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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Instituto de Física
Instituto de Química
Instituto de Biociências
Faculdade de Educação

UM OLHAR WINNICOTTIANO SOBRE A RELAÇÃO DOS


ESTUDANTES COM O PRÓPRIO PROCESSO DE
APRENDIZAGEM

LUCIANO MASSA FERNANDES

Orientador: Prof. Dr. Alberto Villani

Dissertação de mestrado apresentada ao


Instituto de Física, ao Instituto de Química,
ao Instituto de Biociências e à Faculdade de
Educação da Universidade de São Paulo,
para a obtenção do título de Mestre em
Ensino de Ciências.

Comissão Examinadora:
Prof. Dr. Alberto Villani (IFUSP)
Profª. Dra. Elisabeth Barolli (UNICAMP)
Profª. Dra. Nilce da Silva (FEUSP)

SÃO PAULO
2007

1
FICHA CATALOGRÁFICA
Preparada pelo Serviço de Biblioteca e Informação
do Instituto de Física da Universidade de São Paulo

Fernandes, Luciano Massa


Um olhar winnicottiano sobre a relação dos
estudantes com o próprio processo de aprensizagem.
São Paulo, 2007.

Dissertação (Mestrado) - Universidade de São Paulo.


Instituto de Física. Departamento de Física Aplicada

Orientador: Prof. Dr. Alberto Villani

Área de Concentração: Ensino de Ciências

Unitermos:1. Ensino; 2. Física; 3. Ensino e


Aprendizado.

USP/IF/SBI-022/2007

2
ÍNDICE

Agradecimentos ................................................................................................................ 05
Resumo ............................................................................................................................. 06
Abstract ............................................................................................................................. 07
Introdução ......................................................................................................................... 08

CAPÍTULO 1
1 - CONTEXTUALIZAÇÃO ........................................................................................... 12
1.1 - O caminho percorrido antes do mestrado .............................................................. 12
1.2 - O início do mestrado ............................................................................................. 14
1.2.1 - Trabalhando com o referencial de grupos operativos ..................................... 14
1.2.2 - Trabalhando com o referencial de grupos operativos: uma segunda tentativa 16
1.3 - O novo referencial: uma introdução à teoria da transicionalidade de
Winnicott .............................................................................................................. 20
1.4 - Novos objetivos para a pesquisa ........................................................................... 21
1.4.1 - Nova coleta de dados ....................................................................................... 22
1.5 - O ambiente das aulas ............................................................................................. 23
1.5.1 - As atividades aplicadas em 2005 ..................................................................... 24
1.5.1.a - Atividades em grupo .................................................................................. 24
1.5.1.b - Conversando sobre o processo de aprendizagem ...................................... 25
1.5.1.c - Trabalho de leitura e produção de textos ................................................... 27
1.5.1.d - Atividade livre ........................................................................................... 28
1.5.1.e - Auto-avaliação ........................................................................................... 29
1.5.1.f - Atividade de auxílio ao aluno (plantões) ................................................... 29
1.5.2 - Algumas considerações adicionais sobre as atividades aplicadas em 2005 .... 30

CAPÍTULO 2
2.1 - REFERENCIAL TEÓRICO .................................................................................. 34
2.1.1 - Os estágios da teoria do amadurecimento de Winnicott ................................. 34
2.1.2 - Fenômenos transicionais ................................................................................. 35
2.1.3 - Sobre o brincar ................................................................................................ 40
2.2 - METODOLOGIA DE PESQUISA ....................................................................... 42
2.2.1 - Instrumentos de pesquisa ................................................................................. 43
2.2.2 - Metodologia de análise .................................................................................... 44

CAPÍTULO 3
3.1 - ANÁLISE DOS DADOS INICIAIS ..................................................................... 46
3.1.1 - Reações às dificuldades encontradas no estudo da Física ............................... 46
3.1.2 - As primeiras interpretações ............................................................................. 49
3.1.3 - A obtenção de novos dados e a elaboração das categorias de análise ............. 51
3.1.4 - Classificação dos alunos feita de acordo com as categorias ........................... 53
3.1.5 - Análise das migrações de categorias ............................................................... 62

3
CAPÍTULO 4
4 - ANÁLISE DOS DADOS ............................................................................................ 70
4.1 - A dependência absoluta na primeira série do ensino médio - 2004 ..................... 70
4.1.a - Uma análise dos fatos ocorridos em 2004 ....................................................... 77
4.2 - A dependência relativa na segunda e na terceira série - 2005 e 2006 .................. 80
4.2.a - Aumento na capacidade de não desistir diante das dificuldades ..................... 80
4.2.b - As conversas com o professor usadas como objetos transicionais ................. 82
4.2.c - Os materiais de apoio usados como objetos transicionais .............................. 86
4.2.d - Mudança no relacionamento com os colegas .................................................. 89
4.2.e - Mudança na maneira de enfrentar as avaliações ............................................. 90
4.3 - Conclusões sobre a análise dos dados ................................................................... 92

CAPÍTULO 5
5.1 - A teoria do amadurecimento de Winnicott e o aprendizado da Física ................ 98
5.2 - Algumas reflexões sobre o professor suficientemente bom ................................. 100
5.3 - Recomendações ao professor ............................................................................... 108
5.4 - Considerações finais ............................................................................................. 109

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 112

APÊNDICES
Anexo 1 ......................................................................................................................... 114
Anexo 2 ......................................................................................................................... 115
Anexo 3 ......................................................................................................................... 117
Anexo 4 ......................................................................................................................... 117
Anexo 5 ......................................................................................................................... 119
Anexo 6 ......................................................................................................................... 120

4
AGRADECIMENTOS

Acredito que toda obra intelectual acaba sendo, de certa forma, uma construção
elaborada sempre por muitas pessoas. Mesmo quando apenas uma dedica exaustivamente
seu tempo para escrevê-la, muitas outras sempre acabam dando suas contribuições das
mais variadas formas. Por isso, até por uma questão de justiça, eu não poderia deixar de
agradecer a todos os que me ajudaram a chegar até aqui.
Aos meus pais, Walter e Ilda, que deram todas as condições para que eu pudesse
conquistar tudo o que conquistei até hoje; à minha esposa, Renata, por ter aturado a
“bagunça” do nosso quarto de trabalho/estudo, “bagunça” esta de minha inteira
responsabilidade, e por ter suportado minhas ausências freqüentes; à Nina, pela
companhia diária; ao Villani, meu orientador, pelas excelentes idéias, sugestões e críticas
que sempre me traziam de volta para o caminho em momentos de desorientação; a todos
os integrantes do grupo Psicanálise e Educação, pelas inestimáveis sugestões; aos
membros da banca examinadora, Professora Nilce da Silva - pela disciplina oferecida
sobre as idéias de Winnicott e pela importante ajuda no entendimento das mesmas - e
Professora Elisabeth Barolli, pelas valiosas contribuições no Exame de Qualificação; aos
colegas do “corredor de ensino”, em especial ao Glauco e à Luciana, por estarem sempre
prontos a ajudar, apesar do pouco tempo que dispunham por conta das próprias
dissertações; a todos os meus alunos, pela paciência com que responderam aos
questionários, e por terem permitido que os dados obtidos fossem utilizados por mim; e,
finalmente, ao Professor Júlio Garcia por ter dedicado alguns dias das suas férias na
revisão gramatical deste trabalho.
Certamente devo estar deixando algumas pessoas de fora, por isso gostaria de
afirmar que guardo profundo respeito e admiração por todos que cruzaram o meu
caminho durante o mestrado, e que, de certa forma, contribuíram para que este trabalho
fosse concluído com sucesso.

5
FERNANDES, Luciano Massa. Um olhar winnicottiano sobre a relação dos
estudantes com o próprio processo de aprendizagem. 2007. Dissertação (Mestrado
em Ensino de Ciências - Modalidade Física) - Universidade de São Paulo.

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo investigar a relação que estudantes de ensino
médio possuem com o aprendizado da Física, e analisar a importância do professor como
facilitador do processo de aprendizagem. A partir das respostas a questionários
estabelecemos inicialmente algumas categorias representativas da relação dos alunos
com a aprendizagem de Física, bem como de suas ações diante das frustrações surgidas
durante a realização das tarefas sobre esse conteúdo. Em seguida procuramos aprofundar
nosso entendimento com um estudo longitudinal que analisou os dados referentes a uma
aluna ao longo de mais de dois anos. Para interpretar o processo de evolução da aluna
fizemos uso das idéias do psicanalista inglês D. W. Winnicott. Constatamos que sua
teoria do amadurecimento podia dar conta das fases de superação, por parte da aluna, das
dificuldades advindas do estudo da Física. Identificamos que, com o auxílio do professor,
responsável por disponibilizar aos alunos um ambiente propício ao aprendizado, a aluna
pôde fazer uso de determinados objetos – livros, anotações, a crença na própria
capacidade e a confiança no professor – que funcionaram como objetos transicionais da
teoria de Winnicott e sustentaram a superação das ansiedades e frustrações que
perturbavam sua aprendizagem em Física.
Finalizando, procuramos desenvolver uma analogia entre o desempenho de uma
mãe suficientemente boa (na teoria de Winnicott) e um professor suficientemente bom -
aquele capaz de prover seu aluno de um ambiente que assegure a estabilidade e os
incentivos necessários para que o contato deste com a Cultura se dê de forma criativa e
não intrusiva.

PALAVRAS CHAVES: Winnicott; Fenômenos Transicionais; Criatividade; Psicanálise


e Educação; Ensino de Física e Subjetividade.

6
ABSTRACT

The aim of this work is to investigate how the relationship of High School
students with the Physics learning is, and to analyze the importance of the teacher to
make the learning process easier. Using the answers to questionnaires we created some
representative categories about the relation between students and Physics learning and
about their actions because of the frustrations that appear while they are accomplishing
Physics tasks. Then, we decided to make a study in which we analyzed the two-year-data
from a student. To interpret the student’s evolution process we used the ideas of the
psychoanalyst D. W. Winnicott. We noticed that his maturity theory could explain the
student’s phases of success when facing difficulties on her Physics studies. The teacher
was responsible to create a good atmosphere to facilitate learning. So, we could identify
that, with the teacher’s help, the student could use some objects – books, notes, self-
confidence and the confidence on the teacher – which act like transitional objects from
Winnicott’s theory and sustain the success facing anxieties and frustrations that disturbed
her Physics learning.
Finally, we developed an analogy between the performance of a good enough
mothering (in Winnicott’s theory) and a good enough teaching - the one capable of
creating an atmosphere that guarantees student’s stability and the incentives needed to
establish the contact with the culture in a creative way.

Keywords: Winnicott, Transitional Phenomena, Creativity, Psychoanalysis and


Education, Physics Education and Subjectivity.

7
INTRODUÇÃO

A educação no Brasil parece se orgulhar do fato da maioria das crianças estarem


dentro da escola, pelo menos no que se refere à educação básica. Sem dúvida nenhuma
este foi um passo importante para a nossa sociedade. Mas, estar na escola não significa
necessariamente aprender o que nela é ensinado. Há de fato uma separação entre
processo de ensino e de aprendizagem. Podemos perceber claramente esta separação ao
analisarmos pesquisas que se propõem a investigar o nível de alfabetização dos
estudantes. Nossa posição no ranking mundial está longe de nos causar orgulho. É
possível que isso ocorra pelo fato de as escolas ainda não possuírem, com algumas
poucas exceções, estrutura e profissionais qualificados para lidarem com situações de
aprendizagem dos estudantes. Entretanto, como o problema do ensino e aprendizagem no
Brasil é muito complexo, por envolver também fatores econômicos, sociais, políticos e
institucionais, nosso foco será limitado somente ao seu aspecto psico-didático.
Apesar do discurso, muitas vezes mal interpretado, que os alunos podem aprender
brincando, sabidamente aprender não é uma tarefa fácil, e exige certa dose de
perseverança por parte de quem quer aprender e por parte de quem quer ensinar. Todos
os dias estudantes se defrontam com os inúmeros conflitos e dificuldades inerentes ao ato
de aprender, e sempre podem escolher entre seguir em frente na tentativa de solucionar
tais dificuldades, ou desistir, o que acaba sendo o caminho seguido por muitos. Deste
fato surgem, então, algumas questões: o que podemos fazer para evitar que parte dos
estudantes resolvam tomar o caminho da desistência ? Como podemos contribuir para
que um número maior de estudantes resolva enfrentar suas dificuldades, e acabe com isso
aprendendo mais sobre si mesmos e sobre o mundo em que vivem ?
A massificação do ensino, na prática, parece ter relegado aos próprios estudantes
a difícil tarefa de resolverem suas dificuldades, sem que estejam muitas vezes preparados
para isso. Se precisamos de algum tipo de apoio enquanto aprendemos a andar, para que
possamos manter o equilíbrio em determinadas situações, quais seriam, metaforicamente,
os “apoios” disponíveis aos nossos estudantes para que estes aprendam com o tempo a
“andarem com as próprias pernas” ? De certa forma, esta dissertação procurará investigar
alguns destes “apoios” no caso da aprendizagem de Física, focalizando as circunstâncias
nas quais eles funcionaram. Esperamos que isso contribua também para a aprendizagem
de outras disciplinas.

8
No primeiro capítulo, com o objetivo de contextualizar a pesquisa, será feito um
relato pessoal dos fatos ocorridos antes e após o início do mestrado, do ponto de vista do
professor. Este relato será importante para justificar os motivos que nos levaram a
começar investigando o trabalho em grupo dentro da sala de aula, e também os motivos
que nos levaram a mudar, durante o mestrado, o foco da investigação do grupo para o
indivíduo.
No segundo capítulo, apresentaremos o referencial teórico adotado para a análise
dos dados obtidos. A teoria do amadurecimento de D. W. Winnicott mostrou-se
adequada exatamente por sugerir uma maneira pela qual os indivíduos podem enfrentar
suas dificuldades e frustrações ao longo da vida, o que pôde ser estendido às dificuldades
relativas ao aprendizado da Física. Também serão apresentados, neste capítulo, a
metodologia de análise adotada e os instrumentos de pesquisa utilizados durante a coleta
de dados.
No terceiro capítulo, analisaremos o conjunto dos dados inicialmente obtidos,
recorrendo à elaboração de categorias que levaram em conta alguns aspectos da relação
de cada estudante com o próprio aprendizado. A tentativa de classificar os estudantes de
acordo com estas categorias, em dois momentos diferentes, permitiu que observássemos
a ocorrência de casos onde os estudantes relataram terem mudado de categoria durante o
ano de 2005, o que incentivou um estudo mais detalhado objetivando compreender a
mudança de uma estudante de ensino médio em particular.
No quarto capítulo, portanto, apresentaremos os dados obtidos para esta estudante
em particular, ao mesmo tempo em que faremos uma análise dos mesmos a partir do
referencial winnicottiano. Veremos como ela encarou o próprio processo de
aprendizagem, como reagiu às dificuldades inerentes ao aprender, e como se deu a
evolução na sua capacidade em superar tais dificuldades. Também analisaremos o papel
do professor como possível facilitador de todo este processo.
Em seguida, no quinto e último capítulo, extrapolaremos a idéia da mãe
suficientemente boa, proposta por Winnicott, para a idéia do professor suficientemente
bom, como aquele capaz de dar condições para que seus alunos possam desenvolver da
melhor maneira possível suas habilidades. Por fim, terminaremos com as considerações
finais na esperança de ter contribuído, um pouco que seja, para a compreensão do quanto
pode ser penoso para um estudante, no início, enfrentar a difícil tarefa de estudar Física,
e do quão importante pode ser a presença de um professor que esteja disposto a enfrentar

9
tais dificuldades junto do aluno, até que este consiga superar por conta própria as
adversidades decorrentes do processo de aprender.

10
CAPÍTULO 1

“Existe uma receita, a norma dum


caminho certo, estreito, de cada uma
pessoa viver - e essa pauta cada um
tem - mas a gente mesmo, no comum,
não sabe encontrar; como é que
sozinho, por si, alguém ia poder
encontrar e saber ? Mas, esse
norteado, tem. Tem que ter”

J. Guimarães Rosa

11
1 - CONTEXTUALIZAÇÃO

Como se trata de um relato pessoal, os itens 1.1 e 1.2 foram escritos em primeira
pessoa, adotando o ponto de vista do professor. Do item 1.3 em diante, e durante toda a
dissertação, passaremos a usar o ponto de vista do pesquisador, narrando os fatos que
envolveram o professor e suas intervenções em terceira pessoa.

1.1 - O caminho percorrido antes do mestrado

Desde que comecei a lecionar no ensino médio, em 1997, questiono-me acerca da


real eficiência das minhas aulas no que se refere ao aprendizado por parte dos estudantes
dos conteúdos da Física. No início, ainda somente com o bacharelado em Física no
currículo, eu procurava em minhas aulas priorizar a exposição dos tópicos da forma
como estes habitualmente eram exigidos nos exames vestibulares mais conceituados do
estado de São Paulo. Eram, portanto, aulas predominantemente expositivas, avaliadas de
forma subjetiva somente por meio da relação “amigável” que conseguia obter com a
maioria dos estudantes de cada classe. Estes, por sua vez, eram avaliados por meio de
provas mensais que serviam para diagnosticar quem estudava e quem não estudava o
suficiente.
Depois que iniciei a licenciatura, em 2000, tomei contato com o rico universo da
pesquisa em Ensino, do qual eu sequer desconfiava a existência. Tive acesso a
informações que alteraram definitivamente minhas concepções sobre como um professor
deve atuar, quais objetivos deve ter na elaboração de suas aulas, e como estas poderiam
ser para que o aprendizado pudesse ser melhor estimulado.
Já com a licenciatura no currículo, e lecionando na Escola Campo Limpo1, acabei
tentando em 2002 reformular minha prática docente. Porém, esbarrei em obstáculos que
acredito serem comuns a todos que tentam reformular sua maneira de atuar dentro da sala
de aula. Eu era obrigado a cumprir exigências, por parte da escola, que afetavam de
forma negativa o ensino da Física, e não me era dada autonomia para tentar aplicar
algumas metodologias e estratégias supostamente mais eficientes. A coordenação do
colégio também costumava interferir na maneira como as aulas deveriam ser dadas,
demonstrando claramente não confiar na competência dos seus professores em gerir seus
próprios espaços de ensino-aprendizagem. Além disso, as salas de aula possuíam um

1
Todos os nomes das escolas citadas são fictícios.

12
número excessivo de estudantes (mais de 40 por classe), o que dificultava o trabalho,
principalmente na hora de avaliá-los. Como a carga de tarefas burocráticas também era
enorme, o tempo disponível para a elaboração das minhas aulas acabava reduzido, assim
como o tempo necessário para uma reflexão sobre a minha prática docente.
Na tentativa de conciliar um ensino supostamente mais eficiente com todos estes
fatores, resolvi promover o trabalho em grupo dentro da sala de aula - acreditando que
isso facilitaria minha atuação como professor - e procurar investigar o que ocorria
quando os estudantes eram submetidos a esta estratégia de ensino.
Basicamente, a idéia consistiu em formular e aplicar atividades, ou tarefas, que
pudessem ser executadas dentro da sala de aula, por grupos de cinco ou seis integrantes,
dependendo das características de cada classe. Ao final da aula, cada grupo entregava sua
atividade, que era corrigida e comentada por mim. Muitas vezes, a correção acontecia
durante a aula mesmo, e os comentários eram feitos no próprio grupo. Mas, por diversas
vezes foi necessário levar para casa os trabalhos dos alunos e trazê-los na aula seguinte,
corrigidos e comentados.
Os grupos foram mantidos sem rotatividade de integrantes durante todo o
semestre para possibilitar a cada um deles o retorno do próprio trabalho, e também para
tentar estimular o surgimento de vínculos, na esperança que isso trouxesse alguma
contribuição para a aprendizagem dos mesmos.
Vale ressaltar que os primeiros dias destas atividades foram, até certo ponto,
conturbados. Os estudantes não estavam habituados a trabalhar dessa maneira, e tinham
muitas dúvidas a respeito de como deveriam entregar a atividade, de qual era o grupo ao
qual faziam parte, se poderiam ou não trocar de grupo de uma aula para outra (apesar de
todas estas informações terem sido dadas antes das primeiras tarefas). No entanto, com o
passar do tempo as dúvidas foram diminuindo e eles foram se acostumando com as
atividades, que eram intercaladas com aulas expositivas, utilizadas normalmente para
introduzir o assunto que seria trabalhado.
As atividades em grupo e as observações realizadas ocorreram no ano anterior a
minha entrada no mestrado, enquanto tentava escrever minha monografia, e contribuíram
para o interesse inicial que tive, na pós-graduação, em continuar investigando o trabalho
com grupos dentro da sala de aula.

13
1.2 - O início do mestrado

Em 2003, já no mestrado, e com a intenção de aprofundar meus conhecimentos


sobre a dinâmica grupal, li a tese de livre-docência da Profa. Maria Helena Trench
Ciampone sobre Grupos Operativos, e a tese de doutorado de Marcelo Alves Barros,
intitulada "Análise de experiências didáticas com grupos de aprendizagens em Física".
Nestas primeiras leituras, tomei contato com a idéia dos possíveis papéis que poderiam
ser assumidos pelos integrantes de um grupo, bem como, as suas condutas defensivas, e
como elas poderiam interferir na dinâmica grupal durante a realização de uma tarefa
(apesar de as condutas defensivas aparecerem também fora do contexto grupal). Esta
tentativa de entender e identificar tais papéis, ou condutas, durante a realização das
tarefas propostas aos meus alunos, acabou fazendo com que eu me aproximasse da
Psicanálise, o que me obrigou a estudar conceitos até então desconhecidos para mim.
Confesso que esta não foi uma barreira fácil de ser transposta, e, para isso, precisei
recorrer inúmeras vezes a dicionários de Psicologia e Psiquiatria (SILLAMY, 1999 e
BALLONE), além de outras bibliografias (BLEGER, 1984 e 1993).

1.2.1 - Trabalhando com o referencial de grupos operativos

Durante todo o ano de 2003 tentei familiarizar-me com as principais idéias da


teoria de grupos operativos, teoria esta que sugere um modo de atuação inconsciente dos
indivíduos integrantes de um grupo. Estes indivíduos, movidos por fatores subjetivos
(ansiedades, defesas, identificações, projeções, resistências e transferências) acabam
assumindo papéis dentro do grupo, que determinam a maneira como cada um irá
interagir com os outros integrantes, com o coordenador e com a tarefa a ser realizada.
Segundo PICHON (1982), a identificação destes papéis (porta voz2, líder progressista3,
bode expiatório4 e líder da resistência5), e a elaboração de estratégias que estimulem a
circulação destes papéis entre os integrantes podem colaborar para que o grupo evolua

2
Membro que transmite ao professor todas as ansiedades e necessidades do grupo.
3
Faz-se depositário dos aspectos positivos do grupo, ou da tarefa.
4
Faz-se depositário dos aspectos negativos ou atemorizantes do grupo, ou da tarefa.
5
Membro que interfere de forma negativa na funcionalidade do grupo, e na mobilização dos integrantes
para a realização da tarefa.

14
partindo de uma categoria denominada pré-tarefa6 para categorias mais avançadas, do
ponto de vista do funcionamento grupal, como a tarefa7 e o projeto8.
Assim, a idéia inicial do mestrado era identificar estes papéis dentro dos grupos e
elaborar estratégias que estimulassem a passagem da pré-tarefa (fase onde todos os
grupos inicialmente estudados se encontravam) para as outras fases subseqüentes. Para
isso, tentei manter anotações sobre as situações observadas em minhas aulas (ainda na
escola Campo Limpo), e pude, de fato, constatar, dentro da sala de aula, o aparecimento
dos papéis e das condutas defensivas. No entanto, encontrei sérias dificuldades para
orientar meus alunos e ao mesmo tempo anotar observações sobre cada grupo, para que
estas pudessem sinalizar atuações mais adequadas no futuro. Não consegui conciliar as
responsabilidades de um professor às tarefas de um pesquisador. Percebi que não
conseguia dar a atenção necessária a todos os sete ou oito grupos que eram formados
para a realização das atividades em cada classe. Notei que quando eu ficava um certo
tempo em um grupo, até tinha a oportunidade de conversar com os integrantes e tentar
descobrir um pouco das suas angústias e ansiedades. No entanto, isso acontecia sempre
em detrimento dos outros grupos que, apesar de solicitarem minha presença, acabavam
ficando muitas vezes sem a minha atenção. Com isso, de aula em aula, não pude manter
uma certa regularidade de visitas a cada grupo, o que me distanciava deles, apesar da
aproximação conseguida em relação a alguns grupos. A minha impressão era de estar
aumentando a influência sobre a classe, em comparação às aulas exclusivamente
expositivas, mas não achei que este aumento estava sendo suficiente para beneficiar ao
menos metade da turma. Em resumo, era muito difícil dar atenção aos alunos, com
relação as suas dúvidas sobre as tarefas, e ao mesmo tempo observar e investigar o
comportamento dos grupos. Esta fase acabou servindo apenas como experiência para o
trabalho com grupos, já que não fiquei satisfeito com as anotações que fiz durante o ano.
Decidi que realizaria nova tomada de dados no ano seguinte, porém, de maneira
diferente, e concentrando minha atenção em poucos grupos.

6
Fase onde a não elaboração dos medos e das ansiedades bloqueia a aprendizagem, na medida que “afasta”
o indivíduo do conflito - ocasionado pela necessidade de questionar os próprios modos de pensar/agir - e
gera resistências à execução da tarefa proposta.
7
Fase onde os integrantes já conseguem trabalhar suas ansiedades e superar suas condutas estereotipadas
- ações inconscientes que não contribuem para a execução da tarefa - abrindo um canal de comunicação
com seus colegas e com o coordenador, possibilitando o surgimento de vínculos.
8
Fase final caracterizada pela conquista da autonomia por parte do grupo.

15
1.2.2 - Trabalhando com o referencial de grupos operativos: uma segunda tentativa

No ano de 2004, agora no colégio Itupeva9, e com a carga didática reduzida em


função do mestrado, tentei trabalhar novamente com o referencial de grupos operativos.
Porém, houve desta vez uma certa divisão de tarefas: eu fiquei responsável pela função
de professor, enquanto outra pessoa acabou assumindo a responsabilidade de observar as
conseqüências do trabalho em grupo dentro da sala de aula.
A classe escolhida para a investigação era composta somente por doze estudantes,
o que resultou na formação de três grupos, com quatro integrantes cada. Desta vez quase
todas as aulas, de maio até dezembro de 2004, foram gravadas em vídeo, na tentativa de
se obter maiores detalhes a respeito da maneira como cada grupo trabalhava, e deveriam
servir, a princípio, para a minha dissertação e para a dissertação daquele que estava
fazendo o papel de observador dos grupos.
No entanto, durante o ano letivo, por conta de uma maior aproximação para com
os alunos, acabei percebendo fatos que me fizeram repensar o foco das minhas
observações, e culminaram na decisão de mudar a direção desta dissertação. Estes fatos
ocorreram, curiosamente, não só no colégio Itupeva, onde as aulas estavam sendo
gravadas, mas também em outro colégio onde eu lecionava (Escola Jundiaí), e onde as
mesmas estratégias de ensino estavam sendo utilizadas10.
Na medida em que o trabalho com grupos transcorria, agora com mais tempo
disponível, já que a classe observada possuía apenas três grupos, acabei conseguindo
também dar uma melhor atenção aos alunos, o que resultou numa maior aproximação
professor-aluno. Inicialmente, eu procurava anotar tudo o que achava interessante sobre
cada um deles: comportamentos, características dos trabalhos e avaliações, situações de
aula, entre outras coisas. Com o passar do tempo, e com o aumento no número de
informações referentes a cada estudante, pude começar a perceber certos padrões que
eram individuais, e outros comuns, que se repetiam entre eles. Muitas vezes senti a
necessidade de orientá-los individualmente, e conversar sobre assuntos que, na minha
opinião, não seriam de interesse do grupo todo. Para realizar essa orientação
individualizada, comecei então a usar as avaliações escritas na tentativa de abrir um

9
No final de 2003 eu pedi afastamento (licença não remunerada) da escola Campo Limpo, para poder
dedicar um tempo maior às exigências do mestrado. Em 2004, portanto, lecionava somente nas escolas
Itupeva e Jundiaí, ambas particulares.
10
Eu não estava coletando dados na Escola Jundiaí, mas acabei naturalmente transportando para todas as
minhas outras classes o que achava estar fazendo de interessante na classe escolhida para a coleta de dados
- na Escola Itupeva.

16
canal de comunicação com os estudantes, principalmente no caso daqueles que
aparentemente mais necessitavam da minha ajuda. Escrevia nas provas recados que, na
minha opinião, seriam úteis para cada um deles individualmente. Mandava recados
pedindo que me procurassem para conversarmos e os motivava quando percebia
pequenas evoluções na maneira como alguns enfrentavam os problemas propostos nas
avaliações, mesmo que essas evoluções não se refletissem necessariamente em aumento
de notas. Alguns atendiam ao meu chamado, outros não. Dentre os que não me
procuravam, por diversas vezes, tomei a iniciativa da aproximação. Alguns foram
receptivos, enquanto outros, somente ouviam, mas não se abriam para uma conversa
mais franca.
Durante estas conversas, uma aluna da Escola Itupeva desabafou que não sabia
mais o que fazer para entender Física. Ela relatou que sentava em sua escrivaninha para
estudar, e sempre colocava para si mesma um objetivo a ser cumprido: “somente levantar
depois de entender todo o capítulo do livro de Física que fora dado na aula”. Com esse
objetivo em mente, ela começava os seus estudos, mas na medida em que a leitura do
livro texto trazia dúvidas que não podiam ser sanadas de imediato, ela começava a ficar
irritada, e com o acúmulo de problemas sem solução ela acabava se levantando para “dar
um tempo”. Porém, durante este “tempo” a aluna confessou que sempre arrumava algo
“mais interessante” para fazer e acabava não mais voltando aos estudos.
Depois dessa conversa, considerei que ela estava, ao iniciar seus estudos,
colocando para si objetivos impossíveis de serem alcançados. Ou será que um estudante
de ensino médio pode entender um capítulo inteiro de um livro de Física em apenas um
dia ? Os conceitos físicos necessitam de tempo para serem compreendidos, e aquela
aluna não estava levando isso em consideração na hora de propor seus próprios objetivos
de estudo. Certamente havia um equívoco na maneira pela qual ela achava que iria
aprender Física.
Em outra oportunidade, uma outra aluna (agora da Escola Jundiaí) relatou que
estudava muito, mas que não conseguia obter boas notas nas avaliações. Vale ressaltar
que esta conversa somente ocorreu porque eu tomei a iniciativa da aproximação, uma vez
que a aluna em questão tinha vergonha de chegar até mim e iniciar uma conversa. Diante
da sua lamentação, pedi que ela me dissesse como estudava, e ela relatou que lia toda a
teoria, fazia resumos das partes que ela considerava mais importantes, e depois tentava
resolver os problemas propostos por mim como tarefa de casa. Ocorreu-me então de
perguntar se ela acertava os problemas e exercícios que tentava resolver, e ela respondeu

17
que conseguia acertar menos da metade. As questões não entendidas eram levadas então
para uma amiga, que acabava explicando como deveriam ser feitos (esta amiga costuma
tirar as maiores notas da classe). No entanto, depois da explicação dada a ela por outra
pessoa, a aluna relatou que considerava os problemas definitivamente entendidos e não
mais tentava resolvê-los em outra oportunidade. Diagnostiquei aqui também um
equívoco na maneira como ela achava estar aprendendo Física. Ver alguém resolvendo
um problema não garante que a pessoa conseguirá resolvê-lo sozinha depois. Se assim
fosse, bastaria a resolução do professor na lousa para que os alunos não tivessem mais
dúvidas ao chegarem em casa.
Conversamos um pouco sobre isso e sugeri que ela voltasse a pensar, dias depois,
naqueles problemas que haviam sido explicados por outra pessoa, e que ela somente os
considerasse entendidos se conseguisse resolvê-los sozinha depois de um tempo.
O fato foi que suas notas acabaram melhorando, e ela passou também a conversar
mais comigo sobre suas dúvidas. Novamente aqui uma aluna estava cometendo um
pequeno equívoco na maneira de estudar, que a estava prejudicando de certa forma.
Umas poucas conversas, e algumas orientações, parecem ter sido suficientes para
resolver o seu problema.
Diante destas e de outras ocorrências semelhantes, comecei a acreditar que
deveria dar mais atenção a estes detalhes particulares se quisesse orientar de forma
eficiente meus alunos, ajudando-os assim a superarem suas dificuldades. Percebi que
existia uma diferença muito grande entre a minha visão sobre o processo de
aprendizagem de cada um, e a visão que os alunos tinham a respeito do próprio processo
de aprendizagem, e que, muitas vezes, eles não conseguiam saber o motivo pelo qual
seus estudos não traziam os resultados esperados. Além disso, a atenção que eles
percebiam ter do professor parecia ser por si só um fator facilitador, como alguns
chegaram a comentar entre eles e comigo. Concluí que, um professor que não conversa
com seus alunos e alunas, e que não conhece suas necessidades, ou sua maneira de
encarar o mundo, fatalmente terá menor chance de ajudá-los com suas dificuldades.
Desta forma, na medida em que me aproximava mais dos meus alunos
(notadamente um dos pontos positivos de se trabalhar com grupos dentro de uma sala de
aula), pude perceber que existiam particularidades nas necessidades de cada estudante, e
a estratégia que aparentemente funcionava para uns, não contribuía para o
desenvolvimento de outros do mesmo grupo. Concluí que, apesar do trabalho em grupo

18
ser vantajoso, havia a necessidade, muitas vezes, de um tratamento individualizado
(concomitante ao trabalho em grupo) para certos alunos.

“(...) o funcionamento coletivo pode marginalizar os alunos que têm mais necessidade de
aprender” (PERRENOUD, 2000 - p.45).

A massificação do ensino parece ter, na prática, relegado aos estudantes a


responsabilidade por superar suas próprias dificuldades, na medida em que não permite
ao professor, devido ao número excessivo de estudantes, dar a atenção e o apoio que cada
um necessita para o seu desenvolvimento, e muitos naturalmente não possuem a
maturidade suficiente para tamanha tarefa. O sociólogo polonês Zygmunt Bauman relata
esta característica da modernidade. Ele afirma que vivemos numa época de infinitas
possibilidades, quase todas de consumo, onde as pessoas, em troca da aparente liberdade
de escolher o que fazer das suas vidas, carregam sozinhas as responsabilidades e as
incertezas das suas escolhas. “Tudo, por assim dizer, corre agora por conta do
indivíduo” (BAUMAN, 2001 - p.74). Quase não há a quem pedir apoio ou ajuda.
Apesar de as aulas na Escola Itupeva terem sido gravadas em vídeo, acabei
também não conseguindo realizar análises suficientemente satisfatórias desse material,
que valessem o esforço para uma dissertação de mestrado. Confesso que não estava
satisfeito com o referencial usado até então porque não dava conta dos detalhes que
estava descobrindo, pois apontavam para a grande influência de fatores aparentemente
individuais dentro do processo de aprendizagem.
Assim, por conta destes fatos resolvi, com a concordância do meu orientador,
mudar o foco da pesquisa e me interessar por outro referencial de análise. Decidi, então,
tentar investigar como um aluno pode interpretar e encarar as próprias dificuldades e
frustrações inerentes ao processo de aprendizagem, e o que um professor poderia fazer
para ajudá-lo neste processo. Tais indagações acabaram me levando, com a ajuda de uma
disciplina de pós-graduação, finalmente à teoria do amadurecimento de D. W. Winnicott,
que acabou sendo adotada como o referencial teórico deste trabalho.
Termino assim o relato dos fatos que me levaram a escolher o referencial
winnicottiano para a análise dos dados obtidos. A seguir, antes mesmo de apresentar este
referencial teórico, faremos uma breve introdução do mesmo a fim de justificar sua
escolha, passando a usar, a partir de agora, o ponto de vista do pesquisador.

19
1.3 - O novo referencial: uma introdução à teoria da transicionalidade de Winnicott

“Entre vários sujeitos submetidos à mesma aprendizagem, constatam-se


diferenças, às vezes consideráveis, devido a fatores pessoais, como idade, inteligência,
motivação e atitude mais ou menos ativa de cada um deles” (SILLAMY, 1998 - p.27).
Isso nos sugere que, apesar do trabalho em grupo trazer, muitas vezes, benefícios ao
aprendizado de uma disciplina, fatores exclusivamente pessoais podem ser responsáveis
por dificultar, ou mesmo impossibilitar, tal aprendizado.

“Estou muito ‘desligada’... problemas pessoais. Sei que isso não deve interferir, mas fazer o quê ?
Eles acabam com a gente. Espero que você [professor] não esteja desapontado comigo. Sei que
não ando sendo uma grande aluna” (Bárbara11).

“Ultimamente estou muito cansada, e não estou conseguindo me concentrar muito nas coisas. (...)
Acho que estou sob muita pressão, tanto na escola quanto em casa, com outros problemas”
(Vânia).

Por isso, a escolha de um referencial que trabalhe com mecanismos individuais de


enfrentamento da realidade, mais especificamente de situações advindas do contato com
esta, pode ajudar na compreensão de fatos observados com freqüência dentro de um
ambiente de aprendizagem. Então, a partir desta perspectiva foi feita a escolha do novo
referencial.
Com a ajuda de conceitos como: objeto transicional, espaço transicional e o
brincar, o psicanalista inglês D. W. Winnicott deu-nos uma maneira de olhar como nos
relacionamos com o mundo, superando ou não os fracassos e as desilusões pelas quais
passamos durante nossas vidas. Conhecida como teoria da transicionalidade, que é parte
da teoria do amadurecimento elaborada pelo mesmo autor, ela sugere uma atividade
mental que, se presente no indivíduo, em decorrência de condições de maternagem12
suficientemente favoráveis no início da vida, habilita-o a elaborar de forma positiva as
frustrações e desilusões advindas da sua relação com a realidade externa.

11
Todos os nomes de alunos usados nesta dissertação são fictícios.
12
As condições de maternagem representam tudo o que uma mãe pode fazer para adaptar-se bem às
necessidades de seu bebê, possibilitando que este tenha experiências de onipotência. Essas experiências
produzem no bebê a ilusão de que a realidade corresponde a sua capacidade de criar, o que permitirá, mais
tarde, que ele possa passar pelas desilusões advindas da percepção de fenômenos que estão fora do seu
controle.

20
Basicamente, os objetos transicionais são “objetos” que, ao serem usados pelo
indivíduo, tranqüilizam-no em momentos de ansiedade e/ou frustração.

“Salvo para alguns, aprender exige tempo, esforços, emoções dolorosas: angústias do fracasso,
frustração por não conseguir aprender, sentimento de chegar aos limites, medo do julgamento
de terceiros” (PERRENOUD, 2000 - p.70).

Estes momentos de ansiedade e/ou frustração parecem possuir o potencial de


paralisar o processo de aprendizagem de alguns estudantes, que ao sentirem dificuldades
podem resolver deixar tudo de lado e procurarem algo “mais interessante” para fazer,
livrando-se, assim, da angustiante sensação de não conseguirem dar conta de uma tarefa
proposta pelo professor. Mas, se o indivíduo consegue fazer uso de tais “objetos”, abre-
se a possibilidade de que durante o brincar do adulto, caracterizado pelo uso dos objetos
transicionais no espaço transicional do mesmo, este acabe encontrando uma saída
razoável para suas dificuldades, permitindo assim a ocorrência de uma experiência de
aprendizagem.
O professor poderia então diagnosticar aqueles alunos com dificuldades em
brincar, e procurar aplicar atividades que “disponibilizem” possíveis objetos
transicionais, para que estes alunos possam eventualmente aprender a fazer uso de tais
“objetos” na superação das suas dificuldades.
No capítulo 2 faremos uma análise mais detalhada do referencial adotado. Antes,
porém, definiremos os novos objetivos que foram adotados para esta pesquisa e
relataremos o ambiente das aulas onde se deu a nova coleta de dados.

1.4 - Novos objetivos para a pesquisa

A maneira como os estudantes encaram o próprio processo de aprendizagem


resulta em um conjunto de ações que podem não favorecê-lo. As tensões e ansiedades
decorrentes deste não favorecimento, se não trabalhadas, podem realimentar o fracasso e
levá-los para cada vez mais longe de um relacionamento satisfatório com o estudar, um
relacionamento que seja capaz de proporcionar verdadeiras experiências de
aprendizagem.
Aprender implica enfrentar e superar conflitos, uma vez que pressupõe mudanças
na maneira do indivíduo pensar e agir, e cobra do sujeito alguma maneira de fazer isso. A

21
teoria winnicottiana postula a existência de um mecanismo psicológico que, se
desenvolvido durante o processo de amadurecimento do indivíduo, será capaz de dar
conta desta tarefa. Pretendemos com essa teoria, e a partir do diagnóstico da relação que
os estudantes de ensino médio da Escola Jundiaí possuem com o próprio processo de
aprendizagem, bem como suas ações diante das frustrações surgidas durante a realização
das tarefas, compreender os sucessos e os fracassos apresentados por eles. Em seguida,
procuraremos aprofundar este entendimento no caso de uma aluna, analisando os dados
referentes a ela ao longo de mais de dois anos: isso nos permitirá também tentar
identificar a influência do professor dentro do processo de aprendizagem dela.
Finalmente, procuraremos generalizar as informações coletadas durante nossa análise,
explorando também os saberes construídos durante nossa experiência didática, sugerindo
e analisando estratégias de atuação do professor que possam incentivar o
desenvolvimento da capacidade de estudar Física dos seus alunos.

1.4.1 - Nova coleta de dados

Como estávamos interessados em investigar a relação dos estudantes com o


estudo da Física, e os sentimentos decorrentes desta relação, decidimos que faríamos a
coleta de dados por meio de questionários, auto-avaliações, entrevistas e conversas
informais com os alunos. As observações e impressões do professor, ou de outras pessoas
que estivessem envolvidas no processo de aprendizagem dos alunos, também poderiam
contribuir para a obtenção de informações importantes para a pesquisa.
Assim, logo no início de 2005, pedimos aos alunos da segunda série do ensino
médio, da Escola Jundiaí13, que respondessem a um questionário (anexo 1) contendo
perguntas relativas ao cotidiano de cada um, bem como aos seus sentimentos e métodos
em relação ao estudo da Física. Através deste questionário, e das observações e
conversas ocorridas durante as aulas, constatamos que o brincar de Winnicott podia ser
utilizado para entender a maneira como os alunos que não apresentavam dificuldades
com a Física realizavam seus estudos. Esta constatação foi feita por meio dos relatos de
momentos de dificuldades decorrentes do estudo da Física, onde os alunos disseram
quais eram suas “estratégias” para superar tais dificuldades - “estratégias” estas que
puderam ser interpretadas como objetos transicionais sendo manipulados em seus
espaços transicionais. Por sua vez, aqueles que aparentemente sofriam com o estudo da

13
Em 2005 e 2006, o professor lecionava apenas na Escola Jundiaí.

22
Física não relataram tais estratégias e, portanto, de acordo com Winnicott, não eram
ainda capazes de explorar a capacidade de brincar, e encontravam maiores dificuldades
para transpor a barreira das frustrações decorrentes do processo de aprendizagem
(FERNANDES e VILLANI, 2006).
Ao final de 2005, pedimos novamente que os alunos respondessem ao mesmo
questionário, com a intenção de que, juntamente com as auto-avaliações e com as
conversas tidas pelo professor com os alunos, fosse possível diagnosticar eventuais
mudanças na maneira com que os estudantes encaravam o processo de aprendizagem,
relacionando-as, ou não, com a atuação do professor durante o ano.
Para viabilizar esta análise elaboramos algumas categorias que nos possibilitaram
classificar os alunos, de acordo com a relação que cada um possuía com o próprio
aprendizado, em dois momentos diferentes. Com elas foi possível começar a identificar
que alguns estudantes haviam mudado de categoria no decorrer de 2005.
Em 2006, mais precisamente nos meses de janeiro e maio, outros dois
questionários (anexos 2 e 3) foram aplicados com as seguintes intenções: melhorar a
categorização que havíamos feito dos alunos e obtermos algumas informações mais
específicas relativas à maneira com que os estudantes lidavam com as dificuldades
advindas do estudo da Física.
Depois, com a decisão de focar nossa atenção somente na aluna Ana, pedimos
que ela respondesse a um quarto questionário (anexo 4), em agosto de 2006, para que
algumas lacunas deixadas pelos questionários anteriores pudessem ser preenchidas.
De maneira geral, a quase totalidade dos dados desta investigação foram obtidos
entre janeiro de 2005 e agosto de 2006.

1.5 - O ambiente das aulas

Acreditamos ser importante, antes de relatar os fatos observados, descrever o


ambiente da sala de aula na qual os estudantes estavam inseridos quando responderam ao
primeiro questionário, em janeiro de 2005. Este ambiente, portanto, refere-se
inicialmente ao ano letivo de 2004.
O professor era obrigado a cumprir o curso apostilado de Física integralmente até
o final do ano letivo. Isso fazia com que o ritmo das aulas não fosse muitas vezes
compatível com o ritmo de aprendizagem de cada aluno. A rotina das aulas consistia
basicamente na exposição dos tópicos da Física, por parte do professor, e posterior

23
resolução de alguns problemas de demonstração e/ou aplicação dessa teoria.
Eventualmente, o professor selecionava questões para serem resolvidas pelos alunos,
reunidos em grupos, durante a aula. Estes momentos, apesar de não ocorrerem com tanta
freqüência, mostraram-se importantes para que o professor pudesse abrir um canal de
comunicação com os alunos que facilitasse o diagnóstico das suas dificuldades,
ansiedades e frustrações. Além disso, sempre existiam tarefas que os alunos deviam
realizar em casa. Estas tarefas consistiam geralmente de leituras do livro-texto e
resoluções de exercícios ou problemas.
Porém, em 2005, algumas atividades foram inseridas ao processo de avaliação
dos estudantes, enquanto outras foram modificadas a fim de se adequarem melhor aos
nossos objetivos. Dentre esses objetivos, citamos o de dar condições ao aluno de poder
perceber características sobre seu próprio processo de aprendizagem, além de poder falar
sobre seus métodos e dificuldades de estudo, e o de propiciar situações onde o professor
ficasse mais tempo com os alunos, fora das aulas normais, para poder acompanhá-los e
ajudá-los mais de perto com as suas necessidades.

1.5.1 - As atividades aplicadas em 2005

1.5.1.a - Atividades em grupo

Uma primeira estratégia foi o aumento na freqüência das atividades em grupo


dentro da sala de aula, o que permitiu ao professor uma maior aproximação para com os
alunos, principalmente com aqueles que mais aparentavam estarem precisando da sua
ajuda. Durante os atendimentos a cada grupo, o professor teve a oportunidade de
conversar com seus alunos sobre o “funcionamento” do processo de aprendizagem nas
pessoas, na tentativa de enfraquecer algumas idéias equivocadas que os alunos
mostravam possuir sobre o próprio aprendizado. Tais idéias eram: que eles poderiam
aprender Física somente lendo o livro-texto uma única vez, ou somente assistindo às
aulas; que decorar fórmulas e conceitos era um bom método para se aprender Física; que
a tentativa frustrada de se resolver algum problema era sinal de incompetência do aluno;
que errar não era normal dentro do processo de aprendizagem; que aprender não deveria
ser um processo lento e gradual; e que era sempre possível se compreender as utilidades
e vantagens de algo que ainda não havíamos aprendido, ou que ainda não conhecíamos.

24
Estas idéias costumavam aparecer com relativa freqüência quando os alunos eram
estimulados a relatar suas tentativas de realização das tarefas propostas.

Durante estas conversas, o professor também explorou, em determinadas


situações, o testemunho de alguns estudantes da classe que tiveram sucesso em suas
atividades de resolução de problemas. Estes testemunhos foram usados na tentativa de
corroborar a eventual decisão dos alunos de mudarem sua própria disposição em
enfrentar as próprias dificuldades.

Não temos a menor dúvida de que as atividades em grupo foram úteis, entre
outras coisas, para que o professor pudesse abrir um canal de comunicação importante
com seus alunos. No entanto, isto somente foi possível graças às investidas do professor
neste sentido, uma vez que, em várias ocasiões partiu dele a iniciativa de interagir com
alguns grupos, ou com alguns integrantes destes grupos.

“Eu não tenho o hábito de tirar minhas dúvidas com o professor, pois tenho muita vergonha
dele. Não sei direito o porque, mas acho que é porque antigamente os colegas faziam
brincadeirinhas sem graça. Me sentia muito mal, e por isso não pergunto” (Nádia).

“Tinha um pouco de vergonha de perguntar ao professor, mas agora estou perguntando mais”
(Isabel).

Esta aproximação inicial teve papel significativo na ajuda que pôde ser dada a
certos alunos durante os anos de 2005 e 2006.

1.5.1.b - Conversando sobre o processo de aprendizagem

No início do segundo semestre de 2005, o professor preparou uma aula especial


com o objetivo de tentar justificar quais eram os equívocos nos pensamentos relatados
pelos alunos acerca do próprio processo de aprendizagem. Como já dissemos, estes
equívocos surgiam com freqüência quando os alunos eram estimulados a falar sobre suas
tentativas de resolução das tarefas de Física.

“Convém que [o professor] favoreça a metacognição como fonte de auto-regulação dos


processos de aprendizagem” (PERRENOUD, 2000 - p.51).

25
A aula baseou-se na idéia, usada também por Winnicott em seus livros, de as
pessoas possuírem, ao menos, um mundo interno e outro externo. Trabalhou-se a idéia
de que o mundo interno é constituído por imagens e símbolos que construímos dentro de
nós de tudo o que nos é externo, e que a construção desse mundo interno, feita através
dos sentidos e da elaboração psíquica, não é algo que possa ocorrer da noite para o dia.
De fato, para a percepção das características de algo externo é sempre necessário certa
dose de manipulação e reflexão; assim, quanto mais a pessoa trabalhar com determinado
objeto, maiores serão as chances da representação interna deste incorporar detalhes que
dificilmente existiriam com uma manipulação apenas superficial. Foi ressaltado, no
entanto, que objetos internos criados nunca seriam iguais aos objetos externos.
Fazendo analogias com objetos do dia-a-dia, o professor tentou mostrar o quanto
pode ser equivocada a idéia que temos sobre as coisas quando ela é formada
rapidamente, sem muita reflexão ou manipulação, e relacionou isso ao estudo da Física.

“A Física que você usa no dia-a-dia, e até nas provas, não é a Física que está nos livros, mas
sim aquela que você construiu dentro de você, que pertence ao seu mundo interno. E
dependendo de como você estudou, elas podem ser muito diferentes. Errar é uma das maneiras
de, com o tempo, irmos ajustando a Física que aprendemos com a Física dos livros” (professor).

Tentou-se argumentar com os alunos que o mundo interno de uma pessoa daria
também subsídios para que ela pudesse pensar e criar. Um mundo interno repleto de
objetos internos deixaria o indivíduo mais capacitado a interagir com a realidade externa.
Estudar poderia ser, então, entendido como uma maneira de criar e enriquecer este
mundo interno, para que possamos ter condições não só de compreender a realidade
externa, mas também falar e pensar sobre ela.
Foi uma aula da qual os alunos relataram terem gostado, uma vez que, segundo
eles, ajudou na compreensão de muitas coisas que acontecem em suas vidas. Alguns
alunos até confessaram, dias depois, terem se envolvido mais na resolução das tarefas de
casa.

“ (...) depois que o professor falou sobre o mundo externo e mundo interno, compreendi que
para entendermos e aprendermos uma matéria de fato, é preciso trazê-la para o nosso mundo
interno e dedicar-se constantemente a ela. Não basta prestar atenção a aula, é necessário

26
chegar em casa, ler a teoria e fazer os exercícios logo após, e não ficar adiando para o fim de
semana, como eu fazia anteriormente. Aprendi a gostar mais das matérias em geral, aprendi a
valorizá-las (...)” (Amanda).

A intenção também foi, no decorrer do ano letivo, sempre fazer uso dessas idéias
na justificativa dos procedimentos necessários para a melhora na eficiência do
aprendizado da Física, e para o convencimento das possíveis vantagens em se investir no
enriquecimento do mundo interno de cada um deles.

1.5.1.c - Trabalho de leitura e produção de textos

Com o objetivo de estimular o contato dos estudantes com a ciência, propiciando


momentos onde os alunos poderiam opinar livremente sobre determinados assuntos,
dando também a oportunidade do professor interagir com estas opiniões através da
leitura dos textos produzidos, foi pedido que, trimestralmente, os alunos escolhessem um
artigo da mídia escrita que possuísse alguma relação com ciência ou tecnologia. Através
da leitura desse artigo, os alunos deveriam elaborar um texto estritamente pessoal sobre o
tema escolhido e entregá-lo ao professor no prazo estipulado e devidamente formatado.
Para isso, no início de 2005, todos receberam uma folha contendo as informações
relativas à entrega do trabalho, que deveriam ser seguidas durante o ano (anexo 5).
Este trabalho, após ser analisado pelo professor, era devolvido aos alunos com
sugestões de ajustes que, se realizados, conferiam-lhes o direito de ganhar um ponto na
média final trimestral14. Se o trabalho estivesse satisfatório logo na primeira entrega não
haveria a necessidade de tais ajustes. Ficava, então, a cargo do aluno escolher o artigo, e
ficava a cargo do professor avaliar se o trabalho produzido estava de acordo com as
recomendações dadas no início do ano.
A atividade em questão já estava sendo aplicada desde o início de 2004, mas
precisou ser modificada em 2005 para possibilitar uma melhora no canal de comunicação
entre as idéias dos alunos e as sugestões dadas pelo professor que, às vezes, precisava
escrever bastante nos textos antes de devolvê-los aos alunos, para que estes se sentissem
estimulados a melhorar sua produção. Em 2004, a entrega do trabalho era mensal, o que
não permitiu ao professor a dedicação necessária para a análise e correção dos mesmos,
de maneira a favorecer o progresso do aluno na realização dos próximos trabalhos.

14
A Escola Jundiaí dividia o ano letivo em trimestres, ao invés de bimestres.

27
Com as mudanças, pretendíamos que os alunos tivessem a chance de perceber
com maior clareza a idéia de processo na aprendizagem, fazendo com que, através dos
ajustes sugeridos pelo professor, o trabalho final ficasse melhor do que aquele
inicialmente entregue por eles.
Esta foi uma atividade onde os alunos e o professor puderam expressar livremente
suas opiniões sobre temas variados dentro da ciência. Constatamos que esta
oportunidade, em determinados casos, estimulou o diálogo entre professor e aluno,
ajudando a quebrar algumas barreiras que inicialmente pareciam separá-los.

1.5.1.d - Atividade livre

Aplicada desde o começo de 2005, esta atividade conferia ao aluno um ponto na


média trimestral final, se realizada de forma satisfatória, e também era dada ao aluno a
oportunidade de refazê-la, ou aperfeiçoá-la, utilizando-se das observações e sugestões
feitas pelo professor após a sua correção.
A atividade, inspirada em atividade semelhante adotada pela Dra. Nilce da Silva,
da Faculdade de Educação da USP, possibilitava ao aluno a oportunidade de escolha do
tipo de trabalho que desejasse desenvolver, de acordo com um tema de seu interesse -
contanto que o tema tivesse alguma relação com os conteúdos vistos em aula. A
estratégia de devolver o trabalho para as necessárias correções, por sua vez, objetivava
que o aluno novamente passasse por situações de erro e ajuste, até que o trabalho
assumisse uma forma satisfatória. Com isso, esperávamos que os alunos
experimentassem mais uma atividade onde o processo aparecesse como algo importante
na realização do produto final. Também pretendíamos estimular o uso da criatividade na
execução de algo relacionado à Física.
Somente a título de ilustração, o professor deu alguns exemplos do que poderia
ser feito: elaboração de uma pesquisa sobre determinado tópico (que não fosse cópia de
livros ou sites); realização de procedimentos experimentais; análise de filmes que
trouxessem para a discussão algum tema ligado à Física; elaboração de pinturas ou
desenhos, ou até histórias em quadrinhos, entre outros.
Dependendo do trabalho escolhido pelo aluno, havia a possibilidade da formação
de grupos para a realização do mesmo.

28
1.5.1.e - Auto-avaliação

Aproveitando as facilidades da internet, o professor abriu um outro canal de


comunicação com os alunos através do e-mail, fazendo uso deste para o envio de
atividades específicas, conversas particulares, recebimento de atividades propostas em
aula e entrega das auto-avaliações.
As auto-avaliações (anexo 6), de periodicidade variável, possibilitavam ao aluno
também receber um ponto na média trimestral, se entregues no prazo. Cada vez que o
aluno realizava uma avaliação formal, deveria entregar uma auto-avaliação contendo
uma reflexão sobre seus métodos de estudo, seu empenho e seu provável desempenho na
mesma. Esse relato deveria ser entregue ao professor preferencialmente por e-mail até
uma semana após cada avaliação.
Esta atividade permitiu a cada aluno exteriorizar seus métodos de estudo, e
procurou estimular uma reflexão sobre os mesmos. Além disso, serviu para que
pudéssemos obter informações importantes sobre a maneira como os alunos estudavam.

1.5.1.f - Atividade de auxílio ao aluno (plantões)

Houve, desde o início de 2005, e sempre fora do período de aula, um horário


semanal em que o professor esteve disponível para eventuais orientações e
esclarecimentos de conteúdos para os seus alunos. No entanto, a partir do segundo
semestre, devido à baixa freqüência inicial, resolvemos estabelecer um dia fixo para tais
plantões (quarta-feira à tarde). Decidimos também convidar certos alunos para que
freqüentassem estes plantões, na esperança de que uma orientação mais individualizada
pudesse ser disponibilizada para aqueles que enfrentavam problemas com o estudo da
Física.

“Depois do incentivo dos plantões comecei a ler os livros quando podia. Não tinha um dia certo,
ou hora certa (...). Não devia deixar de ter os plantões, ajudou muita gente” (Bárbara).

“Em apenas um dia que fiquei nos plantões percebi que me ajudou muito, pude fazer o exercício
da apostila e tirei minhas dúvidas enquanto ia fazendo” (Raíssa).

“Realmente você tinha razão, os plantões me fizeram muito bem. Começamos a usar mais o livro

29
e com isso comecei a me familiarizar com a linguagem dele” (Joana).

Ao dar mais atenção aos alunos e ao ajudá-los na realização das suas atividades, o
professor esperava contribuir para um aumento na capacidade de brincar de cada um e,
conseqüentemente, na capacidade de superação das dificuldades relativas ao aprendizado
da Física. Assim como, segundo Winnicott, uma mãe suficientemente boa não pode
deixar seu bebê sem assistência, para que este encontre naturalmente seus objetos
transicionais, acreditamos que um professor suficientemente bom teoricamente também
não poderia deixar seus alunos sem o apoio necessário para o desenvolvimento
intelectual de cada um.

1.5.2 - Algumas considerações adicionais sobre as atividades aplicadas em 2005

De maneira geral, todas as atividades implantadas em 2005 tiveram como


objetivos propiciar ao aluno: (A) a idéia de processo na aprendizagem da Física, em
detrimento da idéia de que não precisamos dispor do tempo no aprendizado; (B) a
oportunidade de se expressar com relação a determinados assuntos; (C) a oportunidade
de usar a criatividade na elaboração de trabalhos relacionados à Física; (D) a chance de
exteriorizar e refletir sobre seus métodos de estudo e sentimentos relativos ao
aprendizado da Física; (E) a oportunidade de obter até quarenta por cento da nota final do
trimestre em atividades não relacionadas às avaliações formais; e finalmente, (F) a
abertura de vários canais de comunicação com o professor, na tentativa de fazê-lo se
sentir acolhido e amparado nos momentos de dificuldade.
Por fim, o professor, durante as aulas, procurou, desde o início, manter uma
postura que estimulasse a convivência saudável com cada aluno, tentando, na medida do
possível, respeitar as características particulares de cada um, sem deixar de estimular o
desenvolvimento deles.
Se considerarmos os relatos dos alunos, podemos concluir que, pelo menos para
alguns, estes objetivos foram em parte alcançados.

“Quanto a isso eu estou bem melhor, de saber controlar minha ansiedade e meu nervosismo.
Antes eu não conseguia nem escrever o nome de tão nervosa, e hoje, se o professor chegar na
aula e disser que teremos prova surpresa eu consigo ficar calma, já é um grande avanço eu
acho” (Vânia).

30
“O jeito do professor é muito ‘legal’, eu gosto muito da atenção que ele dá para todos”
(Laura).

“Acredito que o que me deu impulso para estudar Física foram as conversas que o professor
teve com a classe sobre mundo interno e externo. Também comecei a ver a Física por um lado
diferente. Gostei muito dos diálogos que tive com o professor, perguntando-lhe sobre outras
dúvidas, sem ser as de Física, o que me aproximou do professor e me fez participar mais das
aulas” (Amanda).

“Quando você [professor] dá uma dica, ou fala sobre a sua experiência, eu presto atenção, e
penso em uma possível maneira de encaixar essa idéia no meu estilo de estudo” (Cláudia).

“Sinto muito mais confiança por ter a ajuda do professor” (Bárbara).

“Este ano meu desempenho melhorou, passei a entender um pouco mais sobre física, não a
decorar a matéria, mas a saber o conteúdo, que vale mais que pontos na média. Acho que isso
aconteceu pelo fato do professor estar abrindo espaço aos interessados na aula para estudar e
perguntar” (Rodolfo).

“Acho que não precisei falar com ele [professor], descobri os meus erros sozinha. Porém,
ouço muito o professor falar com minhas amigas que não gostam de física e resgatei algumas
dicas do que ele falou, como não deixar acumular os exercícios, tirar sempre dúvida. Reparei
que o professor está sempre aberto para conversas e dúvidas, principalmente com quem tem
mais dificuldades” (Raíssa).

“Antes (no primeiro ano) era bem difícil saber lidar com essas dificuldades [relativas ao
aprender Física]. Mas hoje, depois de muitas conversas com você [professor], dos plantões,
digamos que a situação melhorou bastante. Hoje vejo que o importante é entender,
aprender a matéria, e não a nota em si” (Joana).

“Eu li o livro texto! ! Nossa !! Isso nunca tinha acontecido. Sabe porque eu li ? Foi de tanto
você [professor] ter insistido para eu ler, que eu precisava ler e tal, ai eu li. Sabe, a primeira
impressão é que não mudou muita coisa. Mas eu pensei: pelo menos eu li, tentei uma vez....”
(Vânia).

“Bom eu nunca usava o livro texto para estudar, porque achava desnecessário. Mas venho

31
tentando ler e agora quando tenho uma dificuldade em vez de deixar para tirar dúvida em sala
eu pego o livro, acho que isto está ajudando de certa maneira” (Vânia).

“Muito obrigada por você [professor] ter me escrito, foi de muito valor suas palavras. E
obrigada também por seu elogio” (Vânia).

“Achei que meu desempenho em física melhorou muito este ano, tanto quanto ao meu empenho
quanto as minhas notas e meus resultados em geral. Vi que comecei a entender certas coisas
que não conseguia ver, que me fizeram tomar atitudes diferentes diante de certas situações.
Aprendi a me controlar um pouco mais este ano [2005], e percebo que a cada ano venho
progredindo e fico muito feliz em saber disso. Aprendi a confiar um pouco mais em mim e a
não desistir diante de um problema que não se resolveu de primeira. Pensar é uma grande
virtude e voltar para fazer novamente é outra muito grande também. Saber esperar e ter
paciência é essencial para tudo, não apenas na Física. Acho que tudo isso me fez ir melhor e
me fez progredir me dando resultados satisfatórios” (Vânia).

32
CAPÍTULO 2

“O fato de que o aluno não mostrou


nenhum sinal de progresso ontem ou hoje
é absolutamente compatível com um
possível progresso na semana ou no
bimestre seguinte. As sementes, de fato,
germinam lentamente. Os músculos
demoram para enrijecer. Você conseguiu
nadar logo em sua primeira aula de
natação ? Caso você não o tenha
conseguido, isso significa que você nada
aprendeu nessa aula ?”

Gilbert Ryle

33
2.1 - REFERENCIAL TEÓRICO

2.1.1 - Os estágios da teoria do amadurecimento de Winnicott

Podemos dividir o processo de amadurecimento proposto por Winnicott em três


estágios, que podem se sobrepor e não serem lineares - apesar de alguns estágios
precisarem ser transpostos para a ocorrência de outros. Os três estágios, dependência
absoluta, dependência relativa e independência relativa possuem a característica de
serem relativos por dependerem sempre de outro ser humano.
No estágio primitivo de dependência absoluta, como o próprio nome sugere, o
bebê depende totalmente do ambiente ao seu redor, ambiente este responsável por supri-
lo de cuidados favoráveis ao seu desenvolvimento. Em geral, estes cuidados se
relacionam com a maneira como a mãe sustenta e maneja o bebê, e como ela apresenta
objetos a ele, segundo suas necessidades. Estes cuidados permitem que o bebê realize
algumas conquistas básicas desta fase: a integração no tempo e no espaço, o alojamento
gradual da psique15 no corpo e o início das relações objetais.
As relações objetais ocorrem já no início do estágio da dependência relativa,
quando o ambiente começa a deixar de suprir parte das necessidades do bebê,
propiciando o aparecimento das desilusões e o início dos processos mentais. A partir daí
os estágios da transicionalidade e uso de objetos podem ocorrer, levando o bebê aos
estágios do EU-SOU16 e do concernimento. Na saúde eles se estabelecem por volta dos
12 aos 18 meses.
Na medida em que tudo isso vai ocorrendo, o si-mesmo (self) do bebê vai aos
poucos se constituindo pela repetição contínua de pequenas experiências de integração17,
fazendo com que o estado integrado torne-se cada vez mais estável, o que abre caminho
para a independência relativa. Neste estágio o indivíduo e o ambiente podem ser vistos
como independentes, e o indivíduo terá conquistado, entre outras coisas, a maturidade
necessária para enfrentar de forma saudável as desilusões advindas do viver.

15
A psique abrange, para Winnicott, tudo o que não é soma/corpo, incluída aí a mente. (DIAS, 2003 -
p.105).
16
Este estágio representa a conquista da unidade num eu integrado. Winnicott também usa às vezes os
termos eu e si-mesmo para referir-se a este estágio.
17
Para Winnicott, a integração representa a “(...) tendência inata ao amadurecimento, que leva ao estatuto
unitário (...)” (DIAS, 2003 - p.196). No estado integrado o bebê conquista um sentimento de unidade, de
si-mesmo, que é “(...) a conquista básica para a saúde no desenvolvimento emocional de todo ser humano”
(WINNICOTT, 1996 - p.47).

34
2.1.2 - Fenômenos transicionais

Dentro da teoria do amadurecimento de Winnicott, os fenômenos transicionais


nos ajudam a compreender a maneira como um indivíduo se relaciona com o mundo a
sua volta, principalmente no início da dependência relativa, quando se dá também o
início das relações objetais. A teoria da transicionalidade, da qual os fenômenos
transicionais fazem parte, sugere uma atividade mental que, se desenvolvida no
indivíduo em decorrência de condições de maternagem suficientemente favoráveis no
início da vida, habilita-o a elaborar as frustrações e desilusões advindas da sua relação
com a realidade externa. Nela três conceitos são importantes para entendermos como um
sujeito, ainda nos primeiros anos de vida, pode começar a organizar seu mundo interno e,
ao mesmo tempo, reconhecer uma realidade externa a ele. São eles: espaço transicional,
objeto transicional e o brincar. Estes três conceitos também permitem a compreensão
das possíveis interações entre sujeito e realidade externa. Porém, antes de explicarmos os
seus significados, algumas considerações prévias fazem-se necessárias.
“Para D. W. Winnicott, a criatividade humana, bem como toda a experiência
cultural, tem seu ponto de partida na relação do bebê com a mãe. É essa relação que vai
determinar a amplitude e a qualidade das experiências transicionais” (ABADI, 1998,
p.25-6), que por sua vez determinarão a amplitude e a qualidade das relações que um
indivíduo poderá ter com o mundo externo, inclusive em situações que geram
ansiedades.
Logo ao nascer, e durante aproximadamente os dois primeiros meses de vida, o
bebê não tem consciência de si mesmo e da realidade externa, mas sente certas
necessidades advindas de seu instinto sem saber muito bem como satisfazê-las. Ele
encontra-se num estado de isolamento fundamental denominado não-integrado, onde “os
cuidados físicos [passam a ser também] cuidados psicológicos” (NEWMAN, 2003 -
p.231), e destes o bebê “está apenas em posição de obter proveito ou sofrer
perturbações” (DAVIS, 1982 - p.50).

“A experiência direta que o bebê faz do funcionamento, das sensações e dos movimentos do
corpo tem para ele um sentido, pelo fato de estar sendo imaginativamente elaborada. Apesar
desse sentido não ser diretamente observável, ele se tornará manifesto, posteriormente, no
brincar (...)” (DIAS, 2003 - p.106).

35
Através da chamada elaboração imaginativa, a psique do bebê começa seu
desenvolvimento passando então a elaborar e acumular experiências pessoais
relacionadas aos cuidados recebidos da mãe, os quais acabam por configurarem-se num
mundo para o bebê. O primeiro mundo habitado por ele é, e deve ser, portanto, subjetivo,
e suas características centrais precisam ser a confiabilidade e a previsibilidade. Sem este
mundo subjetivo desenvolvido o bebê não poderá prosseguir suas conquistas relativas ao
amadurecimento.
Com o passar do tempo, e com a estabilidade do meio, o bebê acaba adquirindo a
capacidade de reconhecer coisas e predizer acontecimentos; pelo fato de ainda não
possuir consciência da realidade externa, imagina ou fantasia estar criando tudo o que
chega até ele.

“(...) A fantasia e a realidade são uma só, e o bebê se torna o criador do mundo. Este mundo
criado por ele, que consiste de objetos subjetivos, é sentido como se estivesse sob seu controle”
(DAVIES, 1992 - p.58).

No trecho a seguir, Winnicott ilustra como se dá a elaboração imaginativa, da


necessidade instintual à ilusão da criação do que lhe satisfaz, e suas conseqüências para o
desenvolvimento emocional da criança.

“Imaginem um bebê que nunca foi alimentado. Surge a fome, e o bebê está pronto para
conceber algo; a partir da necessidade, o bebê está pronto para criar uma fonte de satisfação,
mas não existe nenhuma experiência prévia para mostrar a ele o que esperar. Se, neste
momento, a mãe coloca o seu seio ali onde o bebê está pronto para esperar algo e se deixar
suficiente tempo para ele explorar, com a boca e com as mãos, talvez com o sentido do olfato, o
bebê ‘cria’ exatamente aquilo que lá está para ser achado. Finalmente o bebê obtém a ilusão de
que este seio real é exatamente a coisa que foi criada a partir da necessidade (...). Mil vezes
antes do desmame o bebê pode receber exatamente esta introdução particular à realidade
externa [pela mãe]. Mil vezes existiu o sentimento de que foi criado algo que fora desejado, e
descoberta a sua existência. A partir disto, desenvolve-se uma crença de que o mundo pode
conter o que é desejado e necessitado, com o resultado de que o bebê possui esperança de que
há uma relação viva entre a realidade interna e a realidade externa, entre a criatividade
primitiva inata e o mundo em geral que é compartilhado por todos” (WINNICOTT, 1982 - in:
DAVIS, 1982 - p.58).

36
É no estado não-integrado, portanto, que o bebê pode fantasiar estar criando tudo
o que necessita e imaginar que tudo está sob o seu controle, permitindo assim uma ilusão
de onipotência - sentimento que ajudará, no futuro, a trazer esperanças sobre a existência
de algo que o aliviará do sentimento de angústia, quando este começar a aparecer nos
primeiros contatos daquele com a experiência da frustração.
A tendência ao amadurecimento, que de acordo com Winnicott é inata a todo ser
humano, representa a tendência à integração do indivíduo num todo unitário, fazendo-o
responder por um eu e sentir-se real, possuidor de um corpo separado do que será
posteriormente considerado não-eu, ou seja, do que será percebido como sendo externo a
ele.

“O estado de unidade é a conquista básica para a saúde no desenvolvimento emocional de todo


ser humano” (WINNICOTT, 1996 - p.47).

“(...) o oposto da integração é uma deficiência de integração, ou uma desintegração, a partir de


um estado de integração. Trata-se de algo intolerável. É uma das ansiedades mais inconcebíveis
e básicas da infância” (WINNICOTT, 2002 - p.09).

Porém, para que essa integração possa se realizar há a necessidade da existência


contínua de um ambiente facilitador que propicie ao bebê condições favoráveis ao seu
desenvolvimento. Dar estas condições favoráveis seria o papel de uma mãe
suficientemente boa18.

“Iniciar o bebê na capacidade de se iludir é a tarefa essencial da mãe suficientemente boa”


(DIAS, 2003 - p.173).

Podemos considerar que as condições favoráveis, neste estágio inicial, estão


relacionadas a possibilitar ao bebê a aquisição dos sentimentos de temporalização e
espacialização.
A temporalização começa a se desenvolver pela percepção da presença da mãe e
dos seus cuidados que, com o tempo, criam uma memória relativa a eles. Esses cuidados
passam, então, a ser esperados - desde que a confiança necessária instale-se no ambiente,

18
Uma mãe suficientemente boa é aquela “(...) que efetua uma adaptação ativa às necessidades do bebê,
adaptação que diminui gradativamente, segundo a crescente capacidade deste em aquilatar o fracasso da
adaptação e em tolerar os resultados da frustração” (WINNICOTT, 1975 - p.25).

37
se este possuir a característica de ser suficientemente previsível ao bebê. Saber esperar e
poder contar com o tempo são conquistas advindas do desenvolvimento desse
sentimento.
Por outro lado, o colo da mãe e os cuidados desta com relação ao manejo do bebê
contribuem para que ele adquira gradualmente um sentimento de unidade, em detrimento
da percepção fragmentada de suas partes - cabeça, tronco e membros. Quando a mãe
sustenta o bebê de forma segura e confiante, este vai adquirindo a sensação de possuir
um “lugar onde possa habitar”, onde possa “sentir-se em casa”, um lugar para onde se
possa voltar quando da necessidade de descanso.
Estes dois sentimentos, fundamentais para que o bebê possa habitar, por certo
tempo, num mundo subjetivo, e a partir daí estar preparado para tomar contato com a
realidade, vão gradualmente alojando a psique no corpo. Tudo se passa como se ele
“encontrasse” um local para habitar, um local que será, no futuro, diferenciado do que é
externo/não-eu. Esse alojamento da psique no corpo foi chamado por Winnicott de
personalização.
Uma seqüência para o desenvolvimento da integração seria: temporalização e
espacialização, personalização e relações objetais.
Com o passar do tempo, a mãe começa naturalmente a diminuir o suprimento de
cuidados oferecidos ao bebê, e este começa a experimentar breves momentos de
frustração e desilusão. Estes momentos irão desencadear e reforçar a idéia da existência
de uma realidade que não pode ser controlada pois está fora do seu alcance.
Porém, nos breves períodos de ausência da mãe, pode ocorrer de o bebê
“encontrar” e tomar posse de algum objeto que, por trazer algum tipo de conforto, seja de
ordem física ou emocional, acabe funcionando como um tranqüilizador para ele. No caso
de a mãe voltar, e isto é o que se espera de uma mãe suficientemente boa, o poder
tranqüilizador do objeto encontrado acaba sendo reforçado para o bebê. Assim, o objeto
passa a ter um significado importante na vida da criança, principalmente em momentos
de ansiedade.
Cabe destacar que, para o bebê, este objeto não pertence ao mundo externo e nem
ao seu mundo interno, mas sim a uma área intermediária chamada por Winnicott de
espaço potencial, que vai se desenvolvendo em direção ao espaço transicional na medida
em que é transitado pela criança. Segundo Winnicott, o que importa não é tanto o objeto
em si, mas sim o uso que a criança faz deste, pois se ocorrer numa área intermediária
entre o dentro e o fora, fará o paradoxo da negação da realidade, ou da existência do não-

38
eu, e o reconhecimento desta realidade coexistirem sem o surgimento de conflitos ainda
intransponíveis para o bebê.

“O original da teoria winnicottiana encontra-se na idéia de que, somente a partir da criação de


um espaço ambíguo entre o dentro e o fora e de uma investidura ilusória do mundo, se tornará
possível e tolerável o reconhecimento da realidade objetiva” (ABADI, 1998 - p.33).

A representação na área intermediária do objeto encontrado pela criança foi


chamada por Winnicott de objeto transicional, sugerindo que sua manipulação fosse
acompanhada de uma atividade de fantasia. Eis, então, a origem da capacidade de criar e
simbolizar, uma vez que o objeto transicional é símbolo do objeto interno, ao mesmo
tempo que deve ser criado para que possa ser usufruído.
O desenvolvimento da capacidade de uso desses objetos, que só pode ocorrer
quando há, por parte da criança, confiança no ambiente, permitirá a ela “substituir o
objeto ausente e, ao mesmo tempo, favorecer o reencontro com o objeto que representa”
(ABADI, 1998 - p.43). Desta forma, adquire-se uma maneira de tolerar/superar as
ansiedades decorrentes do sentimento de ausência, o qual é causado pela falta
momentânea daquilo que a satisfaz.
Ao conjunto destas experiências Winnicott deu o nome de fenômenos
transicionais, e o que torna possível o uso da transicionalidade, na tentativa de
compreensão do que acontece com os alunos durante o aprendizado da Física, é o fato de
este mecanismo transformar-se num modo de funcionamento psíquico que acaba sendo
transferido para outras experiências. Ele continua, portanto, atuando durante toda a vida
do indivíduo, porém, com novos objetos mais complexos (a amizade, a música, as artes,
a ciência).

“As angústias típicas da adolescência (...) repetem as dos estágios primitivos: o adolescente é, tal
como o bebê, essencialmente isolado. E, tal como o bebê, é apenas a partir desse isolamento que
ele pode se lançar e vir a estabelecer alguma relação sentida como real. (...). O adolescente
repete os estágios primitivos (...), e sua principal luta diz respeito a sentir-se real” (DIAS, 2003 -
p.293).

39
2.1.3 - Sobre o brincar

A manipulação dos objetos transicionais no espaço transicional é característica


do que Winnicott chama de brincar - que deve ocorrer sempre de forma espontânea e
descompromissada. O brincar proporcionará momentos em que a criança, através da
própria criatividade, irá surpreender a si mesma, facilitando assim a construção de uma
experiência existencial baseada na consciência da possibilidade de interação e
transformação da realidade externa, ao invés da submissão ou simples adequação a ela
(WINNICOTT, 1975 - p.75). Ainda segundo Winnicott (1975 - p.63), é interessante
notar que para se controlar o que está “fora” há de se fazer coisas, manipular o exterior, e
não simplesmente pensar ou desejar (usar o mundo interior). Por isso, brincar é fazer.

“A importância do brincar é sempre a precariedade do interjogo entre a realidade psíquica e a


experiência de controle de objetos reais. É a precariedade da própria magia, magia que se
origina na intimidade, num relacionamento que está sendo descoberto como digno de confiança”
(WINNICOTT, 1975 - p.71).

A capacidade de brincar, essencial na vida de qualquer indivíduo, começa a se


desenvolver em decorrência da habilidade materna em propiciar ao bebê o sentimento de
“controle mágico” em relação ao que satisfaz suas necessidades (sentimento de
onipotência). O estado de confiança na mãe, e no ambiente, e a gradual percepção
objetiva da realidade externa são condições necessárias para o desenvolvimento inicial
no bebê do que virá a ser o seu espaço potencial. Lembramos que este espaço não
pertence aos mundos interno ou externo, sendo o lugar onde a superposição de ambos
pode ocorrer.
Após a fase de “origem” do espaço potencial, a criança terá condições de
experimentar o sentimento de estar sozinha na presença de alguém, de brincar “com base
na suposição de que a pessoa a quem ama e que, portanto, é digna de confiança, e lhe dá
segurança, está disponível e permanece disponível quando é lembrada, após ter sido
esquecida” (WINNICOTT, 1975 - p.71). Ao “habitar” com maior freqüência esse
espaço, a criança vai desenvolvendo aos poucos sua capacidade de brincar.
No estágio final, se tudo correu bem nos estágios anteriores, a criança estará
pronta para “permitir e fruir uma superposição de duas áreas de brincadeira”, a sua e a
de outra pessoa. Em geral, no início, esta outra pessoa costuma ser a própria mãe, que ao

40
interagir com a brincadeira da criança abre caminho para o desenvolvimento do brincar
em conjunto, essencial para a habilidade de relacionar-se com outros indivíduos no
futuro, e para a posterior entrada no mundo das experiências culturais.
Curiosamente, essa idéia do brincar em conjunto pode ser muito útil ao professor,
se este também souber brincar, exatamente por representar uma possibilidade concreta
de atuação docente, e permitir uma contribuição para o enriquecimento interno do
estudante. Por outro lado, se a habilidade de brincar não estiver suficientemente
desenvolvida na criança, é provável que ela encontre dificuldades em tolerar as
frustrações e desilusões decorrentes dos seus estudos, e acabe por perder o interesse no
conteúdo ou na disciplina em questão. Fazendo uma analogia entre o trabalho de um
terapeuta e o do professor, lembrando obviamente das diferenças na formação de cada
um, e das características do trabalho de cada um, poderíamos ousar transpor a seguinte
afirmação de Winnicott ao trabalho docente: “onde o brincar não é possível, o trabalho
efetuado pelo terapeuta é dirigido então no sentido de trazer o paciente de um estado em
que não é capaz de brincar para um estado em que é” (WINNICOTT, 1975 - p.59). Essa
analogia é a base de tudo o que será feito nessa dissertação.
O brincar não ocorre somente na infância. Ele é, como já dito, um mecanismo
que evolui e atua durante toda a vida do indivíduo. Podemos pensar, por exemplo, no
brincar do adulto, quando este se entretém com algo do seu interesse e usa todo o seu
potencial criador na apercepção19 de uma realidade externa que já estava lá antes dele,
mas que passa com isso a ter também uma representação interna, que será somente sua, e
fará parte da sua vida.

“As crianças brincam para dominar angústias, controlar idéias ou impulsos que conduzem à
angústia se não forem dominados” (WINNICOTT, 1982 - p.162).

“É no brincar, e somente no brincar, que o indivíduo, criança ou adulto, pode ser criativo e
utilizar sua personalidade integral: e é somente sendo criativo que o indivíduo descobre o eu
(self)” (WINNICOTT, 1975 - p. 80).

Quando a criança brinca, ou quando o adulto brinca, experimenta a ilusão e a


desilusão, uma vez que o brincar proporciona isso, e através do uso dos objetos
transicionais aprende a lidar de forma saudável com os medos, sentimentos conflitivos,

19
O termo corresponde a um modo de percepção no qual o indivíduo adiciona algo de seu ao sentido do
que está sendo percebido (NEWMAN, 2003 - p.73).

41
as dúvidas e frustrações decorrentes do viver, não os deixando interferir de forma
negativa em sua vida, já que pode se apoiar na riqueza das suas experiências criativas,
únicas responsáveis em justificar a própria existência.

2.2 - METODOLOGIA DE PESQUISA

A perspectiva interpretativa, também chamada por alguns autores de qualitativa,


foi adotada por considerarmos que ela melhor se adapta ao tipo de pesquisa que
pretendíamos realizar - e também ao referencial teórico adotado - pelo fato desta sugerir
uma atenção maior ao indivíduo, e às particularidades que o levam a apresentar
determinados comportamentos e maneiras de agir e/ou pensar.

“A preocupação primordial da pesquisa interpretativa é particularização ao invés de


generalização” (ERICKSON, 1986 - p.130).

“As crianças transportarão para a situação escolar as dúvidas e suspeitas que fazem parte de
seu próprio caráter e experiências, que constituem uma parcela integrante das distorções
sofridas pelo seu próprio desenvolvimento emocional (…)” (WINNICOTT, 1982, p.229).

Como cada criança é única, acreditamos que uma atenção mais individualizada,
dada pelo professor, terá maiores chances de ajudá-la a perceber novas possibilidades de
entendimento e de ação sobre suas necessidades.

“A construção do sentido deve ser, em parte, diferenciada e, sobretudo, inscrever-se em um


diálogo singular com um aluno ou com um pequeno grupo” (PERRENOUD, 2000 - p.72).

Para esta modalidade de pesquisa, de acordo com ERICKSON (1986 - p.130), a


possível percepção de universais concretos surge através do estudo detalhado de casos
específicos e da comparação desses casos com outros estudados igualmente em detalhe.
Ela é feita, portanto, do particular para o geral, ao contrário das pesquisas quantitativas,
que normalmente partem de análises estatísticas em busca de universais abstratos que
possam ser extrapolados a casos particulares. Na pesquisa interpretativa “o pesquisador
não procura testar hipóteses e, sim, desenvolvê-las” (MOREIRA, 1990 - p.34).

42
Um outro fator que contribuiu para a escolha deste método de pesquisa teve
relação com o fato de o pesquisador também acumular a função de professor, tendo,
portanto, a responsabilidade de atuar sobre o ambiente observado e interpretado por ele.

“O investigador interpretativo observa participativamente, de dentro do ambiente estudado,


imerso no fenômeno de interesse, anotando cuidadosamente tudo o que acontece nesse ambiente,
registrando eventos (...), coletando documentos tais como trabalhos dos alunos, materiais
distribuídos pelo professor; ocupa-se não de uma amostra no sentido quantitativo, mas de
grupos ou indivíduos em particular, de casos específicos, procurando escrutinar exaustivamente
determinada instância, tentando descobrir o que há nela de único e o que pode ser generalizado
a situações similares” (MOREIRA, 1990 - p.34).

2.2.1 - Instrumentos de pesquisa

A estratégia adotada para esta dissertação, dentro da perspectiva interpretativa de


pesquisa, consistiu basicamente na observação feita, por parte do professor-pesquisador,
de eventos ocorridos dentro e fora da sala de aula, quando os alunos eram colocados em
situações de contato com atividades ou conteúdos relacionados à Física. Durante a coleta
de dados propriamente dita, de 2005 a meados de 2006, as informações referentes aos
alunos foram obtidas através de:
(A) Aplicação de quatro questionários, que se encontram no apêndice (anexos 1,
2, 3 e 4) desta dissertação, com o objetivo de tentar levantar informações pessoais a
respeito do cotidiano de cada aluno, bem como sua maneira de estudar, seus gostos
pessoais e seus sentimentos em relação ao estudo da Física;
(B) Realização de uma tomada de depoimento com a aluna Ana, já no último ano
de coleta de dados, objetivando esclarecer algumas respostas dadas por ela nos
questionários;
(C) Entrega, por parte de cada aluno, após as avaliações formais, de auto-
avaliações contendo reflexões sobre sua dedicação, métodos de estudo, esperanças e
frustrações quanto ao aprendizado da Física (ver no anexo 6 as recomendações feitas
pelo professor aos alunos para a realização destas auto-avaliações). Elas foram entregues
através de e-mail, e possibilitaram acompanhar o desenvolvimento dos alunos com
relação aos métodos empregados por eles para o estudo da Física;

43
(D) Observação do comportamento dos alunos quando colocados diante de
avaliações e atividades de resolução de exercícios dentro da sala de aula. O professor
mantinha anotações a respeito das observações que fazia;
(E) Obtenção de informações, através de conversas informais com os alunos, da
relação que cada um possuía com o estudo da Física, bem como dos métodos
empregados por eles para estudar Física, além das dificuldades sentidas durante o
processo de aprendizagem;
(F) Obtenção do depoimento da professora que auxiliou a aluna Ana, através de
aulas particulares, a estudar Física;
As informações obtidas através dos instrumentos de pesquisa citados acima,
complementadas com as anotações mantidas pelo professor a respeito dos seus alunos em
2004, possibilitaram a análise da trajetória de uma aluna, que, como veremos, apresentou
mudanças em relação à maneira de se relacionar com o estudo da Física. Estas mudanças,
por sua vez, puderam ser interpretadas com o auxílio do referencial teórico adotado.

2.2.2 - Metodologia de análise

A metodologia adotada para proceder a análise dos dados obtidos seguiu alguns
critérios que achamos importante enumerar: (1) apesar de termos coletado, em 2005,
dados referentes a vários alunos, e de termos realizado uma análise preliminar destes
dados, em 2006 resolvemos focar nossa atenção apenas na aluna Ana, na esperança de
que uma análise mais detalhada pudesse contribuir para o entendimento dos fatores que
estariam afetando a sua relação com o estudo da Física. Tomamos esta decisão ao
constatar que esta aluna, assim como outros, apesar das tentativas de estudo, se mantinha
num nível de desempenho abaixo daquele esperado por ela própria. Este fato acabou
indicando, naquele momento, um caminho para as nossas investigações, caminho este
que resolvemos seguir. A partir daí, (2) passamos a comparar as respostas dadas por Ana
aos vários questionários aplicados pelo professor, fazendo uso também das informações
obtidas através dos outros instrumentos de pesquisa, (3) procurando dados que
mostrassem uma mudança, ou não, na maneira da aluna se relacionar com o estudo da
Física, bem como fatores que estivessem interferindo no processo, para tentarmos
interpretar estes dados a partir do referencial winnicottiano.
A análise de todo o material foi feita levando-se em conta sempre esta
perspectiva.

44
CAPÍTULO 3

“Alguém disse que fazer aquilo era impossível, mas


ele, com uma risadinha, replicou que talvez fosse,
mas que não diria isso antes de tentar. Então, ele se
lançou à tarefa com um esboço de sorriso no rosto;
se estava preocupado, não demonstrou. Começou a
cantar, enquanto trabalhava naquilo que era
impossível de fazer, e fez. Alguém zombou: ‘você
não conseguirá fazer isso; pelo menos ninguém
nunca fez’. Ele, porém, arregaçou as mangas, e, num
piscar de olhos, lançou-se à tarefa. De queixo
erguido e com um pequeno sorriso, sem duvidar ou
vacilar, ele começou a cantar, enquanto trabalhava
naquilo que era impossível fazer, e fez. Milhares de
pessoas dirão a você que fazer aquilo é impossível,
milhares profetizarão seu fracasso; milhares lhe
apontarão, um por um, todos os perigos à espreita.
Mas se você arregaçar as mangas e com um
pequeno sorriso lançar-se à tarefa, se começar a
cantar, enquanto trabalha naquilo que é impossível
fazer, você fará”

Edgar A. Guest

45
3.1 - ANÁLISE DOS DADOS INICIAIS

3.1.1 - Reações às dificuldades encontradas no estudo da Física

Quando analisamos as respostas dadas ao questionário 1 (anexo 1), que procurava


investigar o cotidiano dos alunos, bem como seus sentimentos em relação ao estudo da
Física, alguns fatos chamaram nossa atenção. Um destes fatos foi a diferença no tipo de
resposta dada por aqueles que apresentavam muitas dificuldades na sala de aula em
relação àqueles que aparentavam não enfrentar tantas dificuldades. Quando perguntados
sobre como se sentiam quando não conseguiam resolver algum problema de Física, e o
que costumavam fazer nesta hora, os alunos que normalmente apresentavam dificuldades
durante as aulas relataram sentir algum tipo de frustração e um sentimento de raiva ou
irritação muito grande, que acabava desestimulando-os a continuar tentando resolver as
tarefas propostas pelo professor. Estes sentimentos, de certa forma, paralisavam o
processo de aprendizagem.

“Fico com muito ódio... muita raiva. Aí tento de novo, mas se não consigo deixo ‘quieto’ (...).”
(Bárbara).

“Sinto-me muito desmotivada quando não consigo resolver algum exercício, e isso [a
desmotivação] aumenta quando pergunto para algum colega e ele sabe resolver”(Ana).

“Sinto-me mal e arrependida por não ter prestado atenção na aula” (Luana).

“Sinto-me super mal, incompetente” (Kátia).

“Confesso que fico muito estressada, mesmo eu me controlando ao máximo, e então eu realmente
não consigo fazê-lo [o problema de Física]” (Cláudia).

“Eu fico com raiva, mas continuo tentando, se vejo que não consigo, desisto” (Bill).

“Eu me sinto incapaz e revoltada” (Fátima).

“Ou desisto de estudar, ou passo para outro [problema]” (Guilherme).

46
“(...) desisto e vou fazer outra coisa, isso acontece quase sempre” (Breno).

Em contrapartida, os alunos que aparentemente não apresentavam dificuldades


durante as aulas descreveram em suas respostas uma série de ações realizadas na
tentativa de transpor os obstáculos inerentes às tarefas propostas pelo professor,
mostrando uma persistência muito maior. Nestes casos não observamos uma paralisação
do processo de aprendizagem devido às dúvidas ou dificuldades surgidas.

“Quando não consigo fazer algum exercício, releio o enunciado, destacando dados e o que se
pretende saber, refazendo-o quantas vezes forem necessárias até obter o resultado certo,
recorrendo a cadernos, livros e até a calculadoras. Se mesmo assim não conseguir, falo com
meus colegas para que me ajudem ou com o professor” (Amanda).

“Levo as dúvidas para a aula e pergunto para os meus colegas ou para o professor. É errando
que se aprende” (Laura).

“Sinto-me falha... Como se houvesse falhado... Mas procuro na hora reavaliar meus cálculos e, a
dúvida persistindo, pergunto para o professor ou para colegas” (Maria).

“Sinto-me mal, mas mesmo assim continuo tentando resolve-lo lendo mais uma vez o que foi
passado no caderno, ou vendo algum exercício de base” (Vânia).

Outro fato que chamou nossa atenção foi o relato, por parte daqueles que
apresentavam dificuldades nas aulas, da falta de hábito em esclarecer suas dúvidas com o
professor. Ainda mais interessante foi constatar que boa parte dos estudantes declarou
não sanar suas dúvidas com o professor devido ao sentimento de vergonha decorrente
desta possibilidade.

“Às vezes eu me sinto envergonhada” (Luana).

“Tenho vergonha muitas vezes de perguntar as coisas” (Guilherme).

“Tenho muita vergonha, (...) acho que é porque antigamente os colegas faziam brincadeirinhas
sem graça... eu me sentia muito mal, e por isso não pergunto” (Nádia).

47
“Eu sinto vergonha, insegurança e medo da minha pergunta ser inútil” (Mônica).

“Não tenho o hábito de tirar as minhas dúvidas... às vezes fico com vergonha de falar algo
‘feio’” (Tânia).

“Não tenho o hábito de tirar dúvidas com o professor porque sempre tenho muitas dúvidas”
(Breno).

“Não, não tenho esse hábito. Não sei porque, talvez por preguiça” (Tony).

“Não, pois eu às vezes me sinto insegura” (Teresa).

“Não tenho o hábito não [de tirar dúvidas com o professor], porque... sabe que eu não sei !!!”
(Bárbara).

Já os alunos que apresentavam um melhor rendimento durante as aulas relataram


que sempre esclareciam suas dúvidas com o professor. E realmente eles o faziam.

“Tenho o hábito de tirar dúvidas com o professor porque o professor é um profissional que
entende muito sobre Física e que com certeza, quando eu tiver uma dúvida, irá tirá-la ou pelo
menos tentar resolvê-la” (Amanda).

“Sim, pois são com as dúvidas que aprendemos” (Laura).

“Normalmente tiro minhas dúvidas enquanto o professor explica, mas a dúvida persistindo, vou
atrás dele” (Maria).

“Sim, pois acho que ele pode me ajudar a resolver minhas dificuldades e na hora de estudar fica
mais fácil” (Vânia).

Estas constatações iniciais indicaram uma possível interpretação, a partir do


referencial winnicottiano, que nos ajudou a entender um pouco melhor os dados obtidos
até então, e a vislumbrar um caminho a seguir.
No próximo item faremos o relato de tal interpretação.

48
3.1.2 - As primeiras interpretações

A leitura dos dados obtidos, e sua análise através da ótica winnicottiana, nos
permitiu relacionar as tentativas que os alunos faziam para resolver os problemas
surgidos durante seus estudos com o conceito do brincar. Observamos que os alunos
com maior aproveitamento nas aulas eram justamente aqueles que possuíam um
repertório maior de ações visando a transposição de suas dificuldades, ou seja, eram
aqueles que dispunham de uma capacidade maior de brincar. Inclusive a procura pelo
professor poderia também ser entendida como uma das maneiras de se brincar, assim
como:

“reler o enunciado”, “recorrer a cadernos, livros e calculadoras”, “refazer quantas vezes forem
necessárias” (Amanda); “reavaliar (...) cálculos” (Maria); “[ler] mais uma vez o que foi
passado no caderno, ou [ver] algum exercício de base” (Vânia),

o que possibilitaria o entendimento do porquê de um grupo acabar procurando mais o


professor que outro.
Podemos argumentar que, quando o aluno enfrenta uma desilusão, ao perceber
que resolver as tarefas em casa é mais difícil do que ele imaginava ser, uma vez que o
entendimento das explicações e dos exemplos em aula o deixou com esta ilusão, ele pode
mudar o procedimento daquilo que está fazendo a fim de transpor a desilusão e conseguir
atingir seus objetivos, ou mudar o próprio objetivo, deixando as tarefas de lado e indo
fazer outras coisas. Esta fuga acaba sendo, de certa forma, uma defesa que o afasta dos
sentimentos de frustração e irritação relatados nos questionários. Entretanto, essa defesa
é momentânea, e deixa marcas implícitas que se traduzem em sentimentos de culpa por
não ter realizado a tarefa ou até por não ter entendido um determinado ponto da matéria
proposta. Isso parece desencadear um círculo vicioso que se repete mais e mais vezes. O
aluno foge da tarefa em casa, mas sente-se culpado quando encontra o professor,
evitando explorar a possibilidade de discutir suas dificuldades, o que torna mais difícil
ainda a resolução das próximas tarefas.
No entanto, a procura por novos procedimentos, o que caracterizaria o
“encontro/criação”, por parte dos alunos, de objetos transicionais para o brincar de
Winnicott, somente pode ser esperada dos que já possuem a capacidade de brincar e,
portanto, daqueles que sabem lidar com a díade ilusão-desilusão. Aqueles que não

49
possuem esta capacidade, pelo fato de ainda não a terem experimentado com a Física,
estariam fadados a fugir das dificuldades sempre que elas aparecerem; e elas sempre irão
aparecer.
Se pensarmos que o entendimento ocorrido nas aulas foi somente devido à
elaboração feita pelo professor, e que o aluno não teve participação, ou seja, não
necessitou usar sua capacidade de criação, podemos argumentar que ele não teve a
oportunidade de experimentar o brincar. Quando o aluno tenta realizar as tarefas em
casa, porém, é esta experimentação que o fará persistir, pois a criação nesta hora não
poderá ser prescindida (o que até pode acontecer durante a aula, sem que isto interfira no
entendimento desta).
Sabemos que o investimento que o aluno está disposto a fazer na superação das
suas dificuldades é fator fundamental para o seu desenvolvimento. Mas, de acordo com a
interpretação que estamos fazendo, este investimento parece estar relacionado com a
capacidade de brincar, que por sua vez é estimulada pelas “experiências de criação” já
pertencentes ao mundo interno dos alunos, ou, em outras palavras, ao uso de objetos
transicionais.
Devemos ainda ter em mente que outra situação é possível. Além daqueles que se
envolvem, e os que tentam ao menos se envolverem, apesar de não saberem que o
processo de aprendizagem é lento, o que acaba deixando-os desiludidos, pode existir
também aqueles que não desejam se envolver em algo que exija esforço da sua parte.
Alguns indivíduos, e isso é até comum na sociedade atual, estão mais acostumados a
terem experiências de consumo, rápidas e descartáveis, do que a terem experiências de
vivência, que para ocorrerem exigem envolvimento e tempo. Se estas pessoas não
percebem a possibilidade de se satisfazerem com experiências de vivência, é natural que
não se envolvam com atividades relativas a elas. Então, diante de tudo isso, e da
necessidade de se tentar reverter tal quadro, a pergunta natural que nos ocorreu foi: “o
que fazer para estimular a capacidade de brincar dos alunos?”
Acreditamos que ao professor restam, ao menos, duas possibilidades: (1) diminuir
a dificuldade das tarefas, para que a desilusão ocorra em níveis suportáveis ao aluno, até
que este vá adquirindo aos poucos a capacidade de brincar, e (2) desenvolver atividades
que permitam ao professor brincar junto com o aluno. Certamente a desvantagem da
primeira alternativa, principalmente em classes muito grandes, está no fato de cada aluno
possuir seu próprio limite. Uma tarefa nunca poderá ser adequada para todos, talvez até
nunca seja nem para a maioria.

50
“(...) é difícil prever totalmente o nível de dificuldade da tarefa, já que esta dependerá da
dinâmica de grupo e da estratégia coletiva criada, às vezes surpreendente” (PERRENOUD,
2000 - p.44).

Naturalmente a melhor solução seria organizar a sala de aula de tal forma que as
duas possibilidades pudessem ser contempladas.
Nesse sentido, tentamos elaborar algumas estratégias que possibilitassem ao
professor iniciar seus alunos no brincar, a princípio brincando junto com eles, esperando
que estas estratégias ajudassem a melhorar a relação dos alunos com o estudo da Física,
tornando-os mais aptos a enfrentarem as dificuldades das tarefas propostas para casa.
Além disso, achamos que seria interessante se o professor abrisse espaço em suas aulas
para a discussão de idéias a respeito do processo de aprendizagem, uma vez que alguns
alunos relataram não saber o que fazer para aprender Física. E na tentativa de uma maior
aproximação daqueles que diziam sentir vergonha de procurar o professor para esclarecer
suas dúvidas, consideramos que o professor deveria estimular a abertura de novos canais
de comunicação com seus alunos. Assim, todas as atividades aplicadas em 2005, já
relatadas no item 1.5, foram elaboradas na tentativa de cumprir com estas finalidades.

3.1.3 - A obtenção de novos dados e a elaboração das categorias de análise

Ao final de 2005, resolvemos aplicar novamente o questionário do começo do ano


para tentar averiguar possíveis mudanças no tipo de resposta dada pelos alunos.
Esperávamos que estas novas informações nos ajudassem a identificar eventuais
mudanças, ou não, na maneira com que os alunos se relacionavam com o estudo da
Física ou com o professor, e tentar averiguar se estas mudanças estavam de alguma
forma relacionadas com a atuação do professor. Em termos winnicottianos, pretendíamos
apurar se houve a ocorrência, por conta das atividades aplicadas, e por conta da atuação
do professor, de um aumento na capacidade de brincar dos alunos.
Para realizar esta análise, resolvemos inicialmente classificar os alunos em
categorias que pudessem levar em conta a freqüência dos estudos, o relato do surgimento
de dificuldades e a persistência declarada no enfrentamento de tais dificuldades. Se a
classificação fosse feita em dois momentos diferentes, no início e no final de 2005,
poderíamos usar eventuais mudanças de categorias para caracterizar um aumento ou não

51
na capacidade dos alunos em enfrentar os problemas surgidos do ato de estudar Física.
Acreditávamos que, se o aluno demonstrasse, no decorrer do ano, uma maior persistência
no enfrentamento das dificuldades poderíamos associar este fato ao aumento na
capacidade de brincar do mesmo. Consideramos também que a informação sobre hábitos
de estudo era importante por mostrar, pelo menos para aqueles que relatavam
dificuldades, a disposição em dedicar um determinado tempo semanal para estudar
Física. Alguém que somente estudasse na véspera das avaliações, e não conseguisse
atingir seus objetivos, ao resolver aumentar a freqüência dos estudos mostraria a intenção
de fazer algo para resolver seus problemas.
Foram elaboradas então as cinco categorias a seguir:

(1A) Alunos que estudam somente às vésperas das avaliações e declaram sentir
dificuldades para entender os conteúdos.
(1B) Alunos que estudam somente às vésperas das avaliações e declaram não sentir
dificuldades para entender os conteúdos.

(2A) Alunos que possuem hábitos regulares de estudos, declarando sentir dificuldades
para entender os conteúdos. Desistem facilmente diante das dificuldades
encontradas.
(2B) Alunos que possuem hábitos regulares de estudos, declarando sentir dificuldades
para entender os conteúdos, mas que não desistem facilmente diante das
dificuldades encontradas.
(2C) Alunos que possuem hábitos regulares de estudos e conseguem resolver suas
tarefas sem declarar muitas dificuldades.

Todavia, por conta das categorias terem sido formuladas após a aplicação do
questionário, apesar de inspiradas em suas respostas, quando iniciamos a tentativa de
categorização dos alunos percebemos que em alguns casos as informações obtidas não
permitiam inferir com razoável segurança se determinados alunos estariam em uma ou
em outra categoria. Mesmo com o auxílio dos dados obtidos com as auto-avaliações. Por
isso, a fim de sanar tal problema, resolvemos aplicar o questionário 2 (anexo 2), que
continha questões específicas relacionadas ao que estávamos procurando investigar. Este
questionário dava, inclusive, a chance do próprio aluno se colocar nas categorias que
havíamos criado, tanto no início quanto no final de 2005.

52
O segundo questionário foi aplicado logo na primeira semana de aula de 2006, e
do cruzamento dos dados obtidos pudemos montar um quadro mostrando as mudanças,
ou não, de categorias que ocorreram durante o ano de 2005 com 30 alunos20. E as
mudanças relatadas pelos próprios alunos foram, em vários casos, corroboradas pelas
informações que já dispúnhamos do questionário anterior, aplicado, como já vimos, em
dois momentos diferentes.

3.1.4 - Classificação dos alunos feita de acordo com as categorias

Abaixo selecionamos as principais informações que nos permitiram classificar


cada aluno de acordo com as categorias que havíamos elaborado. As letras ou números
grifados representam dados obtidos do segundo questionário (anexo 2), aplicado em
janeiro de 2006, onde os alunos puderam escolher em qual categoria achavam se
encontrar nos dois momentos analisados. Optamos por usar esta informação quando os
dados obtidos do questionário 1 não eram suficientemente conclusivos.

Tony
fev. 2005 1A “Normalmente eu estudava antes do dia da prova”.
“[Meu] método [de estudo] tem um problema, que é estudar na véspera".
nov. 2005 1B “Apesar de não estudar muito eu estava entendendo a matéria”.
“A maior de todas [as dificuldades] é a falta de vontade”.

Caio
“Meu desempenho não foi tão bom porque eu me empenhei pouco, não levei
fev. 2005 1A
muito a sério”.
nov. 2005 1B ----- x -----

Rodolfo
“Não gosto de estudar, (...) meu desempenho no ano passado [2004] foi
fev. 2005 1A
razoável, já que não estudava e não fazia os deveres”.
“Eu não costumava estudar, apenas no dia anterior à prova refazia os
nov. 2005 1B
exercícios”.

20
Na primeira aplicação do questionário 1, a turma em questão possuía 37 alunos. Destes, somente 29
entregaram-no respondido. No momento da segunda aplicação do questionário 1 a classe possuía 36
alunos, dos quais 31 entregaram-no respondido. Já o questionário 2 foi respondido por 32 dos 34 alunos
presentes.

53
“Este ano meu desempenho melhorou, passei a entender um pouco mais
sobre Física, não a decorar a matéria, mas ‘a saber’ o conteúdo, que vale
mais que pontos na média”.
“No começo do ano [2005] eu desistia com mais facilidade, mas no segundo
jan. 2006 ---
e no terceiro trimestre eu fazia o possível para resolver os problemas (...)”.

Guilherme
“Só estudo Física quando tem prova ou lição. Uso as anotações do caderno,
os exercícios que tenho nele e nas apostilas, e pego outros livros que tenho
em casa. [Mas], apesar de fazer tudo isso, (...) faço tudo sem vontade, e
sempre tenho preguiça de estudar”.
“Estudo bastante para aprender, mas parece que a matéria não fica na
fev. 2005 1A
minha cabeça”.
“Apesar de ter passado de ano, eu quase não melhorava [provavelmente se
referindo ao desempenho nas avaliações]. O responsável de minha piora foi
minha preguiça”.
“Eu só estudei no dia anterior à prova e no próprio dia da prova”
“Só estudava um dia antes da prova, ou se tivesse trabalho ou lição de
casa”.
“Só estudava um dia antes da prova (...). Meu método [de estudo] até que
nov. 2005 1B
tem dado certo, mas não é o recomendado”.
“Esse ano eu fui melhor em Física do que no ano passado, esse ano os
assuntos eram mais fáceis”.

Paula
fev. 2005 1A ----- x -----
nov. 2005 2A ----- x -----
“Eu acho que insistia menos [no começo de 2005] para resolver algum
jan. 2006 ---
problema quando sentia dificuldades”.

Teresa
fev. 2005 1A ----- x -----
“[Estudo Física] pelo menos uma vez por semana, e quando tinha prova
mais vezes”.
nov. 2005 2A
“Eu tenho vontade de aprender Física, mas às vezes eu não consigo fazer
alguma coisa e acabo desistindo”.

54
Bárbara
“Quando eu tenho prova estudo a tarde inteira, às vezes no dia anterior da
prova ou, às vezes, bem antes (dependendo da minha dificuldade)”.
“(...) não sei porque Física não entra na minha cabeça. Tento... tento, mas
fev. 2005 1A
não sei o que acontece”.
“(...) sinceramente não sei mais o que fazer para aprender Física, (...) me
empenho sim, mas o que adianta se não consigo entender”.
“Eu antes não costumava pegar os livros, apenas antes das provas. Mas
depois do incentivo dos plantões comecei a ler os livros quando podia. Não
tinha um dia certo, ou hora certa”.
nov. 2005 2B
“Aprendi a me dedicar muito mais e a me organizar na hora de estudar”.
“Estou adorando ficar de tarde [nos plantões], está sendo muito bom pra
mim. (...) Estou aprendendo muito mais, e me esforçando mais”.
jan. 2006 --- “Nos plantões eu sempre tiro dúvidas, me sinto mais tranqüila depois”.

Nádia
“Eu costumo pegar para estudar física no máximo duas horas por semana.
(...) Esse foi um novo método que eu adotei esse ano [2005] ”.
fev. 2005 1A
“Eu sei que seria capaz de melhorar, talvez isso tenha ocorrido pela falta de
(...) vontade de estudar que eu tinha no ano passado [2004]”.
nov. 2005 2B ----- x -----
“No começo do ano [2005] eu não era dedicada o bastante. [Hoje], quando
jan. 2006 ---
aparece alguma dificuldade costumo me dedicar bastante”.

Joana
“Eu estudei um dia antes da prova e fiz alguns dos exercícios que você
fev. 2005 1A mandou pra casa. Não li o livro texto, acho muito complicado pra falar a
verdade. Também não resolvi muitos exercícios, vários não consegui fazer”.
“Geralmente eu estudo no plantão e uns dias antes da prova, no máximo
umas duas horas. Como toda a semana eu vou ao plantão acabo ficando
sem muitas dúvidas, afinal nós fazemos todos os exercícios e tiramos
nov. 2005 2B dúvidas de todos com o auxilio do professor”.
“Como eu freqüento o plantão estudo semanalmente, assim não fica
‘puxado’. Quando chega a prova já estudei tudo, não tem um monte de
matéria, que resultaria em um monte de dúvidas, que não teriam tempo de

55
serem tiradas”.
“Antes eu desistia na hora, não tentava mais fazer nada. Mas hoje não, por
causa do plantão tenho a quem perguntar, posso perguntar tantos os meus
amigos quanto ao professor”.
“Gosto de estudar Física com outras pessoas. Sozinha geralmente me
jan. 2006 ---
‘enrolo’ toda”.

Cláudia
“Estudo elas [as exatas] quando o professor marca a prova”.
fev. 2005 1A “Mas em casa, sozinha, eu tenho que pensar muito para chegar aonde você
[professor] chegou na aula”.
“Eu pego nos livros de física uma vez por semana, durante mais ou menos
duas horas”.
nov. 2005 2C
“Confesso que não me esforcei tanto este ano, por causa de outras matérias
que estou com muita dificuldade em aprender”.

Fátima
“Como não gosto muito da matéria, acabo não estudando como deveria e
acabo ficando meio desleixada. (...) [Estudo] só uma ou duas vezes por
semana, e (...) menos de vinte minutos. (...) Meu esforço não é lá grande
coisa, mas também não é algo ‘lastimável’. Eu sei que poderia me esforçar
mais, mas falta vontade”.
fev. 2005 1B “(...) eu não diria que ele é totalmente eficiente [seu método de estudo], pois
entendo a matéria,(...) mas fico insegura sobre o quanto eu realmente sei.
Esqueço as coisas com facilidade quando fico nervosa, e só vou me lembrar
quando começo a ficar calma”.
“Eu dei uma revisada na matéria dois dias antes e depois dei uma estudada
um dia antes”.
“[Estudo] no máximo duas vezes por semana, durante uma hora e meia,
quase duas horas”.
“Por mais que eu tente entender parece que pior fica”.
nov. 2005 2A
“O fato de não me interessar muito pela matéria” (segundo ela, disso
decorre as dificuldades e a falta de persistência).
“A minha falta de interesse pela matéria [seria o responsável pela piora]” .

56
Tânia
fev. 2005 1B ----- x -----
nov. 2005 2B ----- x -----
“Quando eu gosto da matéria eu insisto [em superar as dificuldades].
jan. 2006 ---
Quando não gosto logo desisto”.

Julia
fev. 2005 1B ----- x -----
“Estudo Física todos os dias depois das aulas. Refaço os exercícios, leio o
livro texto durante uma hora, mas quando é marcada a avaliação começo a
estudar com mais freqüência (3 vezes por semana)”.
“Acho [meu método de estudo eficiente] porque eu entendo a matéria
nov. 2005 2C
melhor quando faço o resumo com as minhas palavras, e me sinto segura
para fazer a prova”.
“Sinto que atualmente não tenho muita dificuldade em compreender a
Física”.

Ana
“(...) por mais que eu me esforçasse era dificílimo para eu entender a
matéria, eu estudava, mas não tinha segurança na matéria”.
“(...) a Física é difícil, não adianta estudar, eu nunca vou conseguir
entendê-la”.
fev. 2005 2A
“(...) quando chego em casa revejo a matéria que foi dada e às vezes tento
refazer alguns exercícios, e quando julgo necessário faço um resumo da
matéria. Vejo também a matéria que terei no dia seguinte, senão fico
perdida na hora em que o professor introduzir um novo assunto”.
“[Estudo] às terças de tarde, quando vou dar uma olhada no que vou ter no
dia seguinte, e às quartas após a aula”.
“Esse ano me surpreendi comigo mesma. De repente me vi bastante
nov. 2005 2B determinada e persistente, acho que melhorei [a persistência] em relação ao
ano passado [2004]”.
“Agora não, se não sei fazer algo, aí que quero mesmo fazer. Procuro
pesquisar em outros lugares (...), nunca desistir”.

57
Raíssa
“Estudo em média duas horas e meia por dia. Faço as tarefas de cada
matéria do dia, de segunda a sexta, e quando tem prova estudo um dia antes
para a matéria. (...) Esse método é eficiente”.
“Agora peguei o hábito de fazer todas as tarefas (...) no dia em que o
professor dá a matéria”.
fev. 2005 2A “O fato de ter bolsa na escola me cobra bastante, [mas] tenho uma
disciplina desde cedo, em estudar e tirar notas boas, [e isso] facilita minha
vida escolar. (...) Tenho como meta fazer uma faculdade pública, e
minha área está muito relacionada com exatas. [Porém], estudar não é uma
das coisas que eu mais gosto de fazer. (...) Estudo em média duas horas e
meia por dia, faço as tarefas da matéria dada no dia”.
“Comecei a freqüentar [os plantões] na metade do ano e percebi a mudança
em relação à matéria. A facilidade é bem maior agora”.
nov. 2005 2C
“Estudo sempre no dia [da aula dada]. Faço as tarefas (gasto em média três
horas estudando), e quando tem prova fico até eu saber bem a matéria”.
jan. 2006 --- “[Eu] odiava estudar Física, aprendi a gostar no ano passado [2005]”.

Mônica
fev. 2005 1B “Eu estudo física somente quando tem provas, uns 3 dias antes”.
nov. 2005 1A “Sinceramente, só [estudava Física] quando tinha prova”.
jan. 2006 --- “Na maioria das vezes eu sinto muitas dificuldades”.

Luana
“Eu costumo pegar os livros de Física uma vez por semana e durante umas
quatro horas”.
“Eu estudava, mas não conseguia ter resultados, não conseguia fazer um
exercício. (...) Tentava todas as possibilidades possíveis de resolver, (...)
fev. 2005 2B
pedia ajuda a alguém, mas mesmo assim não ajudava muito”.
“Eu acho física uma matéria muito difícil de entender e cheia de detalhes.
Gostaria que fosse mais fácil (...). Eu me empenho (...), mas não entendo
nada”.
“Eu estudava [Física] duas vezes por semana, por uma hora e meia. Agora,
se a semana estava cheia de provas eu nem estudava muito. Mas se na
nov. 2005 2A
semana tinha prova de Física eu estudava muito. Ficava até tarde
estudando”.

58
Otávio
“Depende da necessidade eu estudo todo dia ou nenhum dia na semana”.
fev. 2005 1B “Acho que se eu me esforçar mais com certeza [meus estudos seriam
eficientes]”.
“Só estudo quando tem prova. Se eu sei pouco eu estudo bastante, se eu
sei algo da matéria eu estudo pouco”.
nov. 2005 1B
“Meu esforço é grande quando estou precisando de nota e pequeno quando
não estou precisando”.

Mário
“[Reservo] muito pouco [tempo para estudar Física]”.
fev. 2005 1B “[Meus métodos de estudos são eficientes], pois obtive bons resultados ano
passado [2004]”.
“Eu estudava Física durante o plantão de quarta feira e um dia antes da
prova fazia revisão”.
nov. 2005 1B
“Os plantões foram muito eficientes, pois quando tinha prova não precisava
estudar muito, apenas relembrar”.

Noel
fev. 2005 1B ----- x -----
“Não gosto muito de estudar. Sinceramente, quase não dedico nenhum
nov. 2005 1B
tempo a elas [as disciplinas]”.

Breno
“(...) não me empenho muito em Física porque não vejo utilidade em ficar
fazendo contas”.
“(...) só estudo quando tem prova, pois acho muito inútil ficar fazendo conta
fev. 2005 1B
sem sentido e sem uma finalidade, um objetivo”.
“Quando não consigo fazer um exercício desisto e vou fazer outra coisa,
isso acontece quase sempre”.
nov. 2005 1B “Somente [estudo] quando tem prova”.

Bill
“Não gosto de estudar, (...) estudo alguns dias antes da prova uma hora por
fev. 2005 1B
dia”.

59
“(...) no decorrer do ano comecei a me esforçar um pouco mais e melhorei.
Passei sem dificuldades”.
“Quando gosto me sinto capaz e fazer qualquer coisa”.
“Raramente eu estudo Física, no máximo faço alguns exercícios e mais
nada”.
nov. 2005 1B
“Meu desempenho [em 2005] foi com certeza melhor do que nos outros
anos. Não sei o motivo. Acho que ‘me liguei’ mais nas aulas e entendi
melhor a matéria”.
“No começo do ano passado [2005] eu era menos persistente, e me
jan. 2006 ---
empenhava menos”.

Micaela
“Sinceramente, [estudo] só quando tem prova”.
“Tive dificuldades em alguns [exercícios], mas consegui esclarecer minhas
dúvidas, e consegui fazê-los sozinha depois”.
fev. 2005 1B “Eu resolvo os exercícios do livro (caderno de exercícios). E procuro ler o
livro texto. [Acho este método eficiente], pois quando eu fazia isso ia bem”.
“Sempre que tenho dúvidas procuro tirá-las. Assim eu me esforço para
entender como resolver os exercícios”.
“Pra falar a verdade dois ou três dias antes da prova eu estudava umas 3
nov. 2005 1B horas. Na véspera umas 5 horas”.
“Poderia me empenhar mais; falta vontade”.

Kátia
“Física não é para mim, nunca vou aprender isso”, “não consigo entender,
por mais que eu me esforce”, “não adianta, eu sou ‘burrinha’ mesmo”.
“(...) não tenho essa de me dedicar mais a uma do que a outra, todos os dias
estudo a matéria dada no dia, (...) de uma hora a uma hora e meia, (...) e de
sábado às vezes. (...) Mudei meu método de estudo no terceiro trimestre
fev. 2005 2B
[2004]”.
“Em primeiro lugar o responsável pela minha melhora foi eu mesma. Em
segundo lugar o professor, que me ajudou e deu apoio moral. E em terceiro
lugar meus pais que diziam que confiavam em mim e que eu iria conseguir,
era só um pouco mais de esforço que eu conseguiria, e foi o que aconteceu”.
“Costumo estudar [Física] a tarde, quase toda quarta”.
nov. 2005 2B
“O meu desempenho no ano passado [2004] em Física foi péssimo, eu não

60
estava ‘nem aí’, pensava: ‘já que não gosto da matéria, não vou estudar’.
Porém, senti muita diferença nesse ano [2005]”.
“Acho que sem a ajuda de alguém não consigo entender bem a matéria e os
exercícios”.
“Pensei muito sobre os conselhos dados [pelo professor] no decorrer desses
dois anos, porém, às vezes tento desistir, mas logo lembro de que esses
conselhos vem me ajudando bastante, e não só na escola, mas também na
minha vida pessoal”.
“Na maioria das vezes eu insisto para resolver algum problema quando
jan. 2006 --- sinto dificuldades. [No começo de 2005] eu iria dizer que desistiria
facilmente”.

Amanda
“(...) pego três vezes por semana os livros e o caderno de Física para
estudar, me dedicando umas duas horas no total”.
fev. 2005 2B “Por ser uma matéria difícil e complicada presto muita atenção às aulas,
tiro muitas dúvidas com o professor e faço vários exercícios para testar se
realmente aprendi a matéria”.
“Como se trata de uma matéria difícil e complexa (não sou boa em exatas!),
me dedico mais tempo a ela do que as que tenho mais facilidade. Costumo
nov. 2005 2B dedicar cerca de duas a três horas no total, duas vezes por semana”.
“Sou persistente, e enquanto não aprender a matéria e tirar minhas dúvidas
não desisto”.

Wagner
“Estudo Física duas vezes por semana, pois acho que é uma matéria
fev. 2005 2B
importante”.
nov. 2005 2B ----- x -----
“No início do ano passado eu insistia menos na superação das
jan. 2006 ---
dificuldades”.

Chico
fev. 2005 2B ----- x -----
nov. 2005 2B “Eu sempre procuro fazer o melhor nos estudos”.
“No início do ano passado eu insistia menos na superação das
jan. 2006 ---
dificuldades”.

61
Isabel
“Costumo estudar física quando chego em casa, nos dias de aula (...)”.
“Acho meu método de estudo eficiente”.
fev. 2005 2C “Meu desempenho no ano passado [2004] não foi dos melhores. Mas me
esforcei para entender e superar minhas dificuldades, e acho que no fim do
ano melhorou”.
“[Estudo Física] umas duas vezes por semana, e quando pego, costumo
nov. 2005 2C estudar a tarde toda”.
“Com este método tenho obtido bons resultados”.

Laura
“(...) gosto muito da matéria [Física], então fica até difícil de falar. Eu
gostei muito das minhas notas, acho que batalhei muito para alcançá-las“.
fev. 2005 2C
“Com certeza pelo menos uma vez na semana [estudo Física]. Têm semanas
que estudo mais”.
“Pelo menos uma vez por semana, para fazer os exercícios”.
nov. 2005 2C “A Laura tem me ajudado muito nesta matéria, ela gosta de física e tem
facilidade pra resolver [os exercícios]” (Raíssa).

Maria
“Eu gosto muito de (...) estudar, (...) e estudo ‘bem’ (tanto que os resultados
colhidos são bons)”.
fev. 2005 2C “Vou bem nas avaliações e acabo por não me ‘matar’, como meus colegas,
para compreender a matéria, o que faz com que continue gostando de
estudá-la”.
“Devo meu [bom] desempenho à quantidade de aulas em que eu fiz
nov. 2005 2C exaustivamente as tarefas do caderno de exercícios”.
“Não acho a matéria difícil e raramente tenho muitas dúvidas”.

3.1.5 - Análise das migrações de categorias

Depois de identificadas as mudanças, ou não, de categorias tentamos organizá-las


de tal forma que pudéssemos perceber quais poderiam representar um aumento, por parte
dos alunos, na capacidade de enfrentar os problemas surgidos do estudo da Física, ou na

62
aquisição de hábitos regulares de estudos. Também procuramos organizar os dados que
faziam referência a dificuldades enfrentadas durante os estudos.
O quadro abaixo mostra as migrações de categorias a que estamos nos referindo.

CATEGORIAS
ALUNO(S) OBSERVAÇÕES
(início 2005  final 2005)
- Continuaram declarando estudar às
Tony, Caio, vésperas das avaliações.
1A  1B Rodolfo e - Não declararam mais estarem enfrentando
Guilherme dificuldades consideráveis no estudo da
Física.
- Declaram terem adquirido o hábito
semanal de estudo.
- Continuaram enfrentando dificuldades
1A  2A Paula e Teresa
com o estudo da Física.
- Desistiam facilmente diante das
dificuldades encontradas.
- Declaram terem adquirido o hábito
semanal de estudo.
Bárbara, Nádia - Continuaram enfrentando dificuldades
1A  2B
e Joana com o estudo da Física.
- Não desistiam facilmente diante das
dificuldades encontradas.

63
- Declarou ter adquirido o hábito semanal de
estudo.
1A  2C Cláudia - Não declarou mais estar enfrentando
dificuldades consideráveis no estudo da
Física.
- Declarou ter adquirido o hábito semanal de
estudo.
- Começou a enfrentar dificuldades com o
1B  2A Fátima
estudo da Física.
- Desistia facilmente diante das dificuldades
encontradas.
- Declarou ter adquirido o hábito semanal de
estudo.
- Começou a enfrentar dificuldades com o
1B  2B Tânia
estudo da Física.
- Não desistia facilmente diante das
dificuldades encontradas.
- Declarou ter adquirido o hábito semanal de
estudo.
1B  2C Julia - Continuou declarando não estar
enfrentando dificuldades consideráveis no
estudo da Física.
- Manteve o hábito semanal de estudo.
- Continuou enfrentando dificuldades com o
2A  2B Ana estudo da Física.
- Passou a não desistir facilmente diante das
dificuldades encontradas.
- Manteve o hábito semanal de estudo.
2A  2C Raíssa - Passou a não mais declarar dificuldades
nos estudos.

Quadro 3.1 - Mudanças de categorias que poderiam indicar algum “ganho” para o aluno em
2005.

64
Analisando o quadro anterior percebemos que quinze alunos obtiveram algum
tipo de “ganho” em relação ao estudo da Física, e se observarmos isoladamente cada
característica investigada notaremos que:

 3 alunos relataram terem adquirido ao menos o hábito de estudar Física

(migrações das categorias 1A ou 1B para a categoria 2A);


 7 alunos relataram não sentirem mais tantas dificuldades com o estudo da

Física (migrações 1A1B , 1A2C e 2A2C);


 5 alunos declaram terem aumentado a persistência com que procuravam

superar as dificuldades encontradas nos estudos (migrações 1A2B , 1B2B


e 2A2B)

Por outro lado, constatamos que alguns alunos demonstraram terem diminuído
sua capacidade de persistir diante das dificuldades, ou declaram estarem sentindo mais
dificuldades do que anteriormente sentiam. Foram os casos das alunas Mônica e Luana,
como pode ser visto no quadro 3.2.

CATEGORIAS
ALUNOS OBSERVAÇÕES
(início 2005  final 2005)
- Continuou declarando estudar às vésperas
das avaliações.
1B  1A Mônica
- Começou a enfrentar dificuldades com o
estudo da Física.
- Manteve o hábito semanal de estudo.
2B  2A Luana - Não manteve a persistência diante das
dificuldades encontradas.

Quadro 3.2 - Situações onde as mudanças indicaram um aumento nas dificuldades ou uma
diminuição na persistência em enfrentar os problemas decorrentes dos estudos em 2005.

Uma outra constatação foi a de que treze alunos não demonstraram terem mudado
de categoria durante o ano (permaneceram nas categorias 1B, 2B e 2C), como podemos
observar no quadro 3.3.

65
CATEGORIAS
ALUNOS OBSERVAÇÕES
(início 2005  final 2005)
- Continuaram declarando estudar às
Otávio, Mário, vésperas das avaliações.
1B  1B Noel, Breno, - Continuaram declarando não estarem
Bill e Micaela enfrentando dificuldades consideráveis no
estudo da Física.
- Mantiveram o hábito semanal de estudo.
Kátia,
- Continuaram enfrentando dificuldades
Amanda,
2B  2B com o estudo da Física.
Wagner e
- Mantiveram a persistência diante das
Chico
dificuldades encontradas.
- Mantiveram o hábito semanal de estudo.
Isabel, Laura e - Continuaram declarando não estarem
2C  2C
Maria enfrentando dificuldades consideráveis no
estudo da Física.

Quadro 3.3 - Situações onde não ocorreram mudanças de categorias em 2005.

Destes treze alunos, seis declararam estudar somente para as avaliações,


conseguindo com isso as notas mínimas para a aprovação (categoria 1B). Para eles,
aparentemente, estudar Física não se constituía como um problema que trouxesse
sentimentos capazes de paralisar o processo de aprendizagem.

“Só estudo quando tem prova, se eu sei pouco eu estudo bastante e se eu sei algo da matéria eu
estudo pouco. (...) Costumo ficar muito tranqüilo, dificuldades como essas [relacionadas aos estudos]
não me causam desespero, pois sei que é só esperar um dia e ir tirar a dúvida com o professor”
(Otávio).

“Sinceramente, [estudo] só quando tem prova. (...) Tive dificuldades em alguns [exercícios], mas
consegui esclarecer minhas dúvidas, e consegui fazê-los sozinha depois” (Micaela).

“[Reservo] muito pouco [tempo para estudar Física]. (...) [Meus métodos de estudos são eficientes],
pois obtive bons resultados ano passado [2004]” (Mário).

66
“Não gosto de estudar, (...) estudo alguns dias antes da prova uma hora por dia. (...) No decorrer do
ano comecei a me esforçar um pouco mais e melhorei. Passei sem dificuldades” (Bill).

Já para os outros sete alunos (categorias 2B e 2C), que normalmente estavam


entre os que conseguiam as maiores notas da classe, com exceção da aluna Kátia, suas
motivações para o estudo faziam com que as dificuldades enfrentadas não chegassem a
causar problemas que interferissem na disposição em continuar estudando, como
podemos verificar pelas frases abaixo.

“Eu estudo Física para aprender! É a única coisa que me faz querer ir tanto pra escola e me faz ler
tantos livros. Eu PRECISO aprender. Acho que quando perdemos a capacidade de aprender
morremos; o cérebro precisa de exercício, e estudar é o melhor!” (Maria).

“O que me leva a estudar Física é aprender melhor o funcionamento de certas coisas, eu gosto dessa
matéria. Acho interessante estudar para compreender melhor e não apenas ficar decorando
fórmulas” (Laura).

“Estudo por obrigação, (...) para poder ser alguém na vida” (Wagner).

“Minha família, meu namorado, meus amigos e o professor com certeza me incentivaram muito a
aprender Física, sendo que o que mais me ajudou foi meu objetivo de ser uma boa aluna e superar
minhas dificuldades (já que na 8ª série eu não sabia praticamente nada de Física, que era para mim
uma matéria extremamente complicada) (...)” (Amanda).

“As dificuldades de certa forma ajudam, pois é com elas que aprendemos não só a resolver os
problemas, mas também a lidar com as situações. A ter persistência para poder ‘ultrapassá-las’”
(Isabel).

De maneira geral, acreditamos poder concluir que os alunos que não mudaram de
categoria possuíam uma maneira de lidar com os estudos que acabava satisfazendo, de
certa forma, suas necessidades ou desejos com relação ao estudo da Física.
Assim, começamos a considerar o fato dos alunos que não mudaram de categoria,
com exceção da aluna Kátia, possuírem a capacidade de brincar no estudo da Física
(categorias 2B e 2C), ou não considerarem este estudo como um problema em si, que
pudesse trazer algum tipo de sentimento de frustração muito grande (categoria 1B). Por
outro lado, percebemos que cinco alunos declararam terem aumentado sua capacidade de

67
persistir diante das dificuldades surgidas do estudo, o que poderia denotar um aumento
na sua capacidade de brincar, e nove alunos disseram que aumentaram a freqüência dos
estudos, indicando uma intenção de superar os problemas enfrentados com a matéria.
Porém, com relação aos alunos que aparentemente obtiveram algum “ganho” em
2005, uma característica em especial chamou nossa atenção. Vários alunos que
afirmaram terem aumentado sua dedicação ao estudo da Física, através dos questionários
ou verbalmente para o professor continuaram relatando estarem sentindo dificuldades
com a matéria. Foram os casos das alunas Paula, Teresa, Bárbara, Nádia, Joana, Fátima,
Tânia e Ana. Desta constatação surgiu um interesse natural em procurar entender quais
seriam as possíveis causas para este fato, e para isso decidimos aplicar, em maio de 2006,
um terceiro questionário (anexo 3) contendo perguntas específicas relacionadas aos
motivos pelos quais cada um estudava Física, às dificuldades encontradas, às maneiras
usadas para resolver tais dificuldades e aos sentimentos advindos do enfrentamento
destas dificuldades. Este questionário, enviado por e-mail para todos os alunos da classe,
foi respondido por apenas 13 alunos, dos quais acabamos selecionando a aluna Ana para
iniciar uma análise mais detalhada. Ana era uma das alunas que havia relatado enfrentar
dificuldades com o estudo da Física e que declarava insistentemente ao professor que,
apesar dos seus esforços, não conseguia obter um desempenho satisfatório.
No decorrer desta nova investigação, a medida em que as análises evoluíam,
ainda achamos necessário pedir que Ana respondesse, em agosto de 2006, a um outro
questionário (anexo 4), e efetuar a coleta de alguns depoimentos da aluna para que
pudéssemos obter algumas informações que considerávamos importantes para a
pesquisa. A análise completa que fizemos de todas as informações obtidas será relatada
no próximo capítulo.

68
CAPÍTULO 4

“Bebeu palavras preciosas, seu


espírito cresceu forte. Não mais
sentiu que era pobre e sua estrutura
pó”

Emily Dickinson

69
4 - ANÁLISE DOS DADOS

Nos próximos itens faremos uma análise detalhada dos dados obtidos para a aluna
Ana, e usaremos a teoria do amadurecimento de Winnicott na tentativa de compreender
tais dados.

4.1 - A dependência absoluta na primeira série do ensino médio - 2004

Ana é uma aluna que gosta de escrever, ler, cozinhar, e que sente satisfação em
ajudar outras pessoas. Dentre as disciplinas do ensino médio tem preferência por
Química e Biologia, e encontra dificuldades com Matemática e Física.
Em meados de 2006, já cursando a terceira série do ensino médio, Ana declarou:
“Não gosto de física desde o primeiro ano [ensino médio], onde encontrei obstáculos
que até hoje sei que não superei”. Assim, achamos que seria importante inicialmente
analisar alguns fatos ocorridos quando ela ainda cursava a oitava série do ensino
fundamental e a primeira série do ensino médio. É o que faremos a seguir.
Em conversas com o professor, Ana nunca declarou qualquer sentimento negativo
com relação aos três meses em que teve aulas de Física na oitava série do ensino
fundamental. Estes três meses foram seu primeiro contato com a Física. No entanto,
acreditamos que uma reflexão a respeito das avaliações a que era submetida servirá para
entendermos o que ocorreu com Ana na primeira série do ensino médio.
As avaliações na oitava série possuíam uma característica em particular: suas
questões eram, segundo Ana, idênticas às questões de uma lista de exercícios discutida
na véspera das mesmas. Ana comentou que não sentia na época nenhuma necessidade de
estudar Física em casa, uma vez que já sabia com antecedência o que seria exigido na
prova. Desta afirmação podemos deduzir que Ana estudava para a obtenção de notas, e
como ela não encontrava dificuldade para consegui-las, também não sentia a necessidade
de efetivamente estudar Física.
Se, por um lado, a Física não era para ela uma ameaça, o que pode ser benéfico
num primeiro contato com a disciplina, para que não se desenvolvam defesas que possam
obstruir um futuro aprendizado, por outro, a metodologia citada parece ter contribuído
para a permanência de Ana num estado de onipotência com relação ao próprio
aprendizado. Este método de avaliação, para o caso de Ana, não possibilitou que ela
tivesse um contato maior com as dificuldades relativas ao aprendizado da Física, o que

70
não estimulou o início da elaboração de mecanismos que pudessem fazer frente a estas
dificuldades.
Mas não estamos aqui afirmando que isso deveria ter sido feito naquela época.
Estamos apenas narrando um fato para que depois possamos entender melhor o tipo de
relação desenvolvida por Ana com o aprendizado da Física.
No ensino médio, diante da mudança repentina de métodos e de vários
professores, inclusive o de Física, Ana se viu num ambiente bastante diferente daquele ao
qual estava acostumada sem, segundo ela, possuir maturidade para tamanha mudança.

“Os conteúdos aumentaram e se tornaram mais complexos também, a cobrança foi maior. Eu
acho que não era madura ainda, não sabia administrar meu tempo e não insistia quando
encontrava alguma dificuldade” (Ana - agosto de 2006).

Tudo parece ter acontecido numa velocidade maior do que a possível de ser
assimilada por Ana.

“(...) o desenvolvimento, especialmente no início, depende de um suprimento ambiental


satisfatório, (...) que facilita as várias tendências individuais herdadas, de tal forma que o
desenvolvimento ocorre de acordo com elas” (WINNICOTT, 1996 - p.18).

Uma destas mudanças, considerada importante por nós se levarmos em conta o


fato de Ana estudar objetivando a obtenção de notas, deu-se exatamente com as
avaliações a que ela passou a ser submetida. Estas avaliações começaram a exigir de Ana
um entendimento da Física maior do que o exigido no ano anterior. Sabemos que para a
simples reprodução de uma questão não é necessário o entendimento dos fenômenos
físicos envolvidos. Um aluno pode tirar uma excelente nota em uma avaliação sem ter
realmente aprendido Física. Alguns alunos “estudam” para lembrar da resolução de
certas questões, sem a preocupação de entender os motivos que fizeram a questão ser
resolvida de determinada maneira e não de outra. As avaliações na primeira série do
ensino médio exigiam mais do que a reprodução de questões trabalhadas em aula ou nas
tarefas de casa. O professor pedia sempre que os alunos justificassem seus raciocínios e
detalhassem suas resoluções, e formulava questões que não eram necessariamente
idênticas às trabalhadas durante as aulas. Este fato acabou trazendo algumas dificuldades
iniciais para aqueles alunos que possuíam o hábito de memorizar a resolução de algumas

71
questões imaginando que estas seriam cobradas na prova. Ana parecia ser uma destas
alunas.
De fato, durante as correções das avaliações feitas por Ana o professor constatou
que suas resoluções continham tentativas semelhantes àquelas vistas em aula, ou em
exercícios das tarefas, como se Ana tentasse fazê-las “servirem” aos enunciados
propostos nas avaliações. “Tive a impressão que Ana decorou alguns exercícios, uma vez
que resolveu os da prova de forma semelhante aos do caderno, sem saber o que estava
fazendo” (professor). Confirmando esta suposição temos um trecho do questionário 1,
onde Ana afirmou: “Numa prova os exercícios não são iguais. Sei fazer os exercícios que
já foram resolvidos, acho que se eu fizer mais exercícios vai ajudar”. Apesar de ela
perceber que as questões não eram exatamente iguais aos exercícios trabalhados em aula,
ela parecia acreditar que isso ocorria por ela não ter resolvido exercícios suficientes, e
que se resolvesse uma quantidade maior, acabaria fazendo um que fosse bastante
parecido ao da avaliação.
Estas avaliações, bem como os resultados precários obtidos começaram a deixar
Ana diante de situações que pareciam fugir ao seu controle, o que a fez intensificar seus
estudos. Ana passou então a estudar e se esforçar para conseguir entender a matéria dada
em aula. Porém, continuou não obtendo os resultados esperados. Sobre esta época Ana
fez, no início de 2005, o seguinte comentário: “(...) por mais que eu me esforçasse era
dificílimo para eu entender a matéria, eu estudava, mas não tinha segurança na
matéria”.
Até aqui, acreditamos que Ana estava pela primeira vez entrando em contato com
as dificuldades relativas ao aprendizado da Física, sem saber ao certo como enfrentá-las e
o que fazer para superá-las. Nos três ou quatro primeiros meses de 2004, Ana ficou
entregue à própria sorte, sem estar preparada para lidar com as desilusões decorrentes das
suas tentativas frustradas de tirar uma nota boa nas provas de Física. Se as notas eram
para ela a única referência para a medição do quanto os seus esforços estavam
contribuindo para que ela superasse suas dificuldades, elas não indicavam progresso
algum. Acreditamos que ela passou de um estado de ilusão, que apontava, na oitava
série, para um total controle sobre a Física, para um estado onde esta lhe fugia quase que
completamente do controle. Esta mudança ocorreu de forma brusca, sem que o professor
proporcionasse momentos de adaptação à nova realidade. Do ponto de vista da analogia
que estamos fazendo com a teoria winnicottiana, tudo ocorreu sem que Ana tivesse
tempo de encontrar gradativamente objetos capazes de facilitar a transposição de uma

72
fase para outra, para que as ansiedades não gerassem um rompimento na possibilidade de
aprender a Física. Parece que ela não teve condições ambientais favoráveis para construir
e “habitar” gradativamente uma área onde a ilusão do controle sobre a Física e o contato
com a realidade do seu aprendizado pudessem coexistir, sem a necessidade de separar o
fato do aprendizado da fantasia do controle sobre esse conteúdo. “A passagem do mundo
subjetivo, que nunca se perde, ao mundo transicional (...) requer tempo para
estabelecer-se como conquista” (DIAS, 2003 - p.239), e depois de iniciada necessita dos
cuidados do professor a fim de manter sustentada a continuidade do processo. O fato de o
professor não estar consciente do que ocorria com Ana fez com que ela não recebesse a
atenção de que precisava, e este “abandono”, juntamente com a sua inabilidade em lidar
com as dificuldades, contribuíram para o desenvolvimento da idéia de que aprender
Física não era algo possível para Ana, que chegou a afirmar: “(...) a Física é difícil, não
adianta estudar, eu nunca vou conseguir entendê-la”.
No entanto, após o término do primeiro trimestre letivo, em maio de 2004, o
professor percebeu que Ana passava por dificuldades e começou a investir em conversas
com a aluna. Seu objetivo era compreender a maneira como Ana estudava para poder, de
alguma forma, ajudá-la com os estudos.
Durante estas conversas, o professor se dispôs a ouvir o que Ana tinha a dizer
sobre os seus estudos, e a tentar diminuir sua aparente ansiedade sempre que ela
começava a falar das suas tentativas frustradas de conseguir um bom desempenho na
disciplina. Passou a conversar também sobre o desempenho de Ana nas avaliações e de
como ela poderia tentar superar as suas dificuldades. Sugeriu, entre outras coisas, que
montasse um grupo de estudos, que procurasse ler o livro-texto, mesmo que este se
mostrasse, no início, de difícil compreensão. Sugeriu também que ela anotasse no livro o
que não havia compreendido para perguntar posteriormente, que não iniciasse a
resolução dos exercícios sem antes estudar a parte teórica, que não deixasse o conteúdo
acumular, e que tentasse refazer alguns exercícios depois de alguns dias, para se
certificar se os mesmos haviam sido realmente entendidos ao invés de decorados.
A tentativa de auxiliar Ana a enfrentar suas dificuldades não se constituiu em
caso isolado dentro da sala de aula. O professor passou a manter anotações também a
respeito das observações que fazia dos outros alunos, e a partir de maio começou a
investir mais intensamente em conversas particulares com eles, sempre que julgava
necessário. Estas conversas ocorriam muitas vezes durante a própria aula, em momentos
em que a classe resolvia exercícios, ou então durante os plantões de dúvidas. Eram

73
conversas informais, mas que tinham o objetivo, assim como no caso de Ana, de
conseguir uma maior aproximação professor-aluno, na tentativa de entender o que
acontecia com eles para, de alguma forma, poder ajudá-los.
Do ponto de vista da teoria winnicottiana, foi nesta época, através do seu apoio e
das suas conversas sobre métodos de estudo, que o professor começou a propor para Ana
um brincar relacionado ao estudo da Física: vamos ver se você encontra um jeito de
aprender melhor ? Porém, como veremos adiante, Ana ainda precisaria de outro tipo de
ajuda antes de poder começar a brincar.
Com o passar do tempo e das conversas, Ana foi ao menos se sentindo à vontade
para procurar o professor quando achava que isso era necessário, não demonstrando
resistência em tentar seguir as sugestões dadas para os seus estudos. Paralelamente às
conversas informais o professor começou, sempre que percebia melhoras na maneira de
Ana lidar com as questões das provas, mesmo que essas melhoras não resultassem em
aumento significativo da nota, a escrever mensagens em suas avaliações do tipo: “Você
está melhorando, fique tranqüila. Só não pare de estudar (...). Quando esta fase passar
você verá que todo esforço terá valido a pena”. “Você está no caminho certo, muitas
vezes as melhoras não são rápidas mesmo. Tenha paciência e continue sendo
persistente”. O professor acreditava que este apoio era importante para motivar Ana, e
não deixar que ela se sentisse desestimulada pelos resultados negativos que obtinha nas
avaliações. De fato, apesar da atenção e das sugestões de estudo, as notas de Ana não
aumentaram, e isso começou a deixar o professor preocupado. Ana dizia que o que a
motivava estudar era a perspectiva de uma aprovação no final do ano, e que o fato de
suas notas não estarem melhorando deixava-a muito nervosa e ansiosa com relação ao
que poderia acontecer. O professor acreditava que se fosse reprovada, todos os esforços
feitos por Ana teriam sido em vão, o que traria um impacto negativo para a sua auto-
estima, e para a sua crença na própria capacidade. E por achar que não estava
conseguindo dar a atenção necessária, pelo fato de também ter muitos outros alunos para
atender e se preocupar, decidiu indicar para Ana uma professora particular da sua
confiança, que pudesse acompanhar de perto os seus estudos, e que pudesse diagnosticar
com maior precisão se havia algo de errado com a sua maneira de estudar. A professora
em questão cursava o doutorado na área de ensino de Ciências, e participava, assim como
o professor, do grupo Psicanálise e Educação, coordenado pelo orientador de ambos.
Assim, ela estava em condições de auxiliar o professor na ajuda que Ana parecia
necessitar.

74
A sugestão foi feita no início do terceiro trimestre letivo, em setembro, mas
somente em outubro de 2004 Ana começou a freqüentar as aulas particulares. Como
veremos a seguir, estas aulas acabaram tendo um papel importante na mudança do tipo
de relação que Ana possuía com o aprendizado da Física.

“(...) A grande responsável pela minha melhora (...) foram as aulas particulares que fiz”. “(...)
meu desempenho em Física melhorou depois que comecei a ir a uma professora particular” (Ana
- fevereiro de 2005).

Sobre as aulas particulares, Ana comentou: a professora “explicava de uma forma


descontraída. (...) Na parte de forças, ela pegava carrinhos, bolinhas; ela me mostrava
na prática, e eu via como tudo acontecia”.
De acordo com a professora, as aulas particulares transcorriam da seguinte
maneira: Ana era estimulada a tentar explicar algo a respeito dos tópicos que seriam
estudados no dia, o que era feito com interesse por ela, e a professora ia fazendo
perguntas “até que algo pudesse ser sistematizado”. Depois era feita uma síntese do
assunto antes de se partir para a resolução de problemas.
Na resolução de problemas era pedido que Ana lesse o enunciado e depois
tentasse explicá-lo usando suas próprias palavras. A professora relatou que procurava
fazer com que Ana se envolvesse nas tarefas da aula, o que geralmente acabava
acontecendo, ao invés de simplesmente explicar os conceitos e mostrar como cada
problema ou exercícios deveria ser resolvido. Além disso, ela também procurava dar
algumas dicas para que Ana pudesse conseguir um melhor desempenho no estudo da
Física.

“Eu sempre dava uns toques sobre a forma de organizar os dados para resolver um problema,
sobre como iniciar uma seqüência de estudos; falava que precisava melhorar a concentração
nas aulas, porque seria fundamental para que ela conseguisse atingir o objetivo que me
apresentara. Quando ela falava que você [o professor] ‘acreditava nela’ eu dizia que ela também
tinha que acreditar e batalhar para justificar essa confiança” (professora).

Com o transcorrer das aulas, segundo a professora, Ana apresentou melhoras na


maneira com que organizava suas idéias e encarava os problemas a serem resolvidos.
Este fato também foi percebido pelo professor, que continuou a mandar mensagens de
estímulo nas avaliações feitas por Ana. Para a professora, estas mensagens dizendo que

75
Ana estava melhorando, e que tinha potencial, pareciam ser algo significativo para ela,
algo que a deixava mais segura e confiante, motivando-a a realizar as tarefas para que o
objetivo da aprovação pudesse ser conquistado no final do ano.

“A Ana diz sentir-se muito motivada com as mensagens de estímulo que você manda pelas
avaliações” (professora).

Mais ou menos nesta época, enquanto Ana fazia aulas particulares, ela começou
também a escrever mensagens para o professor no final das suas avaliações. Certa vez
Ana escreveu: “Nossa !! Nessa prova não fui nada bem, me enrolei na hora de aplicar os
conceitos. Agora é batalhar para obter um bom resultado na última prova, sou capaz
como os outros e não pretendo desistir”. Na mesma avaliação o professor respondeu: “É
isso aí... continue batalhando. Este é o segredo”.
Com as aulas particulares, e com o estímulo e apoio do professor, dizendo que ela
era capaz, reforçando as dicas de estudo, mostrando-se disponível a ajudar, tentando
diminuir sua ansiedade sempre que ela não conseguia algo nas aulas, e falando que ela
estava no “caminho certo”, e que já estava conseguindo organizar melhor suas
resoluções, mesmo quando estas não estivessem totalmente corretas, Ana parece ter
começado a acreditar que, apesar das enormes dificuldades, aprender Física não era algo
que estava fora das suas possibilidades. Ela passou ao menos a dizer que era capaz, e que
não iria desistir, apesar das dificuldades. Na última avaliação de 2004 Ana escreveu:
“nesta avaliação acho que fui bem melhor do que nas outras (...). Obrigada pela sua
ajuda”. Na mesma avaliação o professor respondeu: “Legal que você também esteja
percebendo a melhora. Parabéns pela dedicação e força de vontade. É isso que está
fazendo você superar as suas dificuldades. Se você continuar vai melhorar ainda mais.
Parabéns novamente”.
Ana acabou finalmente conseguindo a aprovação em Física, apesar de suas notas
não terem sido suficientes. Seus esforços e sua dedicação em tentar superar as
dificuldades tiveram um papel importante nessa aprovação, apesar de ela acreditar que
foram as aulas particulares que a fizeram atingir o seu objetivo.

76
4.1.a - Uma análise dos fatos ocorridos em 2004

Analisando tudo o que foi relatado, e pensando nas idéias de Winnicott,


acreditamos que quando o professor se propôs a ouvir Ana, conversando com ela sobre
as suas dificuldades, acabou também tendo a oportunidade de propor um brincar
relacionado ao aprendizado da Física. Esta foi sendo renovada sempre que o professor
dizia para Ana que todos eram capazes de aprender Física se estudassem e se estivessem
dispostos a aperfeiçoar seus métodos de estudo. Ana parece ter aceitado o desafio de
tentar aprender, sem estar, no entanto, preparada ainda para fazê-lo sozinha.
Para que Ana pudesse desenvolver o brincar, o professor procurou então manter
sua disponibilidade, na tentativa de proporcionar a segurança necessária para a
brincadeira, e procurou manter também a apresentação de objetos e o brincar junto,
sempre que conversava com Ana sobre as suas dificuldades, ou sempre que a ajudava na
resolução de alguma tarefa. Lembrando Winnicott: a criança brinca “com base na
suposição de que a pessoa a quem ama e que, portanto, é digna de confiança, e lhe dá
segurança, está disponível e permanece disponível quando é lembrada, após ter sido
esquecida” (WINNICOTT, 1975 - p.71).
A esperança inicial era que Ana pudesse “encontrar” alguns objetos transicionais
relacionados ao estudo da Física que possibilitassem o brincar proposto pelo professor, e
que isso contribuísse para o seu aprendizado. Porém, todo o apoio dado pareceu não ser
suficiente para Ana, e o professor começou a acreditar que as notas abaixo da média,
além de demonstrarem esse apoio insuficiente, estavam também colocando em risco a
crença da aluna no fato de que os estudos poderiam lhe trazer resultados positivos, já que
ela mantinha os estudos com o objetivo explícito de melhorar suas notas.
De acordo com o professor, Ana parecia necessitar naquele momento de cuidados
maiores ou melhores do que aqueles recebidos até então, e como não havia a
possibilidade de disponibilizar um tempo maior para Ana, por conta da atenção que o
professor também precisava dar aos outros alunos da classe, este decidiu sugerir a ela a
professora particular que pudesse realizar um melhor acompanhamento das suas
dificuldades com relação ao aprendizado da Física.
Na teoria de Winnicott, quando um bebê ainda encontra-se no estado não-
integrado, ele encontra-se como que “espalhado”, desorganizado. Segundo Dias (2003 -
p.128), este é um estado natural de imaturidade caracterizado pela falta de reunião num

77
si-mesmo, que é ocasionado, entre outras coisas, pela falta de integração no espaço e no
tempo.
Como conseqüência, o bebê não consegue contar com o tempo para a resolução
das adversidades que lhe são impostas pelo meio, ou seja, não possui ainda a capacidade
de esperar, e não consegue também encontrar um “lugar onde possa habitar e sentir-se
em casa” nos momentos onde o descanso do contato com a realidade se faz necessário.

“Às vezes caímos em pedaços, quando ocorre uma intrusão aterrorizante, e podemos - caso
tenhamos aprendido a estar sós - encontrar um lugar de descanso em modos de vida não-
integrados (quietos e contemplativos)” (NEWMAN, 2003 - p.235).

Da mesma forma, a ameaça de desintegração, a partir de um estado integrado,


trata-se também de algo intolerável, capaz de gerar ansiedades básicas da infância.

“As defesas organizadas contra a desintegração roubam uma pré-condição para o impulso
criativo e impedem, portanto, uma vida criativa” (WINNICOTT, 1996 - p.23).

Assim, o que a mãe pode fazer é fornecer um “suporte” confiável ao bebê para
que, deste modo, os seus cuidados fortaleçam o ego21 imaturo do bebê. Este “suporte”
implica também no que Winnicott definiu como “segurar22”, que no início representa os
cuidados físicos dados ao bebê, e depois se desenvolve transformando-se em cuidados
psicológicos.

“(...) o apoio do ego materno facilita a organização do ego do bebe” (WINNICOTT, 2002 -
p.09).

“Se a mãe fornece apoio ao ego, e se ela faz isso de modo suficientemente bom, o ego do bebê
torna-se muito forte e passa a possuir sua própria organização” (WINNICOTT, 1994 - in:
DIAS, 2003 - p.143).

21
O ego, para Winnicott, é a “parte da personalidade que tende, sob condições favoráveis, a se integrar
numa unidade (WINNICOTT, 1983 - in: DIAS, 2003 - p.142). Para SILLAMY, é a “parte da
personalidade que equilibra as forças as quais o indivíduo é submetido, isto é, suas próprias pulsões
(tendências profundas), sua moral (ou, mais exatamente, seu superego) e, finalmente, a realidade do
mundo exterior” (SILLAMY, 1998 - p.86).
22
Tornar seguro, firmar, impedir que caia, serenar, sossegar, tranqüilizar.

78
No entanto, para “segurar” é necessária a “capacidade de se identificar, de
perceber como o bebê está se sentindo” (WINNICOTT, 1996 - p.22).
Parece-nos que estas idéias podem ser utilizadas para entendermos o que pode ter
ocorrido com Ana. As dificuldades relativas ao aprendizado da Física traziam consigo a
ameaça da desintegração, o que gerava uma ansiedade a qual Ana não estava preparada
para enfrentar. O apoio dado pelo professor, e depois pela professora particular,
acabaram ajudando no fortalecimento do ego ainda imaturo de Ana, para que ela
pudesse, aos poucos, atingir um estágio de integração onde a volta ao estado não-
integrado pudesse ser utilizado para o “descanso”, sem que isso representasse uma
ameaça de desintegração.
Verificando a metodologia usada pela professora particular nos quase dois meses
de aulas particulares, notamos que ela se mostrava disponível a ajudar Ana com as
dificuldades da Física, e que procurava fazer as tarefas junto com a aluna, ao invés de
simplesmente mostrar como elas deveriam ser feitas. Assim, além do reforço na
manutenção de um ambiente favorável ao brincar, a professora conseguiu fazer com que
Ana brincasse junto com ela, e este brincar em conjunto com outra pessoa parece ter
sido importante para que Ana desse prosseguimento ao desenvolvimento da sua própria
capacidade de brincar.
O fato da aluna se sentir motivada pelas mensagens de estímulo dadas pelo
professor mostra que, de alguma forma, era no olhar do professor que Ana se estruturava
quando a ameaça de desintegração era iminente. No entanto, para manter o olhar do
professor era necessário manter-se no processo de aprender Física, o que nos ajuda a
entender o fato de Ana nunca ter abandonado o estudo da Física, apesar das dificuldades
que enfrentava.
Com o passar do tempo, Ana parece ter começado a vislumbrar a possibilidade de
aprender Física, acreditando um pouco mais nas suas potencialidades. A partir deste
momento o “fazer” relativo ao estudo da Física pôde assumir também outros significados
para ela. Achamos que quando Ana afirmava que “(...) estudava, mas não tinha
segurança na matéria”, ela talvez não tivesse ainda segurança nela mesma, por
apresentar um ego ainda não fortalecido, e estava projetando este sentimento na
disciplina. O fato de a aluna não lidar muito bem com as angústias relativas ao processo
de aprendizagem fazia com que as dificuldades encontradas representassem uma ruptura
na continuidade do seu existir, ameaçando o processo de integração - que seria
responsável por fazê-la sentir-se real, capaz de responder por um eu diferenciado do que

79
é externo. A falta de segurança estaria então relacionada à falta de um ambiente capaz de
dar tal segurança, ou então na falta de alguém capaz de dar o suporte necessário ao
desenvolvimento de Ana naquele momento, alguém que pudesse efetivamente brincar
junto com ela, para que sua própria capacidade de brincar pudesse se desenvolver.
No final de 2004, Ana passou a relatar que acreditava poder superar as
dificuldades relativas ao aprendizado da Física.

“Agora é batalhar para obter um bom resultado na última prova, sou capaz como os outros e
não pretendo desistir” (Ana).

Os fatos de Ana ter conseguido uma nota um pouco melhor na última avaliação, e
ter finalmente conquistado sua aprovação, podem também ter reforçando a crença na
possibilidade de aprender melhor, e de conseguir atingir o objetivo do brincar proposto
pelo professor. A crença nesta possibilidade parece ter sido sua principal conquista no
ano de 2004. No entanto, como veremos a seguir, Ana ainda precisaria em 2005 da
manutenção de certos cuidados para finalmente deixar a fase da dependência absoluta.

4.2 - A dependência relativa na segunda e na terceira séries - 2005 e 2006

4.2.a - Aumento na capacidade de não desistir diante das dificuldades

Ao analisarmos a evolução das respostas dadas por Ana aos vários questionários
aplicados em 2005 e 2006, além do material obtido com as entrevistas e com as auto-
avaliações, percebemos que ocorreu uma mudança na maneira como Ana relatou
enfrentar as tarefas de Física. Ela dizia, no início de 2005, sentir-se desmotivada quando
não conseguia resolvê-las, e que esta falta de motivação aumentava quando ela percebia
que outras pessoas conseguiam obter sucesso onde ela não conseguia.

“Me sinto muito desmotivada quando não consigo resolver algum exercício. Isso aumenta
quando pergunto para algum colega e ele sabe resolver. Não me acho menos capaz do que
ninguém e nem menos esforçada; claro que sei que cada um tem suas dificuldades” (Ana -
fevereiro de 2005).

80
Apesar de dizer não se achar menos capaz do que os outros, era comum Ana
queixar-se com o professor por não conseguir resolver parte das tarefas, e mostrar-se
bastante irritada e desmotivada com este fato. Em 2006, relembrando desta época, Ana
relatou: “Eu me sentia incapaz quando não conseguia resolver os exercícios, (...) não
acreditava muito em mim, achava que eu não tinha condições de melhorar sem uma
ajuda profissional (...) ”.
Acreditamos que os sentimentos de capacidade e incapacidade se revezavam em
função do grau de dificuldade das tarefas propostas pelo professor. Ela ainda estava
aprendendo a lidar com tais dificuldades. A crença assumida da necessidade de ajuda
profissional para que o aprendizado pudesse ocorrer mostra que Ana iniciou 2005 ainda
insegura com relação a dar prosseguimento ao próprio aprendizado, num estágio,
portanto, de dependência absoluta. Porém, como veremos, apesar de ainda se encontrar
neste estágio Ana conseguiria superá-lo sem a necessidade da intervenção de um
professor particular.
Quando o brincar23 foi proposto pelo professor, em 2004, houve a necessidade de
um suporte ambiental favorável para que este pudesse começar a se desenvolver. No
entanto, “a passagem do mundo subjetivo (...) ao mundo transicional (...) requer tempo
para estabelecer-se como conquista” (DIAS, 2003 - p.239), e Ana parecia ainda
depender destes cuidados para dar prosseguimento ao seu desenvolvimento. Ao mesmo
tempo em que ela dizia acreditar ser capaz de superar suas dificuldades, também sentia
desmotivação diante dos problemas que não conseguia resolver. “Nesta época [início de
2005] eu não costumava ser persistente quando encontrava alguma dificuldade” (Ana -
Novembro de 2005). O fato de ela não conseguir entender um enunciado, ou não saber
por onde começar a resolução de um exercício, ou mesmo errar a resolução destes
exercícios ainda gerava uma ansiedade que fugia ao seu controle, e que pode ser
entendida como resultado das ameaças ao seu estado de EU-SOU ainda não
suficientemente fortalecido.
Então, se no final de 2004 Ana havia experimentado momentos em que foi
possível o brincar em conjunto com sua professora particular, no início de 2005 ela
estava experimentando uma situação diferente: agora ela deveria dar prosseguimento ao
brincar sem a companhia constante de um professor particular - ou seja, ela deveria
aprender o que fazer diante das dificuldades para que estas não se tornassem motivo de
desânimo e frustração, o que contribuiria para paralisar o processo de aprendizagem.

23
Lembrando que o brincar proposto foi: “vamos ver se você encontra um jeito de aprender melhor ?”

81
Fazendo uma analogia com as idéias de Winnicott, o sucesso desta nova fase
parece depender da capacidade do professor de manter um suporte adequado ao aluno, e
de facilitar também o “encontro”, por parte do aluno, de objetos transicionais que
possam fazer frente às angústias sentidas por ele no decorrer das tarefas. Por este motivo,
faremos a seguir um relato de como se deu o suporte e a apresentação de objetos feitos
pelo professor, e de como Ana se aproveitou deste ambiente para dar prosseguimento a
sua capacidade de brincar, atingindo assim o estágio da dependência relativa.

4.2.b - As conversas com o professor usadas como objeto transicional

Sempre que possível, o professor procurava ouvir pacientemente tudo o que Ana
tinha a dizer nos momentos em que ela se mostrava insegura ou irritada com as
dificuldades encontradas nas tarefas de Física. Muitas vezes estes momentos geravam
uma reflexão do professor sobre as dificuldades relatadas, fazendo com que delas
surgissem novos procedimentos que poderiam auxiliar Ana a desenvolver uma maneira
mais eficiente de estudar. Outras vezes elas serviam apenas para diminuir a aparente
ansiedade demonstrada pela aluna. De maneira geral, as conversas ocorriam durante as
aulas ou nos plantões semanais, e, segundo o professor, tinham o objetivo mesmo de
estimular uma reflexão sobre o processo de aprendizagem no qual os alunos estavam
inseridos. “Falar sobre os sentimentos que eventualmente podem surgir em decorrência
da realização das tarefas pode ajudar os alunos a se conhecerem melhor, e contribuir
para a melhoria das relações destes com o próprio aprendizado. Acredito que as
conversas devam ocorrer mesmo quando o aluno demonstre, de início, não estar de
acordo com as idéias apresentadas pelo professor” (professor).

“O professor tem de ser capaz de tolerar que duvidem ou suspeitem dele, tal como a mãe tolera
os vários caprichos alimentares dos filhos; (...) [uma eventual impaciência dos professores]
poderá torná-los incapazes de tolerar a seleção e comprovação pelas crianças daquilo que lhes
é oferecido, ou a sua reação inicial à rejeição” (WINNICOTT, 1982 - p. 228-9).

Certa vez o professor teve uma conversa com Ana sobre o papel do erro na
aprendizagem da Física. Isso ocorreu antes da aula que relacionou a construção do
“mundo interno” de cada um com a aprendizagem da Física, dada no início do segundo
semestre de 2005. A aluna relatou que ficava muito irritada quando não conseguia

82
entender alguma coisa, pois não achava isso normal. O normal para ela seria ler a teoria e
já conseguir resolver os problemas propostos. O professor, sabendo que Ana gostava de
cozinhar, perguntou se ela havia aprendido a cozinhar da noite para o dia, e se no começo
ela acertava tudo o que tentava fazer. Ana respondeu que não. Perguntou também se no
início ela acertava a quantidade de sal do arroz, ou se ela sabia os segredos para não
deixar o arroz “empapar”. Ana novamente respondeu que não. Então, o professor
perguntou se o fato de ler uma receita era garantia de acertar o cozimento do prato,
principalmente para quem ainda não tinha experiência na cozinha. Ana mais uma vez
disse que não. Finalmente o professor perguntou por que ela esperava que isso
acontecesse com o estudo da Física, ou com qualquer outra coisa, e explicou que o erro
fazia parte do processo de aprendizagem, não podendo muitas vezes ser evitado, e que as
pessoas estudam exatamente para superar as limitações decorrentes de algo que elas
ainda não conhecem muito bem.
A idéia desta conversa foi tentar mostrar algumas semelhanças entre o aprender e
o cozinhar, que era algo conhecido para Ana. O professor esperava que ela pudesse
“encontrar” nesta analogia algo que a fizesse gradualmente enfrentar os erros como parte
do processo de aprendizagem, não se sentindo mais tão angustiada quando estes
ocorriam.
Outro tema que várias vezes gerou discussão entre o professor e seus alunos, com
alguns deles em particular, foi o aparente conflito existente entre o fato de se entender
determinado problema com o fato de não conseguir depois resolvê-lo sozinho, apesar de
tê-lo entendido. Nas entrevistas, e também nos questionários, alguns alunos relataram se
surpreenderem por não conseguirem resolver problemas sobre determinados assuntos
considerados entendidos durante as aulas. Alguns até nem estudavam em casa por conta
desta confiança, e depois não encontravam explicações para os eventuais fracassos nas
avaliações. Diziam: “eu entendi a matéria, não sei por que não consegui resolver as
questões da prova”. Era comum o professor dizer para a classe:

“o fato de vocês entenderem um problema que eu faço na lousa, ou de vocês entenderem a


explicação de algum colega, não significa que vocês tenham aprendido, e que saberão depois
resolver também problemas relacionados ao mesmo assunto. Entender o que um professor faz é
uma coisa, saber fazer sozinho é outra diferente. Daí a importância das tarefas propostas para
casa. É com elas que vocês podem realmente aprender. E é por isso que não se deve deixar os
estudos para a véspera de uma avaliação. Vocês precisam de tempo para descobrir como

83
resolver as questões que não foram resolvidas na primeira tentativa”.

Além disso, o professor também sempre dizia: “não se pode aprender de uma
hora para outra”; “é preciso que tenhamos paciência e, ao estudar, saibamos esperar as
novas idéias irem aos poucos fazendo sentido para nós”; “não se pode deixar de errar,
os erros servem para mostrar nossos pontos fracos”.
Sobre a importância do tempo no aprendizado, podemos lembrar Winnicott que
diz:

“para controlar o que está fora, há que fazer coisas, não simplesmente pensar ou desejar, e fazer
coisas toma tempo. Brincar é fazer” (WINNICOTT, 1975 - p.63).

Ou seja, para se conseguir um mínimo de “controle” sobre a Física é necessário


“fazer” coisas, o que significa realmente se envolver com os estudos. Apenas pensar e
desejar não são suficientes. Por outro lado, se “fazer” leva tempo, conseqüentemente
também leva tempo para se aprender; e se brincar é “fazer”, e o “fazer” faz parte do
estudar, o brincar deve estar presente no estudar para que este possa efetivamente
contribuir para o enriquecimento pessoal dos alunos. Porém, este enriquecimento não
poderá acontecer se os alunos não possuírem a capacidade de poder contar com o tempo,
para esperar chegarem os frutos das horas investidas sobre os livros ou sobre os
cadernos.
Este foi um resumo das conversas que muitas vezes o professor manteve com
seus alunos, e com Ana em particular. A seguir passaremos a ver as respostas que Ana
deu aos questionários e entrevistas no decorrer de 2005 e 2006, e faremos uma análise
das mudanças em relação ao questionário aplicado no início de 2005.

“Este ano me surpreendi comigo mesma. De repente me vi bastante determinada e persistente


(...). Agora, (...) se não sei fazer algo, ai é que quero mesmo fazer. Procuro pesquisar em outros
lugares, nunca desistir” (Ana - novembro de 2005).

“Quando estou estudando insisto em superar minhas dificuldades” (Ana - fevereiro de 2006).

“Quando estou estudando e encontro dificuldades, procuro não desistir” (Ana - agosto de 2006).

84
Quando Ana diz não mais desistir com facilidade, ela demonstra que sua
capacidade em se manter na tarefa aumentou, mesmo em momentos difíceis. Se antes ela
costumava desistir com facilidade, agora ela já consegue enfrentar as tarefas através de
outra perspectiva. “Hoje vejo a física como um desafio, um obstáculo a ser ultrapassado
COM MUITO MÉRITO24” (Ana - agosto de 2006). Em 2004 Ana sequer acreditava que
aprender Física fosse algo possível para ela. De acordo com a teoria da
transicionalidade, esta mudança seria possível se, no decorrer do ano Ana “encontrasse”
e fizesse uso de objetos que a auxiliassem no enfrentamento das dificuldades relativas ao
aprendizado da Física.
Acreditamos que podemos identificar tais objetos em trechos das suas entrevistas,
e também nas respostas dadas aos questionários. Na última entrevista, por exemplo, ela
relatou que quando encontrava alguma dificuldade, e não conseguia resolvê-la com o uso
do livro e dos cadernos, ela parava a resolução e ia fazer outras coisas.

“(...) se a dificuldade persiste, páro o que estou fazendo e vou ver um pouco de televisão, ou vou
fazer os exercícios de outras matérias para depois voltar aos de Física” (Ana - agosto de 2006).

O fato de Ana dizer ir fazer outras coisas não relacionadas à Física, quando não
conseguia resolver certas tarefas, e depois voltar a elas, mostra um artifício usado para
enfrentar uma possível frustração por não conseguir resolver a tarefa numa primeira
tentativa. Ana parece ter a esperança de poder encontrar a solução posteriormente,
evitando assim parte da ansiedade que, no passado, agia no sentido de paralisar o
processo de aprendizagem, fazendo-a sentir-se incapaz. Agora ela confia na possibilidade
de se chegar a uma solução, parecendo estar tirando proveito da idéia colocada pelo
professor durante as conversas de que muitas vezes a solução de um problema demora a
aparecer, e que, portanto, é necessário ter a paciência de deixar o tempo agir a seu favor.
Provavelmente este artifício já deve ter se mostrado útil em certas ocasiões. Desta forma,
acreditamos que a esperança em se poder encontrar a solução para um problema, apesar
da falta de êxito nas tentativas iniciais, e de se poder contar com o tempo para isso,
acabou se constituindo num objeto transicional para Ana. Mostrando sua capacidade de
contar com o tempo, ela chegou a declarar em agosto de 2006: “(...) quem tem
dificuldades não é ‘de repente’ que vai entender tudo”.

24
Grifo da própria aluna.

85
Além disso, também podemos argumentar que Ana encontrou uma nova maneira
de encarar os erros decorrentes da realização das tarefas. Agora eles parecem fazer parte
do processo, não trazendo mais o sentimento de incapacidade, como era relatado
anteriormente.
No entanto, mesmo contando com o tempo, algumas vezes Ana não conseguia
encontrar as soluções para os problemas, apesar de suas várias tentativas. Para estes
casos ela relatou fazer uso de uma frase do professor para afastar o sentimento de
incapacidade, possível ameaça ao seu sentimento de EU-SOU.

“Se ainda assim não conseguir, lembro de uma frase sua [do professor]: ‘ver o professor fazendo
e entender, é uma coisa, outra é o aluno fazer sozinho’” (Ana - agosto de 2006).

A frase do professor trazia tranqüilidade por não fazê-la se sentir incapaz somente
pelo fato de não ter conseguido encontrar a solução que buscava. Ela anotava então a
dúvida e procurava depois o professor para esclarecê-la, mostrando estar lidando de
maneira natural com as dificuldades. Assim, podemos verificar aqui o uso de uma fala do
professor como objeto transicional.
Um outro fato que deve ser levado em conta, com relação ao aumento na
capacidade de Ana em se manter na tarefa, está também no uso de determinados
materiais que se mostravam úteis na realização das atividades propostas pelo professor, e
que, apesar de já terem sido por vezes usados no início do ano, não haviam ainda se
constituído em ferramentas importantes para Ana. Estamos aqui falando dos livros de
Física e do seu material pessoal. Como veremos a seguir, Ana mudou sua maneira de se
relacionar com eles, a ponto de poder usá-los também como objetos transicionais em
momentos de dificuldade.

4.2.c - Os materiais de apoio usados como objetos transicionais

Era comum também o professor salientar a importância do livro de Física como


apoio na superação das dificuldades, dizendo que ele poderia ser o “professor particular”
dos alunos, se estes soubessem usá-lo.
O material didático adotado pela escola de Ana era apostilado, e consistia em:
livro-texto (com a parte teórica da Física), caderno de exercícios (que deveriam ser

86
resolvidos em casa pelos alunos) e uma apostila de aula (com exercícios que deveriam
ser trabalhados pelo professor durante as aulas).
O professor sempre enfatizou a importância da leitura do livro-texto antes das
tentativas de se resolver os exercícios propostos no caderno de exercício. Como já vimos,
Ana começou a tentar seguir este conselho no final de 2004, quando se viu numa
situação delicada com relação a sua aprovação. No entanto, no início de 2005, apesar das
tentativas, Ana ainda relatou sentir muitas dificuldades para conseguir entender o que o
livro se propunha a explicar: “O livro-texto, nem adianta, eu não entendo, acho muito
complicado e me ‘enrolo’ toda”. “Uma das minhas maiores dificuldades quando estou
estudando é quando tenho alguma dúvida e olho no livro-texto; geralmente a dúvida
aumenta porque não entendo o que o livro tenta passar”.
Então, percebendo que o problema do uso do livro-texto ocorria também com
outros alunos, a partir do segundo semestre de 2005 o professor começou a aplicar em
algumas das suas aulas atividades em que a leitura do mesmo era pré-requisito para uma
posterior resolução de problemas. Nestas aulas, o professor procurava ajudar os alunos
que o requisitavam, quando estes sentiam dificuldades na leitura. Em uma delas o
professor pediu que Ana procurasse identificar suas dificuldades com relação ao livro,
que ela grifasse o que não compreendia, e que viesse depois esclarecer o que havia sido
grifado. Além disso, sempre que Ana se queixava do livro-texto o professor procurava
acalmá-la dizendo para ela continuar se esforçando que com o tempo ela iria aperfeiçoar
sua leitura, fazendo com que certas dificuldades diminuíssem.
Vale ressaltar que, na opinião do professor, o livro-texto realmente deixava a
desejar no que se referia à exposição de alguns conceitos, principalmente em
determinados capítulos, e que para ele, o importante para a autonomia dos alunos era que
eles tentassem usar algum livro, e que pudessem aos poucos ir se familiarizando com a
sua leitura. Por isso, uma outra sugestão geralmente dada era que os alunos tentassem
usar outros livros de Física existentes na biblioteca da escola sempre que não
entendessem os tópicos do livro-texto.
Certa vez o professor levou Ana à biblioteca para que juntos escolhessem um
outro livro de Física. Depois deste dia Ana passou, por vezes, a levar o livro escolhido
nas aulas, e a dizer que estava tendo uma maior compreensão da matéria através dele. De
fato, em agosto de 2006, já na terceira série do ensino médio, Ana confirmou que
somente começou a usar outros livros de Física quando já estava no segundo ano, o que
nos faz acreditar que as tentativas do professor em fazer dos livros um material de apoio

87
para Ana surtiram algum efeito. Os trechos selecionados a seguir apontam para uma
mudança na maneira como Ana passou a se relacionar com tais livros:

“(...) estou tentando entender o livro-texto” (Ana - setembro de 2005).

“(...) estou começando a entender o livro-texto” (Ana - outubro de 2005).

“Comecei a ler o livro-texto; eu não o entendia, mas agora estou melhorando” (Ana - novembro de
2005).

Em 2006 Ana confirmou que sua relação com os livros havia mudado em
definitivo:

“Aprendi a lidar com o livro-texto (...)” (Ana - fevereiro de 2006).

“Atualmente me dou bem melhor com o livro-texto, mas uso-o somente como apoio. Leio os seus
itens, mas não fico só nele, prefiro procurar em outros livros de Física” (Ana - agosto de 2006).

“(...) eu tinha dificuldades para entender os outros livros de Física quando comecei a estudar por
eles, afinal, quem tem dificuldades não ‘é de repente que vai entender tudo’. Mas sempre achei mais
fácil do que o livro adotado pela escola” (Ana - agosto de 2006).

“O meu livro passou de um ‘ser’ insuportável para um material de apoio” (Ana - agosto de 2006).

[Quando não consigo resolver alguns exercícios pego] “meus livrinhos queridos, que tanto me
auxiliam” (Ana - agosto de 2006).

Apesar de ela relatar ainda sentir algumas dificuldades na interpretação dos textos
encontrados nos livros de Física, ela passou ao menos a percebê-los como possíveis
aliados no estudo da Física e, o que é mais importante, a fazer uso dos mesmos.
Acreditamos que a habilidade de se usar um livro de Física não seja algo que o
professor deva supor que seus alunos já tenham consolidada quando entram em contato
com a Física. Acreditamos também que a linguagem utilizada pelos livros, assim como
os exercícios propostos, têm influência determinante no tipo de relação que os estudantes
terão com os mesmos e, conseqüentemente, com a Física.

“Continuo não gostando dos exercícios de Física; uns são muito ‘bobos’, outros não entendo

88
nada” (Ana - agosto de 2006).

Assim, nos pareceu que o suporte dado pelo professor teve importância na
maneira como Ana passou a se relacionar com os livros de Física, e que estes se
constituíram, a partir do momento em que começaram a ajudar Ana nas dificuldades, em
objetos transicionais para ela.
Outro fato interessante está relacionado à maneira com que Ana passou a usar o
seu caderno e a encarar as aulas, depois que começou a fazer uso dos livros. Certa vez
Ana relatou: “(...) a partir do ano passado [2004] comecei a fazer minhas próprias
anotações enquanto o professor falava, ajudou. [Quando] comecei a ler a matéria antes
de ir para a aula, eu comecei a saber selecionar o que era importante para ser
anotado”. De acordo com Ana, a leitura antecipada do livro contribuiu para a melhoria
da qualidade das anotações que eram feitas em seu caderno, aumentando, portanto, sua
importância na hora dos estudos. Ana já dizia fazer uso destes materiais no início de
2005, no entanto, parece que com o passar do tempo este uso foi aperfeiçoado, fazendo
com que ela conseguisse tirar maior proveito deles. Segundo Winnicott, “a criança
adquire experiência brincando” (1982 - p.163). Além disso, o aperfeiçoamento no uso
do material de apoio pode ter contribuído também para que Ana melhorasse o
entendimento que tinha das aulas de Física.

“Agora entendo um pouco mais o que você fala [nas aulas]. Sim, eu nunca entendia o que você
explicava, mas agora entendo” (Ana - agosto de 2006).

4.2.d - Mudança no relacionamento com os colegas

Um outro fato que merece ser relatado, por indicar um amadurecimento de Ana
no decorrer do ensino médio, diz respeito à maneira com que ela se relacionava com os
colegas. No início de 2005 Ana não tinha o hábito de estudar ou tentar tirar suas dúvidas
com colegas. Ela dizia: “não peço ajuda para ninguém na hora de estudar Física;
atrapalha estudar com outra pessoa (...). Prefiro estudar sozinha”.
Em 2006, no entanto, Ana relatou buscar a ajuda dos colegas quando encontrava
dificuldades com as tarefas: “quando estou estudando e encontro dificuldades (...) tento
rever meu material, pesquisar outras fontes, perguntar a algum colega quando isso é

89
possível (...) [ou] tento achar algum exercício de sala parecido, que já foi resolvido pelo
professor”.
Sobre a mudança no relacionamento com os colegas Ana relatou: “nestes três
anos de ensino médio eu acho que melhorei meu relacionamento em geral, sempre fui
muito impaciente e intolerante, principalmente com as pessoas que não me identifico
muito. Aprendi como conviver em grupo, o que facilitou meu relacionamento para os
estudos” (agosto de 2006).
Segundo Winnicott, “(...) o brincar facilita o crescimento e, portanto, a saúde; o
brincar conduz aos relacionamentos grupais (...)” (WINNICOTT, 1975 - p. 63). Assim,
o fato de Ana afirmar ter melhorado a maneira de se relacionar com os colegas pode ser
usado para comprovar que houve mesmo uma evolução na sua capacidade de brincar, e
conseqüentemente, na capacidade de fazer uso dos objetos transicionais.

4.2.e - Mudança na maneira de enfrentar as avaliações

Uma outra mudança constatada em 2005 estava relacionada à maneira como Ana
passou a enfrentar as avaliações formais. Em 2004, era comum Ana relatar que ficava
nervosa e insegura sempre que precisava fazer uma avaliação de Física, colocando por
vezes a responsabilidade das notas ruins neste nervosismo. Ela dizia ficar muito
desmotivada quando recebia tais notas.
O professor conversou várias vezes com Ana procurando passar a idéia de que o
fator emocional estava interferindo negativamente na calma e na tranqüilidade
necessárias para que ela se concentrasse nas questões que deveriam ser resolvidas numa
avaliação. O objetivo destas conversas era disponibilizar meios que pudessem ser usados
por ela para mudar a maneira de lidar com o nervosismo. Certa vez o professor comentou
com Ana: “em uma avaliação você simplesmente mostra uma parte do que aprendeu. Se
você estudou para aprender, não precisa se preocupar. Mesmo que a nota não seja a
esperada, você deve tentar melhorar o modo como estuda, e isso não dá pra se fazer no
momento da avaliação. Assim, na hora da prova o melhor é tentar deixar as
preocupações de lado e fazer o que você conseguir fazer. Porém, se você não estudou,
não vai ser na hora da prova que você vai aprender. Faça o que der, e comece a pensar
no que fazer para que isso não ocorra novamente na próxima avaliação. Além disso, a
nota da prova não é a única coisa que conta para uma aprovação”.

90
O professor lembrava que o peso das notas na média final era de 60%. E que por
isso elas não deveriam ser encaradas como sendo a única maneira de se obter a
pontuação necessária para a aprovação. Além disso, um aluno que mostrasse estar se
esforçando para aprender sempre poderia ter sua dedicação reconhecida pelos
professores em uma eventual decisão de aprovação no final do ano. O professor chegou a
garantir certa vez, na tentativa de tranqüilizar Ana, que se ela mantivesse o empenho e a
dedicação que estava demonstrando provavelmente não teria problemas no final do ano,
mesmo se ela não atingisse a pontuação necessária para a aprovação. A idéia destas
conversas era fazer com que Ana passasse a se preocupar mais com o aprender do que
com as notas das suas avaliações.
Ao final de 2004, Ana foi aprovada em Física, com notas abaixo das necessárias,
sendo recompensada pelos seus esforços e por ter alcançado a pontuação suficiente nas
outras disciplinas. Acreditamos que, além do apoio dado pelo professor, a constatação de
que as notas realmente não eram as únicas responsáveis pela sua aprovação ou
reprovação também contribuiu para que, em 2005, elas não a deixassem tão insegura e
nervosa como antes, propiciando talvez uma nova maneira de enfrentar as avaliações.
Em 2005 Ana relatou:

“Desta vez eu não estava tão nervosa (...)” (março de 2005).

“(...) quanto à prova eu estava segura, sabia a matéria. Porém, não fui nada bem (...).” (junho de
2005).

“(...) achei que estava segura para esta avaliação. Tinha conhecimento da matéria, e fiquei
bastante tranqüila” (agosto de 2005).

Se observarmos a tabela 1, notaremos que suas notas continuaram abaixo da


média em 2005, e que, apesar disso, Ana não mais relatou ficar nervosa antes ou durante
uma prova.

1º trim 2° trim 3° trim


Avaliação 1ª 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª 7ª
(nota máxima) (3,0) (3,0) (3,0) (3,0) (2,0) (2,0) (2,0)
Nota obtida
1,7 1,0 0,15 2,5 0,4 0,45 0,80
por Ana
(%) 57 33 5 83 20 23 40
Média da
70 63 48 75 39 65 50
classe (%)
Tabela 1 - Desempenho nas avaliações realizadas por Ana em 2005. O desempenho médio da
aluna foi de 37%, enquanto a classe teve um desempenho médio de 59%.

91
Ela foi aprovada em 2005 novamente graças à obtenção de notas em outras
atividades25 propostas pelo professor, e graças ao seu empenho na tentativa de aprender,
o que mais uma vez pode ter contribuído para a crença de que as notas das provas tinham
realmente importância relativa, fazendo diminuir então sua ansiedade com relação a elas.
No ano seguinte, já na terceira série, Ana confirmou haver mudado a maneira
com que encarava as avaliações quando relatou:

“Desde o ano passado [2005] passei a encarar as provas como um exercício que vale nota e que
ali vou colocar o que aprendi” (agosto de 2006).

“Coloquei na minha cabeça que (...), nervosa ou não, terei de fazer a prova do mesmo jeito.
Ficando nervosa eu só me prejudico. Então, aos poucos comecei a me acalmar” (agosto de
2006).

“Atualmente me preocupo com as notas no sentido de eu precisar delas para passar de ano (...),
o que antes pra mim era o mais importante. Mas, hoje consigo ver que aprendi muito mais do
que coloquei na última prova” (agosto de 2006).

Ana parece ter encontrado outras maneiras de identificar avanços na


aprendizagem, além das notas obtidas nas avaliações, o que nos faz concordar com
Winnicott quando ele diz: “nada é mais enganador na avaliação dos métodos educativos
do que o simples êxito ou fracasso acadêmico” (WINNICOTT, 1982 - p.230). Além
disso, parece que a satisfação de Ana, que no início estaria na conquista de notas, foi
transferida para o processo de aprendizagem da Física. Manter-se no processo significava
poder contar com o olhar e a atenção do professor, e poder fazer uso deste olhar para
manter-se estruturada, livrando-se assim das ameaças de desintegração causadas pelas
dificuldades encontradas durante a resolução das tarefas, ou durante as avaliações.

4.3 - Conclusões sobre a análise de dados

Acreditamos que no decorrer do ensino médio Ana passou por estágios


semelhantes aos propostos por Winnicott para o amadurecimento, e que a teoria da

25
Participação nas atividades de aula, entrega de trabalhos livres, entrega de trabalhos de leitura e reflexão
sobre artigos “científicos” e entrega das auto-avaliações.

92
transicionalidade pôde nos ajudar a compreender como se deu a passagem do estágio da
dependência absoluta para o da dependência relativa para com o professor.
Mostramos que na primeira série do ensino médio, em 2004, por apresentar certa
vulnerabilidade em relação ao ambiente de aprendizagem da Física, e por não saber
muito bem como proceder diante das dificuldades e angústias surgidas durante a
realização das tarefas, Ana se encontrava num estágio de dependência absoluta do
professor, sem que este soubesse disso. Ana acabou não recebendo, nos primeiros meses
de 2004, os cuidados de que necessitava e acabou desenvolvendo a crença na
impossibilidade de se aprender Física. As angústias advindas do processo de
aprendizagem representavam para ela uma ameaça de desintegração do seu sentimento
de EU-SOU, ainda não suficientemente fortalecido.
Na medida em que o professor e a professora particular deram a atenção que Ana
necessitava, aproveitando em parte sua preocupação com uma possível reprovação no
final de 2004, acabaram também realizando duas tarefas que foram importantes no
desenvolvimento da capacidade de Ana começar a brincar com o estudo da Física: a
apresentação de objetos e o estabelecimento de um ambiente favorável para que Ana
pudesse, com o tempo, encontrar e usar tais objetos. O papel da professora particular foi
ainda além. Ela foi capaz de brincar junto com Ana, no início, quando ela parecia não ter
ainda desenvolvido a capacidade de brincar sozinha.
O ambiente de segurança e confiança propiciado pelo professor foi importante
para que as ansiedades relativas a uma possível reprovação não se constituíssem em
obstáculos intransponíveis para Ana, e o apoio egóico dado contribuiu para a diminuição
das angústias relativas ao sentimento de incapacidade constantemente relatado pela
aluna, o que a deixou em condições de iniciar o desenvolvimento do brincar em Física.
Assim como o bebê precisa do olhar da mãe para se estruturar, Ana fez uso do olhar do
professor para fortalecer o seu sentimento de EU-SOU, sentimento este necessário para
dar prosseguimento ao desenvolvimento na direção de uma independência relativa.
Em decorrência das aulas particulares e dos cuidados oferecidos pelo professor,
vimos que Ana passou com o tempo a acreditar finalmente na possibilidade de se
aprender Física.
Quando o ano letivo começou, em 2005, o professor manteve a apresentação de
objetos e o apoio egóico dado a Ana, por sentir que ela ainda não demonstrava estar
segura da própria capacidade, apesar de já acreditar na possibilidade de aprender Física.
Porém, com o passar dos meses estes cuidados foram naturalmente diminuindo na

93
medida em que o professor ia percebendo que Ana melhorava sua maneira de lidar com
as dificuldades da Física. Em 2005 e em 2006 as aulas particulares não foram mais
necessárias, e Ana passou a confiar no seu potencial, e a acreditar que poderia dar
continuidade ao seu aprendizado sem uma ajuda profissional.
Cronologicamente os dados obtidos nos mostraram o seguinte: em 2004 Ana não
acreditava na possibilidade de se aprender Física; nos primeiros meses de 2005 ela
passou a relatar que aprender Física era possível, mas somente com a ajuda de um
profissional; no final de 2005, e mais intensamente em 2006, ela passou a relatar
acreditar que poderia aprender Física sem auxílio de cuidados externos especiais.

“Aprendi muito, agora me acho capaz de continuar meu aprendizado” (Ana - fevereiro de 2006).

Na medida em que Ana fortalecia sua crença na capacidade de aprender Física


sem a ajuda profissional, ela foi também deixando para trás o estágio da dependência
absoluta para começar a entrar numa fase de dependência relativa do professor.
Não se pode ao certo precisar quando um indivíduo passa da dependência
absoluta para a dependência relativa, uma vez que estes estágios podem se sobrepor.
Além disso, o processo não é linear, podendo apresentar momentos em que o indivíduo
parece oscilar entre ambos os estágios, como de fato ocorreu com Ana. No entanto,
acreditamos que esta passagem começou a ocorrer em meados de 2005, e veio a se
consolidar no ano seguinte, quando a aluna já estava na terceira série do ensino médio.
Chegamos a esta conclusão através dos relatos de Ana, que ao final de 2005 já
aparentava estar confiando bem mais em sua capacidade (sentimento de EU-SOU
fortalecido), além de mostrar também evolução no uso de objetos. Por conta disso, Ana
passou a enfrentar de maneira diferente as dificuldades e angústias relativas ao processo
de aprendizagem da Física, não deixando mais que certas dificuldades interferissem com
tanta freqüência de maneira negativa na sua motivação.
De maneira geral, os novos objetos usados por Ana para lidar com tais angústias
foram, na nossa interpretação, os seguintes: (A) os livros de Física; (B) as suas próprias
anotações de aula; (C) a crença na própria capacidade, quando ela acredita poder
encontrar a solução para os problemas, mesmo depois de não conseguir nas primeiras
tentativas; (D) e a confiança nas palavras do professor, principalmente nas que se
referiam ao processo de aprendizagem, quando ela se lembrava de frases ou das

94
conversas tidas com o professor para se tranqüilizar nos momentos de dificuldade. A
ordem dos objetos relatada acima não significa que um seja mais importante que o outro.
Assim, 2005 foi o ano em que a transicionalidade e o uso de objetos começaram
efetivamente a se desenvolverem, possibilitando que pequenas experiências de
integração fossem experimentadas por Ana, fazendo com que o seu sentimento de EU-
SOU pudesse ser fortalecido. Com este fortalecimento, o estudar passou a ter outro
sentido para Ana: não era somente algo necessário para se conquistar uma nota, e uma
futura aprovação, mas também algo que poderia contribuir para o seu crescimento
pessoal. Esta perspectiva contribuiu para que Ana não se desmotivasse com tanta
freqüência diante das dificuldades encontradas durante o estudo da Física, fazendo-a
entrar definitivamente, em 2006, na fase da dependência relativa, quando a aluna passou
a relatar com maior ênfase estar se relacionando de maneira diferente com os livros, com
as aulas, com as provas, com o seu professor e com os seus colegas, além de mostrar ter
solidificado a confiança na própria capacidade de aprender.
Atualmente, ao terminar a terceira série, parece-nos que Ana está perto da
independência relativa, e bem distante da dependência absoluta, o que pode ser
considerado uma conquista da aluna durante os anos do ensino médio. Acreditamos
também que, por tudo o que foi relatado, a atuação do professor contribuiu
significativamente para que Ana pudesse realizar tal conquista. Uma frase da aluna pode
ser usada para ilustrar esta atuação:

“Sinceramente, eu tinha muita vergonha de chegar pra você [professor] e falar que eu estudava,
mas não conseguia demonstrar nas prova; na minha cabeça um professor não me entenderia,
acharia que era conversa de aluno que gosta de ser ‘PUXA SACO’ (algo que não me encaixo).
Mas agora que te conheço sei que você acredita no meu esforço; tudo ficou mais fácil” (agosto
de 2006).

Segundo Winnicott, “alguns adolescentes sofrem muito, e não oferecer ajuda


pode ser crueldade. (...) É deles a tarefa de tolerar a interação de muitos fenômenos
disparatados - a sua própria imaturidade, suas próprias mudanças relativas à
puberdade, suas próprias idéias do que é vida e seus próprios ideais e aspirações;
acrescente-se a isso sua desilusão pessoal a respeito do mundo dos adultos, que lhes
parece essencialmente um mundo de compromissos, de falsos valores e de infinitas
digressões em relação ao tema central” (WINNICOTT, 1996 - p.20). Eles devem

95
aprender a lidar consigo mesmo e com o mundo. “À medida que os rapazes e moças
adolescentes deixam esse estágio, começam a se sentir reais, e adquirem um senso de
self e um senso de ser. Isso é saúde. A partir do ser, vem o fazer, mas não pode haver o
fazer antes do ser - eis a mensagem que os adolescentes nos enviam”. (WINNICOTT,
1996 - p.20).
Assim, “quanto mais observamos, tanto mais concluímos que se os professores e
alunos estão convivendo de um modo saudável encontram-se empenhados num sacrifício
mútuo de espontaneidade e independência, e isso é quase tão importante, como parte da
educação, quanto o ensino e aprendizagem dos assuntos programados” (WINNICOTT,
1982 - p.230).

96
CAPÍTULO 5

“(...) à frente da excelência os


deuses imortais colocaram suor; o
caminho para a excelência é longo,
íngreme e áspero, de início.
Quando, porém, você chega ao topo,
torna-se fácil, embora duro”

Hesíodo, 700 a.C

97
5.1 - A teoria do amadurecimento de Winnicott e o aprendizado da Física

Winnicott enfatiza a importância do ambiente em prover o indivíduo, nas fases


iniciais do seu desenvolvimento emocional, da confiança e da segurança necessárias para
que este possa, com o passar do tempo, criar um mundo subjetivo, habitando-o, e
desenvolver algumas ilusões26 que contribuirão para o enfrentamento de situações em
que a realidade externa se mostrar fora do seu controle. Com esta segurança o indivíduo
poderá ausentar-se distraído com objetos transicionais, e usar a sua criatividade27 a favor
da superação das dificuldades decorrentes do contato com a realidade.

“(...) nenhuma criança pode vir a tornar-se uma pessoa real, a não ser sob os cuidados de um
ambiente que dá sustentação e facilita os processos de amadurecimento” (DIAS, 2003 - p.96).

“Certamente poderá existir um ambiente prejudicial ou coisa semelhante, mas (desde que
tenhamos realizado um bom começo) as dificuldades que encontramos em defrontar tal ambiente
resultam, principalmente, da existência de conflitos essenciais dentro de nós (...)”
(WINNICOTT, 1982 - p.225-6).

Destacamos que, além da segurança no ambiente, o uso da criatividade por parte


do indivíduo no enfrentamento das situações de contato com a realidade externa também
é de fundamental importância na teoria do amadurecimento de Winnicott.
Acreditamos que esta fase inicial do desenvolvimento de um indivíduo pode
guardar semelhanças com a fase onde o aluno tem seus primeiros contatos com a Física
- em geral na 7ª ou 8ª série do ensino fundamental.
Um aluno poderá ter maiores chances de construir uma idéia favorável acerca do
próprio aprendizado se no início lhe forem dadas condições ambientais favoráveis,
principalmente com relação às tarefas que deve realizar e ao tratamento que recebe do
professor.
O relacionamento com o professor terá sua importância se estimular o
estabelecimento de um padrão para as relações que o aluno venha a desenvolver no

26
Esta ilusão age como um fator motivador, que ajudará o aluno a permanecer dentro do processo de
aprendizagem mesmo quando este exigir o enfrentamento de dificuldades. Sem esta motivação o aluno
tenderia a desistir mais facilmente de aprender.
27
Segundo DIAS (2003 - p.242), a criatividade relaciona-se à maneira pela qual o indivíduo permite à
realidade aparecer, ou à maneira pela qual este recepciona os acontecimentos, ou seja, ao modo como o
indivíduo olha algo ou realiza alguma coisa. Se este o faz de maneira criativa, o acontecimento ou a
realização terá maior significado no conjunto de experiências do indivíduo.

98
futuro com a Física, e se facilitar o surgimento de uma “ilusão” acerca da real
possibilidade de aprendê-la, manipulá-la, e de se poder tirar algum proveito pessoal dessa
manipulação. Assim, iniciar o aluno na capacidade de se iludir, ou se motivar, e
conseqüentemente, abrir caminho ao aprendizado seria a tarefa essencial de um
professor, assim como esta seria também, de acordo com Winnicott, a tarefa essencial de
uma mãe suficientemente boa para com seu bebê.
Poderíamos, então, em analogia à idéia winnicottiana da mãe suficientemente boa,
utilizar a idéia do professor suficientemente bom como sendo aquele que possibilitasse
aos seus alunos um ambiente propício ao amadurecimento de cada um, esperando que
este ambiente também acabe facilitando o aprendizado da Física.
É importante lembrar que esta é somente uma analogia, e como tal, possui suas
limitações. Certamente a relação professor-aluno difere da relação mãe-bebê em vários
aspectos. Um deles, por exemplo, diz respeito à confiança, ou não, que o aluno deposita
no professor. A relação do bebê com a mãe é essencial e inevitável, uma vez que o
primeiro é totalmente dependente do segundo. O bebê não tem a opção de evitar o
relacionamento com a mãe, diferentemente do aluno que pode não ver no professor algo
que lhe falte, ou que seja do seu interesse também possuir. O professor suficientemente
bom acaba tendo, então, uma tarefa anterior, que a mãe suficientemente boa não possui,
que é conquistar e depois manter a confiança do aluno - estabelecer a transferência
pedagógica. Para dificultar a situação, todo e qualquer esforço do professor nunca poderá
garantir que esta relação de confiança venha a se estabelecer.
Porém, acreditamos que a transferência pedagógica, uma vez estabelecida, abrirá
caminho para que o professor possa atuar de maneira a disponibilizar um ambiente
favorável ao aprendizado e amadurecimento dos seus alunos, podendo assim ser
considerado um professor suficientemente bom.
Apesar das limitações desta analogia, é notável como podemos, muitas vezes,
emprestar idéias originalmente pensadas para a relação mãe-bebê e usá-las para a relação
professor-aluno. No próximo item tentaremos propor algumas características desejáveis
para o professor, que poderiam contribuir para a criação de um ambiente facilitador
dentro da sala de aula para a aprendizagem dos alunos. Vale destacar que todas as
referências precedidas do termo “adapt. de” foram adaptadas da relação mãe-bebê para a
relação professor-aluno.

99
5.2 - Algumas reflexões sobre o professor suficientemente bom

A compreensão, por parte do professor, do que acontece com um aluno parece


não ocorrer exclusivamente por via intelectual ou mental, mas exigir algum tipo de
proximidade professor-aluno semelhante à existente na relação mãe-bebê (adaptado de
DIAS, 2003 - p.155). É desta proximidade que surgirão as observações que darão ao
professor condições de tentar facilitar o processo de amadurecimento dos alunos,
principalmente se estas observações levarem em consideração

“(...) tudo o que pode auxiliar o aluno a aprender melhor: suas aquisições, as quais condicionam
as tarefas que lhe podem ser propostas, assim como sua maneira de aprender e de raciocinar,
sua relação com o saber, suas angústias e bloqueios eventuais diante de certos tipos de tarefas, o
que faz sentido para ele e o mobiliza, seus interesses, seus projetos, sua auto-imagem como
sujeito mais ou menos capaz de aprender, seu ambiente escolar e familiar” (PERRENOUD,
2000 - p.49-50).

De fato, com estas observações fomos capazes de conhecer características de


alguns alunos que dificilmente seriam conhecidas pela iniciativa dos próprios alunos, e
estas observações foram importantes para o estabelecimento de uma relação professor-
aluno que pudesse trazer benefícios aos alunos.

“Esqueço as coisas com facilidade quando fico nervosa e só vou me lembrar quando começo a
ficar calma” (Fátima).

“Sempre achei que os meus métodos de estudo resolveriam, mas acabei percebendo que algumas
vezes não resolvem” (Bárbara).

“Quando eu não consigo [resolver as atividades], sinceramente, eu sinto muita raiva de mim
mesma, por não conseguir, e acabo pulando o exercício. Se eu perceber que na maioria dos
exercícios isso acontece, eu desisto de fazer. No dia seguinte, mais aliviada, procuro ajuda. Nem
sempre resolve o meu problema” (Cláudia).

Outro fator importante é que, para que se possa educar os alunos de modo que
estes vivam num mundo de fatos reais, permanecendo criativos, o professor deve ser
muitas vezes paciente, aquiescente e adaptativo (adapt. de DIAS, 2003 - p.142), de modo

100
a deixá-los experimentar a descoberta, para que possam usufruir dessa experiência como
algo pessoal. Além disso, é preciso que o professor acredite no fato de o aluno estar em
fase de amadurecimento ou, ao menos, poder entrar nela. Esta confiança inconsciente
permite que o professor esteja disponível para favorecer ou, ao menos, não dificultar os
movimentos dos alunos de entrada ou de envolvimento na aprendizagem. Por outro lado,
a confiança do professor implica também que não serão os seus cuidados ou o controle
da situação os responsáveis decisivos por fazer este processo ser bem ou mal sucedido.
Enfim, existem aspectos inconscientes que interferem no processo de aprendizagem,
tanto do lado do aluno quanto do professor.
Assim, como a aprendizagem não pode ser vista como uma atividade meramente
racional, conseqüentemente o ambiente também não poderá fazer o aluno crescer, nem
determinará o sentido do crescimento; quando favorável, o ambiente apenas poderá
fornecer as condições facilitadoras para o processo maturativo agir (adapt. de DIAS,
2003 - p.148). Da mesma forma, não há nenhuma regra estipulável que faça o professor
ter a certeza de que um aluno irá aprender o que ele tem para lhe ensinar. Ao contrário,
qualquer normatização das qualidades desejáveis para um professor suficientemente bom,
em analogia às qualidades de uma mãe suficientemente boa, teria como efeito a
destruição das mesmas (adapt. de DIAS, 2003 - p.149), pois as raízes delas estão no
inconsciente do professor e como tal não podem ser controladas a-priori.

“Jamais se pode estar certo de que aprendizagens estão ocorrendo. Entretanto, um professor
experiente, modesto e lúcido é capaz de detectar com uma certa precisão: [1] de um lado, os
alunos que têm chances pequenas de aprender, porque a tarefa exige demais, porque não se
envolvem, entediam-se, trabalham com uma lentidão desesperadora, copiam de seus colegas,
não dialogam com ninguém, não têm objetivos, fixam-se obsessivamente em detalhes ou se
agitam para aprender, na expectativa de que se passe a outro ponto; [2] de outro, os alunos que,
ao contrário, têm boas chances de aprender, porque se envolvem, interessam-se, expressam-se,
engajam-se na tarefa, cooperam, parecem divertir-se, não a abandonam ao primeiro pretexto,
fazem perguntas e questionam-se” (PERRENOUD, 2000 - p.50).

No entanto, apesar disso, poderíamos dizer que um professor suficientemente bom


seria aquele que fosse capaz de oferecer condições favoráveis ao aprendizado de seus
alunos, que se adaptasse a eles no intuito de proporcionar situações reais de aprendizado,
e que se desadaptasse na medida em que os alunos fossem adquirindo condições de

101
suportar sozinhos suas dificuldades. Um professor suficientemente bom seria aquele que
conseguisse, antes de tudo, estabelecer uma relação de confiança com seus alunos.
Com relação a esta confiança, ao longo da nossa pesquisa verificamos que para
alguns alunos ela pôde ser estabelecida, ao passo que para outros não. Então, vamos
aproveitar este momento para tentar enumerar algumas características de atuação do
professor que acreditamos terem contribuído para o surgimento e manutenção da
confiança depositada por certos alunos no professor.

 Manter a coerência entre discurso e prática;

 Mostrar-se disponível para conversar com os alunos sobre suas dificuldades,

ajudando-os sempre que possível;


 Explicitar opiniões e pontos de vista com relação a assuntos que muitas vezes

podem não estar diretamente relacionados aos conteúdos trabalhados em


aula, concordando ou discordando dos alunos quando necessário (tomando
posição diante das discussões, argumentando-as);
 Mostrar que gosta do que faz;

 Cumprir com as obrigações de um professor, e com as promessas

eventualmente feitas em sala de aula;


 Passar segurança naquilo que ensina;

Os trechos abaixo talvez corroborem esta confiança e a intenção do professor em


sempre procurar ajudar os seus alunos em suas dificuldades.

“(...) queria parabenizá-lo pelo professor que é (sei que é um pouco estranho da minha parte
dizer isso, mas... me sinto muito orgulhosa do senhor). Nunca vi um professor que se preocupa
tanto com o aluno quanto o senhor, e uma prova disso foi quando o senhor quis conversar com a
Mônica. Vejo que ela melhorou muito após essa conversa” (Amanda).

“[O professor] me deu algumas dicas, elas com certeza fizeram com que eu melhorasse e foram
ótimas” (Vânia).

“O jeito do professor é muito ‘legal’, eu gosto muito da atenção que ele dá para todos” (Laura).

“Gostaria de agradecer a ajuda que você me deu nas atividades de classe (...) e aos exercícios
que, no meio da aula, com paciência você me explicou” (Nádia).

102
“(...) reparei que o professor está sempre aberto para conversas e dúvidas principalmente com
quem tem mais dificuldades” (Raíssa).

“Eu tenho muito a agradecer pela dedicação que tem para me ajudar. Foi muito válido o e-mail
que me mandou nas férias com o planejamento, aqueles itens me ajudaram bastante” (Ana).

“Às vezes são questionamentos que não têm nenhuma relação com a matéria, mas mesmo assim
sinto necessidade de compartilhá-los com o professor, pois assim como eu, eu acho que ele
também quer entender o mundo” (Amanda).

“Realmente você [professor] tinha razão, as aulas à tarde me fizeram muito bem” (Joana).

“(...) eu queria que me dissesse o que achou, e porque eu fui mal e não consegui fazer a prova se
fiz tudo que lhe disse ? Você viu em sala de aula que eu me esforcei...” (Vânia).

“Mas agora que te conheço sei que você acredita no meu esforço; tudo ficou mais fácil” (Ana).

Um professor suficientemente bom também seria aquele que se empenhasse em


facilitar o processo de amadurecimento do aluno - que pertence exclusivamente ao aluno
- atendendo inicialmente às necessidades deste, ao invés das suas próprias (adapt. de
DIAS, 2003 - p.133).
Certamente, isto requer um certo despojamento por parte do professor. Porém,
sendo maduro, o professor não ficará narcisicamente ferido ao enfrentar os inevitáveis
confrontos decorrentes da tarefa de ensinar, e saberá tolerar seu próprio ódio, sem negá-
lo para si mesmo, mas também sem manifestá-lo diretamente nos alunos; terá a
capacidade de se deixar ferir pelo aluno, e de odiá-lo, sem se vingar (adapt. de DIAS,
2003 - p.138).

“Os professores deverão, com o tempo, apropriar-se de (...) capacidades relacionais que
permitam enfrentar, sem se desestabilizar, nem desencorajar, resistências, medos, rejeições,
mecanismos de defesa, fenômenos de transferência, bloqueios, regressões e todo tipo de
mecanismos psíquicos no decorrer dos quais dimensões afetivas, cognitivas e relacionais
conjugam-se para impedir que aprendizagens decisivas comecem ou prossigam normalmente”
(PERRENOUD, 2000 - p.60-1).

103
De acordo com DAVIES (1982, p.115), o amadurecimento do bebê necessita do
apoio egóico contínuo da mãe sempre que houver uma pressão que possa trazer confusão
ou desintegração. Acreditamos que todo este apoio e atenção dados pelo professor são
imprescindíveis para determinados alunos.

“Deparar-se com o obstáculo é, em um primeiro momento, enfrentar o vazio, a ausência de


qualquer solução, até mesmo de qualquer pista ou método, sendo levado à impressão de que
jamais se conseguirá alcançar soluções” (PERRENOUD, 2000 - p.31).

Segundo a analogia que estamos fazendo entre a mãe suficientemente boa e o


professor suficientemente bom, concluímos que a melhor maneira de inibir um aluno a
estudar e, posteriormente, dificultar a aprendizagem da Física, seria empurrá-la para ele
sem lhe dar a menor chance de “encontrar/criar” alguns objetos (adapt. de DIAS, 2003 -
p.181) que facilitem a sua transição entre o estado inicial de dependência absoluta, onde
o professor ainda precisa se adaptar às suas necessidades, e o estado de dependência
relativa, onde esta adaptação vai gradativamente se desfazendo com o objetivo de levá-lo
a estabelecer relações com o mundo externo28. A relação do aluno com estes objetos será
a base para o posterior uso dos mesmos (adapt. de DIAS, 2003 - p.245), o que ajudará a
trazer alívio diante das dificuldades inerentes ao aprendizado da Física. Se é o meio, e
não o aluno, que repetidamente tem a iniciativa, este pode desenvolver uma série de
reações a estas invasões. Neste caso, o movimento do aluno acaba sendo experimentado
apenas como uma reação à invasão (adapt. de DIAS, 2003 - p.183) e, enquanto o aluno
está somente reagindo não terá chances de ser (adapt. de DIAS, 2003 - p.160). O ser
deve preceder o fazer.
No entanto, se o contato com a Física se der por iniciativa do aluno, ou seja, se o
gesto espontâneo partir do aluno, o fato de ele estar vivo, e a própria experiência, serão
sentidos como reais, e o acúmulo dessas experiências pessoais começará a integrar-se na
personalidade do mesmo. Daí a idéia do professor inicialmente permitir que o aluno
explore a Física a sua maneira, sem cobranças excessivas, para tentar impedir a invasão
da realidade externa no mundo subjetivo do aluno, e contribuir para que este tenha a
sensação de estar, de certa forma, criando aquilo que descobre. O amadurecimento

28
São as falhas nos cuidados do professor para com os alunos que podem impulsionar o uso da mente, se
isso ocorrer na fase certa do amadurecimento destes (adapt. de DIAS, 2003 - p.229). Já os objetos
transicionais exercerão a indispensável função de ampará-los, uma vez que servirão de substituto do
professor que, gradativamente, se desadapta e desilude os alunos (adapt. de DIAS, 2003 - p.237).

104
promove a capacidade de criar mundos e transitar entre eles (adapt. de DIAS, 2003 -
p.238). Para isso, é preciso que a apresentação de objetos, por parte do professor, seja
feita de tal maneira que, ao mesmo tempo em que o aluno estabelece uma relação com
esses objetos, ele é mantido na ilusão de onipotência, ou seja, ele cria o que necessita
sem nenhuma consciência da ajuda que recebeu do professor. E o professor, por sua vez,
nunca deve perguntar se o objeto foi criado ou encontrado; essa ilusão deve ser
sustentada para que depois possa servir de referência ao aluno quando este começar a
enfrentar as dificuldades relativas ao aprendizado da Física (adapt. de DIAS, 2003 -
p.170-1). É errado pensar que o sentido de realidade de um aluno depende da insistência
do professor quanto à natureza externa das coisas do mundo (adapt. de DIAS, 2003 -
p.216). A ilusão e a esperança de que sempre existe algo no mundo externo capaz de dar
fim às agonias e ansiedades decorrentes das dificuldades que surgirão pela frente parece
ser algo essencial para um aluno manter-se no processo de aprender.
Quando um aluno tem determinada tarefa para ser realizada, e esta lhe traz
dificuldades, ou seja, ele não consegue ou não sabe como fazê-la, é comum o relato de
sentimentos de ódio, frustração e raiva. O aluno parece não saber nada sobre a
necessidade que o aflige, nem que tipo de ação seria eficaz para aplacá-la; não sabe nem
ao menos da existência de objetos, quanto mais se dado objeto é adequado ao tipo de
necessidade que o assola.

“Os alunos não dispõem, no início, dos meios da solução buscada, devido à existência do
obstáculo a transpor para chegar a ela. É a necessidade de resolver que leva o aluno a elaborar
ou a se apropriar coletivamente dos instrumentos intelectuais necessários à construção de uma
solução” (PERRENOUD, 2000 - p.43).

Verificamos esta realidade durante nossa pesquisa:

“Sinceramente, não sei mais o que fazer para aprender Física” (Bárbara).

“Eu nunca acho que estou preparada para uma avaliação, mesmo quando fico estudando por
horas para resolvê-la” (Fátima).

Usar um objeto é, igualmente, uma conquista, que só poderá realizar-se no seu


devido tempo.

105
“A construção de atitudes, de competências ou de conhecimentos fundamentais leva meses, até
mesmo anos” (PERRENOUD, 2000 - p.50).

No início, a ação exigida pelo impulso é só um gesto, não tem meta certa; não
incide sobre um objeto em particular (adapt. de DIAS, 2003 - p.176). E um objeto só será
bom para um aluno se for criado por ele (adapt. de DIAS, 2003 - p.181). Eis a
importância de um contato inicial favorável com a Física, um contato que permita a
criação, por parte do aluno, de tais objetos.

“A melhor dica [dada pelo professor] foi a de estudar usando o livro-texto pra ver se eu entendia
melhor. Foi a melhor coisa, me ajudou muito a entender Física” (Bárbara).

“As dicas de estudar um pouco todo dia e não ficar desesperada quando não conseguir fazer
algo me ajudaram muito” (Raíssa).

“Bom eu nunca usava o livro texto para estudar, porque achava desnecessário. Mas venho
tentando ler e agora quando tenho uma dificuldade em vez de deixar para tirar dúvida em sala
eu pego o livro, acho que isto está ajudando de certa maneira” (Vânia).

“Algo que reconheço como sendo um esforço foi aprender a ler o livro-texto” (Vânia)

Porém, para que esta tarefa tenha maiores chances de ser bem sucedida
acreditamos ser necessária a existência de material de apoio adequado. Parece-nos que os
livros didáticos normalmente utilizados nas escolas, em parte pelo aparente receio de
pecarem nas definições exatas dos conceitos apresentados, não possuem uma linguagem
capaz de fazer a maior parte dos alunos vê-los como possíveis aliados no aprendizado.
Além disso, experiências práticas bem conduzidas, onde os alunos possam experimentar
situações, mesmo que, de início, sem a necessidade de concluí-las de maneira formal, ou
de apresentar resultados conclusivos, poderia contribuir para que o primeiro contato com
a Física fosse feito através da criatividade, e não da submissão.
Para que o mundo subjetivo do aluno se mantenha vivo e este continue a criar os
objetos de que necessita, é preciso que alguém se dê ao trabalho de continuamente
apresentar amostras do mundo ao aluno, de forma compreensiva e adequada à capacidade
maturacional do momento, o que muitas vezes não é possível em nossas escolas.

106
“Se a escola quisesse criar e manter o desejo de saber e a decisão de aprender [dos alunos],
deveria diminuir consideravelmente seus programas, de maneira a integrar em um capítulo tudo
o que permita aos alunos dar-lhe sentido e ter vontade de se apropriar desse conhecimento”
(PERRENOUD, 2000 - p.69).

Uma insuficiente apresentação de objetos bloqueia o caminho do aluno na direção


de sentir-se real e de relacionar-se com o mundo real de objetos e fenômenos.
Há ambientes que simplesmente deixam o aluno largado aos seus próprios
recursos, e que não lhe fornecem material para a criação (adapt. de DIAS, 2003 - p.215).

“A instituição escolar coloca os professores de ensino fundamental e médio em uma posição


muito difícil: eles devem instruir, 25 a 35 horas por semana, 40 semanas por ano, durante 10 a
20 anos, crianças e depois adolescentes que, algumas vezes, nada pediram” (PERRENOUD,
2000 - p.67).

Parece-nos ser este o caso nas salas de aula onde o número de aluno excede ao da
capacidade do professor em dar a atenção que cada um deles possa necessitar.

“A maior parte dos alunos tem necessidade de ser reconhecida e valorizada como pessoa única.
Os alunos não querem ser um número em uma sala de aula que tem um número. É por isso que o
ensino eficaz é um trabalho de alto risco, que exige que as pessoas se envolvam sem abusar do
seu poder” (PERRENOUD, 2000 - p.151).

Assim, pode ser comum encontrarmos alunos acreditando que o professor vai
para a escola simplesmente para “passar” o conteúdo do dia, sem se preocupar com todos
os outros fatores envolvidos no processo de aprendizagem.

“Sempre achei que a maneira de estudar o aluno é quem tem de descobrir, por si só” (Cláudia).

Por fim, concordamos com PERRENOUD (2000 - p.61) quando ele diz que para
que o professor possa enfrentar todos estes desafios deverá “ter domínio teórico e prático
dos aspectos afetivos e relacionais da aprendizagem e possuir cultura psicanalítica
básica”.

107
5.3 - Recomendações ao professor

De maneira geral, poderíamos então sugerir cinco recomendações que, a nosso


ver, contribuiriam para o ensino da Física, e que serviriam para caracterizar um professor
suficientemente bom:

1°) O professor poderia tentar estabelecer e manter uma relação de confiança para com
seus alunos, sempre sabendo que nada pode ser feito para garantir o sucesso desta tarefa;

2°) O professor poderia tentar propiciar um ambiente estável no início do contato do


aluno com a Física, onde este possa explorá-la sem cobranças excessivas. O objetivo
seria permitir que o aluno tenha a sensação de estar, de certa forma, criando aquilo que
descobre, o que contribuiria para a crença na possibilidade de se aprender Física. Em
outras palavras, este ambiente estável poderia permitir a criação, por parte do aluno, de
um mundo subjetivo que esteja relacionado ao aprendizado da Física;

3°) Depois de algum tempo, o professor poderia introduzir, gradativamente, falhas nos
cuidados oferecidos ao aluno, para que este possa começar a “encontrar/criar” substitutos
para tais cuidados. Este início deve ficar por conta da percepção do professor do
momento em que seus alunos estariam preparados para lidar com estas falhas. Por conta
desta desadaptação, o aluno começaria a enfrentar pequenas frustrações, que não
deveriam exceder sua capacidade de tolerá-las, e seria estimulado a “encontrar/criar”
objetos que fossem capazes de diminuir as agonias e ansiedades decorrentes destas
falhas. Tais objetos, chamados por Winnicott de objetos transicionais, terão sua
importância na medida em que se mostrarem úteis na superação das dificuldades que
originaram tais ansiedades;

4°) Juntamente com a desadaptação às necessidades do aluno, o professor deveria


proceder a apresentação de objetos que pudessem ser “encontrados” pelo aluno no
decorrer das aulas, ou dos estudos, para que estes possam ajudá-lo na superação das suas
dificuldades. Pela presente dissertação poderíamos sugerir alguns possíveis objetos:
livros e textos que não excedam a capacidade de compreensão do aluno, frases do
professor que contribuam para o esclarecimento de como funciona o processo de
aprendizagem e que contribuam também para estimular o aluno em relação as suas

108
potencialidades. É bom destacar que ao professor cabe somente a tarefa de disponibilizar
tais objetos, e esperar que o aluno possa “encontrá-los/criá-los”, para depois poder fazer
uso destes, com o passar do tempo, em benefício próprio. O professor pode somente
disponibilizar as condições que contribuiriam para o eventual desenvolvimento de um
aluno, não podendo, portanto, realizar tal desenvolvimento para o aluno;

5°) Como o amadurecimento não ocorre ao mesmo tempo para todos os alunos de uma
mesma classe, o professor deveria estar sempre atento, na medida do possível, às
necessidades individuais de cada um, procurando entender cada fase do processo de
amadurecimento. Seria importante que professor e aluno construíssem ao longo dos anos
de convivência na escola uma relação saudável, onde ambos estivessem “empenhados
num sacrifício mútuo de espontaneidade e independência” (WINNICOTT, 1982 - p.230).

5.4 - Considerações finais

Apesar da existência de inúmeras áreas de pesquisa em Ensino, e do que já


conquistamos até hoje, parece que muito ainda deverá ser feito para que possamos
finalmente oferecer uma educação de qualidade à grande maioria dos brasileiros.
Felizmente, muitas pessoas trabalham hoje com este objetivo. No entanto, além dos
conhecimentos técnicos, que devem ser diversificados, devemos também conquistar os
meios pelos quais todas as boas intenções possam realmente chegar às escolas, o que
exigirá uma mudança de valores da sociedade. Hoje nossa sociedade, moldada pelo
capitalismo, está fortemente presa ao lucro e à competição, o que tem sido o motor para o
enriquecimento de poucos em detrimento da enorme maioria e seu empobrecimento.
Somos estimulados diariamente ao consumo sem consciência e estamos nas mãos de
“líderes” corruptos e gananciosos.
Porém, sabemos que a educação é um caminho eficaz para a diminuição gradual
das conseqüências maléficas desta maneira insustentável de viver; uma educação que
estimule a cooperação, a ética e a solidariedade entre as pessoas; uma educação que saiba
acolher as novas gerações e prepará-las para a construção de um mundo para todos, sem
demagogias baratas. O caminho é longo, sem dúvida, mas a ilusão da sua existência é o
que nos dá forças para continuar lutando por dias melhores.
Iniciamos esta dissertação explorando as conseqüências do trabalho em grupo
dentro da sala de aula por conta de uma característica da nossa realidade educacional -

109
salas abarrotadas de alunos. Porém, na medida em que percorríamos o trajeto que nos
trouxe até aqui fomos percebendo o quanto fatores estritamente pessoais eram capazes de
dificultar, ou mesmo inviabilizar o aprendizado da Física. Esta percepção foi tão forte
que decidimos, na metade do caminho, mudar o rumo das nossas observações para
investigar como tais fatores poderiam interferir na aprendizagem, e para explorar
também o papel do professor na superação, por parte do aluno, das dificuldades surgidas.
Constatamos que o ato de estudar Física traz consigo situações com as quais o
aluno pode não saber como lidar, e que estas situações são potencialmente capazes de
gerar sentimentos que acabam afastando o aluno da Física.
Lançando um olhar winnicottiano sobre a relação dos alunos com o próprio
aprendizado, concluímos que o enfrentamento das dificuldades e angústias surgidas da
iniciativa de se estudar Física depende do uso de objetos transicionais que possam fazer
destas angústias algo suportável. No entanto, o uso de tais objetos implica que estes
sejam antes “encontrados/criados” pelos alunos, o que pressupõe um trabalho que pode
ser feito pelo professor no sentido de disponibilizá-los em um ambiente que seja
favorável a este fim.
Em nossa pesquisa verificamos que a aluna Ana aprendeu a fazer uso de alguns
objetos que, no início das observações, não contribuíam para o enfrentamento das
dificuldades decorrentes do estudo da Física. Dentre estes objetos, podemos destacar o
uso do livro de Física, o uso das próprias anotações, a crença na própria capacidade de
aprender e a crença no processo de aprendizagem exposto pelo professor. Observamos
também que estas conquistas ocorreram de forma gradual durante todo o ensino médio, e
contaram com o apoio do professor para que pudessem se realizar, uma vez que foi ele
quem se preocupou em proporcionar a Ana um ambiente onde estes objetos pudessem
desempenhar a sua função.
Estas conclusões foram possíveis graças às informações obtidas dos diversos
questionários aplicados aos alunos e das inúmeras conversas informais ocorridas entre
janeiro de 2005 e agosto de 2006. Com elas notamos o quão valiosa e importante pode
ser a relação entre professor e aluno para o desenvolvimento e amadurecimento deste
último, e de como as posturas e os valores assumidos pelo professor são determinantes
para que o aluno possa, com o tempo, além de confiar no professor, perceber coerências
naquilo que ouve e vê dentro da sala de aula, principalmente com relação aos fatos que
dizem respeito ao próprio processo de aprendizagem.

110
No entanto, acreditamos que o apoio dado pelo professor somente poderá se
realizar se houver por parte deste a iniciativa e a vontade de ajudar seus alunos; de
conversar com eles para descobrir quais são suas esperanças, seus medos e suas
dificuldades. Sem esta relação próxima, muitas vezes dificultada pela maneira como a
educação é aplicada na maioria das escolas brasileiras, o professor não terá subsídios que
o ajudem a contribuir para o amadurecimento dos seus alunos. Além disso, concluímos
também que deve existir, por parte do professor, a capacidade de, muitas vezes, saber
esperar o tempo agir a favor do amadurecimento de certos alunos, uma vez que este
amadurecimento é um processo que depende de inúmeros outros fatores que fogem da
competência docente.
Temos a consciência de que, por conta da carga excessiva de trabalho imposta aos
professores, esta dedicação acaba se tornando, na maioria das vezes, de difícil realização.
Mas, esperamos que este trabalho possa ao menos contribuir para uma reflexão sobre
como a educação poderia ser, e para a constatação de que, apesar das suas humanas
limitações, os professores são peças importantes e nunca substituíveis dentro do processo
educacional. Principalmente se desejarmos uma sociedade diferente desta que possuímos
hoje.

111
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABADI, S. Transições: O modelo terapêutico de D.W. Winnicott. São Paulo: Casa do


Psicólogo, 1998.
BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.
DAVIES, M. & WALLBRIDGE, D. Limite e espaço: uma introdução à obra de D.W.
Winnicott. Rio de Janeiro: Imago, 1982.
DIAS, E. O. A teoria do amadurecimento de D. W. Winnicott. Rio de Janeiro: Imago,
2003.
ERICKSON, F. Qualitative methods in research on teaching. In: Wittrock, M. C. (Ed.)
Handbook of research on teaching (3ª edição). Nova York: Macmillan Publishing
Co., 1986.
FERNANDES, L.M. & VILLANI, A. O “brincar” de Winnicott e a resolução de
problemas em Física. Atas do 5o. Encontro Nacional de Pesquisa em Educação
em Ciências, Bauru: ABRAPEC, 2006.
MOREIRA, M. A., Pesquisa em Ensino: O Vê Epistemológico de Gowin, Temas Básicos
de Educação e Ensino, São Paulo: Ed. EPU, 1990.
NEWMAN, A. As idéias de D. W. Winnicott. Rio de Janeiro: Imago Editora, 2003.
PERRENOUD, P. Dez novas competências para ensinar. Porto Alegre: Artes Médicas,
2000.
PICHON RIVIÈRE, E. O Processo Grupal. São Paulo: Martins Fontes, 1982.
SILLAMY, N. Dicionário de Psicologia Larousse. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
WINNICOTT, D. W. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago Editora, 1975.
WINNICOTT, D. W. A criança e o seu mundo. 6ª edição. Rio de Janeiro: Zahar
Editores, 1982.
WINNICOTT, D. W. Explorações Psicanalíticas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1983.
WINNICOTT, D. W. O ambiente e os processos de maturação. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1994.
WINNICOTT, D. W. Tudo começa em casa. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
WINNICOTT, D. W. Os Bebês e Suas Mães. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

A - OUTRAS REFERÊNCIAS

A.1 - Obras citadas

BALLONE, G. J. Dicionário de Psiquiatria PsiqWeb <http://www.psiqweb.med.br/gloss/>


BARROS, M. A. Análise de experiências didáticas com grupos de aprendizagem em
Física. Tese de doutorado, USP, 2002.
BLEGER, J. Psicologia da conduta. Porto Alegre: Artes Médicas, 1984.

112
BLEGER, J. Grupos operativos no ensino. In: Temas de psicologia. São Paulo: Martins
Fontes, 1993.
CIAMPONE, M. H. T. Grupo Operativo: construindo as bases para o ensino e a
prática na enfermagem. Tese (Livre-Docência) - Escola de Enfermagem.
Universidade de São Paulo. São Paulo, 1998.

A.2 - Obras consultadas

BAUMAN, Z. O Mal-Estar da Pós-Modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor,


1995.
BION, W.R. Experiências com grupos: os fundamentos da psicoterapia de grupos. Rio
de Janeiro: Imago Editora; Editora Universidade de São Paulo, São Paulo, 1975.
COSTA, R. Z. V. A "participação" dos estudantes num laboratório didático de Física.
São Paulo: USP, 1997. Dissertação de Mestrado.
FERREIRA, D.B. (2004) Contribuições da Psicanálise para uma Metodologia de
Pesquisa em Educação em Ciências. Ainda não publicado.
FRANZONI, M. Os pontos de ressonância entre os convites docentes e a construção de
saberes na formação inicial de professores. Tese de Doutorado. Faculdade de
Educação da USP, 2004.
KUPFER, M. C. Freud e a educação: O mestre do impossível. São Paulo: Scipione,
1992.
LAPLANCHE, J. ; PONTALIS, J. B. Vocabulário da psicanálise. São Paulo: Martins
Fontes, 1998.
SANCHEZ, R., U., Grupos Operativos de aprendizagem: uma perspectiva de mudança
para a relação ensino–aprendizagem. Tese de Mestrado, IFUSP, 2002.
TAPIA, J. A. Motivação e aprendizagem no ensino médio. In: César Coll (org)
Psicologia da Aprendizagem no Ensino Médio. Porto Alegre: Artes Médicas,
2003.
VILLANI, A. (1999) O professor de ciências é como um analista? - Ensaio - Pesquisa
em Ensino de Ciências 1(1), pp. 5-28
WINNICOTT, D. W. Privação e Delinqüência. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
WINNICOTT, D. W. Textos Selecionados da Pediatria à Psicanálise. 3ª edição. Rio de
Janeiro: Francisco Alves, 1988.
WINNICOTT, D. W. Estabelecimento da relação com a realidade externa, in: Natureza
Humana. Rio de Janeiro: Imago Editora, 1990.

113
APÊNDICES

Anexo 1

QUESTIONÁRIO 1 (aplicado em fevereiro e novembro de 2005)

1 - Fale um pouco sobre as coisas que você mais gosta de fazer; aquelas que mais te dão
prazer.

2 - Existe algo que você, na sua opinião, saiba fazer bem? Fale um pouco sobre ela.

3 - Escreva como costuma ser o seu dia-a-dia depois que você sai da escola e aos finais
de semana.

4 - Quais disciplinas você gosta de estudar? Quantas vezes, e quantas horas, na semana
você dedica a cada uma delas?

5 - Como você avalia o seu desempenho em Física no ano passado? O que levou você a
ter o desempenho que teve?

6 - Quantas vezes por semana, e por quantas horas, você costuma pegar os livros e os
cadernos para estudar Física?

7 - Explique o que você costuma fazer para estudar Física (quanto mais detalhes você
puder relatar, melhor).

8 - Você acha o seu método de estudo eficiente? Por quê?

9 - Você acha que pode melhorá-lo? Dê algumas idéias de como você pode aperfeiçoar
seu método de estudo.

10 - Como você se sente quando está estudando e não consegue resolver algum problema
de Física? O que você costuma fazer nesta hora?

11 - Alguém o ajuda na hora de estudar ou tirar as dúvidas sobre Física? Quem?

12 - Você tem o hábito de tirar suas dúvidas com o professor? Por quê?

13 - Você já conversou alguma vez com o seu professor sobre a maneira como você
estuda? (Se você responder que não, explique o motivo. Se você responder que sim,
responda também a questão 14)

14 - Se você já conversou, ele lhe deu algumas dicas? Você pensou sobre elas? Elas o
ajudaram?

114
15 - Na sua opinião, quais as suas maiores dificuldades quando você está estudando
Física?

16 - Fale um pouco do seu esforço para aprender Física (e de quanto você se empenha
para isso).
17 - Quais foram, na sua opinião, os grandes responsáveis pela sua melhora, ou piora, no
desempenho em Física do ano passado (pessoas, atitudes, ações...) ?

Anexo 2

QUESTIONÁRIO 2 (aplicado em janeiro de 2006)

1 - Você gosta de estudar Física ? (e outras matérias ?)


2 - Se eu lhe fizesse a pergunta 1 no início do ano passado (2005), o que você
responderia ?
3 - O que você acha que acontece com você na hora de estudar Física ?
a) Na maioria das vezes você sente muitas dificuldades, o que acaba não
permitindo que você aprenda a maioria dos tópicos de Física;
b) Você sente muitas dificuldades, mas na maioria das vezes acaba aprendendo;
c) Só às vezes você sente dificuldades, mas na maioria das vezes acaba
aprendendo;
d) Você não sente dificuldades em aprender Física.
4 - Quando você sente alguma dificuldade na hora de estudar Física, ou resolver algum
problema, o quanto você costuma insistir (muito ou pouco), antes de desistir, para tentar
resolver essa dificuldade ou problema ?
5 - Como você acha que responderia a pergunta 4 se ela fosse feita no início do ano
passado (2005) ?
6 - Hoje você costuma ler o livro-texto para estudar Física ?
7 - Você já tinha o hábito de ler o livro-texto para estudar Física quando ainda estava na
1ª série ?
8 - Escolha entre as alternativas abaixo aquela que você acha em que mais se enquadra
hoje:
a) somente estudo Física quando tem prova, e sinto dificuldades para entender os
conteúdos;

115
b) somente estudo Física quando tem prova, e até que não sinto muitas
dificuldades para entender os conteúdos;
c) eu estudo Física pelo menos uma vez por semana, mas mesmo assim sinto
dificuldades. Normalmente desisto logo quando não entendo alguma coisa ou não
consigo resolver algo de Física;
d) eu estudo Física pelo menos uma vez por semana, mas mesmo assim sinto
dificuldades. No entanto, não desisto com facilidade quando não entendo alguma
coisa ou não consigo resolver algo de Física;
e) eu estudo Física pelo menos uma vez por semana e não sinto tantas
dificuldades, por isso nem preciso me dedicar muito aos estudos dessa matéria;
f) eu estudo Física pelo menos uma vez por semana e não sinto tantas
dificuldades. No entanto, mesmo não tendo dificuldades me dedico muito aos
estudos dessa matéria.
9 - Escolha entre as alternativas abaixo à qual você acha mais se enquadrava no início do
ano passado (2005):
a) somente estudava Física quando tinha prova, e sentia dificuldades para
entender os conteúdos;
b) somente estudava Física quando tinha prova, e até que não sentia muitas
dificuldades para entender os conteúdos;
c) eu estudava Física pelo menos uma vez por semana, mas mesmo assim sentia
dificuldades. Normalmente desistia logo quando não entendia alguma coisa ou
não conseguia resolver algo de Física;
d) eu estudava Física pelo menos uma vez por semana, mas mesmo assim sentia
dificuldades. No entanto, não desistia com facilidade quando não entendia alguma
coisa ou não conseguia resolver algo de Física;
e) eu estudava Física pelo menos uma vez por semana e não sentia tantas
dificuldades, por isso nem precisava me dedicar muito aos estudos dessa matéria;
f) eu estudava Física pelo menos uma vez por semana e não sentia tantas
dificuldades. No entanto, mesmo não tendo dificuldades me dedicava muito aos
estudos dessa matéria.

116
Anexo 3

QUESTIONÁRIO 3 (aplicado em maio de 2006)

1 - Com sinceridade, qual seria o motivo que o leva a estudar Física algumas vezes na
semana ou no mês: aprender coisas novas ou somente obter um desempenho satisfatório
nas avaliações ?
2 - Normalmente quais são os tipos de dificuldades que você costuma encontrar quando
resolve estudar Física ?
3 - Por quais motivos você acha que as dificuldades relatadas acima costumam aparecer
?
4 - Essas dificuldades costumam atrapalhar muito os seus estudos, ou na grande maioria
das vezes você consegue lidar com elas ?
5 - Você percebe que essas dificuldades, quando aparecem, causam em você algum tipo
de sentimento ? O que você costuma fazer nessa hora ?
6 - Normalmente como você costuma tentar resolver as suas dificuldades relativas ao
estudo da Física ? (o que você costuma fazer para superá-las ?)

Anexo 4

QUESTIONÁRIO 4 (aplicado em agosto de 2006 somente para a aluna Ana)

1 - Você havia dito que no 1° ano não costumava usar o livro-texto. Depois, acho que no
começo do 2° ano, começou a usar, mas ainda assim achava complicado. Depois você me
disse que estava melhorando sua relação com o tal livro. Como você também disse que
costuma usar outros livros de Física, gostaria de saber o seguinte:
- qual a sua relação com o livro-texto hoje ? Você continua achando muito complicado
ou as coisas melhoraram um pouco ?
- você prefere, na maioria das vezes, usar outros livros de Física ?
- desde quando você começou a usar outros livros ?
- no início também era difícil de você entender esses outros livros ou desde o começo
sempre foi mais fácil do que o livro-texto (aquele apostilado) ?
2 - Você consegue explicar por que não gosta de Física ? Você lembra desde quando não
gosta ?

117
3 - A que você se apega nos momentos de “desespero” quando está estudando e
enfrentando dificuldades ? O que a faz sentir mais aliviada e capaz de não deixar a
“peteca” cair nessa hora ?
4 - Como eram as aulas particulares ? A professora te ajudava com exercícios somente
ou também dava dicas de como estudar ? Quais foram essas dicas ? Ela lia o livro junto
com você ? Como você acha que ela a ajudou ? O que ela fez que a ajudou ? (já que
você disse que as aulas particulares a ajudaram muito)
5 - O que você achou de fazer os trabalhos de leitura (aquele dos artigos de jornais ou
revistas) ?
6 - O que você achou de fazer as auto-avaliações ?
7 - Hoje, qual é o valor que as notas das provas tem para você no sentido de apontar o
quanto você está aprendendo ? No 1° e no 2° ano você dava mais ou menos valor a elas
do que hoje ? Ou era a mesma coisa ? Você acha que antes, quando tirava uma nota ruim,
você ficava mais desmotivada do que hoje ou não ?
8 - Você saberia responder por que você não fica mais tão nervosa antes e durante as
avaliações ?
9 - Você acha que mudou, nestes anos, sua maneira de se relacionar com os colegas no
que se refere aos estudos ? Por quê ? Quem foi o responsável por essa mudança ?
10 - Você acha que mudou, nestes anos, sua maneira de se relacionar com Física ? Por
quê ? Quem foi o responsável por essa mudança ?
11 - Você acha que mudou, nestes anos, sua maneira de se relacionar com as provas ?
Por quê ? Quem foi o responsável por essa mudança ?
12 - Você acha que mudou, nestes anos, sua maneira de se relacionar com o livro ? Por
quê ? Quem foi o responsável por essa mudança ?
13 - Você acha que mudou, nestes anos, sua maneira de se relacionar com seu caderno e
suas anotações ? Por quê ? Quem foi o responsável por essa mudança ?
14 - Você acha que mudou, nestes anos, sua maneira de se relacionar com o professor ?
Por quê ? Quem foi o responsável por essa mudança ?
15 - Você acha que mudou, nestes anos, sua maneira de se relacionar com as aulas ? Por
quê ? Quem foi o responsável por essa mudança ?
16 - Você acha que mudou, nestes anos, sua maneira de se relacionar com os exercícios e
tarefas de Física ? Por quê ? Quem foi o responsável por essa mudança ?
17 - Desde quando você começou a estudar Física com freqüência ?

118
18 - Você estuda esperando que as questões da prova sejam as mesmas das tarefas ?
Você fazia isso nos anos anteriores ?

Anexo 5

Atividade de leitura, interpretação e reflexão (Tema central: Ciência e Tecnologia)

Você deverá entregar, no mês de fevereiro, e na primeira aula dos meses maio e
setembro, um artigo retirado de jornal, revista ou internet, que de alguma forma esteja
relacionado ao assunto "Ciência e Tecnologia" (…procure não selecionar artigos muito
grandes ou muito pequenos !!). Leia o artigo várias vezes, com atenção (quanto mais
você ler, mais fácil será para entender as idéias contidas nele), e escreva um texto que
contenha a sua opinião sobre o que você leu (não é para resumir o artigo e nem ficar
escrevendo o que você leu. Isto não seria dar a sua opinião).

Atenção: os artigos devem ter sido publicados nos dois meses anteriores ao da entrega
do trabalho. Então, o trabalho de maio deverá ser feito com um artigo publicado em
março ou abril, e o trabalho de setembro deverá ser feito com um artigo publicado em
julho ou agosto. Já o trabalho de fevereiro poderá ser feito com um texto publicado em
janeiro ou fevereiro.

Como deverá ser o seu texto e a entrega:

- Entregar o artigo (ou um xerox dele) e o texto que você escreveu na primeira
aula dos meses de maio e setembro. O trabalho de fevereiro poderá ser
entregue até a última aula de Física do mês. Os trabalhos entregues fora destas
datas perderão até 50% da nota obtida.
- O texto que você escrever deverá ter no mínimo 15 linhas e ser digitado usando-
se fonte Times New Roman de tamanho 12.
- Não colocar capa no trabalho. Você deverá entregar somente o seu texto,
grampeado ao artigo (o texto que você escreveu deverá estar na frente do artigo).
- Trabalhos sem grampear não serão recolhidos (e ninguém poderá sair da classe na
hora da aula para grampear trabalhos).

119
- Todos os trabalhos que não sigam algumas destas determinações, ou que estejam
com algum problema, não receberão nota. Eles serão devolvidos para que sejam
refeitos. A nota só será dada quando o trabalho estiver totalmente finalizado.
- Colocar e preencher o seguinte cabeçalho no início da folha que você for
escrever o seu texto:

Nome: nº Série:
Título do artigo:
Fonte e data da publicação:
Mês da entrega:

Anexo 6

Recomendações para a auto-avaliação

Ela deve ser feita de modo que você faça uma reflexão sobre como foi sua dedicação e
desempenho na última avaliação. Por exemplo, você pode responder perguntas do tipo:
a) Como foi a sua dedicação ao estudo da Física para esta avaliação ? (quanto tempo
estudou por semana, quantas vezes ? ... ou somente estudou na véspera da avaliação ?)
b) Você tem lido o livro-texto ? Tem consultado outros livros ?
c) Você tem feito as tarefas para casa ? Tem conseguido acertar ? Se não acerta, tem
procurado tirar as dúvidas com alguém ? Procura fazer novamente depois ?
d) Você achou que estava preparado(a) para realizar a avaliação ? Mudou de idéia depois
de ver a prova ?
e) Caso ainda não esteja bom, você acha que pode melhorar ? Você está disposto(a) a
trabalhar para isso, reservando algumas horas a mais na semana para estudar ? Já tem
alguma estratégia para mudar o que você acha não estar bom ?

... entre outras reflexões que você ache interessante fazer. Sinceramente, para mim,
quanto mais você escrever, melhor será.

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