8 Comportamento
Apelido:
saiba lidar
com ele
Equilíbrio Especialistas dizem que os
pais não devem tornar o problema
maior do que ele realmente é
TEXTOS: CAROL SCOLFORO
FOTOS: LUCAS ABOUDIB
 Um dia desses, uma leitora do Leve
a Vida pediu uma ajuda à nossa equi-
pe. “Meu filho sempre chega em casa
chateado, porque os colegas o cha-
mam de ‘cabeção’. E o pior é que, de-
pois disso, ele também passou a se in-
comodar com a orelha, que tem a
pontinha torta. Em resumo: fica horas
na frente do espelho analisando seus
‘defeitos’. Morro de pena, mas não sei
como agir...”
A história de nossa leitora nos fez le-
vantar a questão: quem nunca foi alvo
de uma implicância desse tipo? Como
explica a psicóloga e especialista em
educação Renata Terry Brandão, tudo
começa por volta dos sete anos, quan-
do temos o senso estético mais crítico
em relação aos outros. “O fenômeno
acontece principalmente na terceira e
quarta séries do ensino fundamental
e afeta muitas crianças. Por isso, os
pais precisam estar atentos”, frisa.
IMPOTÊNCIA. Os pais mais aten-
tos, realmente, percebem o proble-
ma. Mas a maioria, como nossa lei-
tora, não sabe o que fazer. Passam,
inclusive, por vários dilemas. Den-
tre eles, os clássicos: Valorizar a
auto-estima do meu filho é mimar?
E mimar demais pode criar um ser
humano dependente demais ou ar-
rogante?
Segundo especialistas, a família de-
Vitória (ES), domingo, 17 de junho de 2007 A GAZETA A GAZETA Vitória (ES), domingo, 17 de junho de 2007 Comportamento 9

“Sempre aceitei numa boa”
O estudante Vinícius Prando Sirtoli, 21 anos, começou a ser
chamado de miúdo pelo grupo de Escoteiros, do qual fez par-
te na infância. E desde que ele se lembra é conhecido assim,
porque sabia que era menor que os outros amigos. “É muito
difícil alguém me conhecer pelo nome, onde moro. Mas co-
mo sempre fui muito brincalhão, aceitei numa boa”, conta.
Assim mesmo, sempre levando na esportiva, ele até fez tra-
tamento para crescer, que deu certo, mas não abriu mão do
apelido, que virou sua marca registrada. “Todo mundo tem
apelido na minha turma”, diz, acrescentando que isso nunca
foi motivo para ficar chateado. “Aliás, já inventei vários ape-
lidos para meus amigos também, mas nunca como deboche”,
lembra. O segredo para encarar as implicâncias na escola?
Para ela, ele é não ligar para o que dizem. Quanto me-
nos você se importar, menos as pessoas vão
achar graça em te expor. Se você responde,
dá abertura para a pessoa continuar fa-
lando”, afirma. Outra dica é inventar
um apelido para quem implica.
ve encarar o problema de frente e
tratar a auto-estima da criança com
equilíbrio. “Nesse mundo competi-
tivo em que vivemos, isso deve ser
feito desde cedo, para que a criança
cresça sabendo tanto de suas quali-
dades, quanto de seus defeitos”, diz
Renata.
A invenção de apelidos maldosos ge-
“Tinha vergonha da
Bullying é coisa séria
ralmente ocorre entre os colegas de
classe, observa a psicóloga. Mas nem
por isso os pais devem cobrar posi-
minha altura”  A dica dos especialistas para os pais ten-
tarem resolver o problema com a criança
escola. Nem seja agressivo com ela, dizen-
do que ela não sabe se defender. Isso por-
ções dos professores ou trocar a crian- sem envolver a escola não se aplica aos que muitas crianças que sofreram com es-
ça de escola. O ideal seria fazer com casos de bullying – quando a abordagem sa situação viram futuros agressores. O
 “Sempre tive muitos apelidos em função de extrapola os limites da “brincadeira” e autor procura alguém sempre mais frágil
que a criança ou o adolescente apren- ser muito magra. Bambu e Olívia Palito são
dam a lidar com a situação e, assim, passa a ser uma agressão. que ele, e se vinga do que fizeram no pas-
só alguns deles. Antes de ser modelo tinha Nesses casos, segundo a psicopedagoga e sado”, explica a especialista.
supere um possível trauma. vergonha da minha própria altura (1,78m),
Para a psicóloga Fabíola de Pádua, os neuropsicóloga Kátia Chedid, os pais de- De acordo com ela, pessoas que não
pois eu sempre era a mais alta da turma. vem, sim, procurar o professor e, se for o aprenderam a lidar com diferenças na in-
pais devem ensinar a criança a se Sempre evitava usar salto alto.
sentir superior a tudo isso. “Até por- caso, até mesmo ajuda profissional. fância, dificilmente conseguirão superar a
Fui descoberta por um agente de modelos em “Assim como em casa, é na escola que de- dificuldade quando adultas.
que isso vale para a vida toda, já que uma lan house. Com o tempo, fui aceitei minha
sempre haverá pessoas que querem vem ser trabalhadas as diferenças. Há Há brincadeiras comuns da idade, mas ca-
altura e minha magreza, que, inclusive, é ge- muito a ser feito. O profissional é a chave sos de agressão não devem ser tolerados.
nos colocar para baixo”, diz. nética. Daí, passei a me moldar cada vez mais
que vê a realidade. A ação, a partir disso, é “É complicado porque, normalmente,
ao mundo da moda. Os apelidos continuaram, decidida coletivamente”, aconselha. quem recebe a agressão se acha merece-
RECEITA. O caminho, na análise claro, mas a situação foi superada.
dela, não é enfatizar o problema, Mas há um alerta: “Jamais tire a criança da dor da perseguição”, afirma Kátia.
Aprendi a levar na brincadeira, nunca é
ou exigir uma postura imediata da bom levar a sério um comentário maldoso.
criança, mas trabalhar isso na ro- Ainda me chamam de magrela. Só que hoje
tina dela, junto à escola, ou os ami- eu adoro. Quando me lembro dos apelidos,
gos da rua.
Segundo Fabíola, a auto-estima deve
fico rindo pra mim mesma. Numa visão Cheque onde está o problema
mais ampla, diria que não ligar para esses
ser desenvolvida no dia-a-dia, com comentários maldosos é uma boa dica.”  Se os apelidos mencionarem um pro- entre os colegas. Falta de limites e excesso
atitudes positivas e palavras corre- blema que não seja visual, mas de com- de mimos, por exemplo, podem gerar uma
tas. Os pais devem passar segurança Danielle Fonseca, 17, modelo da Ragazzo portamento, a situação é outra. criança egoísta, chata, agressiva.

para a criança e demonstrar que não Mgmt, desfilará na São Paulo Fashion Week.  Antes de tratar seu filho como o coitadi- Nesse caso, é importante que os pais
se preocupam tanto com o fato, para nho da história, verifique se não é o próprio tratem a raiz do problema, para não
não dar uma dimensão maior do comportamento dele o motivo da rejeição ampliá-lo.
que o problema realmente tem.