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O Ouvido Humano

O ouvido humano – uma visão geral

O ouvido humano é o órgão responsável pela nossa audição e pelo nosso equilíbrio.

A figura seguinte mostra como ele está dividido e quais as principais partes:

Fig. 1 – Esquema do ouvido

O ouvido encontra-se dividido em três partes: o ouvido externo, o ouvido médio e o


ouvido interno. O ouvido externo é constituído pelo pavilhão auditivo, pelo canal
auditivo e pelo tímpano e é responsável pelo direcionamento das ondas sonoras para as
regiões mais internas do ouvido. O ouvido médio que se encontra após o tímpano é
constituído por três ossos interligados, o martelo, a bigorna e o estribo, onde as ondas
sonoras são amplificadas. É igualmente constituído pela trompa de Eustáquio que
mantêm a pressão nesta zona. O ouvido interno, a zona onde se situam as estruturas
responsáveis pelo equilíbrio e pela conversão das ondas sonoras em sinais elétricos é
constituído pela cóclea, órgão que distingue a freqüência e a intensidade do som, os
canais semicirculares e o nervo auditivo.

O ouvido externo

Exteriormente ao ouvido externo encontra-se a orelha cuja finalidade é direcionar o som


para o ouvido externo. Por sua vez este último compõe-se do pavilhão auditivo e do
canal auditivo, com 2,5 cm de comprimento. Devido ao seu comprimento, à sua
sinuosidade, bem como à rigidez das suas paredes, o canal auditivo impede que o
ouvido interno seja danificado, protegendo-o de poeiras, insetos e da introdução de
objetos estranhos. Para esse mesmo efeito o canal auditivo está coberto de pêlos finos e
de cerca de 4000 glândulas, que produzem cerúmen. Um sistema de limpeza está
igualmente implementado nesta parte do ouvido. Denominada por migração epitelial,
esta limpeza consiste na deslocação lateral da pele, do tímpano em direção ao começo
do canal auditivo. Outra das funções do canal auditivo é manter no interior do ouvido
condições climáticas constantes, ou seja, temperatura e umidade constantes,
independentemente dos valores que se encontram no meio ambiente exterior. Além dos
mecanismos de segurança e limpeza descritos acima, o ouvido externo também
apresenta algumas funções acústicas. Considere-se a figura a seguir:

Fig. 2 - Efeitos acústicos do ouvido externo

Um som após ter percorrido o ouvido externo já sofreu uma "equalização" significativa,
sobretudo na gama de freqüências entre os 1. 5 kHz e os 7 kHz, onde sofre um aumento
de 5 a 20 dB respectivamente. Embora uma parte desta alteração seja devido a reflexões
do tronco e a fenômenos de difração da cabeça, existem duas razões preponderantes
neste aumento: a ressonância do pavilhão auditivo na zona dos 5KHz e a ressonância do
canal auditivo e do tímpano perto dos 2,5 kHz (efeito semelhante ao que acontece em
alguns instrumentos musicais como o órgão com tubos fechados), ou seja o ouvido
externo provoca um aumento na sensibilidade auditiva entre os 2KHz e os 5KHz. Para
freqüências acima dos 6KHz existe uma acentuada variação na resposta em freqüência
em relação à localização da fonte sonora, ou seja o ouvido externo funciona como um
amplificador direcional, permitindo então localizar determinada fonte sonora consoante
a amplificação efetuada.

O ouvido médio

Após se ter estudado as propriedades acústicas do ouvido externo, em que deparamos


com um aumento de pressão sonora na zona das freqüências médias, passaremos ao
estudo do ouvido médio. A função de mais relevo do ouvido médio consiste em
amplificar as ondas sonoras provenientes do ouvido externo de modo a transmiti-las
para o ouvido interno. O ouvido médio é basicamente um sistema de amplificação
constituído por três pequenos ossos, designados por martelo, bigorna e estribo, e que
não ocupam no seu conjunto mais que o tamanho de um pequeno botão. O processo de
amplificação pode ser visto simplesmente como a transmissão das ondas sonoras por
parte do tímpano, que cada vez que vibra transmite essa vibração ao martelo. Por sua
vez este último transmite a informação à bigorna e esta ao estribo, estando este alojado
numa abertura chamada janela oval, aonde se passará a informação ao ouvido interno.
Qual a razão de ser necessário essa amplificação no ouvido médio? A razão principal
tem a ver com a elevada perda por reflexão que ocorre quando as ondas sonoras
embatem na janela oval e que apresenta valores perto dos 30 dB. Para compensar essa
perda, os ossos do ouvido médio funcionam como uma alavanca mecânica aumentando
a pressão. Outra fonte para compensar essa perda é o estreitamento do caminho perto da
janela oval que faz com que ocorra um aumento de pressão adicional pois como se sabe
para uma mesma força a pressão é maior em áreas mais pequenas.

Fig. 4 – Amplificação das ondas sonoras pelos ossículos (ouvido médio).


(a) – os três ossos ligam o tímpano ao ouvido interno (janela oval)
(b) – efeito alavanca: uma pequena força atuando numa grande distância resulta numa
força acentuada que atua numa distância pequena
(c) – efeito pistão: uma pressão baixa que es distribui numa área grande resulta numa
pressão alta numa área pequena

Outra das funções do ouvido médio é proteger o ouvido interno de sons com grande
intensidade ou mudanças súbitas de pressão através de dois conjuntos de músculos: um
que faz a contração do tímpano e outro que afasta o estribo da janela oval. Efetuando
uma diminuição de intensidade da onda sonora que pode alcançar entre os 15-30 dB e
que depende da freqüência, estes músculos permitem que nos seja perceptível a fala de
uma pessoa mesmo que nos encontremos num "background" sonoro com intensidades
sonoras elevadas na zona das freqüências baixas. Quer dizer então que este sistema de
proteção é mais eficaz para freqüências graves. A proteção efetuada por estes músculos
apresenta um latência de 30 a 40 milisegundos e a proteção total apenas ocorre após 150
milisegundos. Ou seja sons impulsivos como o disparo de uma pistola ou uma explosão
que são considerados como intensos (mais de 85 dB) não serão abafados por este
sistema de proteção. Como se sabe, exposições a sons de grande intensidade implicam
quase sempre perda de audição. Outro elemento do ouvido médio é a trompa de
Eustáquio que liga este à parte superior da garganta e faz com que a pressão no ouvido
médio seja igual à pressão atmosférica através de aberturas periódicas. Se a trompa de
Eustáquio efetuar uma abertura lenta ou não abrir como acontece quando ocorrem
súbitas mudanças na pressão exterior (ex: mudanças de altitude), logo o mecanismo de
transmissão das ondas sonoras sofre alterações. Nesse caso o som sofre uma perda
abaixo dos 1kHZ na ordem dos 20 dB.

O ouvido interno

É no ouvido interno que se encontram as estruturas que permitem ao ser humano


identificar e caracterizar os sons e suas fundamentais características: freqüência,
intensidade e timbre. Outra das grandes funções do ouvido interno tem a ver com a
regulação e manutenção do equilíbrio do corpo humano. O ouvido interno, composto
por canais semicirculares, pela cóclea e pelo nervo auditivo está situado no interior do
crânio, protegido por uma almofada de fluído. Os canais semicirculares são três canais
perpendiculares que não desempenham nenhuma função na audição humana, mas são
fundamentais no equilíbrio do corpo humano. Cada um destes canais tem um fluído que
estimula os cílios, minúsculos sensores semelhantes a pêlos. Quando o corpo se
movimenta estes três canais mantêm o equilíbrio do corpo enviando impulsos nervosos
e informando o cérebro da posição em que o corpo se encontra. A razão de estes canais
serem perpendiculares entre si tem a ver com o fato de cada um deles ser responsável
pela detecção do movimento em diferentes direções, respectivamente de cima para
baixo, de trás para a frente e de um lado para outro.

O equilíbrio estático é controlado através de umas minúsculas partículas chamadas


otólitos e que se encontram nas células sensoriais existentes na cóclea.

É na cóclea que se faz a conversão de ondas sonoras em impulsos nervosos. Esta


assemelha-se a uma casca de um caracol e é constituída pelo canal vestibular, o canal
timpânico e pelo canal médio ou coclear que separa os outros dois canais. No início do
canal vestibular encontra-se a janela oval, interface que transmite as ondas sonoras que
foram amplificadas no ouvido médio para dentro da cóclea ou mais respectivamente
para dentro do canal vestibular. A cóclea contém dois líquidos denominados endolinfa,
que se encontra no canal médio, e perilinfa nos restantes canais. Estes dois líquidos
estão separados por duas membranas: a membrana de Reisser e a membrana basilar, e
estão igualmente separados por um potencial de +80 mV. Por cima da membrana basilar
existe o órgão de Corti que contem várias filas de células auditivas. Estas células
receptoras assumem uma forma cilíndrica tendo no seu fim um conjunto de pêlos
sensíveis chamados cílios. Cada uma das células sensoriais está inervada na sua base a
fibras eferentes e aferentes do nervo coclear. Ligando o canal vestibular ao timpânico
encontramos o helicotrema. O esquema da cóclea está disposto a seguir:
Fig. 5 – Diagrama esquemático da cóclea (desenrolada)

Existem dois tipos de células auditivas: internas e externas. Em média o ser humano tem
3500 células auditivas internas e 12000 externas e cada uma destas células contem cerca
de 100 cílios, sendo que a sua estrutura e forma difere consoante o tipo de célula em que
os cílios se encontram. Estas células auditivas encontram-se por sua vez a um potencial
de –70 mV em relação a perilinfa e –150mV em relação à endolinfa, o que torna os
cílios mais sensíveis. 90 por cento da audição humana é devido às células sensoriais
internas.

Fig. 6 – Forma das células auditivas internas e externas

Vamos então ver de que forma as ondas sonoras atuam nos cílios.

Quando o estribo vibra contra a janela oval, essa vibração é transmitida para o canal
vestibular por meio do fluído coclear, ou seja, da endolinfa. Toda essa vibração percorre
o canal vestibular e o canal timpânico encontrando depois a janela redonda. Qualquer
movimento efetuado pela janela oval devido a uma onda sonora vinda do ouvido médio
tem resposta na janela redonda. A membrana basilar é uma estrutura ressonante, ou seja,
determinadas zonas da membrana basilar têm uma resposta mais acentuada em uma
pequena gama de freqüências, fazendo com que ela se desloque mais. Perto da janela
oval os sons agudos sofrem o efeito de ressonância e apresentam uma maior amplitude,
isto aonde a membrana basilar se apresenta mais estreita e rígida. Por outro lado os sons
graves apresentam picos de pressão mais acentuados perto da janela redonda, no final
do canal timpânico, onde a membrana basilar é mais larga e frouxa.
Fig. 7 – Deslocamentos da membrana basilar em função da distância ao estribo para
várias freqüências

Quando a membrana basilar entra em ressonância provoca uma inclinação dos cílios, e
logo gera sinais elétricos que serão enviados para o cérebro. A ressonância da
membrana basilar ativa os cílios, o que resulta na depolarização ou hiperpolarização das
células auditivas, como mostra a figura a seguir.

Fig. 8 - Função de polarização das células auditivas

Como se pode ver, a depolarização e a hiperpolarização está relacionada com a


quantidade de impulsos nervosos que são enviadas pelas fibras em direção ao cérebro.
Na depolarização, o envio de impulsos nervosos é máximo enquanto na
hiperpolarização este é mínimo. Freqüências não audíveis (abaixo dos 20 Hz e acima
dos 20 kHz) não provocam então o estado de ressonância da membrana basilar e, logo,
não provocam a inclinação dos cílios e o correspondente envio de impulsos nervosos
para o cérebro. Células que estejam danificadas, seja mecanicamente ou seja por doença,
exibem uma fraca resposta. A destruição destas células resulta na perda de sensibilidade
auditiva na gama de freqüências representada pelas mesmas. Alguns sons podem ser
ouvidos através de vibrações do crânio, chegando depois ao ouvido interno. Este tipo de
propagação de ondas sonoras através dos ossos desempenha um papel importante na
fala humana. Sons como o bater dos dentes ou de zunir são sons que são ouvidos quase
exclusivamente pela condução através dos ossos (basta tapar os ouvidos e verificar que
ao produzir esses sons eles ouvem-se claramente). Ao ouvirmos a nós próprios a falar
ou a cantar estamos na realidade a ouvir dois sons distintos: aquele que se propaga
através do ar e aquele se propaga através dos ossos. É por isso que a nossa voz quando
captado por um microfone nos soa diferente, porque apenas a propagação do som pelo
ar foi capturada.
Processamento do sinal no sistema auditivo

O processamento de sinal no sistema auditivo pode ser dividido em duas partes: aquele
que é feito no sistema auditivo periférico, ou seja, nos ouvidos, e aquele que é feito no
cérebro. As fibras nervosas saem das células auditivas transportando os impulsos
nervosos e dando origem ao nervo auditivo (VIII nervo cranial). Este desloca-se através
da espinhal medula e leva o sinal nervoso até diferentes partes do cérebro tais como o
cerebelo, mesencéfalo, o tálamo e o lóbulo temporal do córtex. É possível então captar o
sinal elétrico que viaja desde a cóclea até ao cérebro, bem como a atividade cerebral
correspondente ao ato de ouvir. Cada uma dessas fibras nervosas responde dentro de
uma cerca gama de freqüências e de pressão, tendo então uma freqüência característica
em que a resposta é máxima. Uma única fibra não pode transcrever toda a diferença de
intensidades a que o ouvido está sujeito, sendo necessário um conjunto de fibras para
codificar os valores da intensidade sonora.

Teorias acerca da percepção do tom

Existem várias teorias mais recentes acerca do modo em como o ouvido se apercebe da
freqüência de um som, sendo que a mais conhecida é a teoria da freqüência, descrita
anteriormente e baseada na ressonância da membrana basilar em diferentes sítios
dependente da freqüência.

Outra teoria relativa ao reconhecimento da freqüência (teoria da freqüência) tem a ver


com o fato que o sistema auditivo preservar a forma da onda, ou seja, memorizar
informação e tal fato é devido às funções de polarização das células auditivas, ou seja, a
despolarização e hiperpolarização, como conseqüência dos movimentos dos cílios.
Quando a membrana basilar responde a sinais de baixa freqüência, as células auditivas
que se encontram na zona onde existe ressonância têm um comportamento alternado de
excitação-inibição com a mesma freqüência que provoca essa ressonância e, portanto,
um padrão de variação de potencial nas fibras nervosas que reflete essa freqüência. No
caso específico de uma onda senoidal de baixa freqüência uma só fibra não responde
sempre aos estímulos gerados por essa onda devido ao seu período refratário. É então
necessário um conjunto de fibras, todas respondendo em "phase locking", para
representar essa onda (Princípio de Volley).
Fig. 9 – Teoria da freqüência – Princípio de Volley

Percepção das características do som: o nível sonoro

O nível sonoro é o julgamento da intensidade sonora feita por um ser humano. A


mínima variação de pressão a que o ouvido humano responder chega a valores da ordem
de um bilionésimo (10-9) da pressão atmosférica! O limiar de audição corresponde a
uma pressão sonora de 2x10-5 N/m2 a uma freqüência de 1000 Hz e o limiar da dor
corresponde a uma pressão um milhão de um milhão de vezes maior do que a pressão
do limiar da audição, mas apenas um milionésimo da pressão atmosférica. Em algumas
freqüências específicas as vibrações do tímpano chegam a valores da ordem dos 10-8
mm, um décimo da diâmetro do átomo do hidrogénio. È estimado que a vibração da
membrana que transmite os estímulos aos nervos auditivos tenha uma amplitude 100
vezes menor do que a dita acima.

Devido à larga gama de variações de pressões a que o ouvido reage é aconselhável usar
uma escala logarítmica, denominada a escala de Decibel (dB), em que se define como
referência um som com uma pressão sonora de 2X10-5 N/m2 sendo que este valor
assume o valor de 0 dB.

Olhando para a figura seguinte é possível visualizar alguns exemplos comuns e


compará-los relativamente ao seu SPL:
Fig. 10 – Escala de níveis de pressão sonora (dB)

A percepção do nível sonoro é bastante simples. Quanto mais alto for o som maior é a
quantidade de cílios que se movem e, logo, mais células auditivas são "ativadas". Os
cílios só respondem ao som a partir de uma determinada intensidade sonora.

Percepção das características do som: o tom

A percepção que um indivíduo tem da freqüência de um som puro denomina-se por tom.
Muitas vezes interliga-se a freqüência de um som ao tom que se ouve, ou seja,
determinada mudança na freqüência implica uma mudança semelhante no tom. Mas
além das ilusões ópticas, existem igualmente ilusões acústicas. A mais conhecida
denomina-se por escala de Shepard. A escala de Shepard dá ao ouvinte a impressão de
uma melodia que sobe continuamente, quando de fato isso não acontece! Ou seja uma
determinada mudança na freqüência não teve associada uma mudança semelhante no
tom. (Eu já ouvi esta escala e achei este fenômeno simplesmente fascinante. Para ouvir
uma amostra deste fenômeno,clique aqui.Lembre-se que o tom inicial é exatamente
igual ao tom final.). A discriminação do tom de um som é sempre subjetivo e varia de
pessoa para pessoa. De fato, para algumas pessoas, um som com uma freqüência
constante podem parecer percepções diferentes da altura do som consoante este se
apresenta pelo lado esquerdo ou direito (a este fenômeno chama-se "binaural
diplacusis").

Em 1933 Fletcher e Munson demonstraram como está definida a sensibilidade auditiva:


Fig. 11 – Curvas de Fletcher e Munson (1 phon é a unidade de nível sonoro)

Note-se então que o ouvido apresenta-se bastante insensível a sons graves e a tem a sua
sensibilidade máxima entre os 3500 e os 4000 Hz, perto da primeira zona de
ressonância que ocorre no ouvido externo. A segunda zona de ressonância ocorre perto
dos 13 kHz. A capacidade de distinguirmos a mínima alteração no tom de um som
depende da freqüência, da intensidade sonora, da duração do som, da velocidade da
alteração bem como do próprio treino auditivo do ouvinte. O ouvido humano é bastante
sensível a diferenças de freqüências entre dois sons. Em sons graves mudanças de
freqüência de 1 Hz podem ser detectadas. A diferença na freqüência das duas notas mais
graves do piano é de apenas 1,6 Hz. Aos 1000 Hz a maior parte das pessoas é capaz de
distinguir mudanças na freqüência com o valor de 3 Hz. Aos 100 Hz mudanças na
freqüência podem ser notas a partir dos 0,3 Hz. Ou seja, o ouvido é sensível não
propriamente a mudanças absolutas da freqüência, mas sim a uma razão entre a zona
que freqüências do som que se está ouvindo e da mudança efetuada. Estudos feitos por
Stevens (1935) verificou que sons puros, ou seja senoidais, de baixa freqüência, tendem
a parecer mais graves ao aumentarmos a intensidade destes, sendo essa impressão mais
acentuada por volta dos 150 Hz. Pelo contrário sons agudos tendem a parecer mais
agudos do que são na realidade, sendo que essa impressão é mais acentuada por volta
dos 8000 Hz. A figura seguinte mostra as diferenças de tom em função do nível de
pressão sonora (SPL) para sons puros entre as freqüências de 200 Hz e 6000 Hz em que
cada 100 centos corresponde a um semitom.
Fig. 12 – Mudanças de tom de sons puros em função com o SPL

Usando como fonte sonora não sons puros, mas instrumentos musicais, verificou-se que
a alteração de altura do som é mínima, da ordem dos 17 centos, quando a intensidade
sonora passa dos 65 dB até os 95 dB, sendo que a predominância de harmônicas abaixo
ou acima dos 1000 Hz têm um papel fundamental em "escolher" se a altura do som
desce ou sobe. Outro fenômeno de alteração de altura do som é igualmente observado
no decaimento do som com reverb elevado, como por exemplo em órgãos de igreja em
que se a altura do som parece aumentar quando o som decaí. No que respeita à duração
do som e a percepção da altura deste temos que ter em conta o princípio de incerteza
acústica dada por , em que é a incerteza na freqüência e a duração do
som. Em condições exemplares, K pode tomar o valor de 0,1. Se a duração do som for
menor que 25 ms, logo, a incerteza na freqüência é maior, ou seja, a altura do som
parece que varia mais. O ouvido tem mais facilidade em detectar alterações na altura do
som em sons puros do que em outros sons. Por exemplo, consideremos ruído centrado
nos 1500 Hz com largura de banda de 10 Hz e o som puro de 1500 Hz. Notou-se que
tem um valor seis vezes maior para o ruído em relação ao som puro, ou seja, o som
puro apresenta uma incerteza bem menos elevada freqüência.

Convém relembrar aqui que uma onda periódica pode ser decomposta nas suas
componentes parciais com freqüências f,2f,3f,4f,etc, e em que f é a freqüência
fundamental. Pode acontecer que a fundamental tenha menor amplitude do que as outras
harmônicas, como foi demonstrado por Seeback em meados do século XVIII.
Utilizando uma sirene e colocando-a dentro de um disco rotatório com fendas espaçadas
de igual modo, é possível ouvir a nota fundamental. Seeback notou que se duplicar o
número de fendas, o som que se ouve corresponde a uma oitava.
Fig. 13 – esquema das três sirenes diferentes usadas por Seebeck

Se o ouvido estiver ouvindo um som que contenha as harmônicas exatas, como por
exemplo um som que contenha as harmônicas parciais de 400, 600, 800, 1000 e 1200
Hz, então o ouvido identificará a altura do som como sendo a fundamental, ou seja neste
caso 200 Hz. Ou seja, o ouvido tem a capacidade de identificar a fundamental mesmo
que esta tenha uma intensidade fraca ou que não exista. Este efeito possibilita então que
seja possível ao ouvido humano reconhecer sons graves em alto-falantes de pequena
dimensão ou rádios portáteis, isto porque para sons complexos com a fundamental até
aos 200 Hz, a altura do som é reconhecida fundamentalmente usando a quarta e quinta
harmônica.

Fig. 14 – Onda com e sem fundamental. O tom corresponde sempre à fundamental

Outro efeito curioso acontece devido a comportamentos não lineares no sistema


auditivo e pode ser observado quando se produz um som puro de freqüência f
suficientemente intenso de modo a que o ouvido tenha a percepção de harmônicas
2f,3f,4f,etc... embora estas não existem na realidade.

Estas harmônicas aurais foram observadas por Fletcher em 1929 sugerindo que a

resposta do ouvido seria dada pela expressão: , em


que p é a pressão sonora e são constantes que podem ser determinadas
por experiência. Esta resposta diz-nos que por cada aumento de 1 dB da intensidade
sonora do som implica um aumento de 2 dB na intensidade da segunda harmônica e 3
dB na terceira harmônica. Por exemplo para um sinal a 70 dB temos que a intensidade
sonora da segunda harmônica encontra-se perto dos 25 dB e da terceira harmônica perto
dos 15 dB.

Percepção das características do som: o timbre

O timbre é a característica do som que permite identificar dois sons como diferentes se
esses sons tiverem a mesma freqüência, intensidade e duração.

Helmholtz em 1877 descobriu que o que caracteriza o timbre da maior parte dos
instrumentos musicais é a série de harmônicas e concluiu que:

a) instrumentos com muitas harmônicas como o piano soam a instrumentos ricos


musicalmente
b) instrumentos com harmônicas ímpares como o clarinete são bastante menos ricos e
até soam nasais se tiverem muitas harmônicas

Ou seja a forma que o ouvido humano tem de detectar o timbre de um instrumento é de


detectar as suas componentes harmônicas. Um lá com freqüência de 440 Hz no piano
não soa igual a um lá numa flauta com a mesma freqüência porque cada uma dessas
notas irá excitar diferentes partes da membrana basilar. É então através de padrões dos
locais aonde a membrana basilar entra em ressonância que é possível distinguir o timbre
de um som, e a capacidade de distinguir o timbre de um instrumento varia bastante de
pessoa para pessoa. Existem pessoas que não conseguirão ou terão dificuldade em
diferenciar um saxofone de uma flauta enquanto outras não terão problemas em se
aperceberem dessa diferença.

Abafamento

O abafamento consiste em tornar inaudível determinado som por intermédio de outro


som. Quando o ouvido é exposto a vários sons simultâneos nota-se que alguns sons
abafam outros. Sobre este assunto foi então concluído que:

1 – sons puros com freqüências próximas abafam-se mais do que se tivessem afastados,
sendo que neste último caso pouco ou nenhum abafamento ocorre.

2 – um som puro abafa mais facilmente sons com freqüências altas do que baixas.

3 – quanto maior for a intensidade do som puro maior é a largura de banda que ele pode
abafar

4 - Uma pequena largura de ruído apresenta as características de abafamento já


definidas para os sons puros. No entanto, o ruído branco abafa sons de todas as
freqüências.

5 - O abafamento de um som pode ser provocado por um som que tenha terminado
(entre 20 a 30 ms) antes deste começar ou por um som que comece um milisegundos
após (até 10 ms)
A figura seguinte demonstra a resposta da membrana basilar a dois sons puros em
quatro situações distintas.

Fig. 15 – Resposta da membrana basilar a dois sons puros

Repare-se que em (a) as excitações produzidas pelos dois sons quase não se sobrepõem,
ou seja o abafamento é mínimo. Em (b) existe já um abafamento significativo por parte
do som B. Se este se tornar mais intenso então ele irá abafar quase completamente o
som de freqüência mais alta A (c). Por outro lado se verificarmos a situação contrária
em que A é mais intenso do que B como se mostra em (d) temos que o som A não abafa
completamente o som B, ou seja é mais fácil abafar um som de freqüência alta do que
baixa.

Consideremos os gráficos a seguir:

Fig. 16 – (a): abafamento usando um som puro de 400 Hz (b): abafamento usando um
ruído centrado em 410 Hz com uma largura de banda de 90 Hz
Em (a), no gráfico que se refere a um som puro de 400 Hz, podemos verificar por
exemplo que esse som tiver uma intensidade sonora de 60 dB então um outro som puro
a 500 Hz necessitaria de um aumento de 22 dB acima do limiar de audição para ser
ouvido. Na presença de um ruído com 60 dB centrado em 410 Hz e com uma largura de
banda de 90 Hz temos que o aumento acima necessário para se ouvir um som puro de
500 Hz é de 40 dB.

A presença de mais do que um som não provoca apenas um aumento no limiar da


audição mas também implica também uma redução do nível sonoro. O gráfico seguinte
mostra-nos como o ruído branco reduz o nível sonoro de um som puro de 1000 Hz.

Fig. 17 – Funções do nível sonoro para um som puro de 1000 Hz parcialmente abafado
por ruído branco

Comparando a curva de ausência de ruído com as curvas em que existe ruído nota-se
que à medida que a intensidade de ruído aumenta que as curvas que caracterizam o nível
sonoro se tornam mais inclinadas

Localização espacial

A percepção espacial de um som ou seja a sua localização consiste em descobrir o


azimute (ou duração), a latitude (ou elevação) e a profundidade (ou distância), tendo
como referencia o ouvinte, como mostra a figura:
Fig. 18 – Localização espacial de um som

Quando uma fonte sonora se encontra mais à esquerda ou mais à direita do ouvinte isso
implica que o som que chega a um dos ouvidos mais depressa do que o outro.
Consideremos a cabeça como uma esfera de raio r como mostra a figura seguinte:

Fig. 19 – Distância adicional percorrida pela onda em relação a um dos ouvidos

É possível encontrar a diferença temporal de cada um dos sinais, dada por:

Numa experiência efetuada por Mertens e Fendderson em que se considerando que r


assumia o valor de 8,75 cm e sendo a velocidade do som aproximadamente 340 m/s,
obteve-se então o seguinte gráfico que contrapõe valores experimentais e teóricos:
Fig. 20 – "Delay" nos tempos de chegada versus azimute. Curvas teóricas e práticas

Ao considerar que a fonte sonora se encontra a 90º, ou seja direccionada em relação a


um dos ouvidos obteve-se que (ms).

A nossa cabeça, bem como as orelhas, o pavilhão auditivo, o canal auditivo e o tímpano
constituem um obstáculo ao som, causando difração e absorção do som e funcionando
como um filtro que depende da posição da fonte sonora relativa à cabeça e aos ouvidos.

A figura seguinte mostra as diferenças de intensidade para diferentes freqüências à


medida que fonte sonora se move dos 0º até aos 180º.

Fig. 21 – Diferenças de intensidade em função do azimute para 4 freqüências distintas


Para cada posição da fonte sonora a diferença da intensidade captada pelo ouvido é
dependente da freqüência, sendo estas diferenças mais significativas para freqüências
acima dos 250 Hz. Pequenos movimentos instintivos permitem ao ouvinte localizar
mais pormenorizadamente a fonte sonora.

A figura a seguinte demonstra a variação da intensidade sonora em função do ângulo de


incidência, variando dos 0º até aos 180º:

Fig. 22 – Diferença de intensidade em função do ângulo da fonte sonora

Note-se que a diferença máxima de intensidade sonora é verificada não aos 90º mas sim
aos 60º com o valor de 7 dB. A precisão da localização encontra-se entre 1º e 2º, sendo
que esta também depende do ângulo de incidência. Neste caso foram utilizadas como
fontes sonoras ruído branco com a duração de 100 ms:

Fig. 23 – Zonas de incerteza no plano horizontal


A localização no plano vertical é menos precisa do que a horizontal, sendo que os
únicos fatores que intervêm neste processo são algumas assimetrias do corpo humano e
dos auriculares. A incerteza da localização situa-se entre os 15º e os 20º para uma fonte
situada acima da cabeça. A figura seguinte mostra a importância que desempenha a
freqüência do som na localização

Fig. 24 – Localização vertical

Constata-se que freqüências centrais de certas zonas do espectro impõem uma direção
aparente ao ouvido tal que:

 Sinais na região dos 8 kHz parecem surgir de cima


 Sinais na região dos 1 kHz parecem surgir detrás
 Sinais na região dos 3 kHz parecem surgir de frente

Esta noção pode ser então criada artificialmente. Por exemplo o efeito de ter o som a ser
elevado pode ser recriado através de uma pré-acentuação na região dos 8 kHz.

Bibliografia

Livros:

Thomas D. Rossing, "The Science of Sound", 1990, Addison-Wesley Publishing


Company, Inc.

Christian Hugonnet & Pierre Walder, "Stereophonic Sound Recording", 1995, John
Wiley & Sons.

Sites da internet:

http://www.neurophys.wisc.edu/~ychen/textbook/mid_ear.html
http://cips02.physik.uni-bonn.de/~scheller/index.html
http://sun.science.wayne.edu/~wpoff/cor/sen/hearing.html

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