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A representação fílmica da Ditadura Militar no Brasil


X Salão de
Iniciação Científica
PUCRS

Luiza Carmona Calheiros1, Cristiane Freitas Gutfreind1 (orientador)


1
Faculdade de Comunicação Social - Jornalismo, PUCRS 2

Resumo

Este projeto tem como tema a representação da Ditadura Militar no Brasil, nos longas-
metragens ficcionais e documentais, realizados entre 1980 e 2008. A investigação parte,
então, da instauração da Lei da Anistia e da proposta de uma perspectiva de abertura política.
Nesse sentido, o projeto tem como objetivo investigar e compreender as diferenças estéticas e
de estilo que correspondem aos diferentes períodos históricos que abrangem o nosso estudo e,
conseqüentemente, as diferenças entre formatos ficcionais e documentais, além de identificar
como a memória sobre a Ditadura Militar brasileira é construída através desses filmes.

Introdução
Nesse projeto, o propósito geral é compreender e investigar a representação que o
cinema brasileiro, através dos seus longas-metragens, faz do período da Ditadura Militar no
Brasil. Parte-se da Lei da Anistia sancionada em 1979 e da sua proposta de uma perspectiva
de abertura política, que mesmo ainda sob o domínio da censura, começou a transportar para a
tela o uso da força para cercear direitos individuais, o controle das mídias, a luta da esquerda,
a dor física e social que deixou suas conseqüências entranhadas na sociedade até os dias de
hoje.
Sabe-se das dificuldades em se representar os horrores de períodos autoritários no
cinema e nas artes de forma geral e o interesse dessa pesquisa é refletir sobre os “limites”
estéticos da idéia de representação quando a temática é da ordem do irrepresentável. O que
pretendemos nessa pesquisa é entender as mudanças ao longo do tempo na estética e no estilo
em filmes cuja temática diz respeito ao irrepresentável, mas que pode continuar, ainda, a fazer
arte.

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Também sabe-se da dificuldade que as sociedades têm para a construção da memória


quando passaram por períodos ditatoriais (Chile, França, Alemanha). No caso do Brasil, a
ditadura deixou como herança uma cultura autoritária reatualizada, reforçando as diferenças
econômicas, políticas e sociais. A narrativa cinematográfica nos interessa no sentido em que
ela pensa uma época, um estilo e um modo de produção enquanto realidades mutáveis, jamais
estáveis, operando em todos os níveis e estabelecendo um diálogo com outras disciplinas
como a História e a Sociologia, além da Comunicação.

Metodologia
Na primeira parte da pesquisa, realizada durante o ano de 2008, foi feito o
levantamento dos longas-metragens documentais e “ficcionais” produzidos no Brasil a partir
de 1980 até 2008, cuja temática esteja relacionada à Ditadura Militar no país. Essa coleta de
material foi dividida em quatro etapas que correspondem períodos diferenciados da produção
cinematográfica brasileira, designadas1 como: o cinema do diálogo (1980 a 1989)2, a crise
(1989 a 1994), a retomada (1994 a 2002), a pós-retomada (2002 a 2008). Essa divisão permite
refletir sobre o processo de criação cinematográfica, pois para compreender um filme precisa-
se levar em consideração as aspirações, as técnicas e o espírito que molda o tempo quando da
sua realização.
Na segunda parte, iniciada no ano de 2009, está sendo realizada a análise imagética do
material coletado sobre os filmes documentais. Essa análise permitirá uma melhor
compreensão da obra e um esclarecimento sobre a sua linguagem, levando-se em
consideração que os filmes são determinados também pelas condições materiais específicas
onde são realizados assim como pelas condições psicológicas de sua apresentação ao público,
esse moldado por instituições socialmente aceitas e economicamente viáveis.
Em sendo assim, pode-se levar em consideração o papel da história no trabalho
analítico do corpus dessa pesquisa. Por isso, confrontamos aquilo que sobressai da
compreensão da análise fílmica, aos dados que podemos investigar da história da sua
produção3 para em seguida confrontá-los com os dados da história do cinema e da própria

1
Essas designações obedecem a nomenclatura utilizada em pesquisa para o meu doutoramento intitulada Un
cinéma possible: une analyse socio-anthropologique de la production cinématographique brésilienne dans la
postmodernité, Paris, Sorbonne, 2001.
2
Segundo pesquisa mencionada na nota anterior, o período designado como o cinema do diálogo iniciou em
1970, mas devido a temática dessa pesquisa serão considerados os filmes produzidos a partir da Lei da Anistia.
3
Por exemplo, filmes que sofreram censura, mesmo na época da Abertura política ainda sob o domínio dos
militares.

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história, ressaltando os “limites” que a temática dessa pesquisa impõe à idéia de


representação. Além da análise dos filmes realizamos uma revisão da literatura referente aos
eixos teórico-conceituais da nossa investigação: a idéia de representação fílmica e a
construção da memória.

Resultados e Discussão
A análise do corpus fílmico nos permitiu observar algumas características relevantes
para a reflexão dos eixos conceituais. Estes filmes se utilizam, em sua maioria, do realismo
que propõem uma impressão de realidade para que o espectador experimente uma
verossimilhança com o mundo que o cerca. Os elementos cênicos utilizados nas freqüentes
cenas de tortura não são gratuitos e estão compostos de forma que o compartilhamento da dor
e da humilhação seja inevitável. Até porque tais obras têm o propósito de construir uma
memória nacional e oferecer elementos representativos para pensar a ética através da estética.
O imaginário cinematográfico se manifesta através de uma obra que se coloca, então,
como documento, como testemunha de uma realidade complexa e estratificada, revelada ao
menos teoricamente e podendo ser revista a qualquer momento, ao longo dos anos.

Conclusão
Podemos afirmar que filmes com corte clássico, uma constante do nosso corpus em
diferentes épocas históricas, recorrem freqüentemente às cenas de tortura. Assim, concluímos
que estes elementos cênicos não são gratuitos e estão compostos de forma que o
compartilhamento da dor e da humilhação seja inevitável, desta forma acabam tendo uma
função pedagógica: mostrar aos espectadores as atrocidades políticas de um passado não tão
distante. Também é possível constatar que existe uma estética cinematográfica
socioculturalmente determinada, atrelada ao jeito de fazer e de ver de um local específico.
Isso se reflete na ruptura de alguns estereótipos identitários que aparecem nos textos fílmicos.

Referências
AARÃO REIS FILHO, Daniel; RIDENTI, Marcelo; e MOTTA, Rodrigo Patto Sá. O Golpe e
a Ditadura Militar – 40 anos depois (1964-2004). Bauru: Edusc, 2004.
AUMONT, Jacques e MARIE, Michel. L’analyse des films. Paris: Nathan, 1998.
KRACAUER, Siegfried. Theory of film. The redemption of physical reality. Princeton:
Princeton University Press, 1997.
LYOTARD, Jean-François. O acinema, in: Teoria Contemporânea do Cinema. São Paulo:
Senac, 2005.

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