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CURSO FORUM

DIREITO PENAL
GABRIEL HABIB
gabriel@cursoforum.com.br

Bibliografia de Parte Geral:


Curso de Direito Penal v. 1 - Rogério Greco.
Tratado de Direito Penal v.1 - Cezar Bitencourt.
Curso de Direito Penal Brasileiro v. 1 - Luiz Regis Prado.
Princípios Básicos de Direito Penal - Francisco Assis Toledo.
Lições de Direito Penal - Heleno Cláudio Fragoso.

Introdução

Quando começamos a estudar o direito penal, a primeira coisa que


temos que fazer a seguinte pergunta:
Qual é a finalidade do Direito Penal?
Existem, atualmente, três vertentes no direito penal brasileiro e
comparado.
A primeira vertente é a de Welzel segundo a qual o D. Penal tem 2
funções, ou missões nas palavras de Welzel: função ético-social e função de
proteção dos bens jurídicos.
A primeira é a função ético-social. Para essa função, a finalidade do
direito penal é amparar os valores elementares da vida da comunidade. A
função primária, do direito penal, para Welzel, não é amparar os bens jurídicos,
ou seja, antes de proteger os bens jurídicos, o direito penal pretende observar
os valores da consciência jurídica. É fazer com que as pessoas ajam conforme
o direito, sempre observando o ordenamento jurídico. É como se fosse uma
função pedagógica. Até porque, dizia Welzel, quando o direito penal é
chamado a intervir, já é tarde demais porque o bem jurídico já foi lesado.
Essa vertente é seguida na Alemanha por dois autores: Hans-Heinrich
Jescheck e Günter Stratenwerth; na Espanha é seguida pelo professor Cerezo
Mir, que é atualmente o maior seguidor de Welzel na Espanha.

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A segunda função é a função de proteção dos bens jurídicos, a função
chamada função protetiva. A finalidade do direito penal é proteger os bens
jurídicos mais importantes, mais relevantes para a vida em sociedade.
Assim, toda vez que o legislador quer proteger um bem jurídico, ele cria
um tipo penal descrevendo a conduta proibida ou mandada, cominando
abstratamente uma sanção penal.
E onde vamos encontrar esses bens jurídicos? Na própria lei penal
incriminadora. Basta abrirmos o código penal para ver. Se abrirmos o código
penal veremos que o primeiro bem jurídico que o legislador brasileiro quis
proteger é a vida, e para tanto criou quatro tipos penais, os chamados crimes
contra a vida: homicídio, induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio,
infanticídio e aborto.

Há uma segunda vertente, ainda no direito comparado, adotada pelo


professor alemão Günter Jakobs, segundo a qual a finalidade do Direito Penal
é confirmar o reconhecimento normativo. É reafirmar a vigência da norma.
Dessa forma, quando o agente comete um crime, ele não está lesando um bem
jurídico, e sim a vigência da norma penal. Então vejam, a norma vigente proíbe
a ação de matar alguém. Quando o agente mata outrem, ele violou a vigência
da norma. E Jakobs traz um argumento bastante sedutor. Ele diz, na tentativa,
ainda que não haja lesão ao bem jurídico, haverá a sua punibilidade. Isso
porque o agente não lesionou o bem, mas sim a vigência da norma que proíbe
a ação de matar alguém.

Há uma terceira vertente, que é a predominante no Brasil, entendendo


que a finalidade do Direito Penal é proteger os bens jurídicos mais importantes,
mais relevantes, mais essenciais para a vida em sociedade, para o convívio
social. Por todos, podemos citar Rogério Greco, autor de grande destaque
atualmente, que muito bem desenvolve o esse tema em seu livro. Mas como
essa finalidade se materializa? Através de um instrumento de coerção
chamado pena.
Toda vez que o legislador quer proteger um bem jurídico, ele cria um tipo
penal (tatbestand para os alemães ou fattispecie para os italianos), com dois
preceitos: no preceito primário o legislador descreve a conduta proibida ou

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mandada, que causa lesão ao bem jurídico penalmente tutelado, e no preceito
secundário o legislador estipula um pena abstratamente.
Mas por que eu estou falando em legislador?
Porque essa tarefa é exclusiva do legislador, a seleção de bens jurídicos
a serem protegidos é uma tarefa exclusiva do legislador.
E é importante verificar, desde já, que essa seleção de bens jurídicos a
serem protegidos pode variar no tempo, de acordo com a realidade e evolução
social. O maior exemplo disso foi a recente revogação do adultério pela lei
11.106/2005.
Dessa forma, de acordo com essa vertente predominante no Brasil, a
intervenção do direito penal somente será legítima quando e onde houver
alguma lesão a um bem jurídico por ele protegido. E hoje predomina
amplamente a opinião segundo a qual todo e qualquer bem jurídico protegido
pelo direito penal deve ter sede constitucional. Basta pensar, vida, patrimônio,
honra, administração pública, meio-ambiente, etc. Sobre isso, recomendo a
leitura de um livro chamado “Bem jurídico-penal e constituição” do Luiz Regis
Prado.
Mas todo e qualquer bem jurídico pode ou deve ser tutelado pelo direito
penal? Não, somente os mais importantes, somente os mais relevantes,
somente os mais necessários. É o chamado caráter fragmentário do direito
penal ou princípio da fragmentariedade que vamos ver daqui há pouco quando
entrarmos nos princípios.

PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO PENAL

INTRODUÇÃO e CONCEITO – Princípios são concretizações de valores.


Mandamento nuclear de um sistema¨(Celso A. Bandeira de Mello)

EVOLUÇÃO HISTÓRICA

1ª fase: Jusnaturalismo- sécs. XVII e XVIII. Funda-se na premissa


de que há Direito fora das normas editadas pelo Estado, um Direito
natural. Há, na sociedade, um conjunto de valores que não decorrem de

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uma norma jurídica emanada do Estado, independente do Direito positivo.
Esse Direito Natural estabelece limites à própria norma estatal.
Direito era princípios.

2ª fase: Juspositivismo- séc. XIX.


Teve seu ponto culminante no normativismo de Kelsen. Só podia ser
Direito o que estava previsto na norma. O Direito reduzia-se a um conjunto de
normas em vigor, considerado um sistema perfeito.
Direito era regras.

Decadência do juspositivismo- derrota do facismo na Itália e do nazismo


na Alemanha, movimentos políticos que promoveram a barbárie em nome da
lei. Os principais acusados de Nuremberg invocaram o cumprimento da lei e a
obediência a ordens emanadas da autoridade competente.
Ao final na 2ª guerra mundial, a idéia de um ordenamento jurídico
indiferente a valores éticos e da lei como uma estrutura meramente formal, já
não tinha mais aceitação no pensamento esclarecido.

3ª fase: Pós-positivismo- séc. XX. Autores: Chaim Perelman (Belga);


Robert Alexy (Alemão); Ronald Dworkin (americano); Manoel Atienza
(espanhol).
O Direito já não mais cabia no positivismo jurídico. Estabelece-se
relações entre valores, princípios e regras, chamada nova hermenêutica
constitucional, voltada para a coexistência das idéias de valores, justiça e
legitimidade.
Esses valores compartilhados por toda a comunidade, em dado
momento e lugar, materializam-se em princípios, que passam a estar
abrigados na Constituição, explícita ou implicitamente, como por ex. liberdade,
igualdade, separação dos poderes e Estado democrático de Direito, dignidade
da pessoa humana, razoabilidade, solidariedade, justiça.

Conclui-se, então, que princípios são a concretização de valores. Os


princípios constitucionais passam a ser a síntese dos valores abrigados no
ordenamento jurídico.

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Com isso, o direito constitucional define a moldura dentro da qual o
intérprete exercerá sua criatividade e seu senso de justiça, sendo as balizas
dentro das quais o intérprete irá interpretar as normas jurídicas.

Dessa forma, o pós-positivismo tem como marco fundamental a


ascensão de valores, o reconhecimento da normatividade dos princípios.
Princípio é norma.

Atualmente, estamos na fase da constitucionalização do Direito


infraconstitucional. Isso significa a reinterpretação e releitura dos institutos de
direito infraconstitucional à luz da Constituição. A isso se chama filtragem
constitucional de todo o direito infraconstitucional.

Direito agora é: princípios e regras.

Princípios
Conclusão: norma
Regras

DIFERENÇAS ENTRE PRINCÍPIOS E REGRAS

1- Abstração- regras são normas de aplicação restrita, mediante subsunção.


Ex. Regra que estipula a aposentadoria compulsória em determinada idade;
regra que prevê que a criação de uma autarquia depende de lei específica;
regra que diz que o mandato do Pres. Da República é de 4 anos, etc.
Princípios têm maior abstração normativa, que perpassa por todo
o ordenamento jurídico. Ex. Princípio da igualdade; Princípio da Dignidade da
Pessoa Humana; Princípio da República; Princípio da Legalidade; Princípio da
Culpabilidade; Princípio da Individualização da Pena; etc.

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2- Normogenética – o princípio é o fundamento da regra. As regras têm
como fundamento os princípios. Princípio ¨não tem fundamento em, princípio é
fundamento de¨ ; princípio não ¨tem base em, princípio é base de¨. Note que
um princípio pode estar contido em várias normas.

DESTINATÁRIO DOS PRINCÍPIOS

Legislador
Aplicador
Intérprete

PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS EM ESPÉCIE

1- PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
2- PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA
3- PRINCÍPIO DA FRAGMENTARIEDADE
4- PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE
5- PRINCÍPIO DA HUMANIDADE
6- PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA
7- PRINCÍPIO DA CULPABILIDADE
8- PRINCÍPIO DA LESIVIDADE
9- PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Qual é então a relevância dos princípios na atualidade?


Hoje, superanda a fase do jusnaturalismo e do juspositivismo, vivemos a
fase do pós-positivismo ou pós-modernidade. Significa dizer que existem
valores expressos ou implícitos na Constituição que são de observância
obrigatória por todos. Estes princípios constitucionais não estão expressos ou
implícitos na Constituição sem um propósito. Hoje reconhece-se a força
normativa desses valores, posto que eles não podem ficar como algo abstrato
na norma. Hoje, esses valores não podem ficar apenas no aspecto abstrato. Os
princípios são a concretização desses valores expressos ou implícitos previstos
na CRFB.

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- Princípio é o mandamento nuclear do sistema (Celso Antonio Bandeira
de Melo). Porque o direito é um sistema jurídico, e para que se interprete esse
sistema tem que se partir de algum lugar, sendo este lugar o núcleo, e o núcleo
é os princípios.
Sobre esse tema, recomendo a leitura do livro Interpretação e Aplicação
da Constituição (Luiz Roberto Barroso).

1. Princípio da Legalidade ou da Reserva Legal – art. 5°, XXXIX


CRFB/88 e art.1° do CP - a conseqüência natural de estar previsto na CRFB é
ter supremacia sobre todo o ordenamento jurídico infraconstitucional. Além de
ter supremacia é uma limitação material ao poder de Emenda, conhecida como
cláusula pétrea, que não pode ser suprimida pelo poder constituinte derivado.
Esse princípio teve origem no art.39 da Carta Magna Inglesa de 1215,
editada ao tempo do Rei João Sem Terra. Este artigo dizia que ninguém
poderia ser detido, ninguém poderia ser preso, despojado de sua propriedade a
não ser em virtude de juízo legal de seus pares e segundo as leis do país.
Vamos buscar o primeiro fundamento lá no princípio da legalidade
administrativa, art. 37 da CR. E essa visão interdisciplinar é importante que
você tenha.
O Estado só pode fazer aquilo que a lei permite, prevê ou autoriza,
enquanto o particular pode fazer tudo aquilo que a lei não proíbe. Então o
Estado só pode praticar um ato jurídico se houver previsão legal.
O Estado exerce o seu jus puniendi coibindo, condicionando condutas,
dessa forma, emprega um meio muito gravoso quando exercer o jus puniendi
que é a pena. Isto porque o Direito Penal trabalha com a restrição do bem
jurídico mais importante depois da vida que é a liberdade.

Estado de Direito em P. da Legalidade são conceitos intimamente


ligados.
Estado de Direito é aquele Estado que se organiza sobre as suas
próprias leis e esse mesmo Estado que cria as leis deve a elas se submeter.
Portanto, se é esse mesmo Estado que exerce o seu jus puniendi, deve haver
autorização na lei para o seu exercício. Na verdade, o que se busca com o P.
da Legalidade é a segurança jurídica.

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É por isso que o penalista austríaco Franz Von Liszt dizia que o
CP é a Carta Magna do delinqüente.
Assim, o princípio da legalidade não se resume apenas em não há crime
sem lei anterior que defina ou pena sem prévia cominação legal.
O P. da Legalidade foi resumido com a expressão latina, Nullun crimen
nulla poena sine lege (não há crime sem uma lei anterior que defina nem pena
sem prévia cominação legal). Essa expressão criada no séc. XIX por um
professor alemão chamado Paul Johann Anselm Ritter Von Feuerbach, e
possui 4 vertentes:
- Praevia - a lei que tipifica uma conduta e a ameaça com uma pena em
abstrato, tem que ser anterior a conduta a conduta do agente; Nasce daqui o P.
da Anterioridade ou Irretroatividade (art.5°, XL CRFB).
- Scripta - se pretende que essa lei que criminaliza determinadas
condutas seja escrita, coibindo a criação ou revogação de crimes e penas por
meio dos costumes, isto porque, uma lei só se revoga por outra lei (art.2°
LICC).
- Stricta - a proibição da analogia in malan parten, ou seja, não há norma
penal incriminadora por analogia; parecido não é tipo, não é crime.
- Certa - se quer afirmar que a lei penal deve ser clara, certa e precisa,
proibindo-se conceitos vagos e imprecisos. Porque vejam, o que se quer com o
princípio da legalidade é a segurança jurídica, e com conceitos vagos e
imprecisos não há segurança jurídica.

Diferença entre Legalidade Formal e Material

- legalidade formal - Consiste na obediência ao processo legislativo


previsto na CRFB, para que uma lei penal possa integrar o ordenamento
jurídico.
- Legalidade material – consiste na obediência daquela lei penal ao
conteúdo da CRFB, ou seja, seus princípios, imposições e proibições.

Princípio da Legalidade X Medida Provisória

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Medida Provisória pode prever/ criar tipos penais? Qual o alcance
da expressão lei?
Lei em sentido formal é aquela discutida, aprovada e promulgada
pelo Congresso Nacional, isto por conta também da segurança jurídica.
Muito se discutiu se medida provisória poderia ou não prever
crimes. Entretanto, com o advento da EC n°32/01 - art.62, §.1°, I 'b' - acabou
com essa discussão, proibindo a medida provisória sobre tema de D.Penal,
Processo Civil e Processo Penal, qualquer tema, sob pena de violar além do
Princípio da Legalidade o Princípio da Separação de Poderes. Isso porque
teremos o executivo praticando um ato típico do poder legislativo.

Norma Penal em Branco Heterogênea X Princípio da


Legalidade

A norma penal em branco heterogênea viola o P. da Legalidade?


Norma Penal em branco heterogênea é aquela que para que tenha
executividade depende de um complemento, complemento este que será
buscado em um ato normativo de hierarquia diferente, inferior daquela principal
(portaria, resolução, regulamento) (ex. Lei de tóxicos 6368 art.36 - não define o
que é substância entorpecente, busca-se esse complemento em uma
resolução chamada de RDC, resolução de diretoria conjunta n° 245/03 do
Ministério da Saúde. Resolução é um ato normativo, mas de hierarquia inferior
em relação a lei. A norma penal em branco heterogênea, por possuir o
complemento que não advém da lei, mas sim em outro ato normativo de
hierarquia diversa, que apesar de possuir força normativa não é lei em sentido
formal, pois não é editada pelo Poder Legislativo, viola o P. da Legalidade?
Duas correntes disputam esse tema:
A primeira corrente sustenta que sim, porque o preceito primário do tipo
penal deve estar previsto em lei, ou seja, ato normativo oriundo do poder
legislativo. Ademais, a se admitir a norma penal em branco heterogênea,
estaria sendo violado o princípio da separação dos poderes, pois o
complemento é editado por órgão do poder executivo. Portanto, a norma penal
em branco heterogênea é inconstitucional. Essa posição é defendida no Brasil

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por Rogério Greco, Nilo Batista, na Argentina por Zaffaroni e Carlos Fontán
Balestra, e na Espanha por Muñoz Conde e Mercedes García Arán.

A segunda corrente sustenta que não. Para que se atenda ao princípio


da legalidade, basta que a descrição básica da conduta criminosa esteja
prevista em lei, ainda que o seu complemento se encontre em outro ao
normativo de hierarquia diversa. Essa é a posição majoritária no Brasil.Por
todos, Mirabete.

Princípio da Legalidade X Medida de Segurança

As medidas de segurança se sujeitam ao P. da Legalidade? O P.


da Legalidade se aplica as medidas de segurança?
Não há crime sem lei anterior que defina nem pena sem prévia
cominação legal. Assim, pergunta-se, a Medida de Segurança é pena?
Medida de segurança é uma espécie de sanção penal, mas não é
pena. Sanção penal é gênero, da qual são espécies a medida de segurança e
a pena.
O P. da Legalidade diz respeito à pena e não as medidas de
segurança. Sobre o tema temos dois posicionamentos:
A primeira corrente sustenta que o P. da legalidade se aplica também as
medida de segurança, com alguns fundamentos: 1° pena e medida de
segurança são espécies do gênero sanção penal, é uma forma de controle
social, onde tem a invasão do Estado na liberdade do indivíduo, sobretudo na
medida de segurança detentiva, art.96, I, CP, na qual há a privação de
liberdade do indivíduo. Essa posição é amplamente dominante e seguida no
Brasil por Cezar Bitencourt, Luiz Regis Prado, Anibal Bruno, Heleno Fragoso,
Magalhães Noronha, Luiz Flávio Gomes, Mirabete. Já no direito comparado
(Espanha) Francisco Muñoz Conde, José Cerezo Mir e Mercedez García Arán.
A segunda corrente sustenta que a medida de segurança não se sujeita
ao P. da Legalidade, uma vez que não está previsto em lei, o art.1° não
menciona. Essa posição é seguida de forma minoritária por Paulo José da
Costa Júnior e Luiz Vicente Cernicchiaro.

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Obs. o CP italiano, no art.199, prevê expressamente que a medida de
segurança se sujeita plenamente ao P. da Legalidade.
O Código Penal espanhol prevê no art. 1º.2, a sujeição das medidas de
segurança ao princípio da legalidade.

Princípio da Anterioridade X Medida de Segurança

O P. da Anterioridade ou Irretroatividade se aplica a medida de


segurança? Duas correntes se formaram sobre esse tema.
A primeira corrente sustenta que as medidas de segurança se sujeitam
sim ao princípio da anterioridade. Fundamento: segurança jurídica. A medida
de segurança é uma forma de controle social. Embora não seja pena, é
espécie de sanção penal. É forma de invasão do Estado na liberdade individual
do cidadão. É a posição de Magalhães Noronha, Cezar Bitencourt, Zaffaroni,
Fragoso, Paulo José da Costa Júnior, Alberto Silva Franco, Guilherme de
Souza Nucci, Delmanto.
O Código Penal português, em seu art. 1º, nº 2, prevê a irretroatividade
dos pressupostos de aplicação das medidas de segurança.
O Código Penal italiano prevê expressamente no art. 199, verbis: ninguém
pode ser submetido a medidas de segurança que não estejam previamente
estabelecidas em lei e fora dos casos por ela previstos.¨
O Código Penal espanhol prevê no art. 2º.1, a sujeição das medidas de
segurança ao princípio da irretroatividde.

A segunda corrente sustenta que as medidas de segurança não se


sujeitam ao princípio da anterioridade, devendo ter aplicação imediata.
Fundamento: se a finalidade da medida de segurança é o tratamento curativo,
pressupões-se que a nova lei traz um tratamento mais eficaz para o
inimputável, devendo desde logo ser aplicada. É a posição sustentada por
Nélson Hungria, Francisco de Assis Toledo, Luiz Vicente Cernicchiaro.
Princípio da Legalidade X Crimes de Perigo Abstrato

Os crimes de perigo abstrato violam o P. da Legalidade?


Uma das várias classificações de crimes é a seguinte:

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Crime de Dano - para se consumar é necessário que haja a efetiva lesão
ao bem jurídico tutelado.
Crime de Perigo - basta que o agente exponha a o bem jurídico em uma
situação de perigo que o crime já estará consumado, não sendo necessária a
efetiva lesão ao bem jurídico tutelado.
Os crimes de perigo se dividem em perigo concreto e perigo abstrato.
Perigo concreto - tem que ficar provado, efetivamente, que aquele bem
jurídico, no caso concreto, correu perigo, não basta a conduta do agente.
Perigo abstrato - basta que o agente pratique a ação perigosa ao bem jurídico,
a lei já presume, de forma absoluta, que aquele bem jurídico correu perigo.
Assim, os crimes de perigo concreto violam o P. da Legalidade? Sobre o
tema temos 2 correntes:
- A corrente tradicional, que é a que predomina majoritariamente,
sustenta que os crimes de perigo abstrato não violam o P. da Legalidade,
porque a tarefa de selecionar o bem jurídico a ser tutelado é exclusiva do
legislador, logo, ele pode sim, em alguns casos, presumir essa situação de
perigo.
- Entretanto, há uma segunda corrente que vai sustentar de forma
minoritária, que os crimes de perigo abstrato violam o P. da Legalidade, já que
a finalidade do D. Penal no Brasil é proteger os bens jurídicos mais relevantes
para a sociedade, a lei não pode presumir perigo sem olhar para o bem
jurídico, sob pena de punir alguém mesmo que o bem jurídico não corra
nenhum perigo. Essa corrente é defendida por Juarez Tavares, Luiz Flávio
Gomes e Luiz Vicente Cernicchiaro.

2. Princípio da Individualização da Pena

Por esse princípio, a pena deve ser aplicada de forma individual, de


acordo com as condições pessoais de cada agente (art.5°, XLVI CRFB e art.59
CP).
Se dois ou mais agentes praticarem o mesmo crime, é bem
provável terem penas diferentes de acordo com as condições pessoais de cada
um (ex. um pode ser reincidente, outro pode ter uma agravante etc).

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Regime de pena também é individualização. Pode ser que, apesar de
terem praticado um mesmo crime, para um agente seja necessário o regime
fechado, enquanto que para outro o semi-aberto. E por que isso? Em razão da
influência do período Iluminista, quando Ceasare Beccaria começou a
sustentar que a pena aplicada a quem cometesse crimes deveria ser a pena
justa. E pena justa é a pena necessária e suficiente para a prevenção e
repressão do crime de acordo com as condições pessoais de cada agente
O P. da Individualização da Pena possui 3 fases:
- Legislativa - feita pelo legislador. O legislador, quando cria o tipo penal
comina uma pena abstratamente. Então, o legislador, abstratamente
individualiza a pena de acordo com cada crime.
- Judicial - feita pelo juiz da vara criminal. O juiz da vara criminal, no
momento de proferir a sentença condenatória, Individualiza a pena de acordo
com cada réu, partindo da pena-base, passando pelas agravantes e
atenuantes e terminando nas causas de diminuição e aumento de pena (art. 68
do CP).
- Executória - feita pelo juiz da vara de execução penal. Aqui já está
sendo executada a pena. Nesta fase o juízo da execução individualiza de
acordo com as condições pessoais de cada réu.
Não podemos esquecer que regime de pena também é individualização

A lei 8.072/90 (Lei de Crimes Hediondos) no art.2° §.1° - dispõe que as


penas do crimes hediondos além do tráfico, terrorismo e tortura, serão
cumpridos em regime integralmente fechado.
Regime e cumprimento de pena faz parte da individualização da pena. E
a grande questão aqui é que o direito peal brasileiro adotou os sistemas
progressivo e regressivo de cumprimento de pena privativa de liberdade. Aqui
está o grande problema porque se a lei estipula o regime integralmente
fechado, estaria impedindo a progressão de regimes.
Reparem que o legislador fixou o mesmo regime de cumprimento de
pena genericamente para todos que cometessem crimes hediondos, tráfico,
terrorismo e tortura.
Assim, esse regime integralmente fechado viola o P. da Individualização
da pena? E se violar, qual será a conseqüência?

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- Uma primeira corrente dizia que o regime integralmente fechado
violava o P. da Individualização da pena, com o fundamento segundo o qual,
quando o legislador fixou o regime genericamente para todos, impedindo que o
juiz individualizasse a pena na segunda fase. O juiz não pode achar, por meio
do art. 59 CP, a pena justa, necessária de acordo com cada réu, violando
também o P. da Individualização da Pena na terceira fase, pois impede que o
juiz da execução conceda a progressão de regime da pena. Essa é a posição
de Alberto Silva Franco e Eugênio Raul Zaffaroni. Essa sempre foi a posição
também do STJ.
- Diametralmente oposta está a segunda corrente, sustentando que o
regime integralmente fechado é constitucional, posto que não viola o princípio
constitucional da Individualização da Pena por 2 fundamentos: 1° ao contrário
de violar, o legislador levou em consideração esse princípio quando fixou o
regime integralmente fechado, levou em consideração na primeira fase, que é a
legislativa, onde o legislador cria e individualiza a pena; o segundo fundamento
é: pela leitura do art. 5°, XLVI CRFB - "a lei regulará" - quando a CRFB utiliza
essa expressão está se referindo a lei ordinária. Assim, a própria CRFB estaria
delegando à lei a função de individualizar a pena, e foi o que a Lei de Crimes
Hediondos fez. Essa é a posição de Cezar Bitencourt, Rogério Greco,
Mirabete, e era a posição do STF (HC 84401 julgado em 18//10/05 publicado -
Informativo 206 do STF).
Agora houve uma inversão de posições porque o STJ passou a
adotar a constitucionalidade do regime integralmente fechado (RESP 766.667
julgado em 6/10/2005 e publicado em 24/10/2005 - STJ).
O STF, na sua nova composição, foi chamado a se manifestar
sobre esse ponto novamente. O STF no dia 23/02/2006, em sessão plenária,
declarou a inconstitucionalidade do regime integralmente fechado, em decisão
apertada por maioria de 6 a 5 (HC 82959 - Relator: Min. Marco Aurélio -
publicado no site do STF em 02/03/2006 as 00:12h). Votaram pela
inconstitucionalidade do regime integralmente fechado os seguintes ministros:
Marco Aurélio, Cezar Peluzo, Carlos Aires de Brito, Gilmar Ferreira Mendes,
Eros Roberto Graus e José Paulo Sepúlveda Pertence. De outro lado, votaram
pela constitucionalidade do regime integralmente fechado os seguintes

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ministros: Carlos Veloso, Joaquim Barbosa, Helen Gracie, Celso de Mello e
Nelson Jobim.
Os argumentos dos ministros foram os mesmos vistos antes, quando eu
citei a controvérsia.
Agora o STJ voltou a julgar pela inconstitucionalidade do regime
integralmente fechado para ter coerência com o STF (HC 46929 julgado em
11/04/06 e publicado em 08/05/2006).

Só tomem cuidado com uma coisa, e isso caiu agora na prova


específica de direito penal do MPRJ. A norma do regime integralmente fechado
não perdeu vigência, tendo em vista que o controle se deu em sede de HC
82959 no STF. Aqui a declaração de inconstitucionalidade foi incidenter tantum,
pelo método difuso por via de exceção, no qual os efeitos são apenas inter
partes, sendo a inconstitucionalidade a causa de pedir na ação de ordem de
habeas corpus.

Em 2007 foi promulgada a lei 11.464, de 28/3/07, que positivou a


jurisprudência do STF, inserido agora na lei de crimes hediondos o regime
inicialmente fechado. Logo, permitindo a progressão de regimes.

Tomem cuidado que essa mesma lei aumentou o prazo para a


progressão de regimes para os condenados por crimes hediondos e
equiparados, que passou a se de dois quintos se o apenado for primário, e três
quintos se reincidente.

Perguntas para a próxima aula.

O Princípio da Insignificância existe?


O Princípio da Insignificância se aplica aos crimes contra a ordem
tributária?

3. Princípio da Intervenção Mínima ou ultima ratio

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É princípio implícito, pois decorre necessariamente dos pressupostos
políticos de um Estado Democrático de Direito. O Direito Penal não é solução
para tudo! Mas a sociedade gosta dele. Por esse princípio, o direito penal só
deve se preocupar com os bens mais importantes e necessários à vida em
sociedade. O Direito Penal intervém na última fase do controle social.
Direito Penal máximo é sinônimo de movimento de lei e ordem, o oposto
do garantismo, defendido por Ralf Dahrendorf, e como tal não deve ser aceito.
A verdade é que as ciências sociais evidenciam que a pena não intimida.
Não adianta pensar que o direito penal é a solução para tudo porque não é.
O Direito Penal deve interferir o menos possível na vida em sociedade,
somente devendo ser solicitado quando os demais ramos do direito não forem
capazes de proteger aqueles bens considerados da maior importância ou de
resolver aquele problema.
Esse princípio orienta o poder incriminador do Estado na criação e
revogação dos tipos penais de acordo com o momento histórico. Se outra
forma de sanções ou outros meios de controle social revelarem-se suficientes
para a tutela de determinado bem jurídico, a sua criminalização será
inadequada e desnecessária. Vocês devem se lembrar, pelo menos os
homens, daquele policial americano que andava de moto, capacete branco e
óculos Ray Ban, o Chips. Pois é, o Chips era um policial que ficava na estrada
escondido atrás de um out door¸ e quando passava um carro acima da
velocidade permitida, ele ia atrás e prendia o sujeito. Lembram? Isso é direito
penal máximo, porque para essa hipótese, já há um ramo do direito que regula
suficientemente o problema, que é o direito administrativo com a multa de
trânsito.
Talvez o legislador nem tenha pensado nisso, mas vejam, um bom
exemplo disso é recente a revogação do crime de adultério. Parece que não
mais se justificava a manutenção daquele tipo penal, pois para essa situação,
já há um ramo do direito que regula suficientemente a matéria, o direito civil de
família que prevê a separação judicial com culpa no caso de adultério, com
todas as conseqüências.
Assim, antes de se recorrer ao Direito Penal devem-se esgotar todos os
meios extrapenais de controle social. O Direito Penal não é a prima ratio, e sim
a ultima ratio.

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4. Princípio da Fragmentariedade

Nilo Batista e outros sustentam que este princípio é um subprincípio da


intervenção mínima.
No P. da Fragmentariedade, busca-se a proteção do D. Penal a apenas
um fragmento do conjunto de bens jurídicos. A seleção desse fragmento a ser
protegido pelo D. Penal é tarefa exclusiva do legislador. Essa seleção de bens
pode variar com o tempo, pode ser que um bem jurídico hoje mereça proteção
do direito penal, mas amanhã não mereça mais. Exemplo: revogação do
adultério
O professor espanhol Muñoz Conde resume o caráter fragmentário do
direito em uma tríplice forma, afirmando que esse princípio ao mesmo tempo,
defende os bens jurídicos somente contra ataques de especial gravidade;
tipificando apenas uma parte do que nos demais ramos do ordenamento
jurídico se tem como antijurídico; não punindo, em princípio, as ações
meramente imorais.

5. Princípio da Subsidiariedade
É tido também como um subprincípio da intervenção mínima, dentre os
autores que entendem dessa forma, Nilo Batista. A intervenção do D. Penal
está condicionada a incapacidade dos demais mecanismos de controle social
em proteger o bem jurídico ou solucionar o problema. Isto porque o D. Penal é
uma espécie de “monstro”, que priva o direito de liberdade, o maior bem
jurídico depois da vida.
Significa que a intervenção do D. Penal está condicionada a
incapacidade dos demais mecanismos de controle social em resolver
adequadamente o problema.
É bem verdade que ele se confunde um pouco com o princípio da
intervenção mínima já visto. Por que parte da doutrina o considera como
subprincípio daquele.

6. Princípio da Humanidade

17
Esse p. veio para extinguir de vez as penas cruéis, corporais,
degradantes. Nenhuma pena privativa de liberdade pode ter uma finalidade que
atente contra a dignidade da pessoa humana (art.5, XLVII CRFB).
Art.5° XLVII - não haverá penas degradantes. Esse inciso não pode ser
retirado da CRFB nem por Emenda Constitucional, isto por conta da limitação
material ao poder de emenda, que são as cláusulas pétreas. Basta verificar a
evolução histórica das penas.

Na era primitiva as penas variavam: cortava-se os dedos dos ladrões;


evoluindo para as mãos e para os pés em caso de reincidência; cortava-se a
língua de quem insultasse um homem de bem; o homem adúltero queimava na
cama ardente; a mulher adúltera era entregue para a cachorrada faminta.

No Código de Hamurabi, inegavelmente, foi adotado pela primeira vez o


princípio da proporcionalidade. Como funcionava? Era olho por olho, dente por
dente. O Código de Hamurabi dizia que: “artigo 196- se um homem arrancar o
olho de outro homem, o olho do primeiro deverá ser arrancado”; “artigo 197- se
um homem quebrar o osso de outro homem, o primeiro terá também seu osso
quebrado”. Perceberam? Não era razoável, mas era proporcional.

Foi na idade média que surgiu a pena privativa de liberdade. A Igreja


punia os seus infiéis com a pena de penitência. Daí o nome penitenciária. O
agente ficaria trancado em quarto cumprindo penitência. Daí a origem da
palavra penitenciária. Na idade média, entre 1.100 e 1.550, aquele que cometia
o terceiro furto era condenado à pena de morte. Essa é inclusive a razão da
criação do crime continuado.

Entretanto, o Iluminismo no séc. XVIII foi o marco inicial para uma


mudança de mentalidade quanto às penas. Por intermédio das idéias de um
jovem advogado chamado Ceasare Beccaria, começou-se a começou a
sustentar que a pena para cada agente deve ser a pena justa e a pena justa é
aquela necessária e suficiente para a prevenção e repressão do crime.
Agora a pergunta que eu faço é: será que o nosso CP adotou essa idéia
de pena justa como aquela necessária e suficiente para a prevenção e
repressão do crime? Sim, basta abrir o art. 59 do CP que fala exatamente com
essas palavras na sua parte final.

18
O art. 5°, XLVII CRFB pode ser suprimido per emenda constitucional?
Não pode porque umas das características do poder constituinte derivado é a
sua limitação, devendo respeitar as limitações ao poder de emenda e aqui a
limitação é material – cláusula pétrea.
E por um nova constituição? Pode uma nova Constituição mudar o
art.5°, XLVII da CRFB?
A doutrina majoritária entende que sim, pois uma nova Constituição é
exercício do poder constituinte originário e, portanto, ilimitado.
Outra parte da doutrina, dentre outros Rogério Greco, não pode, posto
que os direitos e garantias individuais do art.5° CRFB/88 são garantias
conquistadas ao longo da evolução da humanidade.

7. Princípio da Culpabillidade

É exteriorizado pela expressão nullun crimen sine culpa.


Hoje, o maior estudioso, a maior autoridade em se tratando de
culpabilidade é o professor espanhol Santiago Mir Puig. Para este autor a
culpabilidade se divide em 3 vertentes:
1. A culpabilidade como elemento integrante do conceito analítico de
crime.
No seu conceito analítico, o crime tem 3 elementos, a saber, fato típico ,
ilicitude e culpabilidade. Culpabilidade hoje é sinônimo de reprovabilidade ou,
como prefere Zaffaroni reprochabilidade (que é sinônimo de censura). É um
juízo de reprovação que recai em um sujeito que praticou um ilícito penal (fato
típico e ilícito). Essa vertente será abordada quando estudarmos a teria do
crime

2. Como elemento medidor da aplicação da pena.


Nessa vertente a culpabilidade funciona como fundamento e limite da
aplicação da pena. Mais uma vez, trazemos as idéias de Ceasare Beccaria,
quando afirmou que a pena justa é aquela necessária e suficiente para a
prevenção e repressão do crime.

19
Basta verificar o art.59 CP, que tem a culpabilidade como primeiro
elemento a ser levado em consideração no momento da aplicação da pena. A
culpabilidade é o norte que o juiz tem para chegar a aplicação da pena.

3. Como elemento que visa a afastar a responsabilidade penal objetiva.


Toda responsabilidade penal é sempre subjetiva, ou seja, sem dolo ou
culpa, aquela conduta é irrelevante para o direito penal. Ninguém poderá
responder por um resultado absolutamente imprevisível, sem que tenha agido
com dolo ou culpa. A responsabilidade penal é sempre pessoal, não existe
responsabilidade penal coletiva, subsidiária solidária ou sucessiva.
Vejam alguns dispositivos legais:
Lei 4728/65 (disciplina o mercado de capitais). O art. 73 § 2º diz que em
caso de pessoa jurídica, a responsabilidade penal recairá sobre todos os seus
diretores. Estabelece responsabilidade penal coletiva e objetiva. É
inconstitucional por violar o princípio da culpabilidade. Por todos, Nilo Batista.

Lei 5250/67 (crimes de imprensa). O art. 37 e ss. estabelecem


responsabilidades penais sucessivas, em cascata. Prevê responsabilidade
penal sucessiva e objetiva. É inconstitucional por violar o princípio da
culpabilidade. Por todos Nilo Batista.

LCP – dec. Lei 3688/41, art. 3º diz que se deve perquirir dolo ou culpa
somente quando a lei estabelecer. Estabelece responsabilidade penal objetiva.
Não é somente quando a lei estabelece, e sim sempre deve ser perquirido dolo
ou culpa do agente. É inconstitucional por violar o princípio da culpabilidade.
Existe uma fórmula genérica chamada versari in re illicita, segundo a qual
o agente respondia pelas conseqüências dos seus atos, incluídas as
decorrentes de caso fortuito. Essa fórmula não tem mais aplicabilidade, em
face do princípio da culpabilidade.

Essa terceira vertente do P. da culpabilidade impede ainda a punição do


agente nos crimes qualificados pelo resultado, se esse resultado qualificador
não decorrer de dolo ou de culpa. Art. 19, CP. Ex. Art. 129, §2º, V. Por
exemplo, se o agente não sabia que a mulher estava grávida, não agiu com

20
dolo; também não lhe era previsível, não agindo com culpa. Portanto, não
responderá pela qualificadora, sob pena de violação do princípio da
culpabilidade.
Essa terceira vertente do P. da culpabilidade impede também a punição
por resultados absolutamente imprevisíveis, sem que o agente tenha agido
com dolo ou culpa.
Essa terceira vertente do P. da culpabilidade impede, por fim, a
punibilidade do agente por ele não ter podido conhecer a ilicitude ou adequar a
sua conduta ao direito.

8. Princípio da Insignificância

Esse princípio foi criado por Claus Roxin em 1964. Também


chamado de P. da Bagatela (expressão criada por Klaus Tiedemann).
Esse princípio está ligado a tipicidade da conduta. É na tipicidade
que você vai fazer incidir esse princípio dentro da teoria d crime. Assim,
quando o principio incidir, a conseqüência é a atipicidade material da conduta,
ou seja, analisa o grau de violação do bem jurídico.
Isso porque além da tipicidade formal, a doutrina entende que deve-se
trabalhar também com a tipicidade material porque deve se perquirir o grau de
violação do bem jurídico, tendo como conseqüência a atipicidade da conduta.
Portanto, uma vez aplicado o princípio da insignificância, o réu será
absolvido com base no art. 386, III do CPP, ou seja, quando o fato não
constituir crime.

Para a doutrina tradicional - o P. da Insignificância existe e deve ser


aplicado, gerando a atipicidade material (majoritária). Sempre se entendeu que
há a incidência do princípio porque o grau de ofensa ao bem jurídico é ínfimo, a
ponto de não justificar a incidência d direito penal.
Há uma doutrina bem moderna, recente, que sustenta que o P. da
Insignificância não existe e não pode ser aplicado, com alguns fundamentos:
1. ausência de previsão legal
2. a norma de proibição tem atualmente um inegável fundamento na
necessidade da reafirmação da vigência das normas de convívio pacífico em

21
sociedade (não é só o bem jurídico que deve ser verificado, mas também a
norma de convívio social).
3. todo crime por si só já é uma lesão a juridicidade, já lesa o
ordenamento jurídico.
4. impossibilidade de se definir um critério lógico objetivo para a aferição
do que vem a ser insignificante, o que varia de pessoa para pessoa.
5. a definição acerca do que deve merecer ou não a proteção do penal é
tarefa exclusiva do legislador, e não do intérprete da lei.
6. por ser tarefa exclusiva do legislador ele optou por não descriminalizar
as condutas que causem lesão de pequena monta. Pelo contrário, por meio da
lei 9099/95 o legislador criou um procedimento específico para essas condutas
que causam lesão de pequena monta, inclusive com medidas
despenalizadoras, como por exemplo a transação penal.
Essa posição é sustentada hoje por Alexandre Araripe Marinho e
Marcelus Polastri Lima, sendo o primeiro titular da banca de direito penal do
MPRJ.
A autoridade policial analisa apenas o fato típico (tipicidade
formal), não podendo aplicar o P. da Insignificância.

Vejam no STJ o HC 41638 julgado em 07/03/06, publicado em 17/04/06.


O STJ aplicou o princípio da insignificância porque no caso concreto o agente
subtraiu um carregador e uma capa de celular do Supermercado Carrefour, no
valor total de R$56,40, Disse o acórdão que não constitui crime de furto, pois
inexistente a tipicidade material. Disse ainda o acórdão que na aplicação do
princípio da insignificância leva-se em conta, tão só, o valor da coisa subtraída
e nunca a utilidade que propicia ao proprietário ou possuidor, à vista do bem
jurídico que se tutela, o patrimônio;

Aplica-se o P. da Insignificância aos crimes contra a ordem tributária?

Princípio da insignificância no STF e STJ. Entendimento anterior. Os


Tribunais superiores tinham entendimentos diversos acerca da incidência do
princípio de insignificância nos crimes contra a ordem tributária. De um lado, o
STJ tinha jurisprudência pacificada no sentido de que se o valor do tributo

22
sonegado não ultrapassasse R$ 100,00, aplicava-se o princípio da
insignificância, por não haver lesão significante ao bem jurídico tutelado ordem
tributária, com base no art 18, § 1º, da lei 10.522/2002, que determina o
cancelamento do débito, dispondo que ficam cancelados os débitos inscritos
em Dívida Ativa da União, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 100,00
(cem reais). Se afirmava que não se deveria confundir o art 18, § 1º com art.
20, ambos de lei 10.522/2002. O art. 20, que traz o valor de R$ 10.000,00, que
não determina o cancelamento do débito tributário, mas tão somente
arquivamento dos autos sem baixa na distribuição, ao dispor que serão
arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador
da Fazenda Nacional, os autos das execuções fiscais de débitos inscritos como
Dívida Ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou por ela
cobrados, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais).
De outro lado, o STF entendia que o princípio da insignificância deveria incidir
quando o valor do tributo reduzido ou suprimido sonegado não ultrapassasse o
valor de R$ 10.000,00, com fundamento no art. 20 da lei 10.522/2002. Para o
STF, se a lei diz que os autos da execução fiscal serão arquivados e o Fisco
não irá cobrar, é porque aquele valor é irrelevante para o Fisco. Assim, não
pode um mesmo valor ser irrelevante para o Fisco na esfera administrativa e
também não ser irrelevante na esfera penal.

Princípio da insignificância. Entendimento atual. Depois de muitas


discordâncias, o STF e o STJ pacificaram as suas jurisprudências no sentido
de que o princípio da insignificância deve ser aplicado aos crimes contra a
ordem tributária, tendo como critério o valor do tributo suprimido ou reduzido,
com base no art. 20 lei 10.522/2002, que determina o arquivamento dos autos
da ação de execução fiscal, sem baixa na distribuição, que dispõe: “serão
arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do Procurador
da Fazenda Nacional, os autos das execuções fiscais de débitos inscritos como
Dívida Ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou por ela
cobrados, de valor consolidado igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais)”.
Assim, se o valor do tributo suprimido ou reduzido não ultrapassar o limite de
R$ 10.000,00, reconhece-se o princípio da insignificância. O mesmo

23
entendimento se aplica a outros crimes de natureza tributária, como o
descaminho (art. 334 do Código Penal).
STF. INFORMATIVO Nº 552.
PRIMEIRA TURMA.

Descaminho e Princípio da Insignificância - 2


Considerou-se que, na espécie, dois aspectos objetivos deveriam ser
considerados: 1) a inexpressividade do montante do débito tributário apurado,
se comparado com a pena cominada ao delito (de 1 a 4 anos de reclusão) e
com o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), previsto no art. 20 da Lei
10.522/2002, para o arquivamento, sem baixa na distribuição, dos autos das
infrações fiscais de débitos inscritos como dívida ativa da União; 2) o fato de ter
havido a apreensão de todos os produtos objeto do crime de descaminho.
Registrou-se, todavia, a necessidade de uma maior reflexão sobre a matéria,
de modo a não se afirmar, sempre, de forma objetiva, a caracterização do
princípio da insignificância quando o valor não seja exigível para o Fisco,
devendo cada caso ser analisado conforme suas peculiaridades. Vencido o
Min. Marco Aurélio, que indeferia o writ ao fundamento de que, no que tange ao
patrimônio privado, não se chegaria a assentar o crime de bagatela quando a
res alcançasse o valor de R$ 10.000,00, não sendo coerente, destarte, decidir-
se em sentido contrário quando se visasse proteger a coisa pública. Asseverou,
ademais, ser relutante em admitir essa fixação jurídica criada pela
jurisprudência, na medida em que tal preceito não se encontraria em dispositivo
normativo algum. HC 96661/PR, rel. Min. Cármen Lúcia, 23.6.2009.

STJ. INFORMATIVO Nº 406.

TERCEIRA SEÇÃO.

REPETITIVO. DESCAMINHO. PRINCÍPIO. INSIGNIFICÂNCIA.

A Seção, ao julgar o recurso repetitivo (art. 543-C do CPC e Res. n. 8/2008-


STJ), entendeu que, em atenção à jurisprudência predominante no STF, deve-
se aplicar o princípio da insignificância ao crime de descaminho quando os
delitos tributários não ultrapassem o limite de R$ 10 mil, adotando-se o
disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002. O Min. Relator entendeu ser
aplicável o valor de até R$ 100,00 para a invocação da insignificância, como

24
excludente de tipicidade penal, pois somente nesta hipótese haveria extinção
do crédito e, consequentemente, desinteresse definitivo na cobrança da dívida
pela Administração Fazendária (art. 18, § 1º, da referida lei), mas ressaltou seu
posicionamento e curvou-se a orientação do Pretório Excelso no intuito de
conferir efetividade aos fins propostos pela Lei n. 11.672/2008. REsp
1.112.748-TO, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 9/9/2009.

Princípio da insignificância X crimes ambientais


Sim. O STF aplicou o referido princípio em decisão liminar no RHC
88.880, relator Min. Gilmar Mendes. Informativo 430.
No caso concreto, o recorrente havia cortado duas árvores de espécie
nativa Pinheiro brasileiro, configurando o crime do art. 50 da lei 9605/98.
O relator disse que o corte de duas árvores, em um conjunto de sete
outras árvores da mesma espécie na configura degradação ou risco de
degradação de toda a flora que compõem o ecossistema local.
Fundamentou também no princípio da intervenção mínima e da
subsidiariedade, ao argumento segundo o qual o direito administrativo já
regulamenta satisfatoriamente o caso.
Disse, ainda, que um conjunto de 7 árvores não chega a compor um
floresta-elemento do tipo.
Advertência: essa foi uma decisão monocrática, em sede de liminar.
Deve-se aguardar o julgamento do mérito para saber se essa decisão será
mantida pelo STF ou se será reformada.

Princípio da insignificância X posse de drogas praticado por militar

JURISPRUDÊNCIA - STF
INFORMATIVO 515

PRIMEIRA TURMA – NÃO APLICOU

Art. 290 do CPM e Princípio da Insignificância

25
A Turma indeferiu habeas corpus impetrado em favor de militar condenado
pela prática do crime de posse de substância entorpecente em lugar sujeito à
administração castrense (CPM, art. 290). Buscava-se o restabelecimento da
decisão absolutória proferida em primeira instância, na qual aplicados os
princípios da insignificância e da proporcionalidade. Considerou-se que, no
caso, o fato não seria penalmente irrelevante e que a existência de
precedentes do STF no sentido pretendido pelo paciente, inclusive admitindo a
incidência do postulado da insignificância e aplicação da Lei 11.343/2006 à
justiça militar, não seria bastante a demonstrar como legítima a sua pretensão.
Asseverou-se que, na espécie, o paciente, preso em flagrante em
estabelecimento castrense, informara que sabia estar cometendo um ilícito
penal e que levaria o entorpecente para um colega de farda que lhe pedira para
comprar a substância. Tendo isso em conta, refutou-se o alegado
constrangimento ilegal, haja vista que a droga apreendida, além de ter sido
encomendada por outra pessoa, seria suficiente para o consumo de duas
pessoas, o que configuraria, minimamente, a periculosidade social da ação do
paciente.
HC 94649/RJ, rel. Min. Cármen Lúcia, 12.8.2008. (HC-94649)

SEGUNDA TURMA - APLICOU

Art. 290 do CPM e Princípio da Insignificância


A Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de militar condenado
pela prática do crime de posse de substância entorpecente em lugar sujeito à
administração castrense (CPM, art. 290). Preliminarmente, reconheceu-se a
legitimidade ativa do membro do Ministério Público Militar de primeira instância,
para, mesmo em sede originária, impetrar habeas corpus perante o STF. No
mérito, enfatizou-se que o princípio da insignificância qualifica-se como fator de
descaracterização material da tipicidade penal e que, para sua incidência, deve
ser observada a presença de certos vetores, tais como: a mínima ofensividade
da conduta do agente; a ausência de periculosidade social da ação; o
reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade
da lesão jurídica provocada. Ademais, acentuou-se que a jurisprudência desta
Corte tem admitido a inteira aplicabilidade desse postulado aos delitos

26
militares, mesmo que se cuide de crime de posse de quantidade ínfima de
substância entorpecente, para uso próprio, e ainda que se trate de ilícito penal
perpetrando no interior de organização militar. Precedentes citados: HC
84307/RO (DJU de 25.5.2005); HC 85725/RO (DJU de 23.2.2007); RHC
89624/RS (DJU de 7.12.2006); HC 87478/PA (DJU de 23.2.2007); HC
922634/PE (DJU de 5.9.2007).
HC 94809/RS, rel. Min. Celso de Mello, 12.8.2008. (HC-94809)

INFORMATIVO 508

Crime Militar - Entorpecente - Posse - Uso Próprio - Quantidade Ínfima -


Princípio da Insignificância (Transcrições)

HC 94809 MC/RS*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

EMENTA: “HABEAS CORPUS” IMPETRADO, ORIGINARIAMENTE,


PERANTE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, POR MEMBRO DO
MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR DE PRIMEIRA INSTÂNCIA.
LEGITIMIDADE ATIVA RECONHECIDA. DOUTRINA.
JURISPRUDÊNCIA. PORTE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE.
CRIME MILITAR (CPM, ART. 290). QUANTIDADE ÍNFIMA.
INVOCAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA, COMO FATOR
DE DESCARACTERIZAÇÃO MATERIAL DA TIPICIDADE PENAL.
POSSIBILIDADE DE SUA APLICAÇÃO AOS CRIMES MILITARES.
PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MEDIDA
CAUTELAR DEFERIDA.

INFORMATIVO Nº 492

27
Art. 28 da Lei 11.343/2006 e Crime Militar
A Turma deferiu habeas corpus para absolver militar condenado pela
prática do crime de posse de substância entorpecente em lugar sujeito à
administração castrense (CPM, art. 290), decorrente do fato de ter sido preso
em flagrante quando fumava e portava cigarro de maconha no interior de
unidade militar. Tratava-se, na espécie, de writ impetrado pela Defensoria
Pública da União contra acórdão do STJ que mantivera entendimento do STM
quanto à inaplicabilidade do princípio da insignificância no âmbito da justiça
militar. Concluiu-se pela aplicação desse princípio, na hipótese, porquanto
preenchidos seus requisitos objetivos, a saber: mínima ofensividade da
conduta; ausência de periculosidade social da ação; reduzido grau de
reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica
causada. Ademais, a despeito do princípio da especialidade e em atendimento
ao princípio da dignidade da pessoa humana, considerou-se que a Nova Lei de
Drogas (Lei 11.343/2006) deveria incidir na hipótese, não obstante tal
possibilidade não tivesse sido examinada pelo STJ. No ponto, ressaltou-se que
a referida norma prevê que a distinção entre usuário de drogas e traficante
deve ter por base o caso concreto e que o primeiro precisa ser recuperado ao
invés de penalizado, tratando-se, pois, de norma claramente benéfica ao
usuário e dependente de drogas. Por fim, salientou-se que o paciente já fora
punido com exclusão das fileiras do Exército, sanção suficiente para que
restassem preservadas a disciplina e a hierarquia militares.
HC 92961/SP, rel. Min. Eros Grau, 11.12.2007. (HC-92961)

INFORMATIVO Nº 489

Crime Militar e Princípio da Insignificância


Por falta de justa causa, a Turma deferiu habeas corpus para trancar ação
penal promovida contra militar acusado da suposta prática do delito de
abandono de posto (CPM, art. 195). Tratava-se, na espécie, de writ impetrado
pela Defensoria Pública da União em favor de cabo da marinha que, diante da
necessidade de socorrer seu filho que fora internado, em caráter de urgência,
para a retirada de rim, afastara-se por algumas horas de seu posto de serviço

28
(vigiava bomba de gasolina fechada a cadeado). No caso, ante o reduzido grau
de reprovabilidade da conduta e considerando seus motivos determinantes,
aplicou-se o princípio da insignificância e entendeu-se configurada, ainda,
causa excludente de ilicitude, qual seja, o estado de necessidade. Ademais,
ressaltou-se a jurisprudência da Corte no sentido da aplicabilidade, ao
processo penal militar, do aludido princípio da insignificância. Ordem concedida
para determinar a extinção definitiva do procedimento penal instaurado contra o
paciente, que tramita perante o Juízo da 4ª Auditoria Militar da 1ª Circunscrição
Judiciária Militar do Rio de Janeiro.
HC 92910/RJ, rel. Min. Celso de Mello, 20.11.2007. (HC-92910)

Princípio da insignificância X Crime de moeda falsa

Não se aplica. O bem jurídico tutelado é a fé pública.

STJ - Informativo n. 393

Quinta Turma

MOEDA FALSA. NOTAS. 50 REAIS. PRINCÍPIO. INSIGNIFICÂNCIA.

A Turma negou a ordem por entender que não se aplica o princípio da


insignificância ao crime de moeda falsa por tratar-se de delito contra a fé
pública, visto que é interesse estatal a sua repreensão. Precedentes citados do
STF: HC 93.251-DF, DJ 22/8/2008; do STJ; AgRg no REsp 1.026.522-CE, DJ
8/9/2009; REsp 964.047-DF, DJ 19/11/2007, e HC 52.620-MG, DJ 10/9/2007.
HC 129.592-AL, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 7/5/2009.

STF - INFORMATIVO 514

Falsificação de Moeda e Princípio da Insignificância

A Turma indeferiu habeas corpus em que condenado pela prática do delito


previsto no art. 289, § 1º, do CP, por portar 10 cédulas falsas, cada uma com
valor facial de R$ 5,00, pleiteava a aplicação do princípio da insignificância.
Considerou-se que o paciente, ao fazer circular as notas falsas, sem comprovar

29
a sua boa-fé, incorrera no crime de falsificação de moeda falsa, cujo bem
jurídico tutelado é a fé pública. Desse modo, o tipo penal em questão não tem
como pressuposto a ocorrência de prejuízo econômico, objetivamente
quantificável, mas a proteção de um bem intangível, que corresponde à
credibilidade do sistema financeiro.
HC 93251/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 5.8.2008. (HC-93251)

Princípio da Lesividade

Qual a finalidade do direito penal? Proteger os bens jurídicos mais


importantes para a vida em sociedade.
Vocês vão reparar que esse princípio tem total e direta ligação com a
finalidade do direito penal.
Uma conduta só pode ser criminalizada se ela efetivamente causar lesão
ou ameaça real de lesão ao bem jurídico penalmente tutelado. Esse princípio
possui 4 vertentes:
1. Proibir a incriminação do pensamento - quando o agente pensa em
cometer um crime não está ferindo nenhum bem jurídico tutelado pelo do
penal. Logo não poderá ser punido por isso. É por isso que a cogitação,
primeiro momento do iter criminis, não é punida.

2. Proibição de incriminação de condutas que não excedam o próprio


agente.

3. Proibir a incriminação de simples estados de existência. Se uma


pessoa um dia quiser se colocar em algum estado de existência, não se pune o
autor por aquilo que ele é, mas pelo que ele pratica. Caso contrário, estaríamos
falando em direito penal do autor, e não em direito penal do fato.

4. Proibição de incriminação de condutas que não afetem qualquer bem


jurídico. Essa vertente é a mais genérica. É por isso que os atos preparatórios,

30
segundo momento do iter criminis, não é punido, pois não há lesividade a
nenhum bem jurídico tutelado, salvo se constituir um crime autônomo.
E por que os atos executórios já podem ser punidos? Por que o direito
penal já se manifesta a partir dos atos executórios, terceiro momento do iter
criminis?
Por dois fundamentos. Primeiro porque o art. 14, II do CP diz
expressamente “iniciada a execução”. Segundo porque, veremos mais a frente,
que a partir dos atos executórios já há lesividade ao bem jurídico tutelado.

Então olha pra cá. Iter criminis:


a) cogitação - não é punida em razão da primeira vertente.
b) atos preparatórios - não são punidos em razão da segunda e quarta
vertentes.
c) atos executórios - a partir daqui já poderá haver a punição do agente,
porque já foi iniciada a execução (art.14, II CP) e porque já há lesividade a um
bem jurídico tutelado.
d) consumação.

Vejam a importância prática e clara desse princípio. O suicídio é crime?


Hoje não, mas era crime no direito canônico porque o suicídio era equiparado
ao homicídio e sanção era: o suicida era descomungado e não tinha direito a
uma sepultura cristã. E Hoje não é crime por que? Olha para as vertentes do
princípio da lesividade, sobretudo segunda e quarta vertentes. Da mesma
forma, e pelos mesmos fundamentos, a tentativa de suicídio também não é
punida pelos mesmos fundamentos, ou seja, princípio da lesividade.
Outro exemplo é o crime impossível - tem como conseqüência a
atipicidade da conduta. E por que? Porque não há lesividade, logo não pode
ser punido.
Outro exemplo ainda é o art.127 CP. Causa de aumento de pena para o
crime de aborto. Se aplica aos artigos 125 e 126. Se aplica ao aborto com ou
sem consentimento da gestante. Com relação ao auto-aborto não se aplica,
isto porque a gestante em decorrência das manobras abortivas causou em si
mesma lesão corporal grave. Não há lesividade a nenhum bem jurídico de
terceiros.

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O uso de substância entorpecente tem lesividade?
A doutrina majoritária diz que configura crime porque há lesividade, posto
que é um crime de perigo comum e de perigo abstrato, e para este tipo de
crime a tão somente conduta de usar a substância entorpecente, porque afeta
a saúde pública e o bem estar social.
Para Nilo Batista e outros (minoria), a conduta de uso não oferece a
lesividade, porque quando o sujeito usa, ele pratica uma conduta que não afeta
nenhum bem jurídico tutelado e não transcende o próprio agente, por isso não
há lesividade.

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