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Médico Reumatologista, Mestre em Reumatologia e Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – FMUSP, Diretor Técnico do Serviço de Reumatologia do Hospital do
Servidor Público Estadual de São Paulo “Francisco Morato de Oliveira” – HSPE-FMO, São Paulo (SP), Brasil.
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Mestre, Chefe da Secção de Diagnóstico e de Terapêutica do Serviço de Reumatologia do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo “Francisco Morato de Oliveira” HSPE-FMO, São
Paulo (SP), Brasil.
3
Encarregado da Enfermaria do Serviço de Reumatologia do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo “Francisco Morato de Oliveira” – HSPE-FMO, São Paulo (SP), Brasil.
Autor correspondente: Wiliam Habib Chahade – Rua Pedro de Toledo, 1.800 – 9º andar ala central – Vila Clementino – CEP 04039-004 – São Paulo (SP), Brasil – Tel.: 11 5088-8099/5571-5495/3887-
2977 – e-mail: wchahade@terra.com.br
das, a COX-1 (constitucional ou fisiológica) e a COX-2 central mais facilmente e estão associados com leves al-
(induzida ou inflamatória)(1). terações no humor e na função cognitiva.
A partir desses achados, desenvolveram-se inúme-
ros antiinflamatórios não hormonais (AINHs), os inibi-
dores seletivos de COX-2, numa tentativa de aumentar MECANISMOS DE AÇÃO
a aceitação dessas medicações pelos pacientes, ao ten- Sabemos que as PGs são produtos originados do ácido
tarem reduzir a toxicidade, principalmente gastrintes- aracdônico ou araquidônico (AA), que é obtido da
tinal, e aumentar os efeitos analgésicos e antiinflama- dieta ou do ácido linoléico, encontrando-se presentes
tórios. em todos os tecidos animais e exercendo várias
Podemos classificar os AINHs baseados nas estru- funções. Quimicamente, são partes de um grupo
turas químicas de fármacos convencionais ainda de uso denominado eicosanóides, derivados do AA e liberados
corrente, ao lado daqueles considerados com maior de fosfolipídeos de membrana de células lesadas, por
seletividade anti-COX-2 (meloxicam, nimesulida, cele- ação catalítica da fosfolipase A2. As COX-1 e COX-2
coxibe, rofecoxibe, etoricoxibe, valdecoxibe, lumiraco- e a hidroperoxidase catalisam as etapas seqüenciais de
xibe)(3,6). síntese dos prostanóides (PGs clássicas e tromboxanos)
Progressivamente nos últimos anos, foram surgindo e as lipoxigenases transformam o AA em leucotrienos e
novas preocupações com a utilização dos considerados outros compostos(1,6).
seletivos de COX-2, principalmente pelo provável au- O principal mecanismo de ação dos AINHs ocorre
mento do risco cardiovascular em idosos, sendo que por meio da inibição específica da COX e conseqüente
alguns desses novos e eficazes fármacos, tais como, o redução da conversão do AA em PGs. Reações media-
rofecoxibe e valdecoxibe, foram retirados do mercado. das pelas COXs, a partir do AA, produzem PGG2, que
Assim, evidenciou-se queda de cerca de 15% na prescri- sob ação da peroxidase, forma PGH2, sendo então con-
ção desses medicamentos(2). vertidas às PGs, prostaciclinas (PGI2) e tromboxanos
(TXs)(1,6).
As PGs têm ação vasodilatadora, a PGD2 é liberada
FARMACOLOGIA de mastócitos ativados por estímulos alérgicos ou ou-
Os AINHs constituem um grupo heterogêneo de tros e a PGE2 inibe a ação de linfócitos e outras células
compostos de um ou mais anéis aromáticos ligados a que participam das respostas alérgicas ou inflamatórias.
um grupamento ácido funcional. São ácidos orgânicos Além de promoverem vasodilatação, sensibilizam os
fracos que atuam, principalmente, nos tecidos nociceptores (hiperalgesia) e estimulam os centros hi-
inflamados e ligam-se, significativamente, à albumina potalâmicos de termorregulação(1,6). A PGI2 predomina
plasmática. Pacientes com hipoalbuminemia têm no endotélio vascular e atua causando vasodilatação e
maiores concentrações da forma livre da substância, que inibição da adesividade plaquetária. O TX, predomi-
corresponde à forma ativa da mesma. Sua absorção é nante nas plaquetas, causa efeitos contrários como va-
rápida e completa, depois de administração oral (exceto soconstricção e agregação plaquetária(1,4).
as preparações entéricas e de liberação lenta). Não Os leucotrienos aumentam a permeabilidade vas-
atravessam imediatamente a barreira hematoencefálica cular e atraem os leucócitos para o sítio da lesão. A
e são metabolizados, principalmente, pelo fígado. A histamina e a bradicinina aumentam a permeabilidade
indometacina, meclofenamato e sulindac apresentam capilar e ativam os receptores nocigênicos(1,4).
recirculação hepática(1-6). Existem pelo menos duas isoformas de COX, que
Essencialmente, todos AINHs são convertidos em apresentam diferenças na sua regulação e expressão.
metabólitos inativos pelo fígado e são, predominante- A atividade de ambas as isoformas são inibidas por to-
mente, excretados pela urina (embora o sulindac tam- dos os AINHs em graus variáveis. A COX-1 e COX-2
bém possa ser metabolizado nos rins). Por outro lado, possuem 60% de homologia na sua seqüência de ami-
certos AINHs e/ou seus metabólitos têm excreção noácidos, expressa em muitos tecidos. As COX-1, ditas
biliar(4,7). como constitutivas, auxiliam na manutenção da integri-
Os salicilatos têm a meia-vida ampliada com o au- dade da mucosa gastroduodenal, homeostase vascular,
mento da concentração plasmática da droga. Isso se agregação plaquetária e modulação do fluxo plasmático
deve ao fato da aspirina apresentar cinética de ordem renal(4).
zero, por causa da capacidade (limitada) do fígado de A COX-2 é uma enzima indutível, geralmente in-
biotransformá-la, quando usada em altas doses(8-9). detectável na maioria dos tecidos, e sua expressão é
Os AINHs mais lipossolúveis, como cetoprofeno, aumentada em processos inflamatórios. Ela é expressa
naproxeno e ibuprofeno, penetram no sistema nervoso constitutivamente no cérebro, rins, ossos e, provavel-
mente, no sistema reprodutor feminino. Sua atividade é atuação, inibindo, preferencialmente, a COX-2, man-
importante na modulação do fluxo sanguíneo glomeru- tendo um bloqueio parcial da COX-1. Outros AINHs
lar e balanço hidroeletrolítico. Sua expressão é inibida já em uso, como o etodolaco e a nimesulida, também
pelos glicocorticóides, o que explicaria os efeitos antii- se mostraram inibidores preferenciais ou seletivos para
flamatórios dessas substâncias esteroidais(3-4). COX-2. Atualmente, estão sendo comercializados no
Recentemente, foi descoberta uma variante do gene Brasil, alguns inibidores seletivos da COX-2: celecoxi-
da COX-1, descrita como COX-3. Esta parece ser ex- be, lumiracoxibe e etoricoxibe (Quadro1).
pressa em altos níveis no sistema nervoso central e pode
ser encontrada também no coração e aorta. Essa enzi- Quadro 1. Classificação atual dos AINHs
ma é seletivamente inibida por fármacos analgésicos e Inibidores seletivos da COX-1 Aspirina (em baixas doses)
antipiréticos, como o paracetamol ou acetaminofeno e, Inibidores não-seletivos da COX-1 Aspirina (em altas doses), piroxicam,
indometacina, diclofenaco, ibuprofeno,
possivelmente, a dipirona, e é potencialmente inibida nabumetona, aceclofenaco
por alguns tradicionais AINHs. Essa inibição, por sua Inibidores seletivos da COX-2 Meloxicam, etodolaco, nimesulida,
vez, pode representar um mecanismo primário central salicilato
pelo qual essas substâncias diminuem a dor e, possivel- Inibidores altamente seletivos da COX-2 Celecoxibe, paracoxibe, etoricoxibe,
lumiracoxibe
mente, a febre. A relevância dessa isoforma ainda está
para ser determinada.
A aspirina e os demais AINHs inibem a síntese de Esse grupo de medicamentos carece de um grupo
PG mediante a inativação das COXs. A aspirina ace- carboxílico presente na maioria dos AINHs e, por isso,
tila as isoenzimas (COX-1 e COX-2) covalentemente, são capazes de, seletivamente, se dirigirem à enzima
inativando-as de forma irreversível e não-seletiva. A COX-2, diferindo dos outros antiinflamatórios tradicio-
maioria dos AINHs tradicionais age de forma reversível nais. Eles apresentam baixa hidrossolubilidade, o que
e não-seletiva sobre as mesmas enzimas. No entanto, dificulta a sua administração parenteral(13).
convém salientar que tanto a aspirina quanto os outros
AINHs não bloqueiam a via da lipoxigenase, não inibin-
do, dessa forma, a produção de leucotrienos. Portanto, PERFIL CLÍNICO DOS AINHS E SEUS EFEITOS
os AINHs reduzem, mas não eliminam completamente COLATERAIS
os sinais e sintomas inflamatórios(7). Devemos sempre observar que a otimização da indicação
A inibição de PG é responsável por seus principais terapêutica de AINHs é parte essencial dos cuidados
efeitos colaterais: gastrite, disfunção plaquetária, com- que devemos ter ao tratar pacientes idosos. Essa, por
prometimento renal e broncoespasmo. O efeito anti- sua vez, inclui: decidir qual é o melhor fármaco a ser
trombótico ocorre pelo bloqueio da COX-1, ao inibir a escolhido, determinar a menor dose eficaz e o esquema
produção do TX, ocasionando o predomínio da ativida- mais apropriado para o estado psicológico do enfermo,
de de PG endotelial(1). monitorar a eficácia e a toxicidade do medicamento
e educar o paciente em relação aos prováveis efeitos
colaterais que poderão surgir. Também não devemos
INIBIDORES SELETIVOS DA COX-2 nos esquecer da variabilidade da resposta ao fármaco
Os AINHs tradicionais existentes podem causar graves em enfermos com idades mais avançadas.
efeitos colaterais que limitam suas utilizações, princi- Quando um fármaco é indicado para um idoso, é
palmente a médio e a longo prazo, em enfermidades necessário sempre procurar uma alternativa mais se-
reumáticas crônicas. Todos eram mais ou menos respon- gura (acetaminofeno, por exemplo), com objetivo de
sáveis, pelo aparecimento de intensos transtornos gás- diminuir a intensidade da dor de uma artropatia não-
tricos e intestinais. Também nos rins, as complicações inflamatória. Numerosos estudos têm documentados
eram tão graves que foram denominadas de nefropatias eventos adversos associados com o uso de AINHs nesses
analgésicas, caracterizadas por necrose papilar, hiper- pacientes, que incluem: sangramentos gastrintestinais,
tensão arterial e, finalmente, insuficiência renal(10-12). comprometimentos renais e insuficiência cardíaca.
Essas complicações, freqüentemente observadas na Como muitos desses eventos são dose-relacionados,
primeira metade do século passado, provocaram uma devemos utilizar as menores doses necessárias, para se
busca incessante de novos medicamentos que fossem obter o beneficio clínico.
eficazes e tivessem maior margem de segurança, com
respeito aos inconvenientes mencionados(10-11).
O primeiro antiinflamatório lançado para comer- Gastrintestinal (GI)
cialização a partir desse conceito foi o meloxicam, de- Todos AINHs convencionais têm a tendência de causar
senvolvido a partir de uma molécula que apresentava efeitos adversos gastrintestinais (Quadro 2) , que po-
Quadro 2. Efeitos colaterais gastrintestinais dos AINHs A Food and Drug Administration (FDA), agência
Efeitos leves Dispepsia norte-americana que controla o uso de medicamentos
naquele país, estima que úlceras GI, sangramentos e
Erosões gastrintestinais (estômago > bulbo duodenal)
perfurações ocorrem em aproximadamente 1 a 2% dos
Efeitos moderados Anemia ferropriva
pacientes usando AINHs por três meses e aproximada-
Úlceras gastrintestinais (estômago e intestino) mente 2 a 5% naqueles usando por um ano. A maio-
Efeitos graves Sangramento gastrintestinal severo (estômago > bulbo ria dessas complicações ocorre em pacientes que não
duodenal > esôfago > intestino grosso e delgado) tinham história pregressa de eventos gastrintestinais(4).
Perfuração aguda (bulbo duodenal> cólon) Há um grande número de fatores que aumentam o
risco de sangramento intestinal ou morte por causas GI.
Obstrução gástrica Os principais fatores de risco que estão relacionados
com o desenvolvimento de úlceras gastroduodenais,
causadas pelo uso de AINHs, são a idade avançada,
dem variar de dispepsia à sangramentos de estômago e sexo feminino, história de úlcera, uso concomitante de
duodeno, ativar doenças inflamatórias intestinais quies- corticosteróide, altas doses desses fármacos (incluindo
centes e causar dano tecidual (como úlceras) no trato a associação concomitante de dois ou mais medicamen-
GI baixo, geralmente, após um longo período de uso(6). tos dessa classe), uso de anticoagulantes e a presença
Muitos antiinflamatórios não hormonais são deriva- de grave doença sistêmica. Outros possíveis fatores as-
dos do ácido carboxílico e se encontram na forma não sociados são: a presença de infecção com Helicobacter
ionizada no lúmen gástrico e, dessa maneira, podem ser pylori, o tabagismo e a ingestão de álcool(18).
absorvidos pela mucosa gástrica. Com a mudança de Aspirina em doses menores que 100 mg/dia pode
pH ácido para neutro, no interior da mucosa, a droga inibir a geração de PGs e causar dano gástrico. Após a
ionizada é armazenada temporariamente no interior parada do uso de doses baixas de aspirina (< 100 mg/
das células epiteliais, o que causa dano às mesmas. En- dia), o estômago necessita de cinco a oito dias para re-
tretanto, esse dano tópico não parece ser de fundamen- cuperar a atividade da COX-1 e a síntese das PGs pro-
tal importância para a patogênese da sintomatologia ul- tetoras Estudos epidemiológicos placebo-controlados
cerosa. Esta última parece estar relacionada à inibição mostram que existe um risco elevado de eventos graves
da COX-1 da mucosa GI. Mesmo a administração intra- com o aumento da dose da aspirina(18).
muscular ou intravenosa de aspirina ou outros AINHs Há controvérsias na literatura quanto à associação
pode causar úlceras gástricas ou duodenais(14-16). do H. pylori e os AINHs, na patogênese da úlcera gástri-
Por inibirem a COX-1, os AINHs impedem a síntese ca. Em metanálises recentes e revisão sistemática da li-
de PGs gástricas, especialmente PGI2 e PGE2, que ser- teratura (num total de 21 estudos avaliados), observou-
vem como agentes citoprotetores da mucosa gástrica. se que o risco de úlcera péptica sem complicações, em
Estes eicosanóides agem inibindo a secreção ácida pelo usuários de AINHs, foi significativamente maior entre
estômago, aumentando o fluxo sanguíneo na mucosa os pacientes positivos para o H. pylori, comparados com
gástrica e promovendo a secreção de muco citopro- os pacientes sem a bactéria. A doença ulcerosa péptica
tetor. A inibição da sua síntese, portanto, acarreta ao foi também mais comum em pacientes com H. pylori,
estômago maior suscetibilidade às lesões, cujo aspecto comparados com àqueles sem H. pylori, independente
característico com infiltrado inflamatório levou ao uso do uso de AINHs. A erradicação dessa bactéria deve
da denominação de gastropatia por AINH. Além dis- ser reservada aos pacientes com história de doença
so, diminui a adesividade plaquetária, aumentando os péptica(18-19).
riscos de sangramento. A indometacina, sulindac e me- Os sintomas pépticos bem como a prevenção de úl-
clofenamato sódico apresentam acentuada recirculação ceras gástricas são manejados com medidas gerais e a
enteropática, o que aumenta os efeitos tóxicos desses utilização de medicamentos. Cuidados simples como a
fármacos(6). administração junto às refeições podem minimizar os
A maioria dos AINHs inibe a COX-1 e a COX-2 sintomas. Já os bloqueadores H2 se mostraram eficazes
de forma não-seletiva e assim diminuem a produção de na prevenção da úlcera duodenal. Pode-se, ainda, con-
PGs gástricas em pequenas concentrações (< 1 µM). siderar o uso profilático de antiulcerosos, sobretudo em
Os inibidores seletivos da COX-2, assim como os inibi- pacientes de alto risco, como idosos, pacientes com histó-
dores da COX-3 (paracetamol), preservam a proteção ria recente de ulceração péptica, os que recebem outras
mediada por PGs gástricas. Entretanto, os inibidores drogas ulcerogênicas e os que desenvolveram anemia
seletivos da COX-2, em altas doses, podem perder sua quando previamente tratados com antiinflamatórios(20).
especificidade e também bloquear a COX-1 no estôma- Um estudo recente mostrou que o omeprazol foi supe-
go e duodeno causando danos(17). rior à ranitidina em cicatrizar, prevenir úlceras e ero-
sões GI, bem como controlar sintomas dispépticos nos e carotídeas, reforçando a participação dessa enzima no
pacientes que faziam uso diário de antiinflamatórios(21). processo inflamatório aterosclerótico. Dessa maneira,
Torna-se necessário suspender, ou não iniciar, o uso esses sistemas enzimáticos mantêm um equilíbrio entre
desses medicamentos quando os benefícios podem ser os processos hemorrágicos e a trombose(33). Os inibi-
suplantados por efeitos GI indesejáveis, cuja morbida- dores da COX-2, reduzindo a produção de PG vascu-
de comprometa a qualidade de vida(22-23). lar, poderiam afetar o equilíbrio entre TXA2 e PGI2,
Estudos randomizados controlados têm compro- levando a um aumento de eventos trombóticos e car-
vado a diminuição na incidência de úlceras e de suas diovasculares. Essas alterações da fisiologia da cascata
complicações com uso de inibidores seletivos da COX- do AA, teoricamente, explicam um aumento na ocor-
2(24-27). rência de eventos cardiovasculares associados ao uso
Em idosos, a prevenção secundária de sangramento de coxibes(33). Grandes estudos clínicos prospectivos e
por úlceras induzidas por AINHs é de valor inestimável. observacionais apontam diferenças entre os coxibes e
O uso desses seletivos da COX-2 mostrou resultados o risco cardiovascular. Tais diferenças não estão ape-
equiparáveis ao uso de AINHs tradicionais, associados nas associadas a eventos trombóticos, mas também à
aos inibidores de bomba de prótons, embora o núme- retenção de sódio e água, elevação da pressão arterial e
ro de casos desse estudo tenha sido pequeno(17,28-31). O ao desenvolvimento de insuficiência cardíaca, devido a
Colégio Americano de Gastroenterologia recomenda a alterações na formação de PGs, alterando as trocas de
profilaxia medicamentosa nos pacientes com os seguin- sódio e água no nível tubular renal(33).
tes fatores de risco: idade > 60 anos, história prévia de No ano 2000, o estudo VIGOR (Vioxx Gastroin-
evento gastrintestinal (úlcera, hemorragia), uso de altas testinal Outcomes Research), desenvolvido pela Merck
doses de AINHs, uso de glicocorticóides e uso associa- Sharp & Dohme, ao comparar rofecoxibe com napro-
do de anticoagulantes(32). xeno em pacientes com artrite reumatóide (AR), obser-
vou um número maior de eventos adversos graves car-
díacos e trombóticos no grupo rofecoxibe. A incidência
Cardiovascular de infarto agudo do miocárdio foi menor no grupo do
Os inibidores seletivos da COX-2, conhecidos como naproxeno 0,1% versus 0,4% para o rofecoxibe. O risco
coxibes, vieram ao mercado com o objetivo de aliviar relativo cardiovascular foi de 1,1% naqueles que rece-
os sinais-sintomas inflamatórios e diminuir com maior beram o rofecoxibe versus 0,5% no naproxeno. Os even-
segurança o risco de eventos gastrintestinais indesejáveis. tos cardiovasculares incluíram: infarto do miocárdio
No entanto, alguns estudos clínicos evidenciaram fatal/não-fatal, angina instável, morte súbita de origem
ocorrência elevada de eventos cardiovasculares e cardíaca, evento cerebrovasculares e eventos vasculares
tromboembólicos, em usuários crônicos destes novos periféricos(24).
medicamentos(33). Por sua vez, o estudo CLASS (do inglês Celecoxib
Desde o lançamento dos coxibes (celecoxibe, rofe- Long-term Arthritis Safety Study), coordenado pela
coxibe, valdecoxibe, parecoxibe, etoricoxibe e lumiraco- Pfizer e publicado no mesmo ano, comparou celecoxibe,
xibe), levantou-se intensa polêmica sobre se tais even- com ibuprofeno e também com diclofenaco, em pacien-
tos estariam relacionados à classe do fármaco e/ou à tes com AR e osteoartrite (OA), observando-se também
relação dose-efeito, assim como, também, se a aspirina um aumento no número de eventos cardiovasculares,
poderia interferir nesses eventos, em pequenas doses, com risco relativo em 1,3% dos pacientes em uso do
ao atuar nos fenômenos tromboembólicos. Outra ques- celecoxibe versus 1,2% com os demais AINHs(35).
tão levantada foi a preocupação de que os AINHs tra- Em 2004, foram desenvolvidos dois estudos com o
dicionais poderiam apresentar riscos semelhantes aos mesmo desenho, o TARGET (do inglês Therapeutic
coxibes(33). Arthritis Research and Gastrointestinal Event Trial), de
No aparelho cardiovascular, observam-se altas con- responsabilidade da Novartis, em que no primeiro com-
centrações de COX-1 em plaquetas e células endoteliais pararam lumiracoxibe com naproxeno e com ibuprofe-
vasculares. Essa enzima é responsável pela produção de no no tratamento da OA. O segundo ensaio avaliou o
TXA2, resultando em potencial efeito pró-trombótico, papel do lumiracoxibe num desfecho composto (morte
promovendo o aumento na agregação e adesão pla- cardiovascular, infarto agudo do miocárdio silencioso e
quetária, estando ainda associada à vasoconstricção não-fatal e acidente vascular cerebral). A incidência do
e ao remodelamento vascular(34). A COX-2 resulta na infarto agudo do miocárdio foi de 0,32% com lumiraco-
formação de PGI2, promovendo efeito antitrombótico, xibe versus 0,1% com naproxeno e 0,11% com lumiraco-
vasodilatação e redução da agregação e adesão de pla- xibe versus 0,16% com ibuprofeno, durante um ano de
quetas. Mais recentemente, identificou-se a COX-2 em seguimento(34,36). Outros estudos analisaram esses efei-
amostras obtidas de placas ateromatosas coronarianas
tos e são encontrados quando da revisão sistemática da que a eficácia é similar a dos AINHs não-seletivos, a
literatura(24, 27,33-35,37-38). custo consideravelmente mais alto e menor segurança
Por sua vez, o parecoxibe só mostra eficácia in vivo, cardiovascular.
quando se converte em valdecoxibe. Este foi aprovado Parece prudente adotar uma atitude de cautela em
com base em estudos realizados em pacientes com pe- relação aos representantes desse novo grupo de fárma-
queno risco cardiovascular. Em outubro de 2004, a Pfizer cos, que permanecem no mercado, evitando seu uso
informou sobre sua potencial associação com reações como medicamentos de primeira linha. A prescrição de
cutâneas e aumento de eventos cardiovasculares(39). coxibes deve ser reservada a pacientes com alto risco
Mamdani et al.(40), em nova avaliação, compararam gastrintestinal, sendo contra-indicado na doença coro-
os efeitos do celecoxibe, rofecoxibe e AINHs não-sele- nariana e cerebrovascular estabelecida.
tivos, em relação a controles (não usuários de AINHs), O Quadro 3 seleciona os principais AINHs comer-
analisando a incidência de hospitalização por ICC. Ob- cializados no Brasil e suas doses usuais.
servaram que pacientes, em uso de rofecoxibe e AINHs
não-seletivos, tiveram risco aumentado de admissão por Quadro 3. Principais AINHs comercializados no Brasil e suas doses usuais
ICC, enquanto celecoxibe não apresentava tal risco(40). AINHs Doses
No primeiro fascículo do British Medical Journal, Ácidos carboxílicos
em 2005, Gottlieb(41) menciona o significativo aumen- Ácido acetilsalicílico (aspirina) 2,4 - 6,0 g/24 horas (em 4 - 6 doses)
to de risco de morte cardiovascular, infarto agudo do Saicilatos de dissolução entérica 2,4 - 6,0 g/24 horas (em 4 - 6 doses)
miocárdio e doença cerebrovascular com celecoxibe, Ácidos propriônicos
Ibuprofeno 200 - 400 mg - 3.200 mg/24 horas (em 3 - 4 doses)
em estudo previsto para cinco anos de duração (2.026
Naproxeno 250, 375 ou 500 mg (duas vezes ao dia)
pacientes), com objetivo de determinar sua eficácia na
Cetoprofeno 50, 100 mg (duas a três vezes ao dia)
prevenção de câncer de cólon (Adenoma Prevention
Derivados do ácido acético
with Celecoxib – APC). Em doses de 400 a 800 mg/dia, Indometacina 25, 50 mg (duas a quatro vezes ao dia)
celecoxibe aumentou aquele risco em 2,5 e 3,4 vezes Diclofenaco 50, 75 mg (duas doses ao dia)
respectivamente, em comparação a placebo (0,9%)(41). Aceclofenaco 100 mg (duas vezes ao dia)
Em dezembro de 2004, o estudo foi prematuramente Etodolaco 200, 300 mg (duas a quatro vezes ao dia)
suspenso pelo National Care Institute(42). Ácidos enólicos
O laboratório Pfizer publicou, então, que os resul- Piroxicam 10, 20 mg (uma dose ao dia)
tados de um ensaio patrocinado pela companhia em Meloxicam 7,5 , 15 mg (uma dose ao dia)
pacientes com câncer – estudo Prevention of Sporadi- Tenoxicam 10, 20 mg (uma dose ao dia)
cal Adenomatous Polyps (PreSAP) – não evidenciou Inibidores seletivos de COX-2
maior risco de eventos cardiovasculares com celecoxibe Celecoxibe 100, 200 mg/24 horas
em relação ao placebo. Um terceiro estudo, Alzheimer Lumiracoxibe 100, 200, 400 mg/24 horas
Disease Anti-inflammatory Prevention Trial (ADAPT), Rofecoxibe 60, 90, 120 mg/24 horas
Sulfonanilida
realizado em cerca de 2.400 pacientes, com alto risco
Nimessulida 100 mg (duas vezes ao dia)
de doença de Alzheimer, foi prematuramente suspenso
Fonte: (modificado de: UpToDate, 2007. Available from: www.uptodate.com)
em dezembro de 2004, até que se revissem os potenciais
riscos cardiovasculares(43). Renal
A segurança cardiovascular do etoricoxibe foi re-
Os AINHs podem induzir insuficiência renal aguda
centemente estudada pela Merck Sharp & Dohme,
(IRA) de duas diferentes maneiras: hemodinamicamente
no programa Multinational Etoricoxib and Diclofenac
mediada ou por nefrite intersticial (freqüentemente
Arthritis Long-term (MEDAL), que analisou três estu-
acompanhada de síndrome nefrótica). Esses efeitos
dos separados, comparando o etoricoxibe com diclofe-
estão diretamente relacionados à redução da síntese de
naco. O risco de eventos trombóticos cardiovasculares
PGs induzida pelos AINHs(45).
no grupo etoricoxibe foi similar ao do diclofenaco. A
Embora as PGs renais sejam primariamente vaso-
interpretação desses resultados é problemática, já que
dilatadoras, elas não apresentam papel principal na re-
se acredita que o diclofenaco está associado com um
gulação da hemodinâmica renal, já que a síntese basal
aumento do risco cardiovascular(44).
é relativamente baixa. Entretanto, a liberação dessas
Acredita-se que diferenças na estrutura química dos
substâncias (particularmente a PGI2 e a PGE2) está au-
coxibes sejam fatores determinantes do perfil farmaco-
mentada em doenças glomerulares subjacentes, insufi-
lógico de cada um deles. Entretanto, as relações entre
ciência renal, hipercalcemia e por substâncias vasocons-
doses e efeitos adversos têm mostrado linearidade co-
trictoras (angiotensina II e norepinefrina). A secreção
mum a todos os coxibes. Questiona-se, também, o papel
desses últimos hormônios é aumentada em estados de
dos coxibes na terapia antiinflamatória e analgésica, já
depleção de volume (como insuficiência cardíaca con- Não existe evidência que a terapia com corticóides
gestiva, cirrose e perda de água e sal pelo trato gastrin- ou, mesmo pulsoterapia, seja benéfica nesse contexto.
testinal ou renal). Nesses contextos, as PGs vasodila- Entretanto, um curso de prednisona pode ser conside-
tadoras agem preservando o fluxo renal sanguíneo e a rado em pacientes com insuficiência renal que persis-
filtração glomerular por diminuição da resistência pré- te por mais de uma a duas semanas após a retirada do
glomerular. Isso é particularmente importante quando AINH. Esses pacientes devem evitar subseqüentes ad-
existe depleção de volume efetivo, situação em que as ministrações de AINHs(49).
PGs antagonizam o efeito vasoconstrictor da angioten- Tem sido proposto que o uso diário de AINH, por
sina II e da norepinefrina. Na doença glomerular, en- um período prolongado, pode estar associado com ris-
tretanto, o aumento na produção de PGs parece manter co aumentado de doença renal crônica, provavelmente
a taxa de filtração glomerular na presença de importan- devido à necrose papilar, um mecanismo semelhante
te redução na permeabilidade do capilar glomerular(46). àquele visto com outros analgésicos(45).
Inibição da síntese de PGs por AINHs, nesses pa-
cientes, pode levar a uma isquemia renal reversível, um
declínio da pressão hidrostática glomerular e IRA. O Hepático
aumento da creatinina plasmática é visto durante o ter- Elevações de transaminases são comumente associadas
ceiro ao sétimo dia da terapia, tempo necessário para ao uso desses medicamentos, entretanto, insuficiência
alcançar níveis estáveis da droga e máxima inibição da hepática é muito rara. Pacientes com AR, quando
síntese de PGs(45). comparados com pacientes com OA, ambos em uso
Os inibidores seletivos da COX-2 também podem de AINHs, têm um risco dez vezes maior de injúria
precipitar IRA em alguns pacientes. A freqüência rela- hepática aguda. A exposição concomitante com outras
tiva dessa ocorrência, comparada com os AINHs não- medicações hepatotóxicas provavelmente aumenta o
seletivos, ainda é desconhecida(47). risco de dano hepático em pacientes com AR(50).
Há evidências de que alguns AINHs não-seletivos A hepatite tem sido relacionada ao uso do diclofe-
tenham um menor potencial nefrotóxico que os outros naco, incluindo também auto-anticorpos antinucleares
AINHs. Baixas doses de aspirina (40 mg/dia) e de ibu- (FAN positivo) e evidência histológica de hepatite crô-
profeno parecem ser seguros, pois inibem menos a sín- nica ativa(51).
tese de PGs renal(45). Recomendam-se a dosagem das enzimas e testes de
A segunda forma de IRA induzida por AINHs tem função hepáticas oito semanas após o início da terapia
dois componentes, sendo que um ou ambos componen- crônica com AINH. A monitorização sintomática não
tes podem estar presentes no mesmo paciente: uma é suficiente, já que sintomas hepáticos são raros. Mas
nefrite intersticial aguda (NIA) (com um infiltrado in- os AINHs devem ser suspensos nas seguintes situações:
tersticial composto primariamente por linfócitos T) e aumento das aminotransferases maior que três vezes o
a síndrome nefrótica (SN), devida à liberação de linfo- valor de normalidade, queda sérica da albumina (suges-
cinas tóxicas por células T ativadas; e uma nefropatia tivo de defeito de síntese induzido pela droga) ou se o
membranosa que pode ser encontrada em muitos pa- tempo de protrombina ficar prolongado.
cientes que foram tratados com AINHs(45).
Essas desordens ocorrem mais comumente com o
fenoprofeno, mas provavelmente, podem ser induzi- Pulmonar
das por qualquer AINH não-seletivo e inibidores da Os AINHs raramente induzem problemas pulmonares,
COX-2. Ainda não se conhece o mecanismo pelo qual embora a atual incidência de eventos adversos seja
os AINHS induzem NIA ou SN. É possível que a inibi- desconhecida. As principais reações pulmonares
ção da COX por AINHs resulte na conversão preferen- que podem ocorrer incluem: broncoespasmo
cial do AA em leucotrienos, que poderia então ativar (particularmente em indivíduos sensíveis a aspirina,
células T helper(48). acompanhados de pólipos nasais) e infiltrados
Pacientes acometidos podem apresentar hematúria, pulmonares com eosinofilia(52).
piúria, proteinúria e um aumento agudo na creatinina Os infiltrados pulmonares têm uma típica apresen-
plasmática. Um quadro típico de reação alérgica (fe- tação de febre, tosse, dispnéia e eosinofilia periférica
bre, rash, eosinofilia e eosinofilúria) está tipicamente absoluta. Na avaliação anatomopatológica são encon-
ausente, mas um ou mais desses achados podem estar trados granulomas mal definidos com infiltração eosi-
presentes. Recuperação espontânea geralmente ocorre nofílica. Para reversão do processo, glicocorticóides são
durante semanas a poucos meses após o término do tra- necessários, assim como a interrupção do fármaco(52).
tamento.
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