos, quando na maioria das vezes os pobres são
“utilizados” nas frentes de ocupação das madeireiras e dos agro-pecuaristas, que causam os
maiores impactos sobre as florestas e seus habitantes tradicionais.

Não se pode dizer se é tarde ou não para modificar esse processo histórico de
ocupação predatória. Mas, se pode afirmar que movimentos nessa direção vêm surgindo e
crescendo dentro da própria sociedade civilizada e criadora da tecnologia que ajudou a
acelerar os interesses gananciosos sobre os recursos naturais. Não só as populações
habitantes da floresta (e a própria floresta) sobrevivem, resistem e lutam para se manter em
seus territórios, com direitos de uso respeitados pelos “forasteiros”, a despeito da violência
e rapidez com que são aviltadas, bem como vários setores da sociedade em geral estão se
voltando para compreender melhor o mundo do ‘outro’ e rever suas posições e paradigmas.
154

Nesse movimento de contraposição a valores dominantes e predatórios, vêm


surgindo várias iniciativas políticas e técnicas, dentre elas os projetos de pesquisa &
desenvolvimento em florestas sociais, juntamente com iniciativas para controlar os
desmatamentos e reconhecer os direitos das populações locais, valorizar e legalizar suas
formas de uso e manejo das florestas. Diante da evidente magnitude dos impactos da ação
de madeireiras e outros agentes capitalistas interessados nos recursos da floresta e na sua
rápida substituição para outros usos da terra, membros de agências internacionais e de
governos, ONGs ambientalistas e organizações sociais e outros atores vêm se mobilizando
para compreender melhor as causas dos desmatamentos, procurando identificar e avaliar
causas subjacentes ao rápido declínio das florestas tropicais – pressões do mercado
globalizado, políticas nacionais que afetam direta ou indiretamente o setor florestal (como
os planos de colonização e assentamento e os planos de ajuste estrutural para atender às
exigências internacionais de renegociação da dívida externa), relações político-econômicas
Norte e Sul, desigual distribuição de terra e acesso aos recursos, legislação inadequada,
falta de capacitação, clientelismo e corrupção nas instituições públicas de comando e
controle sobre terra e recursos florestais,... todos problemas inerentes aos países “em
desenvolvimento”.

A mobilização e o debate sobre essas questões estão começando a acontecer e um


longo caminho há ainda para ser percorrido. Fazem parte desse caminho iniciativas como a
de reformulação de políticas florestais internacionais (de vital importância, como a do
Banco Mundial) e nacionais, algumas já dando sinais de melhoras na relação com as
populações que habitam e dependem das florestas, e iniciativas como as de pesquisa &
desenvolvimento em florestas sociais.

Iniciados nos anos 1970, os projetos de p & d em florestas sociais avançaram


bastante e parecem representar um movimento muito dinâmico de ação colaborativa entre
profissionais (pesquisadores/executores) e populações locais, ambos interessados na
conservação dos recursos e dos serviços das florestas. A quantidade de publicações a
respeito das experiências em curso é cada vez maior e a preocupação com a auto-avaliação
é constante. As dificuldades vivenciadas nessas iniciativas em florestas sociais dizem
respeito às mesmas questões (ou causas subjacentes) que conduzem aos desmatamentos.
Problemas relativos à posse da terra e direitos de uso de árvores e florestas são
155

freqüentemente citados na literatura como fatores críticos e decisivos nas abordagens em


florestas sociais, aparecendo muitas vezes como o fator mais importante, entre tantos outros
que podem definir sucesso ou fracasso das iniciativas, tais como a ação centralizadora dos
Estados, as desigualdades de direitos e de participação nas tomadas de decisão, tanto dentro
das comunidades como entre essas e os “de fora” (governos, agências doadoras, florestais,
ONGs, etc.), importantes questões de gênero e de relações com mercado local, regional e
internacional.

Um dos aspectos mais importantes nas iniciativas em florestas sociais se refere à


participação (que também diz respeito à descentralização). Os primeiros projetos em
florestas sociais estavam pautados no objetivo principal de melhorar as condições das
populações rurais pobres, em áreas degradadas, no sentido de suprir suas necessidades
básicas de produtos da floresta, especialmente de lenha, evitando igualmente a pressão que
essas populações poderiam exercer sobre as florestas ainda existentes. Na prática, isso
significou promover o plantio de árvores em terras pertencentes ou controladas pelo Estado,
com a “participação” local, que se limitou ao uso da mão-de-obra local para o plantio das
árvores que o Estado decidia quais eram e onde seriam plantadas. Na Índia, onde essas
iniciativas começaram, críticos do programa governamental de florestas sociais apontam
que este não passou de um programa de fomento ao plantio de eucalipto, que no máximo
serviu para gerar aos produtores alguma renda (mais dependência do que renda, pela
saturação do mercado) na venda das árvores para a indústria de celulose/papel (a Índia é o
país que tem a maior área de plantações comerciais de eucalipto – 8.000.000 hectares). Os
principais interessados no programa não participaram efetivamente e as expectativas de
reverter o processo de expansão das monoculturas arbóreas em favor do “grande capital”
para um processo de resgate das formas tradicionais de poli-cultivo das comunidades rurais,
através de um programa realmente voltado para as “necessidades básicas” do povo,
acabaram frustradas e os recursos alocados favoreceram ainda mais os detentores de maior
capital simbólico (econômico e político).

As críticas à condução centralizadora do programa de florestas sociais da Índia


ainda são feitas hoje, lá (ao atual Joint Forest Management) e em muitas outras iniciativas
em florestas sociais em outros países. Mas, de modo geral, os empreendedores dessas
iniciativas estão atentos e procurando modificar a relação “top-down” que sempre
156

caracterizou a ação extensionista das ciências agrárias e a relação dos governos com o
povo. Metodologias de gestão participativa vêm sendo desenvolvidas, no sentido de
aproximar mais os interessados e criar meios de “escuta” e de diálogo em favor do
empoderamento dos “locais”.

O cenário atual de questões críticas envolvendo a situação das florestas tropicais


coloca em foco o papel do setor florestal – legislação, estruturas institucionais, políticas
públicas... e, principalmente, a atitude dos profissionais desse setor, cujos paradigmas
devem ser revistos em favor de uma melhor relação sociedade-florestas. Lembrando Paulo
Freire – “A quem sirvo com a minha ciência” – é uma pergunta que esses profissionais
devem se fazer constantemente, em um momento histórico que reclama por eqüidade social
e sustentabilidade ambiental.

O tema florestas sociais é de grande importância no cenário atual de mobilização e


enfrentamento do processo de declínio das florestas tropicais e tem grande potencial para
provocar a discussão e a busca de novos caminhos que diminuam as desigualdades sociais e
aumentem a responsabilidade coletiva em prol da sustentabilidade no manejo das florestas
tropicais. No Brasil, as iniciativas são poucas, mal começaram a se desenvolver de modo a
se poder avaliar os resultados e o tema é praticamente desconhecido ou pouco valorizado
nos meios científicos e político-institucionais do setor florestal.

Espero que essa dissertação possa contribuir ao menos como “sinalizadora” do


potencial de pesquisas que podem ser desenvolvidas sobre o tema no Brasil, tanto no
campo da pesquisa básica em sociologia, antropologia, ciências políticas e ciências agrárias
sobre questões diretamente envolvidas neste tema (gênero, participação e descentralização,
direitos de posse e uso da terra, etc.) como no campo das pesquisas aplicadas voltadas para
o desenvolvimento de iniciativas interdisciplinares de tratamento dos problemas sociais e
ambientais do país, especialmente no uso/manejo das florestas.
157

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Gráfico 1
Situação das Florestas no Mundo e por Região, segundo o WRI, 1997 (em milhões km²)
70

60
Floresta Original

Floresta Remanescente
50

Fronteiras Florestais (flor. intactas)

40

30

20

10

0
África Ásia Am. Central Am. do Norte Am. do Sul Europa Rússia Oceania Mundo
“Florestas Sociais: Uma Resposta à Destruição das Florestas Tropicais?” Dissertação defendida em março/2001 no CPDA/UFRRJ por Cláudia Teixeira

Gráfico 2
Países com maiores taxas de desmatamento no período 1990-2000 (hectares po ano)
Fonte: FAO, FRA 1990 e FRA 2000 (excluindo áreas de plantações arbóreas)

2.500.000

2.000.000

1.500.000

1.000.000

500.000

0
Indonesia

Tailandia

Argentina

Venezuela
Malasia

Iran (NT)
India

Rep. Dem. Congo


Brasil

Nigeria
Myanma
Sudão

Zimbabwe

Peru
Zambia
“Florestas Sociais: Uma Resposta à Destruição das Florestas Tropicais?” Dissertação defendida em março/2001 no CPDA/UFRRJ por Cláudia Teixeira

Florestas do Mundo - Extraído e reduzido do mapa original da FAO, que pode ser obtido na Internet
(www.fao.org/forestry/fo/fra/index.jsp).
“Florestas Sociais: Uma Resposta à Destruição das Florestas Tropicais?” Dissertação defendida em março/2001
no CPDA/UFRRJ por Cláudia Teixeira

Detalhe do mapa anterior, incluindo a legenda, com destaque para a América da Sul, onde
ocorre a maior floresta tropical do mundo – a Floresta Amazônica – e a maior taxa de
desmatamento das últimas décadas.

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