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Sucessão Testamentária

Conceito de Direito das Sucessões: é o ramo do Direito Civil cujas normas regulam a
transferência do patrimônio do morto ao herdeiro, em virtude de lei ou de testamento.

Embora a sucessão legitima predomine na sociedade, nosso legislador regulamentou em


maior número de artigos a sucessão testamentária.

A sucessão testamentária é conduzida pelo testamento, sendo um princípio de direito


sucessório o respeito à vontade do extinto (vide aula 2). O testamento pode contemplar herdeiros,
que sucedem a título universal, e legatários, que sucedem a título singular (vide aula 1).

Conceito de testamento: negócio jurídico solene pelo qual alguém, nos termos da lei, dispõe
de seus bens, no todo ou em parte, para depois de sua morte (1.857).

Digo negócio jurídico pois se trata de uma declaração de vontade que produz efeito jurídico;
digo solene pois testamento não pode ser verbal, mas sim escrito, conforme espécies e formalidades
previstas em lei.

A liberdade de testar é grande, mas a lei impõe um limite em respeito à família e aos
herdeiros necessários (§ 1º do 1.857 e 1.846).

Via de regra as disposições testamentárias são patrimoniais, versam sobre os bens do


extinto, mas o testamento pode conter cláusulas extra-patrimoniais, como por exemplo o
reconhecimento de um filho (§ 2º do 1.857, 1.609, III), a nomeação de um tutor para um filho
menor (1.634, IV) ou determinações sobre seu funeral.

Características:

- o testamento é revogável, pois o seu autor pode se arrepender, demorar a morrer, e querer mudar
alguma disposição, então a liberdade de revogar é a mesma de testar (1.858). Inclusive não se
admite renúncia ao direito de revogar o testamento, até porque o testamento só produz efeito após a
morte do seu autor.

- é imprescritível: um adolescente de 16 anos já pode testar (pú do 1.860), então mesmo que
ele só venha a morrer aos noventa anos, se não for revogado seu testamento continua válido embora
redigido há 74 anos! E por que a capacidade de testar foi reduzida dos 18 para os 16 anos? Porque o
testamento só produz efeitos após a morte, então se o testamento prejudicar o adolescente, ele já
morreu mesmo.

- testamento é ato pessoal: só o hereditando pode testar, de modo individual e exclusivo, não
se admitindo testamento por procuração (1.858). Um advogado/contador pode ajudar a redigir, mas
o testador tem que estar presente. Também não se admite testamento feito por duas pessoas,
inclusive para facilitar a mudança ou a revogação do ato (1.863).

- testamento é ato unilateral quanto às partes porque se forma apenas pela vontade do
testador, independentemente da aceitação do herdeiro. Diz-se também unilateral quanto aos efeitos,
semelhante a uma doação, pois não existe contraprestação, não existe vantagem para o testador, até
porque ele já morreu quando o testamento passa a produzir efeitos. Todavia, semelhante às doações,
admite-se encargo nos testamentos, mas o encargo não pode ser grande a ponto de criar uma
obrigação excessiva para o herdeiro ou legatário, podendo o Juiz reduzir o encargo exagerado.

Capacidade para testar: como todo negócio jurídico, o testamento deve atender ao art. 104
do CC.

Então quem pode testar? Qualquer pessoa física desde que lúcida e maior de 16 anos (1.860
e pú). Pessoa jurídica não pode testar porque não está sujeita a morte, e sua extinção ou falência
interessa ao Direito Empresarial. Se o testador enlouquecer após redigir o ato, o testamento é válido
(1.861). Testamento feito por incapaz é nulo, e a nulidade é para sempre (166, I e 169; depois
revisem anulabilidade que é menos grave do que a nulidade). Porém alguns autores acham que a
nulidade pode prescrever, ou seja, mesmo o ato nulo pode produzir efeitos, por isso existe um prazo
de cinco anos do art. 1.859, c/c o art. 1.126 do CPC. Reflitam!

Quem pode adquirir por testamento? Quem pode ser instituído herdeiro e designado
legatário? De regra todas as pessoas, físicas ou jurídicas (1.799, II e III). Animais não podem ser
herdeiros ou legatários, mas podem ser encargos (ex: deixo minha herança para João com o ônus de
cuidar do meu cachorro; leiam Quincas Borba de Machado de Assis). Pessoas não concebidas até a
morte do testador não podem também adquirir por testamento (1.798), salvo as hipóteses de
fideicomisso que veremos em breve (1.799, I e 1.925). Também não podem ser nomeadas herdeiras
e legatárias aquelas pessoas sem legitimidade do art. 1.801. A legitimidade é um freio da
capacidade, então tais pessoas do 1.801 são incapazes, lhes faltam autorização para herdar por
razões morais e éticas. O deserdado é também excluído da sucessão.

Formas de testamento
São várias as formas e espécies de testamento previstas em lei, cada uma com suas
vantagens e desvantagens, pelo que a orientação do advogado ou do tabelião é essencial para, caso a
caso, verificar qual a melhor opção para seu cliente.

Os testamentos têm formalidades exigidas pelo legislador por uma questão de segurança a
fim de garantir a autenticidade do ato, a espontaneidade da manifestação e a sanidade do declarante,
preservando a vontade do extinto.

Não se podem misturar as espécies, ou seja, é preciso escolher uma delas e atender às
exigências da lei, vejamos:

1 – testamento ordinário: este pode ser usado pelas pessoas capazes em qualquer condição, e
se divide em público, cerrado e particular (1.862);

2 – testamento especial: somente permitido a determinadas pessoas em situações peculiares,


e se divide em marítimo, militar e aeronáutico (1.886);

3 – codicilo;

Começando por este último, o codicilo é um testamentinho, é uma carta, é um pequeno


registro deixado pelo extinto, com poucas formalidades e tratando de bens de pequeno valor (1.881)
da nomeação de testamenteiro (é a pessoa que vai cumprir o testamento, 1976 e 1.883), ou
finalmente da encomenda de missas (1.998). As expressões “pouca monta” e “pouco valor”
referidas no art 1.881 são relativas e dependem, é claro, do tamanho da herança, a ser examinado
pelo juiz, em geral cerca de 10% do patrimônio do extinto. Um testamento pode revogar um
codicilo, mas o contrário não.

Testamento ordinário

1 – público: feito por qualquer tabelião do cartório de notas do país e anotado em livro
próprio (1.864). Esta espécie é mais segura contra destruição, extravio ou modificação pois consta
do livro público do cartório. Outra vantagem é porque tal espécie é redigida pelo tabelião, ou seja,
profissional habilitado, com fé pública e experiência, que dificilmente vai errar e causar nulidade ao
testamento. Por ter que ser lido em voz alta, esta espécie é recomendada para os analfabetos, surdos
e cegos (1.867). Desvantagens: é pago, tem um custo já que o cartório cobra para redigir o
testamento; é aberto, ou seja, todos podem ficar sabendo seu conteúdo, provocando ciúmes e
frustrações de quem não foi contemplado, estando o testador ainda vivo.

2 – cerrado: conhecido como secreto ou místico. Ao contrário do público, não é ditado pelo
testador para o tabelião digitar, mas sim entregue já escrito ao tabelião para aprová-lo. Essa
aprovação é aquela do art. 1.869, ou seja, é um termo onde o tabelião confirma se tratar aquele
documento da vontade autêntica do hereditando. Sua maior vantagem é o sigilo, afinal só o testador
conhece seu teor. Sua desvantagem é a possibilidade de extravio, pois o documento é entregue ao
testador que não mais estará vivo para dizer onde ele se encontra quando o testamento precisar ser
aberto (1.874). Analfabetos e cegos não pode usar esta espécie, mas os surdos e mudos sim, desde
que saibam ler (1.872).

3 – particular: é a mais rápida, simples e fácil espécie de testamento, dispensando até o


tabelião. É aberto (1.876). O testador precisa ter algum conhecimento jurídico para não cometer
ilegalidades que venham a anular o ato. Não se esqueçam de datar o testamento. Outra desvantagem
é que ele pode ser extraviado ou falsificado, já que não tem a intervenção do cartorário. Mais uma
desvantagem: as testemunhas precisam sobreviver ao testador para confirmar a autenticidade do
documento perante o juiz (1.878).

3.1 – testamento particular excepcional: admitido em situações emergenciais de risco


iminente de perder a vida, não havendo testemunhas disponíveis, como num desastre, naufrágio,
seqüestro, preso numa caverna, dentro de um avião caindo, etc. (1.879). Tem que ser manuscrito. A
doutrina o critica , e não o aceita,pois é fácil de ser fraudado. Cabe ao juiz aceitá-lo ou não.

Testamento especial

Os testamentos especiais são mais simples e fáceis de fazer do que os testamentos


ordinários, com menos solenidades. Porém eles não são de livre escolha do cidadão, só podendo o
testador optar por eles se estiver numa situação especial. Outra característica é a de que os
testamentos especiais prescrevem, ou seja, têm prazo de eficácia e precisam ser confirmados. Já o
testamento ordinário pode ser celebrado por alguém com 16 anos, e mesmo que só venha a morrer
aos 90 anos, o documento ainda estará válido após 74 anos. Vejamos as espécies de testamento
especial:

1 – marítimo: para aqueles que estão com medo de morrer em alto-mar. Curioso é que temos
a vida toda para testar, vamos nos preocupar com isso logo quando entramos num navio? Inclusive
porque as viagens marítimas não são mais tão longas, e mesmo a bordo temos telefone e internet
(1.892). Bom, caso necessário o comandante vai corresponder ao tabelião do cartório de notas
(1.888). Esse testamento precisa ser confirmado quando terminar a viagem, sob pena de caducidade
(1.891).

2 – aeronáutico: essa espécie não se justifica, pois em vôos normais não há necessidade, podendo o
testador aguardar algumas horas até o desembarque (1.889); e se o avião estiver em perigo, aplica-
se o testamento particular excepcional acima. Talvez o legislador esteja pensando nas viagens
espaciais, quando ficaremos anos viajando entre as estrelas... Ou então para alguém que passe mal
dentro do avião e ache que vai morrer antes do pouso... Bom, reflitam!

3 – militar: feito por militares, médicos, engenheiros, padres, repórteres, reféns e


prisioneiros em época de guerra, em combate ou em cidades cercadas (1.893). Tal ato caduca caso
não confirmado três meses após o testador deixar a zona de guerra, ou cessarem os combates
(1.895).

3.1 - o testamento militar admite a espécie nuncupativa, ou seja “in extremis” quando o militar
ferido, agonizante, confia sua vontade oralmente a duas testemunhas. Depois as testemunhas terão
que escrever o que ouviram do moribundo e entregar o documento ao comandante do batalhão. Tal
espécie é muito fácil de ser fraudada, pelo menos é raríssima (1.896).

Disposições Testamentárias

Vamos começar a tratar do conteúdo interno do testamento. Estas disposições são as


cláusulas do testamento onde o falecido dá destino a seus bens, instituindo herdeiros e legatários.
Nosso legislador do Código Civil tenta ajudar o juiz e os herdeiros a interpretar, explicar e aplicar
as cláusulas do testamento.

Regras gerais:

- o que não estiver no testamento não tem validade, assim não adianta o nome do herdeiro constar
de uma escritura pública, de uma procuração, de uma declaração perante um juiz, etc., se não
estiver no testamento.

- a designação de legatário sempre é expressa, mas o herdeiro pode ser tácito (1.906, 1.966,
1.788)

- o testamento pode ter cláusulas extra-patrimoniais (ex: art. 14 e pú).

- respeito à vontade do falecido (arts. 112 e 1.899); nos arts. 1.902 e 1.903 o legislador
presume em regras detalhistas qual seria a vontade do extinto.

- na dúvida os sucessores herdam por igual (1.904).

Espécies de disposições:

- simples: é a cláusula pura, sem imposição de qualquer condição ou restrição, possuindo


eficácia imediata face ao princípio da saisine (ex: deixo 10% de meus bens para meu amigo João,
1.897). A legítima do herdeiro necessário deve sempre ser simples.

- condicional: depende de evento futuro e incerto (ex: deixo minha biblioteca para minha
sobrinha se ela se formar em Direito; trata-se do direito eventual a um legado condicionado a
acontecimento futuro e incerto; se a sobrinha morrer antes de se formar não terá herdado nada).

- a termo ou prazo: uma disposição a termo, com prazo, só vale para legatários (1.924), pois
para herdeiros é nula (1.898; ex: não se pode nomear alguém seu herdeiro por dez anos, pois uma
vez herdeiro, sempre herdeiro, mas um legado pode ser por prazo certo); enquanto a condição ou o
termo não chegam, os bens ficam com os herdeiros legítimos; o único caso de prazo para o herdeiro
é no fideicomisso, que veremos em breve; lembro que se um herdeiro for nomeado a prazo, fora dos
casos de fideicomisso, esse prazo não será considerado e a herança será tida como simples.

- modal: é a cláusula que tem encargo ou ônus, ou seja, possui uma pequena contraprestação
a ser cumprida pelo sucessor (ex: Quincas Borba); o encargo é imposto nas liberalidades como nas
doações e testamentos. O descumprimento do encargo pode levar o herdeiro legítimo a pedir a
anulação da herança a fim de beneficiá-lo. Condições e encargos ilícitos e imorais são nulos. A
legítima do herdeiro necessário não se sujeita a condição ou encargo.

- motivada: o testador indica as razões pelas quais está beneficiando aquela pessoa (1.897, in
fine). Tal motivação é dispensada pela lei, o testador indica se quiser, porém eventual motivação
equivocada pode anular a cláusula testamentária (art. 140).

Cláusula de inalienabilidade (CI):

O saudoso Orlando Gomes chama com razão essa cláusula de “anacrônica, violenta,
polêmica e antipática”. Trata-se de uma cláusula restritiva que implica também em
impenhorabilidade e incomunicabilidade, ou seja, se o testador deixar seus bens com essa cláusula,
tais bens não poderão ser vendidos ou doados pelo herdeiro (inalienáveis), não poderão ser tomados
pelo credor do herdeiro (impenhoráveis), e nem se transmitirão ao cônjuge do herdeiro
(incomunicabilidade, 1.911).

Conceito: é um meio de gravar o próprio bem em relação a terceiro beneficiário, que não
poderá dispor dele, gratuita ou onerosamente, recebendo-o apenas para usá-lo e fruí-lo.

A CI não pode ser imposta aos bens do testador, pois não podemos gravar os nossos próprios bens,
mas apenas os bens que transferimos a terceiros por doação ou herança. A CI não é obrigatória, mas
uma vez presente no testamento a propriedade sobre os bens herdados ou legados fica limitada. A
CI dura no máximo uma geração, então não atinge os filhos do herdeiro. O herdeiro ou legatário
poderá usar, alugar e emprestar estes bens, mas não poderá vendê-los, ou seja, tais bens ficarão fora
do comércio.

Sub-rogação: excepcionalmente o juiz pode autorizar a venda, mas o produto da alienação


continuará gravado (§ 2º do 1.848 e pú do 1.911). Assim trocada a coisa, o novo bem fica sub-
rogado na inalienabilidade imposta pelo extinto. O art. 1.109 do CPC dá muito poder ao juiz, mas é
preciso usar essa força com razoabilidade.

Pode a CI incidir sobre os bens da legítima (1.846), mas exige justa causa (1.848), cabendo os
herdeiros questionar judicialmente a “justiça” dessa causa, afinal o falecido pode estar apenas
atrapalhando a vida de filhos que não pôde excluir da herança. A causa deve ser clara e objetiva (ex:
filho perdulário, toxicômano), não se admitindo: “deixo uma casa para meu filho com a CI pois não
gosto da esposa dele...”

A CI precisa estar inscrita no Cartório de Imóveis para ter eficácia plena e ser de
conhecimento público. Se os bens herdados forem móveis (ex: uma jóia), a CI é inoperante, pois os
bens móveis, salvo os veículos, não se sujeitam a um registro organizado como os bens imóveis.

Fundamento: por que se justifica a CI?

1 – para respeitar a vontade do falecido, que é um dos princípios do Direito das Sucessões.
2 - para se criar um ônus real sobre o bem herdado, protegendo herdeiros inexperientes e pródigos
contra credores espertos ou um casamento ruim (1.848).

Críticas: por que se condena a CI?


1 – porque prejudica o credor do herdeiro. O credor do falecido não se prejudica, afinal ninguém
pode gravar seus próprios bens com a CI. Já o credor do herdeiro fica frustrado, pois o herdeiro não
tinha bens para pagar sua dívida, e agora não pagará com os bens que recebeu do pai face à
impenhorabilidade, causando insegurança jurídica.

2 – premia um herdeiro incompetente, desorganizado, tolo, incapaz de cuidar de seus próprios


negócios.

3 – limita a circulação de riquezas, viola a lei fundamental da economia política, por retirar um
bem do comércio.

4 – prejudica o genro ou nora do hereditando, qualquer que seja o regime de bens do herdeiro, face
à incomunicabilidade decorrente da inalienabilidade.

Espécies de inalienabilidade:

1) absoluta (em nenhuma hipótese o testador admite a venda) ou relativa (o extinto admite
vender em alguns casos, a certas pessoas ou em certas condições previstas pelo mesmo, ex:
pode vender a João, mas não pode a José; pode vender por motivo de saúde, etc.);

2) total (estende-se a todos os bens do testador) ou parcial (apenas sobre parte dos bens do
hereditando);

3) temporária (ex: durante dez anos, até o herdeiro fazer 50 anos, etc.) ou vitalícia (prazo
máximo de uma geração).

Observações:

- o bem gravado com a CI não se sujeita a usucapião por terceiros para evitar fraudes;
- a CI não impede a penhora do bem gravado por dívidas de tributos do próprio bem, assim pague o
IPTU senão o governo toma!
Legado

Já sabemos que são duas as espécies de sucessão: a testamentária (quando o falecido diz
quem são seus herdeiros) e a legítima (quando na falta de testamento, a lei prescreve quem são os
herdeiros).

Na sucessão legítima só há herdeiros, mas na sucessão testamentária, além de herdeiros,


poderemos encontrar legatários. Já falamos disso na aula 1, mas lembro que o legatário difere do
herdeiro pois este herda uma fração a título universal (ex: 10% da herança, 1/3 da herança),
enquanto o legatário sucede a título singular, recebendo coisa certa (ex: uma jóia, uma casa, uma
cifra em dinheiro, um rebanho, um cavalo de raça, uma coleção de selos, uma loja comercial, ações,
etc.).

Conceito: disposição testamentária a título singular pela qual o extinto deixa um ou mais
objetos individualizados a qualquer pessoa, inclusive um herdeiro. Se o herdeiro também receber
legado, será chamado de prelegatário (obs: o legado do herdeiro é o prelegado). O herdeiro pode
aceitar a herança e renunciar ao legado, e vice-versa (§ 1º do 1.808).

O legado é personalíssimo, então se o legatário morre antes do testador, não haverá direito
de representação em benefício dos filhos do legatário, até porque a representação é exclusiva da
sucessão legítima, e só pode existir legado na sucessão testamentária.

Morrendo o legatário antes do testador, o legado será transferido aos herdeiros legítimos conforme
1.788. Admite-se todavia o substituto do legatário (1.947), mas se testar é raro, mais raro ainda
prever-se um substituto para o legatário faltoso.

Aquisição do legado: a posse da herança transmite-se imediatamente com a morte face ao princípio
da saisine (1.784), já o legado é de coisa determinada que precisa ser pedida pelo legatário aos
herdeiros, exercendo seu “direito de pedir” (§ 1º do 1.923). Empossando-se indevidamente do bem,
o legatário comete o crime do exercício arbitrário das próprias razões, previsto no art. 345 do CP.

Na prática é na partilha, ao final do processo de inventário, que o legatário recebe seu bem arcando
com eventuais despesas (ex: impostos, frete, 1.936). Recebido o legado (ex: uma fazenda), seus
frutos (ex: crias dos animais) serão do legatário desde a morte do testador, pois a propriedade
retroage, mas a posse não (1.923 e § 2º)

Legado

Disposição testamentária a título singular pela qual o extinto deixa um ou mais objetos
individualizados a qualquer pessoa (ex: uma jóia, uma casa, uma cifra em dinheiro, um rebanho, um
cavalo de raça, uma coleção de selos, uma loja comercial, ações, etc.).

O legado assemelha-se a uma doação, só que o legatário recebe o bem do herdeiro e não do
“doador” já morto. O legado será dos herdeiros legítimos caso o legatário não aceite o bem (ex: uma
fazenda hipotecada, cheia de dívidas trabalhistas, com servidão predial, etc., 1.937).
Como o legatário sucede a título singular, não responde pelas dívidas do extinto, dívidas que
cabem aos herdeiros por sucederem a título universal (no universo dos bens = patrimônio = ativo +
passivo), mas o legatário só recebe o bem se a herança for solvível, afinal onde só há dívidas não há
herança e nem legado. Só com o inventário, apurando-se o ativo e deduzindo-se o passivo do
extinto, é que se podem verificar as forças da herança.

O testador pode indicar quem será o herdeiro incumbido de cumprir o legado, chamado de
onerado. Se o testador não indicar o onerado, caberá a qualquer herdeiro pagar o legado na
proporção do que herdar (1.934).

Espécies de legado:

a) legado de coisa própria: é o mais comum, afinal ninguém pode dispor de mais direitos do
que tem (1.912). Se a coisa legada foi vendida pelo testador antes de morrer, essa disposição perde
o objeto (1.916).

b) legado de coisa alheia: exceção à regra anterior, pois o testador pode deixar uma coisa genérica
que ele não tem para o legatário, mas a coisa tem que ser incerta (243, ex: o falecido deixa um
cavalo de raça para João, mas o falecido nunca teve cavalo, então o herdeiro-onerado deve comprar
esse cavalo para dar ao legatário, 1.915, 1.929).

c) sub-legado com encargo: o testador determina ao legatário que dê uma coisa dele para ganhar
outra (ex: o testador deixa uma casa para João se João der um carro a José; se João não der o carro
não ganha a casa, 1.913; o testador impõe um encargo ao legatário; a casa é o legado e o carro é o
sub-legado; João é o legatário e José o sub-legatário).

d) legado alternativo: o falecido deixa para o legatário uma coisa ou outra, cabendo a escolha ao
herdeiro-onerado (252 e 1.932).

e) legado de coisa de certo lugar, ex: deixo para fulano meus quadros da casa de Gravatá, 1.917; o
legado dos quadros não implica no legado da casa, mas se o legado for de uma casa presume-se que
são com os móveis, afinal a regra é o acessório seguir o principal; pergunta: se o falecido deixa para
fulano uma fazenda, e após testar adquire uma fazenda vizinha a esta, o legado será das duas
fazendas contíguas? Não, face ao 1.922.

f) legado de direito real limitado: ao invés da propriedade de um bem, o falecido deixa uma
superfície, habitação ou usufruto desse bem para o legatário, e a propriedade-nua para outrem
(1.921).

g) legado de créditos e débitos: o falecido pode deixar certa quantia em dinheiro para o legatário
(1.925), ou então perdoar uma dívida do legatário (1.918).

h) legado compensatório: o falecido deve mil a João e lhe deixa uma jóia, pode se tratar de
compensação da dívida se for expresso (1.919); se o credor não quiser a compensação, basta
renunciar ao legado compensatório e cobrar a dívida do espólio.

i) legado de alimentos: o testador determina ao onerado que alimente alguém, cabendo ao juiz fixar
o valor (1.920; esse alimento pode ser em hospedagem ao invés de dinheiro (1.701).

j) legado de cota condominial, ex: João e José tem um barco, e João deixa esse barco para Maria,
então se trata apenas de metade do barco, e Maria será condômina do barco com José (1.914).
Caducidade dos legados: a caducidade difere da nulidade do legado. A caducidade é a perda da
eficácia, é a decadência do legado. O legado foi celebrado validamente, porém pode deixar de
existir.

Já a nulidade seria, por exemplo, o legado de substância entorpecente, o testamento celebrado por
um incapaz, (166, I e II), o legado a pessoa sem legitimidade (1.802 e 1.801), etc.

São cinco os casos de caducidade previstos no art. 1.939 do CC, vamos comentá-los:

I – ex: o falecido deixa madeira/mármore para o legatário, porém antes de morrer faz
móveis/estátuas desse material. Se deixar uma barra de ouro, mas depois viraram jóias, vale o
legado? Se deixou um terreno nu, mas depois lá construiu um edifício, vale o legado? Reflitam!

II – já vimos isso acima no legado de coisa própria ; o falecido revoga tacitamente a cláusula
testamentária se vender a coisa legada.

III – ex: um jóia legada caiu no mar, ocorre o perecimento já que o resgate é impossível; se houver
culpa de alguém para a perda cabe responsabilidade civil; não há perecimento de coisa genérica no
legado de coisa alheia (246); .

IV – são os casos de indignidade.

V – é a premoriência que não enseja direito de representação como dito acima (1.788).

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