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Contagem regressiva
Presidente regional do Sinaenco faz as previsões sobre a Copa e
Olimpíada no Brasil e diz o que já não será mais possível construir até
os jogos em vista dos atrasos
José Roberto
Bernasconi
Engenheiro civil e
advogado, José Roberto
Bernasconi é diretor
presidente da Maubertec
Engenharia e Projetos,
atuando em diversos
setores da infraestrutura.
Foi professor da Poli-USP
entre 1970 e 1975, no
Departamento de Estruturas e Fundações, das Disciplinas Construções de
Concreto e Pontes e Grandes Estruturas. Participou de diversas entidades de
classe, como CBIC, Fiesp, Upadi e Instituto de Engenharia, que presidiu nas
gestões 1985-1987 e 1987-1989. Foi presidente nacional do Sinaenco
(Sindicato da Arquitetura e da Engenharia) entre 2006 e 2009, e, atualmente,
preside sua regional de São Paulo, além de ser diretor do Deconcic
(Departamento da Indústria da Construção), no âmbito da Fiesp. Em dezembro
de 2010, recebeu o título de Eminente Engenheiro do Ano pelo Instituto de
Engenharia.
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Estádio Olímpico, Parque Aquático, entrada monumental, pontes etc. No verão
de 2008, e só nesse momento, começaram as obras. O Velódromo, por
exemplo, ficará pronto no verão de 2011, com um ano de antecedência, e
receberá eventos de testes. Isso é coisa de gente grande.
Para algumas coisas, não há mais tempo. A Copa do Mundo correu solta, sem
coordenação. O Governo Federal já declarou que os estádios estão por conta
dos Estados, e que o apoio de infraestrutura virá pelo PAC da Copa (ou PAC da
Mobilidade). Mas os aeroportos são de responsabilidade do Governo Federal e
até agora nada foi feito. E o problema dos aeroportos não é para a Copa do
Mundo, é para hoje. A demanda cresceu mais de 20% e a oferta dos serviços
não acompanhou.
Que casos são mais adequados para uma concessão e uma parceria público-
privada?
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Depende do resultado. Um aeroporto como o de Guarulhos, que tem um
movimento extraordinário, é caso típico de concessão ou privatização.
Respeito a opinião de que o controle do espaço aéreo implica soberania e
segurança nacional e deve ficar nas mãos da Aeronáutica. Então, a prestação
do serviço pode ser feita ou por concessão ou parceria público-privada. Os
aeroportos de Brasília, Guarulhos e Congonhas (São Paulo), Galeão e Santos
Dumont (Rio de Janeiro) têm movimento suficiente para gerar renda a uma
concessão. Talvez os aeroportos de Cuiabá e Goiânia não tenham um volume
tão grande que permita uma remuneração adequada, então pode-se
estabelecer uma PPP. Porém, não pode permanecer estatal, porque a situação
atual é a consequência de as coisas não terem sido feitas.
É possível que o trem de alta velocidade, o TAV, saia em tempo para esses
eventos?
Para a Copa do Mundo não, mas para a Olimpíada há um pouco mais de tempo.
A Serra das Araras, no Rio de Janeiro, é o trecho mais custoso e com menor
demanda, não há problema se não ficar pronto. O trecho mais importante
situa-se entre Campinas, São Paulo e São José dos Campos, que tem maior
viabilidade e maior demanda. Se o Governo Federal implantar o TAV nessa
região, contaremos com um equipamento de alto rendimento que serve de
interesses de ligação entre polos da macrometrópole de São Paulo e essas
duas cidades. Faltariam Santos e Sorocaba.
Sim, muitos carros particulares e ônibus fretados seriam tirados das estradas.
A grande vantagem do transporte ferroviário é que ele chega até o Centro da
cidade. São necessárias grandes obras para enterrar as estações, como fez
Barcelona, Turim. O trem vem pela superfície e, já na periferia, mergulha e
deixa de causar aquela separação na cidade, e a cidade fica integrada.
Há perigo de não começar. Não devemos esperar além deste primeiro trimestre
para definir quais vão continuar ou não. Em vez de 12 cidades, talvez
tenhamos apenas oito cidades, o número mínimo, por serem oito grupos.
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Está, só não está na mídia. De todas as cidades, Salvador está com ritmo um
pouco melhor, com a concessão definida e financiamento do BNDES (Banco
Nacional do Desenvolvimento); o Mineirão (Belo Horizonte) está aparentemente
bem; os outros estão muito devagar. Para a Copa das Confederações em maio
de 2013, precisamos de, no mínimo, quatro estádios. Isso é possível, mas a
hora da verdade é agora, tanto para os estádios estatais como privados.
Segundo a CBF (Confederação Brasileira de Futebol), a cidade de São Paulo vai
sediar a abertura, mas ainda não há estádio. Ainda há tempo, pois estamos a
40 meses da Copa do Mundo, e um projeto de estádio pode ser feito em 32, 30
meses.
Antes da mobilidade, é preciso um plano sobre o que será feito com essa área.
O estádio de Itaquera pode ser um gatilho para a reinvenção da zona Leste,
mas isso não é projeto para a Copa, e sim para daqui a 20 anos. Não só a
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região de Itaquera, mas todo o entorno do município de São Paulo pode se
transformar em um grande polo de desenvolvimento.
Creio que foram várias razões. Não consigo fazer a análise completa, mas um
fato é verdadeiro: havia uma disputa pessoal não resolvida, ou resolvida da
pior maneira, entre o Ricardo Teixeira, presidente da CBF, e o Juvenal
Juvêncio, presidente do São Paulo. Não sei se só em nome disso, mas também
em nome disso, não havia nenhuma boa vontade [em relação ao estádio do
Morumbi]. Além disso, São Paulo é a cidade preparada para receber o jogo de
abertura, não pelo estádio, mas pela infraestrutura. Não há cidade no Brasil
que tenha a mesma capacidade hoteleira que São Paulo, a mesma experiência
para receber grandes eventos, apoio logístico, treinamento de pessoal.
Até março, o Governo Federal deve ser chamado a colaborar com os Estados
donos de estádios, para garantir que eles fiquem prontos a tempo. É melhor
que essa decisão seja tomada logo, para que os recursos possam ser alocados
e seja possível construir de maneira planejada, organizada, com projetos de
engenharia para controle de custos e de qualidade. Se deixar para a véspera,
que é o segundo semestre de 2012, pode haver uma repetição dos Jogos Pan-
Americanos (2001). Não sou contra aplicação de recursos públicos nos
estádios, pois, assim como para a zona Leste, pode ser um gatilho para uma
grande renovação urbana.
Cada um tem sua problemática local, que precisa ser equacionada. Nos Jogos
Pan-Americanos, a maior crítica recaiu sobre o Engenhão, um belíssimo estádio
implantado em um lugar deteriorado. Não foi feita melhoria, seja de acesso,
segurança ou serviços de água, esgoto, telecomunicações e energia que
permitiriam uma melhor utilização. Cada cidade tem seus problemas. Recife
está fazendo uma cidade nova junto ao novo estádio, um novo centro
comercial e de negócios, centro residencial, além do caminho de acesso,
transporte e todos os sistemas. Tudo isso gerará um bairro novo, uma área de
expansão da cidade. Benefícios podem ser feitos em qualquer lugar. Os
requisitos necessários são: macroacessibilidade (aeroportos, portos,
rodoviárias etc.) e mobilidade urbana (metrô, VLT, VLP, BRT, transporte
público).
Se não for feito a tempo, declaram-se férias escolares. Tira-se o trânsito das
ruas, as vias ficam menos congestionadas. Em junho, serão declaradas férias
escolares nas cidades-sede da Copa, e isso será decidido em 2013. E, em dias
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de jogo, será declarado feriado. A África do Sul fez isso. Porém, não é uma
solução eficiente, senão uma remediação.
Nós advogamos, pelo Sinaenco, que o ideal é contratar a obra com o projeto
executivo. Para isso, a solução é o órgão público contratar o projeto com
antecedência suficiente para haver tempo de realizar sondagens, topografia, e
todo o material necessário para fazer um projeto executivo completo.
Posteriormente, constrói-se com o projeto executivo em mãos, e as chances
de estouro de verba e de prazo são muito pequenas.
Ainda não. Mas muitas pessoas falam sobre isso, até empresários de
construção. A Apeop (Associação Paulista de Empresários de Obras Públicas)
faz desse seu discurso oficial: é melhor a contratação de uma obra a partir do
projeto executivo, que deixa de ser uma loteria. Na Câmara Brasileira da
Indústria da Construção, está sendo discutida a modificação da lei 8.666, hoje
no Senado, para que a obra seja contratada pelo projeto executivo. Seria
dado um prazo de disposição transitória de dois anos depois da publicação da
A grande solução, sempre, é o gestor público saber o que está comprando. Ele
precisa de preparação técnica, com equipes ou consultores, para fazer o
melhor uso do dinheiro público. Sobretudo, o gestor tem que ter os projetos.
Para certas obras de alta complexidade de execução, que exigem
equipamentos especiais e equipes treinadas, não há tanta gente preparada, e
as empresas capacitadas são todas bem-vindas ao certame. O problema é o
preço fugir do controle. O Metrô já soube, muito melhor que hoje, quanto
custa um projeto de engenharia. Na Linha 6 houve proponente que ofereceu
42% de desconto no projeto básico em relação ao preço colocado, e foi
contratado. É impossível fazer esse desconto. O Metrô chegou a contratar
sondagem de subsolo por pregão e recebeu sondagem falsa. Perdeu-se meses
até se perceber o erro e o Metrô solicitar nova sondagem.
As obras por conta dos prazos apertados parecem negligenciar cada vez mais
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As obras, por conta dos prazos apertados, parecem negligenciar cada vez mais
a segurança. O senhor vê isso se agravando?
Pode ser se não houver projeto adequado. É preciso bom projeto e boa
construção, que também é Engenharia. Perde-se a perspectiva de que a
construção é técnica de engenharia na manipulação e execução, acreditando
que construção é coisa de empreiteiro, especulador imobiliário, mas é
Engenharia de alto nível e tem que ser bem feita. Além disso, o bom
planejamento, com os critérios de gestão da qualidade de hoje, ensina a
pensar antes. Outro ponto importante é o gerenciamento. O projeto é a
definição do que precisa ser feito, a construção realiza e o gerenciamento é
feito por empresas que acompanham, em nome do cliente, se aquele projeto
está sendo feito de maneira adequada. Com a gestão da qualidade, se aprende
que o bom é fazer bem na primeira vez.
O Brasil está sendo chamado para fazer parte do clube das nações mais
desenvolvidas, mesmo com todas as nossas carências, desequilíbrios e
desajustes. O Brasil tende a ser, até 2020, o quinto PIB do planeta. Eu chamo
esse clube de Champions League, é a Primeira divisão. Precisamos preparar
gente, precisamos de educação, melhorar a infraestrutura, o sistema de
defesa nacional. Temos que planejar, projetar, executar com qualidade, de
maneira adequada, com racionalidade e senso de realismo. É preciso dar um
choque de realismo e qualidade na gestão pública e na gestão privada. O Brasil
tem essa capacidade. E essas mudanças não são para 2020, mas para 2050.
Falo de um Brasil modificado, e cada um precisa fazer sua parte. Esse é o
desafio que temos pela frente.
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