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O ESTADO DE S. PAULO SEGUNDA-FEIRA, 16 DE MAIO DE 2011

Cineasta Ganhador de três Oscars, começou

Entrevista norte-americano
✽ Diretor, ator, escritor, roteirista e
como ator e roteirista em O Que É
Que Há, Gatinha? (1965). Como dire-

Woody Allen músico, Woody Allen nasceu Allan


Stewart Königsberg em NY (1935).
tor estreou em 1969, com Um Assal-
tante Bem Trapalhão.

FOTOS STEVE MCCURRY/MAGNUM/DIVULGAÇÃO


– o homem viril, o aventureiro, o sedu-
tor... Você precisou fazer muita pes-
quisa?
Nenhuma! Tudo o que coloquei na
tela, e nos personagens, faz parte da
minha cultura acumulada, da minha
vivência. Tenho a impressão que He-
mingway e William Faulkner são os
gigantes da literatura norte-america-
na do século 20. Scott Fitzgerald
também é muito bom, mas está um
pouco abaixo. E poderia citar ou-
tros norte-americanos em Paris,
John dos Passos. Hemingway virou
uma referência especial justamente
porque o homem se tornou tão im-
portante quanto o escritor. Todo
mundo acompanhava o Hemingway
viril, aventureiro, sedutor, caçador,
beberrão. Essa mistura de arte e vi-
da atuou no imaginário de toda uma
geração e influenciou outros que
vieram depois... Norman Mailer,
por exemplo. Sim, você tem razão.
O filme transpira esse fascínio.

● Uma das piadas mais deliciosas do


filme é quando seu alter ego, o perso-
nagem interpretado por Owen Wilson,
sugere a Luis Buñuel a ideia para O
Anjo Exterminador. É um filme impor-
tante para você?
É um filme importante para a histó-
ria do cinema. Mas essa é uma piada
que as pessoas entendem aqui na
França, em Cannes. Nos EUA, o pú-
blico dificilmente vai captar a nuan-
ce. Eles conhecem Buñuel por lá,
Sobre Machado. “Memórias Póstumas de Brás Cubas é completamente moderno, poderia ter sido publicado na semana passada”, diz o diretor mas não possuem essa sofisticação.
Amo O Anjo Exterminador. Acho ge-
nial a ideia daquelas pessoas presas
num espaço. A propósito, o filme
mostra o plano dos criados abando-
“GOSTO DO HUMOR RÁPIDO, POR ISSO nando a casa e o repete, exatamente
do mesmo ângulo. Perguntaram o
porquê para Buñuel e ele disse que

CORTO SEM DÓ”


os produtores o haviam contratado
para fazer um filme de, sei lá, 100
minutos. Ele tinha 95. Repetiu o pla-
no só para atingir a duração.

● Justamente a duração dos filmes.


Os seus são muito curtos. Por quê?
Porque não preciso de mais tempo
para dizer o que quero. Sempre ti-
ve a maior admiração pelos Ir-
mãos Marx, por Preston Sturges.
O humor deles é rápido, o diálogo,
Luiz Carlos Merten / CANNES vivo. Morro de medo de entediar o
espectador. E por isso corto, corto
sem dó.
Diretor que abriu o festival francês com Midnight in Paris também ● Isso é raro. A maioria dos autores
lembra de suas variadas admirações que ele coloca em seu novo filme se recusa a cortar o próprio trabalho,
concorda?
Absolutamente, e é um erro. A monta-
gem é uma arte que eu gosto de exer-
citar. Sou a favor dos filmes curtos.

● Na maioria de seus filmes, senão


em todos que você não representa,
ábado à tarde na Croi- nest (Hemingway) e os outros. não conheça, Julio Bressane e André primeira vez que vim aqui foi em 1964. há sempre um personagem que é seu

S
sette, no Hotel Marti- Woody Allen conta tudo. A origem Klotzel. Gostaria de assistir aos filmes? Foi amor à primeira vista. Mas não pen- alter ego. Owen Wilson é o melhor de
nez. Woody Allen está do filme, do seu amor pela França, pe- Em cópias com legendas? Claro. É mui- sava num filme. Me veio o título, Meia- todos os Woody Allens da tela. Con-
terminando sua partici- la literatura. Com a palavra, o autor. to interessante o que você diz. Dois di- Noite em Paris. O que poderia ocorrer corda?
pação no 64.º Festival retores de perfis bem diferentes. É nesse horário, numa cidade tão mágica? Melhor que eu? Owen trouxe uma
de Cannes. Ele conce- ● Antes de falar sobre Midnight in Paris, curioso como diferentes artistas po- De repente tive o click e vi uma forma vida para o filme que superou toda
de ao Estado sua penúltima entre- tenho duas questões que se referem es- dem se apropriar do mesmo material de resgatar a Paris mítica que está no a minha expectativa. Não lhe dei ins-
vista, uma individual programada pecificamente ao Brasil. Uma delas diz com objetivos próprios. Eu mesmo fiz imaginário dos norte-americanos. truções precisas, não dizia como ele
para durar 20 minutos, mas que respeito à sua descoberta de Machado o meu Guerra e Paz (de Tolstoi) com deveria ler as linhas. Ele chegou ao
se estende por mais dez, para de- de Assis. Como isso aconteceu? um recorte muito particular (A Última ● Foi fácil chegar aos personagens que desenho do personagem por si só.
sespero da assessora que aponta a Devo a uma fã brasileira que me man- Noite de Boris Grushenko). você queria reencontrar nessa Paris míti- Captou algo de mim e acrescentou
toda hora para o relógio. Mas Al- dou um e-mail falando de Machado, ca? o melhor dele.
len está feliz da vida. Midnight in de Memórias Póstumas de Brás Cubas. ● A outra questão é sobre seu filme bra- Pergunte a qualquer norte-americano
Paris foi bem recebido pela crítica Ela me recomendava que lesse o livro. sileiro. Você vai mesmo filmar no Rio? que tenha um lustro cultural e ele sabe- ● Por falar em melhor, ninguém é me-
– e o filme estreia em 17 de junho Tinha certeza de que não iria me de- Tenho filmado em Londres, Barcelo- rá de cor os personagens de Paris nos lhor do que Marion Cotillard. A perso-
no Brasil. cepcionar. E não me decepcionei! O li- na, Paris. Agora vou a Roma. Minha ir- anos 1920, na belle époque. Se estou nagem dela, essa modelo de Picasso,
Conta a história de um roteirista vro é sutil, divertido, inteligente, mas mã e produtora esteve no Brasil con- contando a história de um americano é acurada?
de Hollywood que está cansado de acima de tudo o que me encantou fo- versando com o pessoal de lá. Produto- que viaja aos anos 1920, na França, ele Sublimei na personagem tudo o que
vender seu talento para o cine- ram a sua ironia e a sua modernidade. res, a film comission. Existe por en- tem de encontrar Scott Fitzgerald, Er- sempre li sobre as musas inspirado-
mão. O cara acha que nada poderá Machado refletia sobre o próprio traba- quanto um rumor. Não há nada acerta- nest Hemingway, Luis Buñuel, Salva- ras de grandes pintores e esculto-
superar a magia dos anos 1920, lho de uma forma muito contemporâ- do, mas um filme no Brasil poderia ser dor Dalí. São todos os arautos de uma res. E Marion é, sim, maravilhosa.
quando Paris era uma festa. E en- nea. Nesse sentido, Brás Cubas é com- interessante, por que não? era de mudança, que me deu vontade No início, a personagem era uma
tão, uma noite, depois de discutir pletamente moderno. Poderia ter sido de retratar. norte-americana em Paris. Mudei
com a namorada, ele vê chegar, ao publicado na semana passada. ● Agora sim, Midnight in Paris. Você dis- só para poder tê-la no elenco. Ela
som das batidas da meia-noite, a se que o título lhe veio antes da história. ● Tenho a impressão que seu ‘Ernest’ chegou vacilante, estressada, sem
oportunidade de realizar uma via- ● Existem duas adaptações do livro pelo Isso ocorre com frequência? (Hemingway) ganha um destaque espe- saber se conseguiria fazer o papel.
gem fantástica ao encontro dos cinema brasileiro, feitas por diretores de Nunca! Tinha esse contrato para fazer cial. Ele diz as coisas mais profundas e, Eu tinha certeza. Marion representa
seus ídolos – Scott (Fitzgerald), Er- perfis bem diferentes que você talvez o filme na França e nenhuma história. A ao mesmo tempo, é aquela figura mítica a própria sedução da França na tela.

PONTOS ALTOS
CLIVE COOTE/REUTERS FOTOS DIVULGAÇÃO

● Hannah e Suas Irmãs ●A Era do Rádio ● Match Point ● Vicky Cristina Barcelona
Oscar de coadjuvante para Dianne Wiest (D) Contou com Tico-Tico no Fubá na trilha sonora A força do acaso na vida das pessoas Para Allen, seu primeiro filme europeu

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