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OPINIÃO
Instituto para o Desenvolvimento de Energias Alternativas
e da Auto-sustentabilidade (Ideaas)PR
Plantas exóticas 77
invasoras: a ameaça da
contaminação biológica
A introdução de espécies de plantas –agrícolas, florestais ou ornamentais– vindas
maiores ameaças à biodiversidade, mas ainda não foi dimensionado nem está sendo
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OPINIÃO
de uma planta estão a produção biomassa, acúmulo de serrapi-
de sementes pequenas e em gran- lheira (o que pode aumentar o ris-
de quantidade, com dispersão efi- co de incêndios), taxas de decom- Do total de espécies
ciente (em especial pelo vento) e posição, processos evolutivos e re-
alta longevidade no solo. Outros lações entre plantas e polini- ornamentais introduzidas
fatores favoráveis são crescimen- zadores. Podem modificar o ciclo
to rápido, maturação precoce, re- hidrológico e o regime de incên- em outros ambientes, em todo
produção também por brotação, dios, levando à seleção das espé-
floração e frutificação mais lon- cies e, em geral, ao empobreci-
gas, pioneirismo, adaptação a áre- mento do ecossistema. Há risco
o mundo, quase a metade
as degradadas, eficiência repro- de gerar híbridos com as espéci-
dutiva e liberação de toxinas ca- es nativas, talvez com potencial
tornou-se invasora com o tempo
pazes de impedir o crescimento invasor maior. Essas mudanças
de outras plantas nas imediações ameaça atividades econômicas li- dade das espécies nativas é pre-
(alelopatia). gadas ao uso de recursos naturais judicial ao modelo de pecuária
Espécies invasoras tendem a se em ambientes estabilizados, pela sustentável adotado há séculos na
adaptar com maior facilidade a alteração da matriz de produção região e exige medidas de contro-
ambientes similares à sua região pretendida, o que em geral tem le (lavração e uso de herbicidas).
de origem. Isso explica a rápida impactos negativos. Estima-se que, dos 15 milhões de
adaptação de seus ciclos de ger- Plantas invasoras de maior por- ha de campos naturais, 2 milhões
minação e ocupação em ambien- te que as nativas causam maio- estejam sob invasão, implicando
tes que sofrem perturbações na- res impactos, como na invasão de grande perdas na produção, pois
turais ou induzidas. formações herbáceo-arbustivas o gado bovino não pasta esse ca-
por espécies arbóreas. Nesses ca- pim. O capim-annoni também já
A situação em várias áreas inva- sos, além das relações de domi- invadiu os campos naturais de
didas e a falta de políticas de pre- nância, é alterada a fisionomia da Santa Catarina e do Paraná.
venção fazem com que a contami- vegetação, levando à acelerada O capim-gordura (Mellinis
nação biológica seja um dos im- perda da diversidade. minutiflora) e várias espécies do
portantes agentes de mudança glo- gênero Brachiaria ameaçam a di-
bal decorrente de ações humanas, Entre as espécies de árvores con- versidade natural do cerrado no
junto com o efeito estufa e a con- sagradas como invasoras no Bra- Parque Nacional da Chapada dos
versão de áreas naturais para ati- sil estão alguns pinheiros (Pinus Veadeiros, no planalto central,
vidades produtivas. Além disso, as elliottii, P. taeda), a casuarina além de outras regiões. Entre as
mesmas espécies invadem diver- (Casuarina equisetifolia), o cina- ornamentais, estão amplamente
sos países e sua dominância tende momo (Melia azedarach), a uva- estabelecidas a maria-sem-vergo-
a homogeneizar a flora mundial. do-japão (Hovenia dulcis), o ama- nha (Impatiens walleriana) e o lí-
Em ilhas isoladas, as espécies relinho (Tecoma stans), a goiabei- rio-do-brejo (Hedychium corona-
invasoras constituem a maior ra (Psidium guajava), a vassoura- rium), para citar algumas.
causa atual de degradação am- vermelha (Dodonaea viscosa), o Os países com os melhores
biental, provocando perda de di- alfeneiro (Ligustrum japonicum). registros de invasões biológicas
versidade em áreas onde é gran- Entre as plantas menores, os gê- são África do Sul, Nova Zelândia,
de o número de plantas endêmi- neros Bracchiaria, Eragrostis e Austrália e Estados Unidos, que
cas (que só ocorrem no local). O Mellinis, de capins africanos in- provavelmente são também os
problema, de âmbito mundial, troduzidos para pastagens, são dos maiores detentores de espécies
não pode ser tratado isoladamen- mais problemáticos. invasoras. O problema tem a mes-
te, sem uma estratégia comum, No Rio Grande do Sul, o ca- ma magnitude e gravidade em inú-
proposta a partir das conferên- pim-annoni (Eragrostis spp.) ame- meros países que não despertaram
cias da ONU sobre biodiversidade. aça os sistemas de produção de para a questão e ainda não têm
As invasões por plantas exóti- gado estabelecidos nos campos registros confiáveis nem medidas
cas tendem a alterar proprieda- naturais em função da perda da de prevenção, controle e erradi-
des ecológicas essenciais, como cobertura vegetal nativa, compos- cação. Tais países precisam de es-
ciclo de nutrientes, produtivida- ta por grande número de espéci- tudos que retratem a situação atu-
de, cadeias tróficas, estrutura da es de gramíneas, leguminosas e al e permitam previsões. Este é,
comunidade vegetal (distribui- outras famílias importantes do sem dúvida, o caso do Brasil, onde
ção, densidade, dominância, fun- ponto de vista alimentar. A grada- o capital verde é provavelmente o
ções de espécies), distribuição de tiva perda em freqüência e quali- último grande trunfo nacional. n