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Levando-se em conta a baixa concentração do vapor d'água em relação aos demais constituintes
do ar, a ocorrência de nucleação homogênea é pouco provável, mesmo em ambientes controlados, com
umidade relativa bastante superior a 100%. Experiências feitas em câmaras, usando ar filtrado, mostraram
que foi necessária uma sobre-saturação de 400% para que ocorresse condensação em torno de íons nega-
tivos e de 600% em torno de íons positivos (Peixoto, 1970).
Outro aspecto que torna improvável a nucleação homogênea em condições naturais é que
a aglutinação de poucas moléculas não permitiria o desenvolvimento de forças coercitivas sufici-
entes para mantê-las agregadas. Assim, as moléculas mais externas tenderiam a se libertar rapi-
damente do êmbrio, o que exclui a possibilidade de tais agregados moleculares se formarem len-
tamente. O surgimento de um êmbrio estável (cujas moléculas não voltassem à fase gasosa), por
colisão seguida de aglutinação de um grande número de moléculas, teria de ser praticamente
instantâneo, o que é virtualmente impossível de ocorrer na atmosfera.
Segundo Byers (1965), mesmo sob uma sobre-saturação de 200%, à temperatura de 0oC,
por exemplo, um êmbrio somente se manteria estável se seu raio ultrapasse 0,00173P, o que si-
gnifica que deveria possuir 714 moléculas. A probabilidade de que tantas moléculas se choquem
simultaneamente e se aglutinem é diminuta. Sob umidade da ordem de 400%, para formar um
êmbrio estável com 0,00087P de raio, àquela temperatura, seriam requeridas 89 moléculas agluti-
nadas, o que ainda é pouco provável. É evidente que na atmosfera, onde não ocorrem tais condi-
ções de supersaturação, a formação de um êmbrio por nucleação homogênea está descartada.
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Mário Adelmo Varejão-Silva
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A explicação da origem dos produtos de precipitação em nuvens frias foi desenvolvida por
T. Bergeron e aperfeiçoada por F. Findeisen (Berry et al., 1945). A teoria de Bergeron-Findeisen
se fundamenta no fato da pressão de saturação sobre gelo ser menor que sobre a água sobrefun-
dida. Assim, em uma nuvem fria, onde coexistem gotas d'água e cristais de gelo a temperaturas
bem abaixo de 0oC, estes crescem às custas daquelas. Atingindo a um tamanho suficiente o cris-
tal de gelo iniciaria sua queda em direção à superfície.
No caso das nuvens quentes, o tamanho das gotículas inicialmente aumenta por conden-
sação de mais vapor d'água em sua superfície ou seja, o crescimento resulta somente da difusão
do vapor. O aumento do volume é relativamente elevado nessa fase e, mesmo havendo uma so-
bre-saturação pequena, em pouco tempo alcançam raios de 5 a 10P, típicos de uma gotícula de
nuvem (Haltiner e Martin, 1957). Acredita-se que, nessa fase inicial, a presença de núcleos hi-
groscópicos e em particular os gigantes, desempenhe um papel muito importante e facilitem o
surgimento de gotículas de tamanhos diferentes. Como se sabe, as gotas grandes tendem a cres-
cer às custas das pequenas de mesma concentração salina, devido à diferença da pressão de
saturação. O efeito do raio de curvatura, porém, pode ser parcial ou totalmente compensado em
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O processo de crescimento apenas por difusão requer cerca de um dia para que um gotí-
cula possa atingir o tamanho característico de uma gota de chuva (0,5mm de diâmetro). A experi-
ência mostra, no entanto, que uma nuvem quente pode se formar e iniciar precipitação em poucas
horas, fato muito comum na Região Tropical, por exemplo. É evidente, portanto, que outros meca-
nismos devem estar envolvidos no crescimento das gotículas.
I. Langmuir desenvolveu uma teoria explicando que, em seu movimento vertical, as maio-
res gotas normalmente se fragmentavam e as gotinhas resultantes, não tão pequenas, continua-
vam a crescer por colisão-coalescência com as gotículas circunjacentes, numa verdadeira reação
em cadeia (Peixoto, 1970). O efeito multiplicador desse processo seria suficiente para justificar
como as nuvens cumuliformes conseguem desenvolver aguaceiros em tão pouco tempo.
Sob o ponto de vista dinâmico, o requisito básico para que essa fábrica funcione é a exis-
tência de instabilidade atmosférica, favorecendo o desenvolvimento de correntes ascendentes
intensas as quais irão facilitar o crescimento das gotas. Caso não existam mecanismos capazes
de assegurar a requerida instabilidade, a nuvem formada certamente não conseguirá produzir
precipitação, ou o fará em quantidades insignificantes. Tampouco haverá precipitação abundante
na ausência de um suprimento adequado de vapor d’água.
Diversas tentativas têm sido feitas no sentido de provocar a formação de gotas grandes,
capazes de desencadear precipitação. A técnica mais comum, no caso de nuvens quentes, con-
siste em aspergir nelas (a partir de uma aeronave) grandes gotas de solução salina,. A hipótese
assumida é a de que tais gotas irão iniciar a reação em cadeia. Em nuvens frias costuma-se efe-
tuar a estimulação mediante a dispersão de neve carbônica (CO2 congelado), visando à geração
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de núcleos de sublimação.
A estimulação de uma nuvem com vistas a provocar chuva só tem cabimento em época de
estiagem (no período chuvoso não teria sentido algum). Mas, durante esses períodos secos, a
chuva torna-se naturalmente escassa ou inexistente justamente porque não há bastante umidade
atmosférica, ou existem mecanismos inibidores da instabilidade atmosférica (como a camada de
inversão dos ventos alísios, por exemplo), ou ambos os fatores. Na época chuvosa estão espon-
taneamente satisfeitas essas condições (suprimento de vapor e instabilidade) e é evidente que as
nuvens tendem a se desenvolver e, sem nenhuma estimulação, produzem chuva. A questão que
se coloca é se o efeito das estimulações consideradas bem sucedidas não teria sido apenas o de
antecipar o que iria acontecer naturalmente mais tarde. Aliás, esse é o argumento usado diante
dos juizes quando alguém se sente prejudicado pelo fato do vizinho ter recorrido à indução artifici-
al da chuva.
A inoculação de uma nuvem com produtos estimulantes, sem que as condições de supri-
mento e de instabilidade estejam satisfeitas, no máximo produziria uma quantidade muito pequena
de chuva, que nem sempre chega a atingir o solo. Precipitação da ordem de 2 a 5 litros por metro
quadrado do terreno, em plena época de estiagem, não parece ter efeitos consideráveis sobre as
culturas. Questiona-se, caso a temperatura à superfície do solo seja elevada durante o período
não chuvoso, se uma precipitação dessa magnitude efetivamente chega a ser aproveitada, mes-
mo que parcialmente.
8.1 - Hidrometeoros.
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