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XII - MANDADO DE SEGURANÇA 2006.02.01.

006595-5

RELATOR : DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO FELTRIN


CORREA
IMPETRANTE : SIDMAR RIBEIRO DA SILVA E OUTROS
ADVOGADO : VANILDO JOSE DA COSTA JUNIOR
IMPETRADO : JUIZO DA 2A. VARA FEDERAL CRIMINAL DO RIO
DE JANEIRO
ORIGEM : SEGUNDA VARA FEDERAL CRIMINAL DO RIO DE
JANEIRO (200451015305172)

RELATÓRIO

SIDMAR RIBEIRO DA SILVA, ANA PAULA DE ALMEIDA


RIBEIRO, FERNANDO VIANA PEREIRA BELO impetraram este
mandado de segurança, com pedido de liminar, objetivando a liberação de
veículos de sua propriedade, apreendidos por força de decisão proferida pelo
MM. Juízo da 2ª Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Rio de
Janeiro, na qual não estaria especificada a necessidade e obrigatoriedade da
medida coercitiva.
Alegam, em suma, “que encerrada a instrução criminal e
proferida a r. sentença de mérito, a Douta Juíza da 2ª vara Criminal
Federal não liberou os referidos automóveis, para que os impetrantes,
fazendo jus na íntegra de seus direitos de propriedade, pudessem
regularizar pendências financeiras promovidas pelas prisões em que
incorreram, bem como disporem livremente da maneira como bem
entenderem”.
Aduzem, por fim, estarem presentes os pressupostos
autorizadores da tutela de urgência em relação ao o 2º e 3º impetrantes,
configurado pela absolvição de ANA PAULA DE ALMEIDA RIBEIRO,
proprietária do veículo Mercedez-Bens Classe A, e o fato do automóvel
Chevrolet- Zafira ter sido adquirido por FERNANDO VIANA PEREIRA
BELO antes do início das investigações, restando tal fato consignado na

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própria sentença.
Requerem “a concessão da ordem de segurança,
consubstanciada na determinação de liberação dos veículos dos
impetrantes, cujos perdimentos não foram decretados em favor da União”.
As informações relativas ao alegado foram prestadas às fls. 102,
com inclusas peças processuais, por cópia, de fls.104/183.
O pleito de liminar concessão da ordem foi indeferido às fls.
185/186.
Deu-se vista ao d. representante do Ministério Público Federal
que, em parecer de fls. 193/203, opinou “pela concessão da segurança em
relação ao veículo Mercedez-Benz Classe- A (placa KRE-0346), de
propriedade da 2ª impetrante, e a denegação, relativamente aos veículos de
propriedade dos 1º e 3º Impetrantes”.
É o relatório. Peço dia.

SERGIO FELTRIN CORRÊA


Relator

VOTO

DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO FELTRIN CORRÊA


(RELATOR):

Conforme relatado, o presente mandamus versa sobre alegado


direito líquido e certo dos impetrantes em reaver seus bens, apreendidos por
força de decisão proferida pelo MM. Juízo da 2ª Vara Federal Criminal da
Seção Judiciária do Rio de Janeiro, os quais não teriam sido objeto de
perdimento em favor da União Federal.
Como bem assinalado no parecer do D. Órgão do Ministério
Público Federal, merecem prosperar, em parte, os argumentos apresentados
pelos ilustres Impetrantes.
O aludido parecer (fls. 687/693) tratou com propriedade a

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quaestio, extraindo-se do mesmo a seguinte passagem:


“(...)
Conforme a denúncia oferecida pelo MPF, faziam parte de uma
organização criminosa, que compreendia empresários do ramo
de combustíveis, seus empregados, policiais rodoviários
federais, policiais civis, fiscais do estado, proprietários de
gráficas, fiscais do meio ambiente e bombeiro militar, que tinha
como objetivo a vinda de combustível no estado do Rio de
Janeiro, procedente do interior de São Paulo e da cidade de
Campos, lastreados em notas fiscais falsas. Os distribuidores de
combustível pagavam propina a Policiais Rodoviários Federais
e a Fiscais do Estado do Rio de Janeiro para garantir a venda e
distribuição do combustível com notas fiscais falsas.
Há que se destacar que SIDMAR, ora 1° impetrante,
distribuidor de combustível, foi apontado como um dos
mentores intelectuais da quadrilha, e que os 2° e 3° impetrantes
atuariam na organização criminosa ligados a ele.
(...)
Os elementos informativos constantes da impetração não
conduzem a mais mínima certeza de que os bens apreendidos
não foram adquiridos com recursos financeiros provenientes da
prática criminosa, o que já seria bastante para não se entender
como configurado o direito líquido e certo que dizem ostentar
os Impetrantes e que seria indispensável a eventual concessão
de segurança, se a via mandamental fosse apropriada à
insurgência manifestada contra a decisão censurada.
Nesse sentido, Manoel Gonçalves Ferreira Filho assinala que o
"direito líquido e certo é aquele que, à vista dos documentos
produzidos, existe e em favor de quem reclama o mandado, sem
dúvida razoável" (Curso de Direito Constitucional, 27 ed., São
Paulo, Saraiva, 2001, p. 318).
Acrescente-se que o Juízo impetrado deferiu o pedido de
restituição do veículo, a fim de que não perecesse, nomeando a
segunda impetrante como depositária dos veículos objeto do

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presente mandamus.
Por outro giro, conforme bem salientou o juízo impetrado em
suas informações, contra suposta omissão, contradição ou
incorreção da sentença, quanto à decretação do perdimento dos
bens em questão, poderiam ter sido opostos pelos impetrantes
embargos de declaração.
Ademais, não se vislumbra qualquer ilegalidade na decisão
preferida nos autos da Ação de Restituição de Coisa Apreendida
nº 2004.51.01.536621-5 (fls.74) posto que devidamente
fundamentada e conforme a legislação vigente (art.463 do
CPC).
Ressalte-se que os motivos ensejadores da constrição efetuada
não são objeto de discussão no presente mandamus, até porque
os impetrantes não trouxeram aos autos a decisão que
determinou a busca e apreensão dos referidos bens.
Quanto à alegação, por outro lado, de que o Juízo impetrado
teria se omitido na apreciação do perdimento dos referidos bens
em favor da União, a simples colação do trecho da sentença que
aborda esta questão, afasta qualquer dúvida sobre sua legalidade
e fundamentação, verbis:
“ Dispõe o art.91 do CP que um dos efeitos decorrentes da
condenação é:
‘I - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou
de terceiro de boa-fé:
a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas
cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato
ilícito; b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que
constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato
criminoso.’
Este efeito da sentença penal condenatória que, em realidade, se
traduz em uma pena de confisco, foi merecedor dos seguintes
comentários por parte de Cezar Roberto Bitencourt:
‘O confisco, na nossa legislação atual, não é pena, mas simples
efeito da condenação, e limita-se aos instrumentos e produtos

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do crime. Instrumentos do crime são os objetos, isto é, são as


coisas materiais empregadas para a prática e execução do delito;
produtos do crime, por sua vez, são as coisas adquiridas
diretamente com o crime, assim como toda e qualquer
vantagem, bem ou valor que represente proveito, direito ou
indireto, auferido pelo agente com a prática criminosa.’
O intento do legislador ao estabelecer o perdimento de bens foi,
sem dúvidas, o de buscar evitar o enriquecimento ilícito do
infrator e, ao mesmo tempo, evitar que determinados bens
potencialmente lesivos permaneçam em poder da população.
Esta medida, no entanto, é excepcional, por implicar em
exceção ao direito de propriedade, razão pela qual não pode ser
determinada abusivamente pelo juiz, mas sim apenas naquelas
hipóteses previstas em lei que estiverem devidamente
comprovadas.
De fato, para a perda do bem, medida excepcional, há a
induvidosa necessidade de um nexo etiológico entre o delito e o
objeto utilizado para sua prática ou que o mesmo tenha sido
obtido em decorrência da prática do primeiro. Do contrário,
impõe-se a liberação do bem.
Além disso, a jurisprudência é pacifica no que se refere à
impossibilidade de apreensão de bens, cujos proprietários não
possuem qualquer relação com a prática criminosa, conforme
atestam os julgados abaixo transcritos:(omissis).
Realizado este pequeno intróito, observo que a Autoridade
Policial e o próprio MPF não trouxeram elementos concretos
que indicassem qualquer vínculo entre a maioria dos bens
apreendidos com os ilícitos que foram praticados, descumprindo
o ônus que lhes foi imposto.
Ressalvo, outrossim, que se tratam de centenas de apensos
formados em razão destas apreensões, sendo que em muitos
sequer houve a juntada de relatórios de bens devolvidos, o que
gera graves incertezas para o decreto de perdimento.
Igualmente, também devo salientar que não houve manifestação

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do MPF especifica para esta perda e que, conforme pude


observar nestes apensos, muitas constrições sequer se
justificam, como, por exemplo, aquelas que receiem sobre
veículos adquiridos em datas anteriores aos fatos criminosos ou
as que recaem sobre alguns bens que poderiam ser
perfeitamente adquiridos pelos acusados, bastando fazer uma
breve consulta nas declarações de renda e nos contracheques
que alguns dos próprios réus apresentaram.
Em conseqüência, entendo que o decreto de perdimento de
bens, neste momento processual, e diante do quadro que se
afigura, não é a medida mais recomendável, devendo a mesma
ser realizada oportunamente na forma, tempo e prazos
estabelecidos no art.122 do CPP, caso a Autoridade Policial e o
MPF consigam demonstrar o preenchimento dos requisitos
legais autorizadores para tanto, pois, do contrário, tais bens
constrictos fatalmente retornarão aos seus titulares.
No entanto, os bens abaixo listados comprovadamente decorrem
do atuar ilícito dos denunciados condenados, pelos motivos que
serão abaixo apresentados, o que já me permite decretar,
imediatamente, os seus perdimentos, tal como dispõe o art. 91,
inciso II do CP. São eles: (omissis)” (grifamos)
Vê-se, assim, que não há qualquer ilegalidade na medida
adotada, uma vez que não estaria o magistrado obrigado a se
pronunciar acerca do perdimento dos bens no exato momento
da prolação da sentença, conforme o preceito do artigo 122 do
CPP, que autoriza tal pronunciamento no prazo de 90 (noventa)
dias do trânsito em julgado da sentença condenatória.
Frise-se, que não há prova pré-constituída nos autos quanto ao
trânsito em julgado da sentença condenatória proferida em
relação aos 1 ° e 3° impetrantes.
Neste ponto, há que se diferenciar a situação da 2° impetrante
em relação aos demais, já que a mesma foi absolvida, em razão
da ausência de provas para sua condenação.
Destarte, deve ser concedida a ordem para devolver a plena

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propriedade do automóvel, Mercedez-Benz Classe A, à segunda


impetrante. Isto porque a medida constritiva de perdimento de
bens, como efeito da condenação, não poderia ser a ela
aplicada, vez que não houve condenação. Acrescente-se que, o
Ministério Público Federal, já em sede de alegações finais,
pleiteou a absolvição da 2ª impetrante, em razão da
insuficiência de provas para sua condenação.
Por fim, não merece prosperar a alegação do 3° impetrante de
que faria jus a liberação do seu automóvel, vez que o mesmo
teria sido adquirido antes do início das investigações que
redundaram na ação penal originária.
Segundo os documentos de fls.45/46, o 3° impetrante teria
adquirido efetivamente o automóvel apreendido (Chevrolet-
Zafira) em 05/12/2004. Entretanto, não há qualquer
comprovante do pagamento dos boletos bancários apresentados.
Ainda que assim não fosse, tanto os fatos imputados aos
impetrantes, como as investigações realizadas, são anteriores à
referida data, até porque os impetrantes foram denunciados em
02 de dezembro de 2004, antes, portanto, da suposta aquisição
do referido veículo. ”.

Conforme salientado, não obstante a insurgência dos i.


impetrantes, mostram-se afastados os pressupostos de liquidez e certeza do
direito invocado, no que concerne a apreensão dos veículos de propriedade
de SIDMAR e FERNANDO, porquanto a condenação dos mesmos impede,
por ora, a liberação de seus bens, nos termos dos artigos 118 e ss do CPP.
Contudo, em relação a impetrante ANA PAULA, forçoso
reconhecer o direito subjetivo em reaver automóvel de sua propriedade (v. fl.
42). É que em seu favor foi proferida sentença penal absolutória (art. 122 do
CPP, em contrário sensu), inclusive com trânsito em julgado para a
acusação, conforme andamento processual no sítio da Seção Judiciária.
Assim, concedo, em parte, a segurança somente para liberação
do veículo Mercedez-Benz Classe-A, de propriedade da impetrante Ana
Paula de Almeida Ribeiro.

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É como voto.

SERGIO FELTRIN CORRÊA


Relator

EMENTA

PROCESSO PENAL. MANDADO DE SEGURANÇA. VEÍCULOS


APREENDIDOS. SENTENÇA.
- Afastados os pressupostos de liquidez e certeza do direito invocado, no que
concerne à apreensão dos veículos de propriedade de dois impetrantes cuja
condenação impede, por ora, a liberação de seus bens, nos termos dos artigos
118 e ss do CPP.
- Sentença penal absolutória em favor da segunda impetrante, inclusive com
trânsito em julgado para a acusação.
- Segurança concedida, em parte, somente para que se proceda a liberação do
automóvel de propriedade da segunda impetrante.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima


indicadas, DECIDE a Egrégia Primeira Turma Especializada do Tribunal
Regional Federal da 2ª Região, à unanimidade, conceder parcialmente a
segurança, nos termos do Relatório e do Voto constantes dos autos, que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 31 de janeiro de 2007. (Data do Julgamento)

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SERGIO FELTRIN CORRÊA


Relator

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