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O JORNALISMO DE CIDADES E AS PRÁTICAS COTIDIANAS

Amanda Tenório

O que é o jornalismo de cidades?

Antes mesmo de discutirmos o que seria supostamente entendido como jornalismo de


cidades, ou seja, o caderno mais habitual nos jornais brasileiros, devemos compreender o momento
dos estudos sobre a cidade em suas diversas facetas presentes nas ditas ciências humanas e sociais.
De antemão, entretanto, de uma coisa precisamos estar atentos: a imprecisão histórica e
antropológica do conceito de cidade. Ou seja, finalmente, de que cidade ou cidades estamos
discutindo? E em que tempo e em que espaço? Em “A ideia de cidade”, Joseph Rykwert (2006, p.
216) entende que muitos conceitos sobre o mesmo tema acabam coexistindo:

Esta multiplicidade de projetos de mundo, cada qual explicado por seu próprio mito
etiológico é, via de regra, desconcertante para o leitor ocidental moderno, que
espera que uma das explicações seja preferível às demais. Isso nunca acontece. Do
mesmo modo, os modelos do universo coexistem, completam-se e, às vezes – como
ocorre entre os dogons com o modelo referente ao corpo ou ao modelo da cesta
orientada – são impostos um sobre o outro.

A história das cidades

Os estudos sobre a complexidade e a importância das cidades na sociedade começaram há


um longo tempo, e não apenas com a concepção grega da pólis. Na divisão histórica tradicional
podemos segmentar a história das cidades, a chamada história urbana, ramo responsável pelo estudo
das áreas urbanizadas, seguindo a linha cronológica das grandes civilizações.
Na região da Mesopotâmia desenvolveram-se, há alguns mil anos, cidades como Ur, relatada
pela Bíblia. Na Idade Média observamos cidades com população de 120 a 150 mil habitantes como
Alexandria e Cartago. Historiadores acreditam que em I a.C. Roma chegou a ter mais de 1 milhão
de moradores.
Depois disso, seguindo um longo percurso, os pesquisadores da modernização Ribeiro &
Pechman (1996, p.16) admitem que: “Entre os anos de 1900-1910, a cidade é transformada em
objeto global de intervenção. As palavras ou expressões urbanismo, city planning ou ciência da
cidade começaram a ser usadas na França, na Inglaterra e nos Estados Unidos”.
Nesse sentido os tempos modernos da urbanização das cidades são marcados pelo
crescimento exorbitante de atividades, das mais variadas, desenvolvidas numa rede aonde circulam
tanto homens quanto máquinas e bens.
Assim, voltando-se para a realidade local, o Brasil, país descoberto oficial em 1500, com
população aproximada de 190 milhões de habitantes, é um dos únicos do mundo a definirem o
município como uma entidade administrativa urbana local, cuja definição assemelha-se a de cidade.
Segundo o IBGE, (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) o país possui 5.565
municípios e um distrito federal. Em 2003 foi criado o Ministério das Cidades, cujo objetivo tem
sido realizar o planejamento urbano e a fiscalização dos aglomerados urbanos do país, segundo as
diretrizes e os princípios constantes na Constituição. De acordo com Barros (2007, p.108), para ser
considerada uma cidade, o local deve conter as seguintes características, entre outras:

Um determinado qualitativo populacional formado por indivíduos socialmente


heterogêneos; uma localização permanente; uma considerável extensão espacial,
um certo padrão de espacialidade e de organização da propriedade; a ocorrência de
um certo padrão de convivência; a identificação de um modo de vida característico
dos citadinos; a presença de ocupações não agrícolas; a presença de um
quantitativo populacional considerável, cujo limiar é redefinido a cada época da
história; a ocorrência de uma considerável densidade populacional; uma abertura
externa; uma localidade de mercado. (BARROS, 2007, p. 108)

A temática das cidades no jornalismo

Na sociedade moderna a temática das cidades passou a ser estudada por vários campos,
inclusive o jornalismo, suscitando pesquisas interdisciplinares. Geografia urbana, sociologia urbana,
antropologia urbana são todas responsáveis em suas respectivas delimitações pelo estudo das
cidades e suas formas sociais.
O nosso objeto de estudo neste segmento será claramente a cidade como um lugar onde a
vida cotidiana coexiste com elementos humanos individuais e práticas sociabilizantes. O jornalismo
de cidades se preocupa basicamente com os fatos que ocorrem repetidamente no âmbito das
cidades, das suas ruas e bairros, acontecimentos estes que não poderiam estar incluídos em outros
cadernos, como política - no qual já conhecemos as personagens, esportes nem cultura.
Entretanto, é preciso pensar nas cidades não apenas no lugar do objetivo, mas também do
subjetivo, ou seja, na possibilidade do simbólico. Seja por meio de desenhos, discursos e gráficos, a
cidade tem a capacidade de ser tanto um desejo do observador quanto uma possibilidade de se
tornar real. Em “Espelho das Cidades”, Henry-Pierre Jeudy (2005, p.81) afirma que:

A cidade excede a representação que cada pessoa faz dela. Ela se oferece e se retrai
segundo a maneira como é apreendida. Uma certa nostalgia parece nos fazer
acreditar que a cidade não corresponde mais ao signo porque se teria tornado
excessivamente percebida graças aos símbolos de sua monumentalidade exibida.

O caderno de cidades é o espaço da vida comum, das rotinas do dia a dia e por isso da
interação social. É o lugar do jornal destinado aos desconhecidos, onde desde os acusados até as
vítimas encontram um forte apelo perante os leitores, visto que as passagens, mesmo que retratadas
com uma certa frequência, sempre ocorrem.

Cotidiano, jornalismo de cidades e interacionismo simbólico da Escola de Chicago

Os pesquisadores dessa vertente do estudo da antropologia e sociologia surgida na década


de 1910 nos Estados Unidos, mais precisamente em Chicago, acreditam que as cidades são amplos
“laboratórios sociais”. Seu principal atributo era utilizar a etnografia para a coleta de dados e tentar
entender como se davam as formas de vida em ambientes notadamente urbanos unto a seus
problemas característicos.
A aparição dessa escola no período entre-guerras pode ser explicada pelo inchaço da
população urbana e o consequente agravamento dos problemas da metrópole de Chicago que não
estava preparada para receber todas essas pessoas.
Do ponto de vista epistemológico e metodológico existem várias “escolas” de Chicago. Essa
corrente que indicamos, em especial, surgiu na década de 1960 sob orientação de Goffman,
Garfinkel e Cicourel, direcionando, o que para muitos, viria a ser a etnometodologia e fazendo
aumentar o interesse em torno dos estudos da agora conhecida “sociologia do cotidiano”.
A principal contribuição da escola era a ideia de que os significados sociais são produzidos
nas circunstâncias interatuantes dos atores. E é nesse momento que o pesquisador deve estar
presente, a partir de observações diretas e conhecimento prático.
Dessa forma, essa corrente presta-se de maneira eloquente ao jornalismo de cidades já que
está fortemente ancorada na ideia de desvio, ou seja, essa sociologia irá dar apoio ao estudo das
formas de sociabilidade e socialidade onde os sujeitos encontram-se desestabilizados. Nesse caso, o
estigma foi uma palavra-chave ao lidar com algumas personagens e grupos que foram retratados nas
matérias e verbetes.

Como se define o jornalismo de cidades na Paraíba?

Na Paraíba temos três publicações que dominam o mercado de consumidores, todas


possuem um caderno dedicado a discussão das temáticas que predominantemente estão inseridas na
cidade de João Pessoa. Podemos perceber que os títulos irão variar, em O Norte o caderno se chama
Dia a dia. Em Correio da Paraíba e Jornal da Paraíba temos o caderno Cidades.
No dicionário escolheremos palavras que se tornarão verbetes, e com a sua explicação e
definição enquanto elemento na práxis discursiva poderá representar como a cidade torna-se
claramente um ambiente de apropriação e interação entre o individual e o geral para se compreender
o cotidiano e sua linguagem.
O tema mais recorrente nos cadernos de cidades da capital paraibana é a violência e suas
decorrências, como a criminalidade e as mortes. Por isso mesmo, a escola – teoria indicada para
estudar o referido caderno seria o interacionismo, este que surgiu em um momento delicado da
cidade de Chicago, onde o número de crimes aumentava assustadoramente.

Referências:

BARROS, José D'Assunção. Cidade e História. Petrópolis: Vozes, 2007.

JEUDY, Henry-Pierre. Espelho das cidades. Rio de Janeiro, Casa da Palavra: 2005.

RIBEIRO,Luiz Cesar de Queiroz; PECHMAN, Robert. Cidade, povo e nação: gênero do urbanismo
moderno, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996.

RYKWERT, Joseph. A ideia de cidade. São Paulo, Perspectiva: 2006.

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