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Grave-Resendes, Lídia (2004).

“O Direito à educação e a Educação dos


Direitos”, in Educação e Direitos Humanos, CNE

Seminário

“O Direito à educação e a Educação dos Direitos”

PAINEL I – Aprender a Prevenir e a Gerir Conflitos

Profª Doutora Lídia Grave-Resendes

Antes de mais, gostaria de agradecer à Dra. Maria Emília Brederode dos Santos o convite
que me fez para participar nesta conferência e felicitar o Conselho Nacional da Educação
por mais esta iniciativa.

A temática que vou abordar, Mediação Entre Pares, tem a ver com a gestão/resolução, de
conflitos na escola, e com o modo como esta pode ser feita de uma forma positiva,
apelando à participação activa dos alunos na resolução dos próprios conflitos.

A Universidade Aberta foi pioneira na disseminação em Portugal da implementação da


Mediação entre Pares como forma de resolução de conflitos na escola. Em 1998, como
professora da Universidade Aberta, candidatei-me com uma colega, a um projecto que
incluia vários parceiros considerados inovadores na disseminação da mediação escolar a
nível europeu.

Começámos as primeiras experiências de Mediação entre Pares em Portugal no âmbito do


projecto GESPOSIT. A partir deste projecto, e com base no conhecimento que tinha da
Mediação nos Estados Unidos, tenho vindo a desenvolver investigação nesta área. Acredito
que esta forma de gestão/resolução de conflitos oferece outra interpretação do conflito,
serve de catalisador para a promoção de uma participação activa do aluno no processo
educativo, e contribui para a prevenção da violência na escola.

Gostaria de, sucintamente, vos apresentar a Mediação entre Pares, o processo de


implementação e respectivos benefícios.

Quando falamos de conflito, vêm imediatamente à nossa mente imagens negativas


sobretudo de violência – guerra, ira, divergências, combate – imagens sempre negativas que
associamos à palavra “conflito”.

Os conflitos podem ser de natureza diversa: interpessoal (entre dois indivíduos),


intrapessoal (entre nós próprios), intergrupal (entre dois ou mais grupos que são
maioritariamente os tipos de conflitos existentes nas nossas escola) e intragrupal (dentro do
mesmo grupo).

O conflito é normal. Todos nós somos atingidos por ele de vários modos e com graus de
intensidade variáveis. Ao enfrentarmos um conflito temos vários processos de o resolver:
1 a negação - o objecto do conflito não é identificado – evitam-se os problemas, foge-
se da realidade, as partes não se encontram;
2 a demissão - isto é, reconhecemos que o conflito existe, mas não o enfrentamos,
adia-se a solução, procura-se contornar a situação e espera-se que o tempo,
eventualmente, resolva o conflito;
3 o pacto - em que as partes tentam chegar a um acordo, se bem que por vezez a
solução seja insatisfatória para ambas as partes;
4 perspectiva ganhador-perdedor - reconhece-se a existência de um conflito, mas o
objectivo não é resolver o conflito,(faltam coisas que não sei porquê eliminou e
fazem falta pois posteriormente refere-se a ganhador-peerdedor e
5 o confronto violemto.

Em vez de negar a sua existência, esperar que desapareça ou ignorá-lo, devemos reconhecer
que existe, aprender a resolvê-lo, e utilizá-lo construtivamente como estímulo para uma
mudança positiva a nível do nosso comportamento.

A mediação assume uma forma alternativa e positiva de gerir o conflito que é visto, não de
uma forma negativa, mas numa perspectiva positiva como forma de nos desenvolvermos,
como forma de nos reconhecermos, de nos tornarmos melhores seres humanos.

A mediação considerada como uma nova cultura de gestão/resolução do conflito, é o que


estamos a tentar disseminar nas nossas escolas. Consiste em utilizar o próprio conflito e
proporcionar, através da sua identificação da análise crítica e da comunicação eficaz, aos
alunos soluções numa perspectiva de ganhador-ganhador e não de ganhador-perdedor.

Trata-se de um processo estruturado, desenvolvido num ambiente de confidencialidade, no


decurso do qual, um terceiro (que é o mediador) imparcial e neutral, ajuda os litigantes a
exporem os seus próprios pontos de vista e a encontrarem a solução para o conflito que os
opõe, tendo em vista o estabelecimento voluntário de um acordo comum. Não é o mediador
que vai dizer qual a forma de resolver o conflito, são as partes em conflito que vão
encontrar uma solução, e esta exige algo importantíssimo que é o diálogo, a comunicação
que permite esclarecer e conciliar pontos vista antagónicos.

Todo o processo de mediação é voluntário. O professor pode sugerir ao aluno ir a um


mediador, não vai exigir que o aluno vá à mediação, porque todo o processo é um processo
voluntário - procura-se solução de um conflito com intervenção de um terceiro.

Para Jean Pierre Bonafet-Schmit, investigador internacional, a mediação insere-se num


processo educativo que tem por finalidade desenvolver as capacidades de comunicação, de
raciocínio que estão presentes quer na gestão do processo de mediação quer na procura de
soluções do conflito.

A mediação é um processo que possibilita o desenvolvimento de competências como a


escuta mútua, a gestão da agressividade, a cooperação, o sentido de responsabilidade,
permitindo indirectamente, uma valorização das capacidades de cada um , uma tomada de
consciência da forma de resolver os próprios conflitos, os quais, por vezes implicam até
comportamentos violentos. A Mediação entre Pares implica que dois alunos sejam os
mediadores no processo de mediação. Nem todos os alunos são capazes de ser mediadores,
dado que ser mediador implica possuir uma capacidade de escuta, de comunicar,
imparcialidade, distanciamento e criatividade. Para alguns alunos, ser mediador implica
também uma resposabilidade para a qual também não se encontram preparados. A
formação em mediação conduz a uma descoberta de si dado que o próprio processo permite
uma participação activa do aluno, uma descoberta das suas próprias capacidades, e um
desenvolvimento de competências que se prolongará ao longo da vida.

Implementação da mediação na escola

O processo de implementação da Mediação entre Pares na escola exige que haja em


primeiro lugar uma procura por parte da escola para uma forma alternativa de
gestão/resolução de conflitos. A implementação processa-se por fases, que são:

1. Sensibilização da comunidade educativa – esta fase tem por objectivo


sensibilizar a comunidade educativa (docentes, não docentes, alunos, pais,
identidades governamentais). Realiza-se numa sessão aberta ao público e
anunciada pela escola.
2. Formação de professores – em regime de voluntariado.Destina-se aos
professores que queiram saber mais sobre a mediação, e aos professores que irão
fazer um acompanhamento aos alunos mediadores;
3. Abertura de concurso para mediadores – esta fase tem por objectivo anunciar
aos alunos da escola a abertura do concurso . De um modo geral, pede-se aos
alunos interessados que escrevam uma composição sobre as razões porque
querem ser mediadores.
4. Selecção dos mediadores – nesta fase, está incompleto
5. Formação de alunos mediadores - durante esta fase, os alunos recebem a
respectiva formação, e seguidamente, é-lhes concedido um período de reflexão
sobre o que implica ser mediador. É nesta altura que alguns alunos reconhecem
que não são capazes de vir a ser mediadores.
6. Constituição dos mediadores entre pares – nesta fase organizam-se os pares de
mediadores e são revistos todos os recursos necessários para a abertura do
gabinete de Mediação entre pares;
7. Abertura do gabinete de mediação - nesta fase, é anunciado a toda a comunidade
educativa a abertura do Gabinete de Mediação entre Pares, horários de
atendimento com os respectivos mediadores;
8. Acompanhamento da mediação – por acompanhamento, entende-se uma
supervisão que é dada aos mediadores pelos professores que no início do
processo se voluntariaram para o fazer.
9. Partilha de informação/resultados – é importante haver, se possível, uma altura
ou mais do que uma, em que os mediadores e professores acompanhantes da
mediação partilhem com a comunidade educativa o progresso e resultados da
implementação; se há procura por parte dos alunos para a mediação, qual tem
sido a reacção, e auscultar a nível de toda a escola o impacto da mediação.

Benefícios da Mediação entre Pares

A minha experiência e a investigação que tenho vindo a fazer nesta área, demonstram que
os benefícios da Mediação entre Pares se situam em vários níveis. A Mediação entre Pares
beneficia os alunos mediadores, os alunos em geral, a escola, e a família dado que as
competências desenvolvidas se repercutem na família.

Alunos Mediadores
A Mediação entre Pares contribui para:
1 a participação dos estudantes na gestão da escola;
2 o desenvolvimento de competências de liderança;
3 o desenvolvimento de competências de comunicação;
4 o desenvolvimento de competências de trabalho cooperativo;
5 o desenvolvimento da tolerância;
6 o desenvolvimento de competências de resolução de problemas;
7 o desenvolvimento de uma interacção positiva entre os alunos mediadores e os seus
colegas; e
8 faz com que os mediadores se tornem modelos dos colegas em situação de conflito.

Alunos em Geral
A Mediação entre Pares contribui também para uma melhoria a nível geral das escolas:

1 promove o envolvimento activo dos mediadores e dos litigantes no processo de


resolução de problemas;
2 contribui para que assumam uma maior responsabilidade na resolução dos próprios
problemas;
3 motiva a partilha de sentimentos;
4 melhora as relações entre colegas:

Comunidade Educativa
Na comunidade educativa (docentes, não docentes, pessoal administrativo, pais e alunos)
observam-se os seguintes benefícios:
1 maior cooperação entre os membros da comunidade educativa;
2 maior colaboração na resolução de problemas;
3 um menor número de processos disciplinares;
4 diminuição do tempo de resolução de conflitos;
5 melhoria da comunicação na escola.

Gostaria de chamar a atenção para o seguinte facto: para que um programa de mediação
funcione, há a necessidade de haver, por parte da escola, aceitação desta forma de resolver
os conflitos, uma nova atitude perante o conflito e, essencialmente, permitir que o aluno
participe activamente na resolução do mesmo, algo que para muitas das nossas escolas é
inadmissível. Para mim, a participação activa dos alunos no seu processo educativo, é o
grande desafio que vejo na implementação da mediação na escola.
A aprendizagem da gestão/resolução de conflitos, deverá fazer parte integral da vida como
oportunidade de crescimento e de mudança. É uma competência que todos necessitamos
de desenvolver e de encorajar nos outros. Se um maior número de pessoas for exposto à
resolução não violenta de conflitos, então haverá uma verdadeira esperança de que a
violência na nossa sociedade diminuirá e novos comportamentos surgirão.
FIM

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