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A PAPILOSCOPIA NO CONTEXTO DA INTELIGÊNCIA POLICIAL

Por estar lidando com as lutas diárias dos peritos em Papiloscopia há anos, buscaremos
desenvolver o histórico da identificação no Brasil sob uma visão estritamente sindical.
Logicamente, trata-se de uma visão crítica, pois que analisada sob a ótica sindical. Mas
deixamos claro nosso respeito a tudo o que se tem tentado fazer, de forma diversa, pelo
crescimento da Papiloscopia, exatamente por conhecermos a atuação de incontáveis abnegados
que arduamente dão seu esforço para o engrandecimento dessa Ciência.

A PAPILOSCOPIA NO CONTEXTO DA INTELIGÊNCIA POLICIAL

Introdução

Por estar lidando com as lutas diárias dos peritos em Papiloscopia há anos, buscaremos
desenvolver o histórico da identificação no Brasil sob uma visão estritamente sindical.
Logicamente, trata-se de uma visão crítica, pois que analisada sob a ótica sindical. Mas
deixamos claro nosso respeito a tudo o que se tem tentado fazer, de forma diversa, pelo
crescimento da Papiloscopia, exatamente por conhecermos a atuação de incontáveis abnegados
que arduamente dão seu esforço para o engrandecimento dessa Ciência.

Incontestável afirmação, entretanto, nos impõe atestar ser muito difícil reconhecer o uso
indiscriminado de pessoas e situações para fins não altruístas nestas plagas; mormente por nos
encontrarmos invariavelmente envolvidos por propagandas distorcidas, cujos fins primários
estão muito distantes dos princípios desenvolvidos pelos profissionais da identificação humana
na busca real por um mundo melhor e mais justo.

Todas as informações aqui contidas foram colhidas em pesquisas efetuadas nos maiores centros
de informação histórica do país: Biblioteca Nacional, Arquivo Nacional, Museu da República,
Senado Federal, etc.

Críticas, seguidas de proposições, fazem-se sempre necessárias à inserção das instituições e


das pessoas no sistema democrático. E esse é o nosso verdadeiro papel no contexto social.

Parte I (volta ao passado)

Há quem goste de voltar reiteradas vezes à Inglaterra de alguns séculos atrás,


descrevendo o surgimento de uma figura folclórica naquele país que congregava em
torno de si as qualidades inerentes tanto à investigação (poder investigativo) quanto
ao domínio de inúmeras ciências. Esta figura é bem representada por um personagem
conhecido de todos nós, surgido tempos depois: Sherlock Holmes. Este personagem
idealizava uma figura que detinha conhecimentos vários em diversas áreas e que os
aplicava na busca da elucidação dos delitos, unindo, de forma indissociável, ciência e
investigação; habilidade em ciências gerais e específicas aplicadas à elucidação dos
crimes com habilidade em investigar profundamente os crimes.
Faço menção a este personagem pois entendo imprescindível para a discussão que
vamos iniciar.
Mas não vou retroceder tanto no tempo. Vou começar nosso debate a partir da
publicação do Código Criminal do Império, em 1830, quando pela primeira vez
aparece uma menção à medicina legal, e também centrá-lo a partir do fim do século
dezenove e início do século vinte, quando veio à efervescência, por aclamação
popular, a necessidade de criação de uma polícia científica, voltada realmente para
combater práticas ainda comuns naquela época, desgastadas e por todos deploradas.
Naqueles tempos ainda se praticavam penas degradantes, como a pena de banimento,
penas das galés, o açoite, as chibatadas e até a pena de morte. Naquela época a
polícia detinha quase todos os poderes, fazendo o papel inclusive da Justiça (o
Intendente Geral dirigia a polícia e a Justiça).
Foi exatamente para se contrapor a estas penas degradantes, e diante de veementes
apelos da população, que já não suportava mais tantas injustiças, é que surgiu na
mente de alguns idealistas a necessidade de adaptação da atividade policial aos novos
tempos que se avizinhavam, principalmente na Europa, tornando-a mais humana no
trato com os delinqüentes e com a população. Era a época do prender primeiro para
depois investigar que se buscava dar um fim.
Assim é que alguns abnegados sonhavam com novos tempos para a atividade policial;
com uma polícia voltada para a defesa dos interesses gerais; afastada das influências
malévolas exercidas por políticos dissociados da vontade popular. A população não
suportava mais ser vitimada por tantos arbítrios.
Desta forma é que surgiu esse desejo de criação de uma polícia científica, bem
preparada, dotada de conhecimentos e meios técnicos e científicos indispensáveis à
produção de provas que fundamentassem as acusações lançadas contra as pessoas
que se desviavam do seu caminho, partindo para a prática de delitos.
Mais do que isso até, baseava-se e remetia-se a essa figura acima referida - o
Sherlock Holmes -, como o ideal a ser perseguido por uma polícia técnica. Chegou-se
até a imaginar o nascimento de uma polícia civil toda técnica e científica, contendo em
seus quadros unicamente cargos técnicos e científicos (sonho ainda não realizado).
Mormente porque nunca foi da nossa tradição uma figura tipo essa, unindo numa
mesma pessoa qualidades de ciência e de investigação - várias cabeças num mesmo
corpo -, buscou-se aliar o ideal perseguido às peculiaridades brasileiras.
Isso porque era impossível alcançar aquele ideal com governantes que buscavam
arregimentar investigadores não entre aqueles dotados de maior técnica e preparo
para lidar com o povo, mas sim entre aqueles que demonstrassem maior
predisposição em abater potenciais agressores do sistema.
Outro fato relevante ao qual credito essa impossibilidade, era e ainda é o abandono a
que estão relegados todos os policiais; que são deixados pelos governantes ao
alvedrio da própria sorte na busca do aprimoramento constante a que deveriam ser
constantemente submetidos.
Fator relevante, outrossim, são as peculiaridades inerentes às práticas criminosas de
cada povo. Na Inglaterra, bem ao contrário do Brasil, os criminosos ainda não fazem
das armas e das agressões irracionais um massacre inútil contra inocentes.
Exatamente por isso, a polícia inglesa dispara pouquíssimos tiros por ano (média de
meia dúzia toda a polícia), impondo a todos o uso precípuo da cabeça e do
aprimoramento ininterrupto como meio mais eficiente de combate aos delitos (apesar
do assassinato brutal do brasileiro, recentemente, confundido com um terrorista).
Mas todo o ideal de criação da polícia técnica nasceu da necessidade de se unificar,
senão numa mesma pessoa, mas fazendo com que trabalhassem conjuntamente dois
tipos de peritos: um, conhecido de todos nós, os peritos da polícia técnica, detentor de
conhecimentos em ciências específicas voltadas para a elucidação dos crimes
(papiloscopia, documentoscopia, balística, grafotecnia, etc) e de ciência gerais
aplicáveis a esta elucidação (física, química, biologia, matemática, etc), a um outro
perito ignorado por muitos - e por muitos não considerado perito: o perito em
investigação (o investigador, ou detetive, como queiram). Esta figura, o detetive, tal
como nós, também é um perito, em seu sentido lato, um perito em investigação.
Para unir estas duas figuras, o perito em polícia técnica e o perito em investigação,
nasceu todo o ideal de criação da polícia técnico-científica. Seu ideal, diverso do
congênere inglês, buscava unir vários corpos numa só cabeça.
Nessa época, no início do século passado, só existia a figura do médico-legista. Os
legistas eram responsáveis pela realização de perícias (basicamente as mesmas que
ainda hoje realizam), quais sejam: aquelas relacionadas à determinação da causa
mortis, sendo responsáveis pela realização de exames de corpo de delito, atendendo
às solicitações emanadas da Justiça.

A Justiça, frise-se, ainda possuía largas ligações com a polícia, haja vista que só
ocorreu a desvinculação destas duas instituições em 1927, pois o intendente geral de
polícia, anteriormente, também comandava o Poder Judiciário.
Ainda se iniciava no Brasil os estudos sobre a medicina legal, o que veio a se tornar
mais forte em meados de 1800 (de 1850 em diante), principalmente nas
universidades (da Bahia e do Rio de Janeiro). Havia uma forte resistência dos médicos
localizados nestas universidades em vincular a nascente atividade de medicina legal
aos organismos policiais. Uma parte dos médicos era favorável e a outra radicalmente
contrária; esta última entendia a atividade médico-legal como essencialmente
científica e ligada indissolúvel e exclusivamente às universidades.
O fato é que a medicina legal não se prestou a fazer o papel exigido pela nova
concepção de polícia que se formava no momento. Muito menos se prestava a realizar
o papel de trabalho conjunto entre investigação e perícia, exigido para o ideal de
polícia técnica que se formava. Não se adequava à elucidação dos novos tipos de
crimes que surgiam, cada vez mais complexos e exigindo uma diversidade de
conhecimentos não dominados pelos legistas. Suas inumeráveis atribuições também
não lhes permitiam.
E no vácuo deixado pelos médicos legistas, exatamente para suprir essa lacuna, surge
a necessidade de criação de um novo departamento. Desta forma, é que surgem os
institutos de identificação. Nascem para dar cabo à complexidade dos novos delitos
surgidos; bem como, e mais importante, para fazer atuar em conjunto o perito
responsável pela investigação e o perito detentor das ciências aplicáveis à elucidação
dos delitos.
Foi a época do boom da Papiloscopia no Brasil. O Departamento de Identificação era a
coqueluche do momento. Tudo girava em seu entorno. Nessa época chegou-se a
cogitar a transformação da Polícia Civil numa Polícia Técnica, tal a operacionalidade
do Departamento de Identificação. Os peritos do Departamento eram responsáveis
pela realização de todas as perícias exigidas pelos crimes em voga naqueles tempos, à
exceção da determinação da causa mortis, que continuava com os legistas.
Os profissionais da Papiloscopia já eram, inquestionavelmente, chamados de peritos,
e ninguém duvidava de tal afirmativa. No Departamento de Identificação se
localizavam os laboratórios periciais, o laboratório fotográfico (a fotografia chegava
ao Brasil naqueles tempos) e o quadro de peritos da Polícia Civil.

Mas, duas coisas caminhavam paralelas, tais como hoje ainda se vê: a identificação
civil e a identificação criminal. Com a crescente complexidade dos crimes e
aparecimento de um sem número de outros, o pouco investimento pelo governo no
departamento (poucos peritos, falta de materiais, falta de cursos de especialização,
etc), e o que é o principal, com o aumento populacional, o que fez voltar basicamente
as atividades para a identificação civil (dava e ainda dá muitos votos), foi-se
paulatinamente perdendo terreno, surgindo daí a necessidade de criação de um novo
departamento para levar a contento as tarefas às quais eram os Departamentos de
Identificação incumbidos, e para fazer trabalhar, de fato, os peritos em ciências
policiais e o perito em investigação, objetivo maior do nascimento do chamado ideal
de criação da polícia científica.
Assim, foram os peritos em Papiloscopia perdendo terreno pouco a pouco, chegando
aos tempos atuais alijados do ideal para o qual foram realmente criados: ser a polícia
que a sociedade exigia, técnica, científica, voltada para a união de investigação e
perícia na busca da elucidação dos delitos. O principal fator da decadência dos
Departamentos de Identificação, entretanto, relato linhas adiante.
Paralelamente a esse enfraquecimento, um novo departamento se fortalecia: o
Gabinete de Pesquisas Científicas. Este Departamento (Gabinete) era responsável,
inicialmente, pela realização de pesquisas voltadas para o auxílio das atividades
desenvolvidas pelos peritos da polícia (então peritos do departamento de
identificação) e pelos investigadores. Era composto basicamente de químicos e
destinava-se aos exames laboratoriais de uma gama de matérias levantados nos
locais de crimes. Deste departamento (Gabinete) nasceu, indubitavelmente, o que
hoje chamamos de departamento de criminalística.

O Gabinete de Pesquisas Científicas foi criado em 10/01/1933, através do Decreto


22.332, para a realização de exames complementares aos realizados pelos médicos
legistas.
Desta forma, em largas passadas, estava criado o tripé que deu origem ao que hoje
denominamos de Polícia Técnico-Científica Brasileira, composta dos três
Departamentos atuais: Medicina-Legal, Identificação e Criminalística.
Na época da criação do departamento de identificação, os peritos em Papiloscopia
participavam ativamente de toda atividade desenvolvida pela polícia no campo
investigativo, aliando técnica à busca da elucidação dos crimes, sendo considerados a
mola-mestra de todo o crescimento desfrutado pela Polícia Civil naqueles tempos.

Era a própria Polícia Técnica dos tempos modernos, com seu ideal voltado para a
prestação de um serviço eficiente à população, produzindo provas irrefutáveis para a
condenação dos criminosos.
Posso garantir a todos que os primeiros profissionais do Estado a receberem esta
denominação, qual seja, a de perito oficial, foi o perito em Papiloscopia. Os
profissionais dos departamentos de medicina legal eram chamados de médicos
legistas e os profissionais dos gabinetes de pesquisa científica (hoje departamentos
de criminalística) eram chamados de químicos. Portanto, os peritos dos
Departamentos de Identificação foram os primeiros a receber tal denominação.
Mas, como todo fato histórico que se preze, duas vertentes caminhavam passo a
passo: uma, construída por idealistas; outra, construída pelos inúmeros governantes
brasileiros e aos Institutos de Identificação imposta.
Concomitantemente ao ideal de polícia científica, o Governo do Brasil possuía outras
intenções a respeito da utilização do Departamento de Identificação (má utilização,
diga-se de passagem).
Em 1934, movido por uma onda de violência que assolava o Brasil (o Rio de Janeiro
era a capital da República), com o aumento vertiginoso dos roubos, furtos, uso de
narcóticos, assassinatos, etc, conforme amplamente noticiado pela imprensa à época,
realiza-se no Rio de Janeiro o Primeiro Congresso de Identificação do Brasil. Neste
Congresso, patrocinado por empresas norte-americanas que desejavam vender suas
tecnologias ao país, são traçados os novos rumos a serem seguidos pelo
Departamento de Identificação; rumos estes a serem aplicados em todo o território
nacional.
Realizado sob o Governo de Getúlio Vargas que, devido às suas notórias ligações com
o nazismo de Hitler, pretendia estabelecer uma política de estudos eugênicos
(estabelecimento das qualidades físicas e mentais do homem) para determinar o
estereótipo do criminoso brasileiro.
Para tanto, o local escolhido para estes estudos foi o Departamento de Identificação.
Fortaleceu-se, nessa época, uma seção do Departamento - a Seção de Antropologia -,
convidando-se para dela fazer parte um grupo de médicos legistas (antropólogos) que
foi incumbido dos estudos referentes à estipulação do biótipo do criminoso brasileiro.
Os médicos legistas incumbidos dos estudos que levaram à estipulação do biótipo do
criminoso brasileiro parecem ter sido escolhidos a dedo, pois eram fervorosos adeptos
de Cesare Lombroso.
Lombroso tentou relacionar certas características físicas, tais como o tamanho da
mandíbula, à psicopatologia criminal, ou a tendência inata de indivíduos sociopatas,
com o comportamento criminal. Assim, a abordagem de Lombroso é descendente
direta da frenologia, criada pelo físico alemão Franz Joseph Gall no começo do século
IX e estreitamente relacionada a outros campos da caracterologia e fisiognomia
(estudo das propriedades mentais a partir da fisionomia do indivíduo). Sua teoria foi
cientificamente desacreditada, mas Lombroso tinha em mente chamar a atenção para
a importância de estudos científicos da mente criminosa, um campo que se tornou
conhecido como antropologia criminal.
A principal idéia de Lombroso foi parcialmente inspirada pelos estudos genéticos e
evolutivos no final do século IX, e propõe que certos criminosos têm evidências físicas
de um "atavismo" (reaparição de características que foram apresentadas somente em
ascendentes distantes) de tipo hereditário, reminiscentes de estágios mais primitivos
da evolução humana. Estas anomalias, denominadas de estigmas por Lombroso,
poderiam ser expressas em termos de formas anormais ou dimensões do crânio e
mandíbula, assimetrias na face, etc, mas também de outras partes do corpo.
Posteriormente, estas associações foram consideradas altamente inconsistentes ou
completamente inexistentes, e as teorias baseadas na causa ambiental da
criminalidade se tornaram dominantes.
Rios de dinheiro público foram aplicados naqueles estudos. Tudo contando com o
apoio dos grupos empresariais estrangeiros que tencionavam vender suas tecnologias
ao Brasil e dominar o emergente mercado da identificação. Isso para não se imaginar
o pior.
Ignorando todo o avanço já desfrutado pela Ciência Papiloscópica e os métodos
desenvolvidos por Juan Vucetich, voltado exclusivamente para fins de
individualização científica (e não segregacionista) dos seres humanos e ferramenta
imprescindível à elucidação dos crimes, passou-se a utilizar com ênfase incontrolável
neste período um método de identificação desenvolvido por Alfonse Bertillon: a
antropometria. Os fins almejados com estes estudos são questionados por inúmeros
historiadores, que o definem como um crime cometido contra o povo brasileiro, tal a
desfaçatez com que foi utilizado.
Os criminosos estudados basicamente eram os oriundos das raças parda, mestiça e
negra. O Departamento de Identificação virou uma central de medições de seres
humanos e uma fábrica de criação de criminosos estereotipados. Ao final, a conclusão
a que chegaram foi de que o criminoso brasileiro era: uma figura de cor negra, nariz
de barraca, com testa pequena e braços longos, lembrando um macaco.

Nesta época foram criados todos os modelos de fichas de qualificação de criminosos,


ainda utilizadas pelos Departamentos de todo o Brasil na atualidade.
Segundo estudiosos, nasceu o próprio estereótipo da população brasileira, associada
aos criminosos, após uma verdadeira massificação das conclusões a que chegaram
aqueles “antropólogos” do Departamento de Identificação. Assim, a imagem do povo
brasileiro foi forjada no Departamento de Identificação e lançada ao imaginário
popular, .
Credito a esta época a dissociação fatal do real objetivo para o qual foi criado os
Departamentos de Identificação, que era a construção de uma polícia científica
voltada para os interesses populares e para a busca incansável da elucidação dos
crimes.
Diante da questionável utilização do Departamento para fins outros que não os que
motivaram sua criação, bem como pelos duvidosos resultados a que aqueles
“cientistas” chegaram, a partir daí, passou a ser um Departamento unicamente
voltado para a identificação civil; meros expedidores de carteiras de identidade,
dissociados de sua atividade precípua, qual seja, ser o elo de ligação entre
investigação e ciência, entre polícia e elucidação de crimes. Tudo sem qualquer
espécie de investimento; relegados ao abandono.
Os peritos em Papiloscopia deixaram de ser o Sherlock Holmes que motivou a criação
dos Departamentos de Identificação.

Parte II - E chegamos aos dias atuais.

Em primeiro lugar, temos que definir que tipo de polícia temos e que tipo de polícia
queremos ter. Recentemente, li um artigo publicado num dos jornais de Vitória, no
qual se propunha que as forças de segurança pública do país se espelhassem nas
forças anglo-americanas que atacaram o Iraque, objetivando dar um basta à
crescente onda de violência e criminalidade que se abate sobre o país.
Segundo este artigo, deveríamos utilizar a experiência da guerra feita no Iraque para
aplicá-la na invasão de favelas e nos demais locais atingidos pelo domínio dos
criminosos. Assim, faríamos incursões aéreas nessas áreas, distribuindo panfletos
alertando sobre a futura invasão; bombardearíamos aquelas populações flageladas
com material de propaganda contra o crime e os criminosos; passaríamos todas as
noites subseqüentes atordoando a população do local a ser “invadido” com música e
outros tipos de barulho ensurdecedor (sugerimos 24h com a voz de Xoxoró, pois os
favelados se entregariam mais facilmente - brincadeira); e logo após iniciar-se-ia uma
invasão comandada por tanques de guerra, reduzindo a pó não só os bandidos, mas
principalmente a população honesta que nada tem a ver com o problema, pois é tão
vítima dos bandidos quanto a população que não reside nas favelas. Isto porque todos
sabemos que o Estado há muito está ausente naquelas localidades e não presta o
mínimo apoio a quem nelas reside.
Enfim, se é este tipo de polícia que queremos, podemos encerrar a discussão sobre
polícia técnica neste momento porque neste tipo de combate a violência, a polícia
técnica é desnecessária. Este tipo de polícia representa uma volta triunfal do arbítrio
e dos tempos remotos em que a polícia primeiro prendia para depois investigar.
Podemos, por outro lado, optar por uma polícia conforme manda o moderno
pensamento direcionado às forças de segurança pública: uma polícia cidadã, uma
instituição pública que, antes de ser instituição, é pública; com policiais plenamente
integrados à comunidade, defendendo posturas democráticas e voltadas única e
exclusivamente para a elucidação dos delitos.
Neste tipo de polícia, a polícia técnica é imprescindível.
Em segundo lugar, devemos discutir o problema da inteligência nacional. Todos
sabemos que os centros de inteligência nacional, historicamente, são as
universidades. Temos outros centros de inteligência, é claro, mas de acesso menos
restrito a todos, inclusive policiais.
Todos conhecemos, também, o distanciamento histórico existente entre os mais
diversos setores das universidades e as forças policiais brasileiras. Isto se deve ao
mau uso das polícias no passado, principalmente durante o período da ditadura,
quando foi criada a polícia política dentre dos órgãos da polícia civil, perpetrando esta
um ataque aos mais variados escalões universitários; ataque este descompromissado
dos reais interesses do povo.
Criou-se, inclusive, no âmago das forças policiais, o protótipo do criminoso político:
branco, classe média, rebelde, contestador, comunista, baderneiro e universitário.
Essa política imposta às forças policiais ocasionou um distanciamento entre os
integrantes das polícias e os centros de inteligência do país – as universidades - ainda
hoje não superado, e que talvez jamais o seja.

Então, vejamos que se torna uma tarefa hercúlea falar em inteligência policial, ou
outro qualquer tipo de inteligência, quando possuímos uma polícia completamente
dissociada dos centros de inteligência do país, aumentando cada vez mais o vácuo
existente entre ambos.
Outro ponto a ser abordado trata do que se entende por inteligência policial. Segundo
a Abin – Agência Brasileira de Inteligência, “Para os efeitos de aplicações desta Lei
entende-se como inteligência a atividade que objetiva a obtenção, análise e
disseminação de conhecimentos dentro e fora do território nacional sobre fatos e
situações de imediata ou potencial influência sobre o processo decisório e a ação
governamental e sobre a salvaguarda e a segurança da sociedade e do Estado.” (§ 2.º
da Lei 9883/99). E como contra-inteligência, segundo a Abin “Entende-se como
contra-inteligência a atividade que objetiva neutralizar a inteligência adversa.” (§ 3.º
da Lei 9883/99). Dá para utilizar, com reservas, esses conceitos.
Alguns dos mais versados doutores em matéria de segurança pública também definem
inteligência policial em termos equivalentes aos preconizados pela Abin, ou seja, uma
polícia que detenha e possa ter acesso a bancos de dados portentosos relativos a
crimes e criminosos; a adoção de uma política de repressão eficiente, concentrada, ou
seja, voltada para as áreas de maior probabilidade de cometimento de delitos;
informatização das polícias; intercomunicação imediata entre os diversos organismos
policiais; aprimoramento constante dos quadros de policiais, com cursos orientados
para os avanços almejados e alcançados pelos criminosos; integração dos diversos
centros de inteligência policial, ao nível federal e estadual; meios materiais postos à
disposição dos policiais para o exercício de um bom trabalho investigativo; etc.

Entretanto, o que eles chamam de inteligência eu chamo de necessidade vital. Isto


porque não se pode pensar em qualquer exercício de atividade policial, principalmente
num mundo como o de hoje, cada vez mais globalizado e complexo, com criminosos
possuindo acesso a tecnologias e armamentos cada vez mais sofisticados, aplicando
uma variedade de crimes potencialmente desconhecidos, sem que uma infra-estrutura
básica mínima seja observada.

E o que eles chamam de inteligência é exatamente esta infra-estrutura mínima


exigida. Mas, nas teorias de poucos desses doutores se verifica um estudo
aprofundado sobre as reais causas que levaram a um distanciamento dos peritos dos
centros de inteligência policial e social.

Tais causas estão diretamente relacionadas ao descrédito a que foi submetida a


Polícia Técnica durante estes anos; não um descrédito relacionado à dedicação dos
peritos, mas sim um descrédito moral, este direcionado ao mau uso político de suas
atribuições; bem como ao descrédito relacionado à falta de recursos, tanto humanos
quanto materiais, e à política de dissociação adotada pelo governo, que levou ao
afastamento da Polícia Técnica dos centros de inteligência nacional.

Isso se observa claramente nos atuais Planos de Segurança implementados pelo


governo, em que se assiste ao equivoco neles adotados de levar os peritos aos
centros universitários para aprimoramento, quando na realidade, o essencial era que
fosse construída uma via de mão dupla, com a universidade mais vindo à polícia
técnica; fato que ainda não ocorre.

O que se observa são tentativas esporádicas de “aprimoramento” levando os peritos


para a realização de cursos nas universidades, o que é insuficiente para dar cabo a
anos de atraso e de dissociação a que estamos todos submetidos.

Outro ponto importante diz respeito à participação das entidades representativas dos
peritos e dos policiais nos centros de discussão sobre as alterações a serem efetuadas
na polícia, civil e técnica. Repetindo o mesmo erro do governo passado, o governo
atual ainda não chamou estes representantes para uma discussão profunda a respeito
dos rumos exigidos pela sociedade em relação à atividade policial. Nota-se claramente
que lidamos com planos criados em gabinetes, sem qualquer participação dos maiores
interessados e principais atores na cena do filme chamado segurança pública: os
policiais e seus representantes.

Assiste-se ao surgimento de um sem número de opiniões emitidas por especialistas


em segurança, mas sem que sejam ouvidos os partícipes primordiais da questão da
segurança, quais sejam, os próprios policiais. Desta forma, o distanciamento das
pretensões de ligação da polícia com a sociedade, de transformação radical da polícia
em uma entidade cidadã vai-se perdendo na inoperância dos planos criados. E isso
pode ser sentido no aumento vertiginoso do número de crimes e de criminosos e da
violência.

A estes fatores se somam as constantes divisões existentes dentro dos próprios


quadros da Polícia Técnica, verificado principalmente entre médicos legistas e peritos
em criminalística, estes que desejam sua desvinculação dos quadros da Polícia Civil,
caminhando numa direção diametralmente oposta àquela que fundamentou a criação
da polícia técnica, qual seja, a de unificar, num corpo único o trabalho dos peritos em
investigação e os peritos propriamente ditos (da polícia técnica, detentores de
conhecimentos científicos periciais específicos voltados para a elucidação dos crimes
e de outras ciências gerais aplicáveis também à elucidação dos delitos).

Incrível pensar que num momento em que se discute e propugna pela unificação das
polícias civil e militar, com a desmilitarização desta última, parte-se para a criação de
mais um organismo policial, o que ao nosso ver aumentará ainda mais o fosso
existente na atuação obrigatória de investigação e perícia com vistas à elucidação dos
crimes.

Desarrazoados são os argumentos utilizados para fundamentar essa separação da


Polícia Técnica dos quadros da investigação policial. Segundo alguns, não há como
realizar um trabalho isento de pressões, estando vinculados à Polícia Civil. Defendem
a vinculação da Polícia Técnica ou ao Ministério Público, ou ao Poder Judiciário, ou ao
próprio governador, ou às secretarias de justiça estaduais. Dizem estes, por fim, que
quem é responsável pela feitura do inquérito policial não deveria produzir as provas
que a ele seguem invariavelmente anexas.

Segundo outros, a Polícia Técnica não nasceu com vocação para integrar os quadros
policiais. Quanto a este último, conforme vimos no decorrer deste debate, contraria a
própria história de criação da polícia técnica. Afirmam estes que “polícia não é ciência
e criminalística não é polícia”. Isto está mais do que claro, pois ciência é ciência e
polícia é polícia. Entretanto, polícia técnica é polícia e ciência ao mesmo tempo e
negar este fato é ir de encontro aos motivos que fundamentaram a criação da polícia
técnica.

Pode-se imaginar um quadro em que a Polícia Técnica tivesse autonomia financeira e


administrativa, o que, sem dúvida, engrandeceria seu desenvolvimento. Entretanto,
só se pode analisar uma possível desvinculação se esta for plena, e não parcial como
pretendem. Isto com todas as conseqüências de se desvincular o perito em
investigação do perito propriamente dito, o que motivou a criação da polícia técnica,
fato que pode ser causador de nefasta piora nos serviços por ela prestados.

Quanto às alegações do primeiro grupo, o que alega falta de isenção na feitura dos
laudos dos peritos, as propostas defendidas são antagônicas por si mesmas. É
imaginar que malfeitores existem apenas nos quadros policiais, pois quem sucumbe a
pressões de policiais fatalmente sucumbirá a pressões de outras autoridades a que
estejam subordinados. Bem porque, o poder de mando e de influência de promotores,
governadores e juízes é infinitamente superior ao de qualquer integrante dos quadros
policiais.

Tecnicamente falando, ainda temos algumas questões que devem ser analisadas: o
Ministério Público é responsável pela apresentação das denúncias contra os
criminosos, utilizando-se para tanto das provas fornecidas pelos peritos. Logo, se
quem preside o inquérito não deveria levantar provas, com muito mais razão quem
deve ofertar as denúncias também não deveria.

Já a Justiça é incumbida de julgar os criminosos, invariavelmente contando com as


provas levantadas pelos peritos, o que sem dúvida compromete o grau de isenção e
eqüidistância que deve ter o juiz das provas trazidas aos autos.

Quanto à vinculação aos governadores e aos secretários de justiça, não creio que
altere a questão em sua essência.

O problema todo se resume em saber se ainda é necessária uma atuação conjunta dos
peritos em investigação e de polícia técnica na busca da elucidação dos crimes e se a
estrutura policial se corrompeu de tal forma que se torna inviável a manutenção dos
peritos nos quadros da polícia civil. Se este fato está ocorrendo, e não houver mais
solução para o mesmo, só existe uma saída: uma depuração urgente nos quadros da
instituição ou a extinção das polícias civis.

Mormente porque, todos conhecemos as mentes dirigentes do país, e a criação de


uma nova polícia técnica desvinculada e autônoma só servirá para aumentar o abismo
hoje existente entre investigação e perícia e, o que é pior, para criar uma nova polícia,
esta de elite, fatalmente voltada para a defesa dos interesses da classe dominante,
enquanto o povo humilde continuará sendo assassinado e massacrado diariamente
sem que se dêem ouvidos às suas súplicas.

Corre-se um grande risco de se criar um novo e inútil organismo, exigindo que num
curto espaço de tempo renasça a “velha” Polícia Técnica para sanar as deficiências
deixadas por aquela polícia que seria criada, essa ligada indissoluvelmente à
investigação e voltada para resolver os problemas dos pobres. Toda sucateada, sem
recursos, sem condições de funcionamento, com um número de peritos sempre
defasado, mas imprescindível para tapar o vácuo que se pretende criar seguindo o
pensamento dos que defendem a desvinculação de investigação e perícia.

Muito questionável pelo aspecto histórico tal pretensão, pois todos sabemos que a
maioria dos políticos brasileiros não deseja uma política eficiente e democrática, mas
sim uma polícia voltada para o massacre dos pobres e subserviente aos interesses dos
ricos, muitos destes os verdadeiros criminosos que estão a ensejar passarem anos
nas cadeias.

Imaginar que seriam investidos rios de dinheiro numa nova polícia técnica seria
risível se não fosse sério e nada solucionaria. Não seriam criados os centros de
inteligência pretendidos, pois, se assim o fosse, as próprias universidades não
estariam totalmente falidas, sucateadas, e num patamar aproximado ao direcionado
às Polícias Técnicas.

Os governos nunca almejaram criar verdadeiros centros de inteligência nacional;


muito menos centros de inteligência policial. Por isso, as cadeias estão lotadas de
pretos, pobres e prostitutas, em vez de ricos e políticos corruptos.

Hoje, o que se observa são ações voltadas para defender os interesses de cargos e
órgãos e não o interesse maior da sociedade: a busca da elucidação dos crimes. Os
interesse de uns poucos se sobrepõem claramente aos interesses da coletividade.
Com isso observa-se que os primeiros a chegar ao local de um crime, em vez de isolá-
lo e comunicar imediatamente aos demais encarregados da elucidação dos delitos,
passam a querer solucionar o caso, antes de tudo tentando engrandecer o nome dos
quadros a que pertencem. E não vamos crucificar apenas a eles, pois dessa forma
ocorre com quase todos os demais encarregados da elucidação dos crimes.

O interesse maior da sociedade parece estar em último lugar na mentalidade de


muitos que estão envolvidos nessas atividades elucidativas e tudo se apresenta como
fruto da massificação do inconseqüente desvio de finalidade, imposto a todos durante
esses anos de propaganda desvirtuada e contrária aos reais interesses dos cidadãos.

Termino, portanto, constatando, com todas as letras que, apesar das tentativas e de
alguma melhora, continuamos dissociados no presente momento dos centros de
inteligência policial e nacional; abandonados, sem qualquer tipo de perspectiva a
curto e médio prazos.

Parte III - A Papiloscopia do futuro


(Breves Considerações)

Vocês se recordam com qual nome foi criado o Departamento de Identificação?


Originalmente nosso nome era Departamento de Identificação e Estatística. Vocês se
recordam que tipos de estatísticas são estas? Nós as encontramos nas disposições
gerais do Código de Processo Penal, no art. 809: “A estatística judiciária criminal, a
cargo do Instituto de Identificação e Estatística ou repartições congêneres, terá por
base o boletim individual, que é parte integrante dos processos e versará sobre:
I – os crimes e as contravenções praticados durante o trimestre, com especificação da
natureza de cada um, meios utilizados e circunstâncias de tempo e lugar;
II – as armas proibidas que tenham sido apreendidas;
III – o número de delinqüentes, mencionadas as infrações que praticaram, sua
nacionalidade, sexo, idade, filiação, estado civil, prole, residência, meios de vida e
condições econômicas, grau de instrução, religião, e condições de saúde física e
psíquica;
IV – o número dos casos de co-delinqüência;
V – a reincidência e os antecedentes judiciários;
VI – as sentenças condenatórias ou absolutórias, bem como as de pronúncia ou de
impronúncia;
VII – a natureza das penas impostas;
VIII – a natureza das medidas de segurança aplicadas;
IX – a suspensão condicional da execução da pena, quando concedida;
X – as concessões ou denegações de hábeas corpus.
§ 1.º - Os dados acima enumerados constituem o mínimo exigível, podendo ser
acrescidos de outros elementos úteis ao serviço da estatística criminal.

São disposições já antigas e que deveriam ser aprimoradas, como se procede em


lugares sérios e que pretendem fazer realizar a paz social. Mas, além de nunca terem
sido praticadas, ainda encontraram um jeito de deixá-las abandonadas e sem
adequação aos dias atuais.
A pergunta que se faz é: alguém tem cumprido, ou melhor, tem podido cumprir as
determinações do CPP, elencadas acima? Vejam a importância dos serviços do
Departamento para a sociedade e para as atividades de inteligência policial. Todas as
informações relacionadas aos crimes e aos criminosos deveriam estar prontamente ao
dispor nos Departamentos de Identificação para as pesquisas efetuadas pelos demais
ramos policiais e por outras instituições.
Nascemos como um dos precursores dos modernos institutos de criminologia e
estamos relegados à própria sorte.
Creio que jamais tivemos condições, dadas pelo governo, de realizar estas
determinações; o que é um crime contra a população que hoje pena sem dados
estatísticos científicos capazes de fomentar as instituições dedicadas ao combate à
criminalidade. Entendo, portanto, como vital à nossa reinserção no contexto da
inteligência policial que voltemos a exercer estas pesquisas e que o departamento
volte a ser o verdadeiro centro de estatística criminal, um dos motivos
fundamentadores de sua criação.
A questão da nomenclatura do cargo e da escolaridade exigida para ingresso no
mesmo, também se nos mostra imprescindível ao reingresso no contexto da
inteligência policial. Isto porque vimos defendendo, ao longo deste diálogo, a
estipulação de uma via de mão dupla entre as universidades e os peritos da polícia
técnica. Um via de mão dupla, com a universidade mais vindo ao nosso socorro do que
com a necessidade de estarmos esporadicamente recorrendo aos seus serviços.
Para que isso ocorra de forma natural é impostergável que o nível de escolaridade
para ingresso no cargo de perito papiloscópico seja o de 3.º grau. Não que se esteja
tentando diminuir as pessoas que possuem graus de escolaridade menores, mas esta
ligação entre universidades e peritos tende a fluir de forma mais profunda e
permanente se nossos quadros forem preenchidos por pessoas egressas dos quadros
das universidades.
Ora, uma política natural para um governo que realmente deseje uma polícia técnica
qualificada e integrada ao moderno pensamento em voga, este que exige policiais
bem preparados para lidar com as causas afetas à população.
Mesmo porque, a crescente complexidade dos novos crimes e criminosos que estão
surgindo exige uma polícia cada vez mais conectada aos centros de inteligência.
Da mesma forma, a questão da nomenclatura. Como querer negar aos profissionais
dos Departamentos de Identificação uma nomenclatura que lhes é de direito desde
sua criação, há 100 anos atrás? Nomenclatura esta estipulada no Decreto
22332/1933, no governo Vargas.
Propomos a unificação das nomenclaturas dos vários cargos da Polícia Técnica em
torno do nome perito em ciências criminais, alterando-se o Código de Processo Penal
na parte que tange a esta nova denominação e suas atribuições.
Propugna-se, outrossim, pela realização de um estudo, com a observância de
propostas que voltem a enxergar a imprescindibilidade do trabalho conjunto realizado
pelos peritos em investigação e pelos peritos da polícia técnica, privilegiando ações
que façam fluir cada vez mais este trabalho, haja vista ser de vital importância para a
elucidação dos crimes e para a realização de pesquisas estatísticas sérias e
despolitizadas relativas aos crimes e aos criminosos no Brasil.
Por fim, almeja-se que cessem as animosidades existentes entre ao vários cargos
componentes da Polícia Técnica, no que toca ao reconhecimento dos peritos do
Departamento de Identificação enquanto tais (peritos), fazendo-se realizar
obrigatoriamente um trabalho conjunto em prol do povo brasileiro, este que não pode
continuar sendo vítima de vaidades pessoais e de distorções da verdade, sob pena de
sucumbir à sanha assassina dos criminosos, estes que pouco se importam com
discussões afastadas dos verdadeiros motivos que fundamentaram a criação da
Polícia Técnica, mas que usam e abusam das deficiências nela encontradas, para fazer
proliferar o medo, a violência e os ataques as pessoas de bem deste país.
Isso tudo acompanhado de maciços investimentos em condições de trabalho, em
materiais de pesquisa, na realização de concursos periódicos para os cargos, na
construção de prédios dignos para abrigar a Polícia Técnica, no aprimoramento
constante dos peritos e na acolhida da opinião dos peritos (policiais) e seus
representantes legais para definir, em conjunto com as instituições democráticas, os
rumos da segurança pública no Brasil.
Definir o retorno da perícia papiloscópica à finalidade que motivou sua criação.
Costumo dizer que fomos concebidos em uma linda e indescritível noite de amor
ocorrida entre o Estado e os objetivos maiores da Papiloscopia. Dessa noite,
nascemos, fomos crescendo e nos dando conta de que havíamos sido gerados num
outro planeta: Marte, por exemplo. Com o passar do tempo e aquisição paulatina de
consciência, nos demos conta de nossa condição de habitantes desse planeta estranho
e começamos a indagar o motivo de nossa existência. Não podíamos nos relacionar,
pois nossa genética com a dos marcianos não combinava; não podíamos fazer uma
revolução, pois seríamos vistos como rebeldes sem causa, e tudo pareceria uma
grande inutilidade. Só nos restava tentar sobreviver, buscando fazer o melhor,
esperando o tempo passar. Pois somos frutos de um Estado que pari bem, mas apóia e
sustenta sua cria muito mal.
Nos Departamentos de Identificação, diante da importância que possui a
individualização dos seres humanos, os peritos em Papiloscopia, consciente ou
inconscientemente forjaram a imagem do criminoso brasileiro e, para muitos, da
própria população brasileira.
E alguns incautos ou despreparados ignoram a verdadeira importância desses
Departamentos, de seus peritos e da Papiloscopia para uma nação democrática que se
preze.
Esses os aspectos que desejávamos abordar.
Na oportunidade, parabenizo a todos os peritos em Papiloscopia que nesses 100 anos
lutam diuturnamente dignificando nossa profissão, mantendo acesa a chama dos
idealizadores que lançaram sua pedra filosofal como uma das profissões mais
essenciais ao serviço público, honrando o nome dessa Ciência no Brasil.

Antônio Tadeu Nicoletti Pereira Perito Papiloscópico Oficial (Estado do Espírito Santo)
Bacharel em Direito e Economia
Diretor do Sindipol-ES, da Cobrapol, da Fenapp e da Associação dos Peritos
Papiloscópicos ES

Há quem goste de voltar reiteradas vezes à Inglaterra de alguns séculos atrás, descrevendo o
surgimento de uma figura folclórica naquele país que congregava em torno de si as qualidades
inerentes tanto à investigação (poder investigativo) quanto ao domínio de inúmeras ciências.
Esta figura é bem representada por um personagem conhecido de todos nós, surgido tempos
depois: Sherlock Holmes. Este personagem idealizava uma figura que detinha conhecimentos
vários em diversas áreas e que os aplicava na busca da elucidação dos delitos, unindo, de forma
indissociável, ciência e investigação; habilidade em ciências gerais e específicas aplicadas à
elucidação dos crimes com habilidade em investigar profundamente os crimes. Faço menção a
este personagem pois entendo imprescindível para a discussão que vamos iniciar. Mas não vou
retroceder tanto no tempo. Vou começar nosso debate a partir da publicação do Código Criminal
do Império, em 1830, quando pela primeira vez aparece uma menção à medicina legal, e
também centrá-lo a partir do fim do século dezenove e início do século vinte, quando veio à
efervescência, por aclamação popular, a necessidade de criação de uma polícia científica,
voltada realmente para combater práticas ainda comuns naquela época, desgastadas e por
todos deploradas. Naqueles tempos ainda se praticavam penas degradantes, como a pena de
banimento, penas das galés, o açoite, as chibatadas e até a pena de morte. Naquela época a
polícia detinha quase todos os poderes, fazendo o papel inclusive da Justiça (o Intendente Geral
dirigia a polícia e a Justiça). Foi exatamente para se contrapor a estas penas degradantes, e
diante de veementes apelos da população, que já não suportava mais tantas injustiças, é que
surgiu na mente de alguns idealistas a necessidade de adaptação da atividade policial aos novos
tempos que se avizinhavam, principalmente na Europa, tornando-a mais humana no trato com
os delinqüentes e com a população. Era a época do prender primeiro para depois investigar que
se buscava dar um fim. Assim é que alguns abnegados sonhavam com novos tempos para a
atividade policial; com uma polícia voltada para a defesa dos interesses gerais; afastada das
influências malévolas exercidas por políticos dissociados da vontade popular. A população não
suportava mais ser vitimada por tantos arbítrios. Desta forma é que surgiu esse desejo de
criação de uma polícia científica, bem preparada, dotada de conhecimentos e meios técnicos e
científicos indispensáveis à produção de provas que fundamentassem as acusações lançadas
contra as pessoas que se desviavam do seu caminho, partindo para a prática de delitos. Mais do
que isso até, baseava-se e remetia-se a essa figura acima referida - o Sherlock Holmes -, como
o ideal a ser perseguido por uma polícia técnica. Chegou-se até a imaginar o nascimento de
uma polícia civil toda técnica e científica, contendo em seus quadros unicamente cargos
técnicos e científicos (sonho ainda não realizado).Mormente porque nunca foi da nossa tradição
uma figura tipo essa, unindo numa mesma pessoa qualidades de ciência e de investigação -
várias cabeças num mesmo corpo -, buscou-se aliar o ideal perseguido às peculiaridades
brasileiras. Isso porque era impossível alcançar aquele ideal com governantes que buscavam
arregimentar investigadores não entre aqueles dotados de maior técnica e preparo para lidar
com o povo, mas sim entre aqueles que demonstrassem maior predisposição em abater
potenciais agressores do sistema.Outro fato relevante ao qual credito essa impossibilidade, era
e ainda é o abandono a que estão relegados todos os policiais; que são deixados pelos
governantes ao alvedrio da própria sorte na busca do aprimoramento constante a que deveriam
ser constantemente submetidos. Fator relevante, outrossim, são as peculiaridades inerentes às
práticas criminosas de cada povo. Na Inglaterra, bem ao contrário do Brasil, os criminosos
ainda não fazem das armas e das agressões irracionais um massacre inútil contra inocentes.
Exatamente por isso, a polícia inglesa dispara pouquíssimos tiros por ano (média de meia dúzia
toda a polícia), impondo a todos o uso precípuo da cabeça e do aprimoramento ininterrupto
como meio mais eficiente de combate aos delitos (apesar do assassinato brutal do brasileiro,
recentemente, confundido com um terrorista).Mas todo o ideal de criação da polícia técnica
nasceu da necessidade de se unificar, senão numa mesma pessoa, mas fazendo com que
trabalhassem conjuntamente dois tipos de peritos: um, conhecido de todos nós, os peritos da
polícia técnica, detentor de conhecimentos em ciências específicas voltadas para a elucidação
dos crimes (papiloscopia, documentoscopia, balística, grafotecnia, etc) e de ciência gerais
aplicáveis a esta elucidação (física, química, biologia, matemática, etc), a um outro perito
ignorado por muitos - e por muitos não considerado perito: o perito em investigação (o
investigador, ou detetive, como queiram). Esta figura, o detetive, tal como nós, também é um
perito, em seu sentido lato, um perito em investigação. Para unir estas duas figuras, o perito
em polícia técnica e o perito em investigação, nasceu todo o ideal de criação da polícia técnico-
científica. Seu ideal, diverso do congênere inglês, buscava unir vários corpos numa só cabeça.A
Justiça, frise-se, ainda possuía largas ligações com a polícia, haja vista que só ocorreu a
desvinculação destas duas instituições em 1927, pois o intendente geral de polícia,
anteriormente, também comandava o Poder Judiciário.Ainda se iniciava no Brasil os estudos
sobre a medicina legal, o que veio a se tornar mais forte em meados de 1800 (de 1850 em
diante), principalmente nas universidades (da Bahia e do Rio de Janeiro). Havia uma forte
resistência dos médicos localizados nestas universidades em vincular a nascente atividade de
medicina legal aos organismos policiais. Uma parte dos médicos era favorável e a outra
radicalmente contrária; esta última entendia a atividade médico-legal como essencialmente
científica e ligada indissolúvel e exclusivamente às universidades.O fato é que a medicina legal
não se prestou a fazer o papel exigido pela nova concepç

Nota:
Por Antônio Tadeu Nicoletti Pereira
Perito Papiloscópico Oficial (Estado do Espírito Santo)

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