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CPQBA-UNICAMP, C.P. 6171, CEP: 13.081-970 Campinas±SP ± BRASIL.


E-mail: iliomj@cpqba.unicamp.br
16/08/2002

 


O valor intrínseco de uma planta medicinal está no seu efeito terapêutico. A


Organização Mundial de saúde diz que planta medicinal é qualquer planta que possua
em um ou em vários de seus órgãos, substâncias usadas com finalidade terapêutica, ou
que estas substâncias sejam ponto de partida para a síntese de produtos químicos e
farmacêuticos. A estas substâncias é dado o nome de princípios ativos. São eles os
responsáveis pelo efeito terapêutico que a planta medicinal possui. As funções
fisiológicas dos princípios ativos nas plantas ainda não estão completamente
esclarecidas, mas associa-se a sua produção à defesa da planta contra agentes externos
como doenças, pragas, radiação solar, etc., ou à resíduos do metabolismo vegetal. Estes
princípios ativos possuem funções ecológicas importantes para a sobrevivência da
espécie e são produzidos (quase todos) pelo metabolismo secundário das plantas. O
metabolismo secundário não é essencial para o crescimento e desenvolvimento do
indivíduo, mas é essencial para a sobrevivência e continuidade da espécie dentro do
ecossistema. Portanto o metabolismo secundário é responsável pelas relações entre o
indivíduo e o ambiente onde ele se encontra e, por causa do seu caráter adaptativo, pode
ser manipulado geneticamente. O fato do metabolismo secundário ser regido pelo
código genético, e este interagir com o ambiente, tem grande importância na produção
de plantas medicinais, pois a qualidade do produto final é fortemente influenciada pelas
técnicas de cultivo adotadas em sua produção e pelas características genéticas da
população sob cultivo. Por esta razão, no caso das plantas medicinais, é importante que
os indivíduos que compõem a população sob cultivo sejam aparentados, pois isso, além
de facilitar o manejo em si, faz com que a matéria prima seja quimicamente homogênea
e atinja um padrão de qualidade necessário para a viabilização técnica/comercial da
produção.

Mas em que isto se relaciona com a produção de plantas medicinais nativas? É que
quase todas as nossas plantas medicinais nativas ainda não são cultivadas, ainda se
encontram em estado selvagem, crescendo espontaneamente, portanto é preciso
entender o processo agrícola para que se possa cultivar estas plantas e fazer delas
produtos agrícolas.

Embora espécies selvagens possam ser cultivadas, o seu cultivo pode ser uma tarefa
difícil, a depender das características da espécie em questão. Para compreendermos o
porquê desta dificuldade, precisamos ter em mente que a sobrevivência de uma espécie
se dá através de gerações. Ocorre que, na natureza, as chances de uma espécie deixar
descendentes aumentam consideravelmente se os indivíduos que compõem uma
população forem diferentes entre si. Assim, se houver um período de seca, por exemplo,
é provável que alguns indivíduos mais resistentes à falta de água consigam sobreviver e
deixar descendentes. O mesmo raciocínio vale para o caso de uma doença, fogo, ataque
de pragas, etc. Os indivíduos que forem capazes de resistir às condições adversas
poderão deixar descendentes, garantindo a continuidade da espécie. Esta é a estratégia
das espécies na natureza: diversificar para sobreviver. Por isso, indivíduos de uma
mesma população selvagem, com a mesma idade, que cresceram num mesmo ambiente,
são quase sempre diferentes entre si.

A estas diferenças, atribuídas a fatores herdáveis, entre indivíduos de uma mesma


espécie, é dado o nome de  . Ela é a base da dinâmica do
processo evolutivo, pois é por seu intermédio que a seleção natural atua e em
conseqüência a própria evolução pode acontecer.

Por trás da expressão variabilidade genética, encontra-se uma grande variação na


dormência das sementes, na morfologia dos indivíduos, no seu desenvolvimento, na
resistência a pragas e doenças, na sua resposta a condições de fertilidade e água do solo,
etc., gerando inúmeros problemas técnicos que dificultam o seu cultivo. Se, por
exemplo, os indivíduos da espécie em cultivo tiverem diferentes tamanhos ou chegarem
ao ponto de colheita em períodos de tempo muito diferentes, isto certamente trará
problemas para o produtor. Por isso, do ponto de vista do agricultor, é bom que as
plantas a serem cultivadas sejam uniformes, germinando e se desenvolvendo sem
muitas diferenças entre si para que possam ser mais facilmente manejadas por ele.

Como as nossas plantas medicinais, isto é, as plantas medicinais nativas do Brasil, ainda
se encontram em estado selvagem, ao cultivá-las, é como se estivéssemos reinventando
a agricultura. Por esta razão é importante entender como se dá o processo agrícola,
assim podemos evitar e/ou solucionar os problemas agrícolas que nossos antepassados
tiveram que enfrentar nos primórdios da agricultura.

      

Ao fazer agricultura quase sempre diminuímos a diversidade original do local onde ela é
feita e fazemos deste local um ambiente instável, que requer energia vinda de fora do
sistema para mantê-lo equilibrado. Com o objetivo de reduzir o problema do
desequilíbrio ambiental causado pela agricultura é preciso empregar princípios
conhecidos como boas práticas agrícolas. São exemplos destas práticas a rotação de
cultura, a adubação verde, os policultivos, a correção do pH dos solos, as coberturas
viva e morta, os cultivos em épocas mais propícias, etc. Mas mesmo adotando estas
práticas, não conseguiremos atingir o mesmo equilíbrio em que o ambiente se
encontrava antes de se tornar um ambiente agrícola e, para mantê-lo, precisamos
acrescentar energia à ele, seja na forma de insumos, seja na forma de trabalho.

Uma idéia comum é que, se a planta nasce e cresce espontaneamente, então há de ser
muito mais fácil fazê-la nascer e crescer sob cultivo. Esta idéia não é correta, pois a
variabilidade genética existente entre os indivíduos de uma população selvagem gera
inúmeros problemas técnicos que, se não impossibilitam, aumentam grandemente as
dificuldades de um cultivo. Ao optar por cultivar uma planta selvagem, o produtor
desencadeará mudanças na estrutura genética da população manejada, através das
sucessivas gerações cultivadas. Estas mudanças são uma resposta evolutiva da
população, que antes estava sujeita às pressões naturais de seleção e que sob cultivo
estão sujeitas a pressões diferentes, causadas pelo homem. Muitas destas mudanças são
involuntárias, como a perda da dormência das sementes, ou voluntárias, quando ele
busca plantas mais próximas do seu ideal, como plantas mais produtivas ou plantas sem
espinhos. Estas mudanças, desencadeadas pelo ato de cultivar, são uma conseqüência,
um reflexo, da mudança da base genética da população cultivada, e do aumento do grau
de parentesco entre as plantas da população, o que conseqüentemente as torna mais
³parecidas´, mais homogêneas. A este processo dá-se o nome de    .
Enquanto o cultivo relaciona-se às atividades humanas na condução do processo
agrícola, como adubação, poda, preparo do solo, irrigação, etc., a domesticação por sua
vez está relacionada com a resposta genética de plantas (ou animais) ao processo
agrícola.

Normalmente associada aos animais e entendida no dia a dia com o sentido de amansar,
a palavra domesticar pode ser usada também em relação às plantas. De origem latina,
significa trazer para o ³domus´, para a casa. A domesticação de uma espécie tem
conseqüências ecológicas importantes. Cultivar populações com uma base genética
estreita torna o ambiente de cultivo instável. A rusticidade de uma espécie, com as
vantagens que ela traz, também vai sendo perdida à medida que a espécie progride no
processo de domesticação, o que a torna dependente do homem. O grau desta
dependência será proporcional ao grau de domesticação atingido.

O cultivo de plantas medicinais nativas é freqüentemente desacreditado porque é


bastante difundida a idéia de que para uma planta medicinal possuir efeito terapêutico
ela não pode ser cultivada. Que para possuir efeito terapêutico a planta deve ser coletada
no seu ambiente natural. Os argumentos a favor desta teoria baseiam-se no fato de que
nas plantas medicinais os princípios ativos são produzidos como uma resposta da
interação da planta, através de seu código genético, com o ambiente, e tem por
finalidade melhorar as chances de sobrevivência da espécie na natureza. Uma vez que a
espécie esteja num ambiente onde ela é favorecida pelo homem, não haveria porque
continuar produzindo princípios ativos. Embora à primeira vista esta idéia seja lógica,
ela é desmentida pelo cultivo das plantas medicinais já domesticadas, que são exóticas
na sua quase totalidade, como a sálvia (c    ), camomila (
  
  ), digitalis (    ), etc., e por dois representantes nativos, que são a
ipeca (       ) levada por ingleses no século XIX para a Índia e que é
hoje produto de exportação daquele país, e o jaborandi (    ),
domesticado pela empresa farmacêutica alemã Merck e cultivada em sua fazenda no
Maranhão. A explicação que desmente a idéia de que plantas medicinais não podem ser
cultivadas se deve ao fato de que está embutido no conceito de planta medicinal, a
condição de que esta planta cure, ajude na cura ou alivie a doença, ou que seja ponto de
partida para a síntese de produtos químicos e farmacêuticos. São com estes objetivos
incluídos no processo de torná-la cultivável que se dá a domesticação de uma planta
medicinal. Ao iniciarmos este processo, estreitamos a base genética da população a ser
cultivada, isto é, selecionamos indivíduos que se adaptam às condições de cultivo e que
possuam potencial genético para a produção de princípios ativos no ambiente agrícola,
concomitantemente. Por isso plantas medicinais corretamente domesticadas, ao serem
cultivadas também possuirão os princípios ativos responsáveis pelo efeito terapêutico.
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Se hoje a maioria da humanidade sobrevive por causa da agricultura, isto se deve ao


trabalho de domesticação feito de maneira inconsciente, apesar de voluntária, desde os
primórdios da agricultura até o começo do século passado, quando então os mecanismos
genéticos passaram a ser conhecidos e a domesticação passou a ser feita
conscientemente. No entanto, para que a domesticação possa ser feita eficientemente é
preciso empregar conhecimento especializado e, mesmo assim, pode demorar anos, pois
os ganhos são conseguidos por cruzamentos direcionados, através de gerações de
plantas. Por estas razões, atualmente este trabalho é feito preferencialmente por
instituições de pesquisa ou empresas produtoras de sementes. Ocorre que a demanda por
plantas medicinais nativas já existe e a tendência é de que esta demanda aumente, pois à
medida que as pesquisas científicas avançam e confirmam a eficácia de muitas espécies
que já são usadas popularmente, criam condições legais para que possam ser
oficialmente receitadas por médicos e transformadas em medicamentos por
farmacêuticos. Desta maneira estas plantas podem ser usadas por pessoas que pertencem
a comunidades culturais diferentes daquela que sempre fez uso tradicional da planta.
Como o produtor que puder se estabelecer primeiro no mercado certamente poderá tirar
mais vantagens econômicas do que aqueles que vierem a se estabelecer depois, o
interesse na produção de algumas espécies é imediato.

Mas como fazer para produzir uma planta que ainda não foi domesticada? Um dos
caminhos, além do cultivo, é o do extrativismo. Para realizá-lo é preciso que o produtor
possua uma licença ambiental. No estado de São Paulo esta licença pode ser conseguida
junto ao Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais (DEPRN), e, de
acordo com a portaria DEPRN-52, de 28/12/98, é preciso que o produtor apresente: I)
Inscrição em cadastro de extrator de produtos florestais múltiplos; II) Aprovação de
plano de manejo pelo órgão licenciador, no caso, o próprio DEPRN.

O extrativismo, depois da aprovação do plano de manejo, passa a ser considerado



, e se diferencia do extrativismo que não está preocupado com a
preservação das espécies exploradas. O manejo sustentado pode ser um sistema de
produção adequado em algumas situações especiais:

a) No caso de matérias primas obtidas de árvores, cujo longo ciclo de desenvolvimento


desestimula o cultivo, como o óleo de sassafrás (Y   ), do óleo de copaíba
(     ), da resina da almécega (   .) e da casca do ipê
(    .), por exemplo.

b) Quando uma espécie aparece espontaneamente em altas densidades populacionais,


como o chapéu de couro (     ), que ocorre em algumas várzeas em
densidades tão altas que tem-se a impressão de tratar-se de uma monocultura. Esta
situação também é comum para outras espécies, como a macela (   .), a
carqueja (    .), o assapexe (   , a goiaba (   ), a
embaúba (    .) e muitas outras plantas, que podem ocorrer em altas
densidades por extensas áreas.

c) Um produtor que possua contatos com laboratórios e farmácias de manipulação pode


explorar também as chamadas plantas invasoras e mesmo as plantas pioneiras que se
instalem em áreas de sua propriedade. No caso, por exemplo, do chamado ³pasto sujo´,
é possível explorar várias plantas (U   !   !c  !c" #
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c      !c    etc.), e ainda favorecer o pasto apícola. Ao
optar por este sistema de produção, é importante que o produtor possua os contatos
comerciais mencionados, porque estes geralmente necessitam de quantidades que
variam de alguns a poucas dezenas de quilos de diferentes espécies mas oferecem um
preço bastante superior ao oferecido pelos atacadistas de plantas medicinais. O
diferencial de preço é que viabiliza o negócio.

d) Enquanto a demanda por matéria prima puder ser satisfeita, tanto em quantidade
como em qualidade. À medida que a demanda por uma espécie cresce, sua importância
econômica também cresce, sendo que esta demanda está estreitamente relacionada com
os resultados dos estudos científicos. Por sua vez, à medida que estes estudos
progridem, os critérios de qualidade tornam-se mais exigentes, inclusive quanto à
análise quantitativa e qualitativa dos princípios ativos.

O produtor deve se lembrar também que produzir com qualidade no sistema extrativista
pode tornar-se oneroso, pois não basta colher e secar as plantas. É preciso também
selecioná-las e, neste sistema de produção, o descarte geralmente é elevado.

No entanto, a principal maneira para se obter, num futuro próximo, matéria prima de
acordo com um mercado cada vez mais exigente, deverá ser através de cultivo. Este
cultivo é aqui entendido como o manejo de populações aparentadas, ou seja,
geneticamente próximas, podendo ser feito em qualquer ambiente, desde áreas abertas
ou até mesmo dentro de uma mata. O cultivo pode tornar-se necessário por duas razões:
a primeira delas é que uma mata, preservada ou em regeneração, não consiga suprir a
demanda por matéria prima, à medida que as espécies forem atingindo maior
importância econômica. A segunda razão é que as empresas de transformação, para
poderem planejar-se administrativamente, precisarão saber com que quantidade,
regularidade e padrão de qualidade poderão contar com a matéria prima que irão
processar. Através do extrativismo ou do manejo sustentado, nem sempre se pode
conseguir matéria prima nas especificações que o comprador deseja, pois os fatores
genéticos, ontogenésicos (o estágio de desenvolvimento da planta) e ambientais
dificultam a obtenção de um bom padrão de qualidade, além de responder aos quesitos
quantidade e regularidade de maneira menos previsível e elástica do que sob condições
de cultivo.

Por causa das razões apresentadas acima, a tendência no tempo para a exploração deste
tipo de recurso natural pode ser representada pelo fluxograma abaixo:

m       

m 
   

tempo


Èalidação científica do efeito terapêutico


  

Deve ser lembrado que o emprego que se fará das plantas medicinais tem implicações
na saúde pública e portanto o seu uso é regulamentado pelo Ministério da Saúde, através
da Secretaria de Èigilância Sanitária, em Resolução RDC- Nro. 17, de 24/02/2000. Esta
Resolução diz que apenas as espécies que possuírem estudos toxicológicos e
farmacológicos poderão servir de matéria prima para a fabricação de fitoterápicos. Ela
fixa um prazo de 5 anos para que se concluam os estudos toxicológicos e de mais 5 anos
para a conclusão dos estudos farmacológicos. Sem estes estudos um medicamento
fitoterápico não pode ser registrado no Ministério da Saúde. Este ponto é muito
importante e deve ser considerado quando da escolha das plantas medicinais a serem
exploradas, pois, embora esta Resolução não se dirija aos produtores, o potencial de
mercado que uma espécie possui está diretamente ligado ao conhecimento científico
disponível a seu respeito. Assim, algumas espécies brasileiras, apesar de ainda não
fazerem parte de nossa farmacopéia, o livro oficial que reúne os medicamentos
aprovados pelo Estado, estão se mostrando bastante promissoras como opções agrícolas.
É o caso do guaco (
"   e
  ), da espinheira santa (
  
 ) e
 &), da carqueja (         ), da
guaçatonga (     ) e do ginseng brasileiro (    e 
 ), para citar algumas.

p 

Como os leitores têm acompanhado, produzir comercialmente plantas medicinais


nativas não é uma tarefa descomplicada, visto tratar-se de plantas selvagens, com a
conseqüente variação genética entre indivíduos de uma mesma população, fato que por
si só já dificulta o cultivo, pois os indivíduos que compõem a população não se
comportam de maneira homogênea. Mas existe também outro fato complicador: as
plantas não domesticadas não possuem, por conseqüência, tecnologia agrícola
desenvolvida, pois não se pode dizer qual o melhor espaçamento entre plantas, quando
os indivíduos de uma mesma população são de diferentes tamanhos, ou qual a melhor
adubação, quando a resposta à adubação variar de planta para planta, ou qual o ciclo de
cultivo, quando os indivíduos chegam ao ponto de colheita em momentos diferentes, e
assim por diante.

Apesar das muitas dificuldades que o agricultor que se propõe a cultivar plantas
medicinais nativas vai encontrar, suas chances de sucesso aumentam conforme a sua
experiência em agricultura e a observância de alguns cuidados. O primeiro problema
com o qual ele vai se deparar certamente será, com raras exceções, a inexistência de
material de propagação que possa ser adquirido no mercado. É muito difícil encontrar
sementes à venda, ou bulbos, rizomas ou tubérculos, uma vez que normalmente estas
plantas não são cultivadas. Sendo assim, o próprio agricultor deve providenciar o
material de propagação com que pretende iniciar o seu cultivo. O ideal é que ele consiga
este material preferencialmente de espécies que ocorram espontaneamente na sua
região, ou de regiões com condições ambientais semelhantes, pois assim ele conseguirá
plantas que se adaptam mais facilmente às condições da sua propriedade e terá mais
chances de sucesso no seu empreendimento. É preciso que ele identifique as plantas
matrizes das quais pretende coletar o material de propagação, acompanhe o seu
desenvolvimento e faça a coleta deste material no momento oportuno. No caso das
sementes, quando estiverem maduras, no caso de estacas, preferencialmente no início da
primavera, pois assim enraizam com mais facilidade e no caso de rizomas ou bulbos,
quando a planta estiver dormente, o que se dá normalmente no outono/inverno. É muito
importante que ele identifique botanicamente as espécies com as quais irá trabalhar,
pois a confusão gerada pela profusão de nomes populares é muito grande. Estes nomes
variam de região para região. São características culturais de cada região, e, portanto
não podem ser considerados errados quando não coincidem com os nomes que estamos
habituados a usar. As manifestações culturais devem ser respeitadas e preservadas, mas
para evitar equívocos, quem se propõe a trabalhar comercialmente com plantas
medicinais deve conhecer estas plantas pelo seu nome científico. Sob o nome de
espinheira santa, por exemplo, podem ser encontradas muitas espécies, inclusive de
gêneros botânicos diferentes como as espécies]   .,      e
c   , porém aquelas que possuem estudos toxicológicos e clínicos são
apenas duas:
   e
   &

Para contornar o problema da heterogeneidade entre as plantas do cultivo, o agricultor


pode optar por espécies que possam ser propagadas vegetativamente (estacas de

"   .,    .,     !   , raízes de


   .
são alguns exemplos). Procedendo desta maneira, as mudas conseguidas terão o mesmo
padrão genético da planta-mãe (aquela de onde foi conseguido o material de
propagação), e, portanto, manterão as mesmas características, trazendo consigo
facilidades para o seu manejo e as vantagens de uma matéria prima padronizada,
característica muito importante para a finalidade a que este tipo de planta se destina. Os
problemas causados pela variabilidade genética também poderiam ser minimizados
coletando-se sementes de algumas plantas-mãe de espécies autógamas (que se
autofecundam), pois este tipo de reprodução faz com que os indivíduos tenham o
mesmo código genético da planta-mãe e assim manifestarão as mesmas características
quando cultivados no mesmo ambiente em que ela se encontra. O inconveniente neste
caso é que pouco ainda se conhece sobre a biologia de reprodução das nossas espécies
medicinais nativas e não se sabe quais espécies são predominantemente de
autofecundação e quais são predominantemente de fecundação cruzada.

Uma característica comum às plantas selvagens e que dificulta bastante o seu cultivo é a
dormência de suas sementes. Esta é uma estratégia da natureza para que a espécie tenha
mais chances de sobrevivência, assim, se por alguma razão (fogo, seca, doença, etc.) as
plantas de um local morrerem, o ambiente poderá se regenerar graças às sementes que
se encontram dormentes enterradas no solo. Esta característica é, no entanto, altamente
indesejada quando se faz a propagação de plantas num viveiro, pois algumas mudas
estarão prontas para o plantio muito antes que outras. Existem diversas maneiras para
quebrar artificialmente a dormência das sementes. A maneia mais eficiente dependerá
do tipo de semente e de testes que o agricultor pode fazer em sua propriedade. No caso
de sementes duras, a escarificação, colocando-se as sementes dentro de uma lata forrada
com uma lixa fina e chacoalhando-a por alguns segundos, pode ser bastante eficiente
para romper a cutícula dura que impede a entrada de água na semente e a sua
conseqüente germinação. Em alguns casos, como em várias palmeiras do cerrado
brasileiro, é o fogo que faz com que a dormência seja quebrada. Para sementes cuja
dormência seja controlada internamente, imergir as sementes uma solução de ácido
giberélico a uma concentração que pode variar de 500 a 2000 ppm por 24 horas é um
método eficiente para fazer com que as sementes germinem ao mesmo tempo.Colocar
as sementes na geladeira por alguns dias também pode quebrar a dormência de algumas
espécies. Como a literatura a respeito de plantas nativas é escassa e muitas vezes o
agricultor não dispõe de tempo para desenvolver os testes de quebra de dormência, uma
estratégia para facilitar o manejo dentro de um viveiro e economizar espaço e substrato
para as mudas, pode ser a de se fazer a semeadura em bandejas sem separação de
células e transferí-las à medida que vão germinando, para o recipiente em que ficarão
até o transplantio no campo. Fazendo isto, além das vantagens mencionadas, o
agricultor pode compor lotes de plantas no mesmo estágio de desenvolvimento.

Existe entre os agricultores a intuição de que uma planta medicinal nativa deva ser
cultivada num ambiente o mais semelhante possível de onde elas se encontram
espontaneamente. Assim, se uma espécie ocorre dentro de uma mata, ela deveria ser
cultivada à sombra, se outra espécie vegeta em áreas degradadas ela deveria ser
cultivada em solos ácidos e pobres em nutrientes, e assim por diante. Nem sempre isto é
verdade. Apesar de ser preciso conhecer as condições ecológicas onde a espécie ocorre
espontaneamente e a que grupo ecológico ela pertence (se é perene ou anual, pioneira,
secundária inicial, secundária tardia ou clímax), e a partir daí estabelecer estratégias
para seu cultivo, muitas vezes as espécies a serem cultivadas são mais vigorosas em
ambientes bastante diferentes do ambiente onde ocorrem espontaneamente. Espécies
como a macela (     e   ) e a carqueja (    .), que
normalmente ocorrem em solos degradados, vegetarão melhor e serão mais produtivas
se forem cultivadas em solos pouco ácidos, ricos em matéria orgânica e nutrientes.
Talvez a explicação para este fenômeno seja a de que elas ocorram espontaneamente em
solos degradados não porque prefiram estes ambientes, mas porque são poucas as
espécies que conseguem se adaptar a estas condições e, como o seu crescimento inicial
é muito lento, em condições ambientais mais favoráveis não conseguiriam competir
com as outras espécies. É preciso também ter conhecimento de que as necessidades de
uma planta mudam conforme os seus estágios de desenvolvimento. Muitas plantas de
mata são exigentes em sombra apenas no início de suas vidas. As plantas trepadeiras e
escandentes, como os guacos (
"   .), o ginseng brasileiro (P    e
a salsaparrilha'c #  buscam alcançar o alto das árvores e só quando alcançam a
luz do sol passam para a fase adulta, florescendo e frutificando. A espinheira santa
(
   ), a pata de vaca (    ), o jaborandi (  
  ) e a erva baleeira (    ) são mais vigorosas, rebrotam
melhor e produzem mais flores e frutos quando estão a pleno sol. Muitas vezes é
importante dar às plantas de mata condições mais amenas de iluminação apenas quando
ainda são pequenas mudas.

Tenho receio de ter levantado mais problemas que soluções para o cultivo de plantas
medicinais nativas, por isso, gostaria de dar alguns conselhos práticos para quem
pretende cultivar estas plantas. O primeiro deles é que o agricultor cultive espécies
perenes e, se possível, de propagação vegetativa. As vantagens de serem de propagação
vegetativa já foram explicadas acima. As vantagens de serem perenes é porque as
perenes correm menor risco de endogamia, que é o cruzamento entre indivíduos
aparentados, que pode levar a uma degeneração genética da população, e também
porque em plantas perenes o custo da formação de mudas e da área de cultivo é
amortizado com o tempo. Além disso, os indivíduos que não se adaptam ao cultivo
podem ser substituídos por outros que se adaptam.

É importante lembrar que além das dificuldades técnicas para o cultivo, o


agricultor encontrará também dificuldades comerciais, pois as plantas cultivadas
encontrarão a concorrência das plantas obtidas por extrativismo, que podem ser
produzidas a um custo muito menor. Por isso o agricultor deve optar por cultivar plantas
que estejam próximas de se tornarem de uso oficial, pois o extrativismo, pelas razões
discutidas acima, não conseguirá atender nem as exigências legais nem as de mercado
para grande parte das plantas de maior interesse econômico.

Para terminar este artigo, permitam-me os leitores escrever quais as espécies, ao


meu ver, têm se mostrado mais promissoras como opções agrícolas: guaco (
"  
 e
  ), espinheira santa (
   ) e
 &),
carqueja (         ), guaçatonga (     ),
ginseng brasileiro (    e  ), erva baleeira'  
  ), quebra pedra (      e  ), embaúba (   
 ( e      ), estévia (c      ), cidreira de folha () 
 ), pata de vaca (    ), maracujá (    e   ),
 '    ), catuaba (    ), muirapuama
(    ) e ipeca (       ).

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