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1
competente, não obstante o fato de que o atributo de ser competente ou
incompetente seja em princípio, para Habermas, algo que caracteriza a
observância de regras técnicas (no trabalho) ou de estratégias válidas, ou seja,
a esfera em que supostamente prevalece a instrumentalidade (apesar das
vacilações de Habermas quanto à interação estratégica).1
1
A crítica à separação entre instrumentalidade e comunicação tem desdobramentos importantes
com respeito à própria idéia de racionalidade, em torno da qual se criou o grande e equivocado
cavalo de batalha da contraposição entre uma racionalidade “meramente” instrumental, vista como
de alguma forma “vil” ou “inferior”, e uma outra, supostamente “substantiva” e “superior”. A
origem dessa contraposição é certamente a inconsistente distinção de Max Weber entre a
“racionalidade com respeito a fins” e a “racionalidade com respeito a valores”, parte da mixórdia
conceitual em que Weber procura estabelecer tipos de racionalidade por referência à ética e tipos de
ética por referência à racionalidade. A obra de Jean Piaget me parece fornecer base sólida para a
superação da contraposição instrumentalidade-comunicação e para substituí-la por uma concepção
“operatória” ou “operacional” em que os aspectos objetivo ou instrumental e social ou
comunicacional da racionalidade se integram devidamente. A inconsistência das concepções de
Weber é discutida em Fábio W. Reis, “Weber e a Política”, a aparecer em Teoria e Sociedade,
número especial dedicado a Weber, sob a coordenação de Renarde F. Nobre. As idéias de Habermas
são examinadas à luz do trabalho de Piaget em Fábio W. Reis, Política e Racionalidade, Belo
Horizonte, Editora UFMG, 2000 (2a. edição), e mais resumidamente em “Mudança, Racionalidade e
Política”, em F. W. Reis, Mercado e Utopia: Teoria Política e Sociedade Brasileira, São Paulo,
Edusp, 2000.
2
Vejam-se Jürgen Habermas, Théorie et Pratique, Paris, Payot, 1975, vol. II, pp. 104-105; e
Alessandro Pizzorno, “Introduzione allo Studio della Partecipazione Politica”, Quaderni di
Sociologia, vol. 15, no. 3-4, julho-dezembro de 1966.
3
Cf. Karl Deutsch, The Nerves of Government, Nova York, The Free Press, 1966, p. 111.
2
Ora, não obstante o contraste aparente entre os dois significados,
algumas observações de interesse se podem fazer se a ambiguidade produzida
por eles é relacionada com certas dificuldades enfrentadas por Habermas na
tentativa de distinguir entre autonomia “política” (ou “pública”) e autonomia
“privada” em Direito e Democracia.4 Apesar de que a idéia de virtude
republicana favoreça a idéia de autonomia como autocontrole, que sugere a
operação de restrições à minha impulsividade como resultado da atenção
prestada à conexão entre meus interesses próprios e os interesses ou objetivos
da coletividade, será de fato possível falar de autonomia sem referência a
algum componente de auto-afirmação? Habermas sustenta ele mesmo que a
realização da autonomia supostamente “política” ou “pública” envolve a
afirmação dos cidadãos na esfera política, onde viriam a assumir a posição de
autores da lei (o que seria até condição necessária para que a autonomia
privada chegasse mesmo a existir);5 pode isso ser visto como envolvendo a
autonomia num sentido que efetivamente evite o componente de afirmação de
si, mesmo que o “si” a ser afirmado remeta a uma identidade e a um ideal de
vida definidos comunitariamente ou como consequência da imersão na
coletividade? Ainda que destaquemos a ligação entre autonomia e
reflexividade, também a idéia “nobre” de autonomia como autocontrole supõe
(como claramente se dá na teoria do desenvolvimento moral elaborada pelo
próprio Habermas, com base no trabalho de Lawrence Kohlberg e Jean
Piaget)6 a capacidade, por parte do indivíduo, de “descentrar-se” (Piaget) e se
afastar da sociedade e de suas normas convencionais na moralidade “pós-
convencional”. Ela supõe, portanto, que haja escolha relativamente à própria
identidade individual – com inevitável ambiguidade quanto à relação entre o
aspecto de auto-afirmação e o componente de “desprendimento” que a idéia
de autocontrole também contém. Pode a distinção entre autonomia privada e
autonomia pública ou política sustentar-se de maneira efetiva no contexto de
tais questões?
4
Jürgen Habermas, Direito e Democracia: Entre Facticidade e Validade, 2 vols., Rio de Janeiro,
Tempo Brasileiro, 1997. Estarei citando adiante a edição americana: Between Facts and Norms:
Contributions to a Discourse Theory of Law and Democracy, Cambridge, Mass., The MIT Press,
1996.
5
Ver, por exemplo, Between Facts and Norms, pp. 119 e seguintes.
6
Veja-se, por exemplo, Jürgen Habermas, “Moral Development and Ego Identity”, capítulo 2 de J.
Habermas, Communication and the Evolution of Society, Boston, Beacon Press, 1979.
3
Public Lies, de Timur Kuran, é um importante exemplo recente.7 A
preocupação central de Kuran é o caráter opressivo que a “opinião pública”
pode adquirir, com as pressões por ela exercidas sobre os indivíduos
produzindo o falseamento da “opinião privada”. As condições em que se dá a
ocorrência desse falseamento vão do fenômeno da “ignorância pluralística”
resultante da censura e da repressão autoritária nos países do “socialismo real”
ou em outros regimes ditatoriais (impedindo que os cidadãos venham a ter
percepção clara do grau de apoio de que dispõe o regime junto à população e
levando-os a ocultar sua posição eventualmente contrária) até a pressão das
opiniões julgadas “politicamente corretas” nos países democráticos, as quais,
como as pesquisas têm mostrado, com frequência contam, privadamente, com
adesão muito menos difundida do que sugerem seus efeitos públicos.
Naturalmente, os fenômenos destacados no trabalho de Kuran e em seus
antecedentes acham-se em nítido contraste com uma concepção idealizada da
“esfera pública” como sendo caracterizada, em medida importante, por juízos
políticos que supostamente resultem de autênticos argumentos. E, do ponto de
vista do ideal democrático e do valor da autonomia, o que ressalta nas relações
entre opinião pública e opinião privada é, de novo, ao menos ambíguo: se, por
um lado, velhas constatações e sugestões ligadas à idéia de ignorância
pluralística, bem como seu uso recente por Kuran e outros, apontam para o
potencial libertário do fluxo desimpedido de comunicação entre os cidadãos,
por outro lado observações como as que se referem ao “politicamente correto”
nos fazem lembrar os temas da “psicologia de multidões” e o sentido em que,
por exemplo, o voto secreto é uma conquista democrática, ao proteger a
opinião privada contra a opinião pública.
7
Timur Kuran, Private Truths, Public Lies: The Social Consequences of Preference Falsification,
Cambridge, Mass., Harvard University Press, 1995.
8
George Armstrong Kelly, “Who Needs a Theory of Citizenship?”, Daedalus, outono de 1979, pp.
37-53 (Proceedings of the American Academy of Arts and Sciences, vol. 108, no. 4).
4
autonomia do cidadão perante os demais e perante o estado. O verdadeiro
cidadão, nesta perspectiva, é aquele capaz de se afirmar por si mesmo, que
reclama seus direitos ou promove seus interesses de qualquer tipo,
mobilizando de maneira independente os recursos que controla na esfera
privada ou no mercado. Em contraste, a dimensão “cívica” da cidadania se
refere ao valor da virtude cívica que supostamente caracterizaria a pólis grega
clássica ou a república romana. Em vez da idéia de direitos, a idéia de
solidariedade e dos deveres do cidadão é que prevalece neste caso, e o cidadão
verdadeiro é antes aquele que age de acordo com suas responsabilidades
perante a coletividade, se necessário com sacrifícios pessoais – até mesmo, no
limite, o sacrifício da própria vida.
5
II
6
mecanismo, afim às velhas concepções relacionadas com a idéia do rei-
filósofo, vale-se de suposições com respeito a de onde (ou de quem) tenderão
a provir os melhores argumentos: já que é impossível contar com que as
pessoas afetadas possam sempre discutir indefinidamente, ou por todo o
tempo que se fizesse necessário para obter o acordo de todos (além de que há
situações em que a presteza das decisões é vital), deleguemos as decisões a
pessoas de maior conhecimento nas áreas relevantes – o médico ou o juiz, por
exemplo, ou talvez simplesmente aquelas pessoas que escolhemos como
nossos representantes e líderes e às quais garantimos as condições necessárias
a que possam dedicar-se às questões a serem objeto de decisão.
11
Abba Lerner, “The Economics and Politics of Consumer Sovereignty”, American Economic
Review, May 1972, vol. 62, no. 2, apud Samuel Bowles e Herbert Gintis, “The Revenge of Homo
Economicus: Contested Exchange and the Revival of Political Economy”, Journal of Economic
Perspectives, vol. 7, no. 1, inverno de 1993.
7
cidadãos que tenham emergido das limitações de classe e se libertado dos
grilhões milenares da estratificação social e da exploração o potencial de um
pluralismo cultural irrestrito pode desenvolver-se plenamente” – e Habermas
não deixa de acrescentar, significativamente, que esse potencial “ocorre de
maneira abundante tanto nos conflitos quanto nas formas de vida geradoras de
significado (meaning-generating forms of life)”.12
12
Habermas, Between Facts and Norms, p. 308.
8
Evoquemos aqui alguns resultados de esforços desenvolvidos por Samuel
Bowles e Herbert Gintis para mapear revisões recentes no campo da
economia, nas quais a perspectiva walrasiana neoclássica é crescentemente
confrontada por uma variedade de abordagens “pós-walrasianas” que
“repolitizam” o campo. Examinando a maneira como as transações
econômicas são tratadas em diferentes abordagens, Bowles e Gintis
sintetizam suas observações numa tabela de dupla entrada que se refere às
suposições orientadoras de cada abordagem com respeito a dois aspectos.
De um lado, temos a natureza do enforcement of claims, ou dos
mecanismos pelos quais se impõe o controle ou a regulação das transações
e dos reclamos relativos a elas: esse controle pode ser visto como
“exógeno” e exercido pelo estado, com suas leis e as imposições nelas
baseadas, ou como “endógeno”, isto é, exercido pelos próprios agentes,
num contexto que será necessariamente tenso e propenso ao conflito. De
outro lado, temos a natureza dos próprios agentes ou de suas preferências e
normas: aqui pode haver seja suposições afins ao individualismo
metodológico, em que as preferências e normas surgem como “exógenas”
e “dadas”, seja a suposição de preferências e normas “endógenas” que
podem ser mudadas, quer através do conflito aberto, quer, naturalmente,
através de processos que incluem o debate ou a deliberação coletiva.
Como ressaltam Bowles e Gintis, no caso da combinação de controle
(enforcement) exógeno com preferências e normas também exógenas
estamos na esfera marcada pelas suposições da economia neoclássica: a
atividade econômica surge aí como competição vitoriana e cavalheiresca,
em que “um aperto de mãos é um aperto de mãos” e o estado vigilante
permite que as transações ocorram sem custos. Em contraste, com controle
endógeno se tem não apenas interação estratégica, mas a “busca do
interesse próprio com perfídia”,13 e as transações inevitavelmente
envolvem custos.
13
Oliver E. Williamson, “The Economics of Governance: Framework and Implications”, Journal of
Institutional and Theoretical Economics, vol. 140, no. 1, março de 1984 (apud Bowles e Gintis,
“The Revenge of Homo Economicus”, p. 84).
9
Embora os autores não formulem os problemas em termos afins à
literatura “deliberativa”, o ponto que nos interessa é o de que a cela
correspondente à deliberação resulta ser, forçosamente, aquela em que temos,
de um lado, suposições “endógenas” quanto à natureza dos agentes, em que a
formação e a transformação de preferências são vistas como processos abertos
e portanto como necessariamente um objeto de estudo, e, de outro,
enforcement exógeno ou propiciado pelo estado. As transações
correspondentes a esta cela são descritas por Bowles e Gintis como
“contratuais”, em contraste com as formas “conflituosas” de intercâmbio ou
transação a serem encontradas nas categorias em que o enforcement é visto
como endógeno.14 A natureza da deliberação como um “problema político
resolvido” se torna bem clara nessa perspectiva.
10
“equilíbrio” que resulta dos ajustamentos espontâneos e automáticos próprios
da operação dos mecanismos do mercado. O elemento de realismo na
perspectiva de Przeworski diria respeito ao fato de que aqui se trata de
interesses: a produção da democracia poderia prescindir da referência a
normas, o que, na verdade, se desdobra na pretensão de que ela pode
prescindir também de qualquer forma de negociação ou barganha explícita.16
Mas há, em contrapartida, a idealização implícita do jogo de interesses, como
condição de que, ao invés do conflito áspero e talvez violento ou de
equilíbrios negativos que poderiam brotar, se possa vir a ter o equilíbrio
propício que conduza “automaticamente” à democracia e a consolide.
16
Aliás, uma curiosidade adicional é a de que esse “realismo” avesso às normas tem seu próprio e
explícito conteúdo normativo ou doutrinário: Przeworski sustenta que “a quintessência da
democracia é que não há ninguém para impô-la” (to enforce it – note-se que isso significa
justamente que o enforcement seria necessariamente endógeno), e a busca de um “consenso
democrático” que marcaria muitas discussões latino-americanas a respeito das transições recentes
de regimes autoritários à democracia é descrita como reveladora de um “legado intelectual não-
democrático”. Veja-se Przeworski, “Microfoundations of Pacts in Latin America”, p. 8.
17
Assim, em “Democracy as an Equilibrium”, vemos Przeworski acabar por admitir um tipo de
equilíbrio sustentado por “compromissos normativos” e por explorar a idéia de institucionalização
em termos que envolvem a correspondência entre normas e equilíbrios auto-impositivos. Já em
“Capitalismo, Democracia, Pactos” o vemos envolvido numa petição de princípio em que a busca
de uma solução institucional que seja auto-impositiva para o problema da democracia é
reiteradamente caracterizada em termos que deixam evidente sua própria dependência de conquistas
institucionais prévias. Discussão mais detida se encontra em meu “Racionalidade, ‘Sociologia’ e a
Consolidação da Democracia”, republicado em Reis, Mercado e Utopia: Teoria Política e
Sociedade Brasileira.
11
básicas – estratégia versus comunicação, ou autonomia versus convergência e
solidariedade –, do qual alguns aspectos adicionais serão elaborados adiante.
III
12
também “o que os outros fazem” pode resultar na introdução de elementos de
poder e desigualdade, com monopólios ou oligopólios. Mas, se o mercado
apresenta esses custos “externos”, o esforço de organização e de levar as
pessoas à participação em decisões coletivas tem seus próprios custos
(“internos”), o que cria a necessidade de recorrer a outro dos três critérios de
Dahl, o da economia.
13
conhecimento ou informação pode na verdade surgir como algo a ser temido
por mim.
Dimensão relevante dos problemas que surgem aqui tem a ver com a
questão da tecnocracia – uma preocupação saliente, como é sabido, da
tradição de pensamento, incluindo a chamada Escola de Frankfurt, a que
muitas das idéias de Habermas se acham relacionadas. A característica central
de uma perspectiva tecnocrática pode ser apontada na tendência a supor que os
fins são dados e não-problemáticos, donde se seguiria que o problema
importante é o do grau de conhecimento “técnico” ou de informação com
respeito aos meios que deverão levar aos fins. Ao contrário, a democracia se
baseia no suposto de que os fins são problemáticos: os fins relevantes são
múltiplos, dizendo respeito aos numerosos indivíduos e a coletividades ou
categorias não apenas diversas, mas ocasionalmente antagônicas, e o desafio
decisivo é o de como conciliar e acomodar a multiplicidade de fins.20
Naturalmente, no que se refere à definição dos próprios fins dificilmente se
poderia sustentar que os peritos ou especialistas devessem desfrutar de
precedência sobre os cidadãos comuns, sob pena de se negar de vez o
compromisso com a idéia mesma de democracia. Isso tem desdobramentos
importantes quanto ao papel dos recursos cognitivos relativamente ao tema
geral da democracia, da participação e da deliberação: quaisquer que sejam as
reservas realísticas a serem impostas às formulações mais radicais ou
ambiciosas do ideal deliberativo, permanece inevitavelmente, em algum grau,
a necessidade de mecanismos que permitam aos cidadãos comuns se tornarem
capazes de pelo menos colocar a questão de como diferentes políticas, na
qualidade de “meios” (talvez em níveis diversos de cadeias mais ou menos
complexas de fins e meios), se articulam com os fins “últimos” a serem
perseguidos – se necessário pelo questionamento dos próprios peritos, ademais
dos líderes.
20
Note-se, de passagem, que a denúncia da tecnocracia encontrada em Habermas, ou, em geral, a
denúncia da “colonização” das esferas comunicativas por elementos de natureza instrumental, é
outro aspecto com respeito ao qual se mostram as dificuldades do empenho de separar mais
cortantemente o instrumental e o comunicativo. É impossível deixar de reconhecer a base
instrumental do próprio questionamento da tecnocracia: qual é a condição alternativa (ou o fim
alternativo) a ser buscada, e como poderemos avançar rumo a essa condição, isto é, a que meios
deveremos recorrer?
14
Mas, mesmo se pomos de lado a questão específica da tecnocracia, o
problema da identidade continua a colocar-se em conexão com a
representação. Ou se justifica a suposição de um grau extraordinário de
identificação entre representantes e representados ou alguma forma de
controle dos primeiros pelos últimos será necessária. A combinação do acesso
diferencial à informação relevante com a falta de identificação e confiança
completas nas relações entre representantes e representados é, naturalmente, o
ponto central da teoria sobre as relações mandante-agente (principal-agent
theory), elaborada em campos novos como a “economia da informação”, de
Joseph Stiglitz, ou, em geral, na economia “pós-walrasiana” anteriormente
mencionada.21 Os problemas aí tratados são de clara importância na vida das
corporações econômicas, como, por exemplo, nas relações entre proprietários
e administradores, ou entre estes e os trabalhadores. Mas são também cruciais,
obviamente, na esfera da política democrática, sobretudo no que se refere às
relações entre os cidadãos como mandantes e os representantes eleitos como
mandatários ou agentes: que mecanismos serão necessários para assegurar
sensibilidade, responsabilidade e a apropriada prestação de contas
(accountability) por parte dos mandatários?22
21
Veja-se, por exemplo, Joseph Stiglitz, Whither Socialism?, Cambridge, Mass., The MIT Press,
1994, e Bowles e Gintis, “The Revenge of Homo Economicus”.
22
Veja-se Bernard Manin, Adam Przeworski e Susan C. Stokes, “Introduction”, em Democracy,
Accountability, and Representation, ed. A. Przeworski, S. C. Stokes e B. Manin, Nova York,
Cambridge University Press, 1999.
15
termos de “planejamento de caráter” (character planning).23 O que há de
problemático nesses supostos se mostra com especial nitidez no contraste, ao
qual Arend Lijphart em particular tem dado atenção, entre os sistemas
majoritários e os sistemas “consociativos” ou “consensuais”: estes últimos
destacam precisamente a necessidade de dar representação apropriada àquelas
identidades compartilhadas (identidades territoriais há muito relacionadas ao
federalismo, identidades étnicas, religiosas etc.) cuja importância para as
pessoas envolvidas proíbe que sejam tratadas meramente em termos de contar
cabeças, com a consequência possível de que identidades coletivas de
profunda significação sejam colocadas permanentemente em posição
minoritária e se deixe de considerar os interesses correspondentes de qualquer
natureza.24
IV
23
Veja-se Jon Elster, Sour Grapes: Studies in the Subversion of Rationality, Nova York, Cambridge
University Press, 1985.
24
Veja-se, por exemplo, Arend Lijphart, Democracy in Plural Societies: A Comparative
Exploration, New Haven, Yale University Press, 1977.
16
Podemos considerar, para começar, os problemas levantados na
perspectiva do “realismo legal”, discutido por Ronald Dworkin em Taking
Rights Seriously e destacado por Francis Sejersted, alguns anos atrás, em texto
sobre a transição do constitucionalismo liberal ao pluralismo corporativo no
caso da Noruega.25 A consideração central é que podemos ter melhores
condições para a deliberação democrática efetiva e a tomada de decisões
coletiva (vale dizer, para o debate em que diferentes pontos de vista sejam de
fato levados em conta) se damos representação apropriada aos interesses e
identidades afetados pelas decisões, isto é, se democratizamos a deliberação.
Naturalmente, isso é trivial de certo ponto de vista, pois a idéia envolvida se
acha subjacente ao próprio recurso à representação em geral. Mas, como
assinalado por Sejersted, “esse princípio colide com a noção liberal do juiz
imparcial, a qual sustenta que aqueles que têm interesse em um caso devem
ser vistos como desqualificados para decidir sobre ele”.26 E cabe acrescentar
que o princípio colide igualmente com a visão idealizada do debate como
baseado na pura força dos argumentos, pois supor a necessidade da presença
efetiva de representantes dos diferentes interesses no processo de deliberação
é admitir que esse processo estará inevitavelmente marcado pela interação
estratégica, ou por fatores que deveriam ser vistos como espúrios daquele
ponto de vista idealizado: argumentos baseados em regras, por exemplo, vão
surgir, pondera Sejersted, como racionalizações.27 Apreciado na perspectiva
das discussões que lidam com a “procedimentalização” entendida como
maneira de levar processos reais de deliberação coletiva a se aproximarem do
modelo do debate “autêntico” e baseado exclusivamente na força dos
argumentos, o princípio surge como claramente contraditório. Pois restringir o
papel da “competência” e ampliar o espaço da interação estratégica aberta
entre os interesses aparece nele como forma de melhorar os resultados dos
processos de deliberação com respeito a algo que deveria ser crucial para
aquele modelo, ou seja, a possibilidade de que diferentes pontos de vista sejam
efetivamente considerados.
25
Ronald Dworkin, Taking Rights Seriously, Cambridge, Mass., Harvard University Press, 1977;
Francis Sejersted, “From Liberal Constitutionalism to Corporate Pluralism: The Conflict over the
Enabling Acts in Norway after the Second World War and the Subsequent Constitutional
Development”, em Constitutionalism and Democracy, ed. Jon Elster and Rune Slagstad, Nova
York, Cambridge University Press, 1993.
26
Sejersted, “From Liberal Constitutionalism to Corporate Pluralism”, p. 299.
27
Donde o rule-scepticism da escola de realismo legal, segundo Sejersted. “Poder positivo só pode
ser confrontado com poder positivo, o que significa que a única maneira pela qual os fracos podem
obter garantias e segurança é se tornarem fortes. A segurança legal deve consequentemente basear-
se no direito de participar do processo de tomada de decisões”. Idem, p. 299.
17
Como indicado pelo contexto da discussão de Sejersted, uma
ramificação relevante de tais problemas se tem com o tema do corporativismo
ou do “pluralismo corporativo” (como alguns, incluindo Dahl e o próprio
Sejersted, o chamam, com certas conotações ambíguas).28 Naturalmente, o
problema de dar representação apropriada aos vários interesses surge também
com respeito à arena parlamentar tradicional. Mas o corporativismo envolve
deliberação em espaços institucionais que contornam os mecanismos de
representação eleitoral e parlamentar. Na verdade, essa é a razão principal da
resistência usualmente oposta ao corporativismo em nome da democracia, pois
os mecanismos de deliberação corporativa com frequência têm acarretado, em
grau maior ou menor, informalidade, reduzida visibilidade e a criação de
monopólios de representação, além de supor um papel importante
(“autoritário”?) por parte do estado como promotor da convergência
corporativa. Contudo, o corporativismo, com tais traços supostamente
negativos, desenvolveu-se de modo natural, em países com longa tradição
liberal-democrática, a partir da dinâmica sociopolítica prévia de uma estrutura
que era ela própria autenticamente liberal e pluralista29 – o que se deu, em
larga medida, como mera resposta aos fortes incentivos a que os interesses
com acesso menos “natural” ao estado, por serem de partida menos providos
de recursos “privados” de vários tipos, se organizassem de modo a compensar
essa deficiência. Além disso, o caráter de democratização que Sejersted
salienta nesse processo é inegável, na medida em que o corporativismo torna
possível a uma categoria de agentes (os trabalhadores), anteriormente menos
presentes em decisões socioeconômicas de interesse crucial para eles, passar a
participar de tais decisões em grau que vai muito além da influência que pode
ser exercida através dos mecanismos eleitorais, ao propiciar-lhes a
representação funcional como trabalhadores nos círculos corporativos. Isso
tem sido visto por alguns autores, com boas razões, como um
desenvolvimento decisivo até mesmo do ponto de vista inclinado a destacar a
importância da democracia político-eleitoral, pois ele seria parte central do
“compromisso social” que esteve sujacente à estabilidade democrática em
seguida à Segunda Guerra Mundial, particularmente nos países que aderiram
de forma mais plena aos arranjos socialdemocráticos. Nessa perspectiva, o
corporativismo se associa com o estado de bem-estar e com o enriquecimento
da própria idéia de cidadania em termos dos direitos sociais que Marshall
destacou, ao lado dos seus componentes relativos aos direitos civis e políticos.
28
Robert Dahl, Dilemmas of Pluralist Democracy: Autonomy vs. Control, New Haven, Yale
University Press, 1982.
29
Embora a literatura costume confundir as coisas ao adotar rótulos como o de “pluralismo
democrático” ou o de “neocorporativismo”, pretendendo que se trate de um corporativismo
diferente daquele que ocorre em países de menor tradição democrática.
18
E os novos desenvolvimentos trazidos pela globalização intensificada, ao
enviar de novo às asperezas do mercado os aspectos correspondentes à
dimensão social da cidadania e ao comprometer as estruturas corporativas,
podem ser vistos como colocando em risco a própria democracia.30
19
tendência de que problemas de identidade se desdobrem em disposições
beligerantes pode ser neutralizada e o processo político pode eventualmente
vir a assumir caráter “desideologizado” e marcado pela tolerância e pelo
ânimo propício à negociação e ao debate.31 Mas assinale-se algo mais: as
condições que permitem a criação de espaços de discussão e deliberação (e
são estimuladas por eles) favorecem também a operação dos mecanismos de
mercado, orientados pela busca tendencialmente pragmática ou “fria”, e talvez
“racional”, do interesse próprio.
31
Veja-se, por exemplo, Giovanni Sartori, Parties and Party Systems: A Framework for Analysis,
vol. I, Nova York, Cambridge University Press, 1976. Embora o tema da segmentação seja aí
explorado em suas conexões especificamente com os partidos e os sistemas partidários, Sartori
remete ao sentido sociológico geral do conceito estabelecido por Talcott Parsons em Structure and
Process in Modern Societies (Nova York, The Free Press, 1960, p. 263), onde a “segmentação” é
distinguida da “diferenciação” pelo fato de que, enquanto subsistemas diferenciados exercem
funções diferentes mas complementares, subsistemas segmentados exercem as mesmas funções.
Politicamente, isso se associa com a idéia de que as decisões importantes para os subsistemas ou
categorias coletivas parciais, como as que dizem respeito a identidades e vínculos “primordiais”
(Geertz), sejam deixadas nas mãos dos próprios segmentos envolvidos, assegurando-se sua
autonomia e a despolitização das questões de identidade – e abrindo-se assim a possibilidade da
construção de espaços de negociação e deliberação conjunta quanto aos demais assuntos. Aguda
exploração do tema geral pode ser encontrada em Stephen Holmes, “Gag Rules or the Politics of
Omission” (em Elster e Slagstad, Constitutionalism and Democracy), onde as teses de Lijphart
sobre consociativismo são aproximadas das idéias de Clifford Geertz em “The Integrative
Revolution: Primordial Sentiments and Civil Politics in the New States”, em C. Geertz, The
Interpretation of Cultures, Nova York, Basic Books, 1973.
20
Há alguns sentidos bem distintos em que a fórmula da “autonomia do
político” é usualmente entendida, incluindo um sentido que se refere a
questões de natureza metodológica e outros em que as questões envolvidas se
poderiam designar como “substantivas” ou teóricas. Se tomamos o primeiro
sentido, em que a fórmula diz respeito a um problema de relações causais
entre diferentes esferas ou planos da realidade social tal como vistas por
modelos analíticos em competição, parece não haver como escapar do recurso
a um velho postulado que responde em termos “sociológicos” à indagação
básica envolvida: as características assumidas pelo estado surgem aí como
dependentes de um substrato correspondente à distribuição social do poder.
Nesta perspectiva, o fato de que o estado venha a revelar-se, em algum grau
significativo, quer a expressão da vontade de todos (do interesse público),
quer um instrumento apropriado por alguns e usado para reprimir e explorar os
outros depende, em princípio, da forma assumida pelo jogo de interesses que
tem lugar no nível da própria sociedade e de quem nele prevalece (os
marxistas diriam que depende da luta de classes). Tal postulado nada mais faz
do que ver o estado, afinal de contas, como parte da sociedade, e não é de
maneira alguma incompatível com o reconhecimento da ocorrência ocasional
de um amplo grau de “iniciativa” estatal. Mas duas coisas de interesse podem
ser ditas se começamos desse postulado analítico ou metodológico.
21
huntingtoniana esboçada), na verdade gira em torno, justamente, de certa
articulação das questões salientadas nestes três significados substantivos da
“autonomia do político”, no quadro propiciado pelo postulado metodológico.
Pois, assim como podemos ter um estado que intervém porque não é neutro,
ou porque algum dos atores envolvidos no conflito social foi capaz de
controlá-lo de vez (considere-se a idéia da “ditadura do proletariado”, ou a
experiência do regime brasileiro de 1964, no qual tínhamos a combinação de
forte intervencionismo com óbvio viés quanto aos vínculos e lealdades sociais
dos donos do poder estatal), assim também podemos ter regras do jogo
estáveis e consolidadas (institucionalizadas), e mesmo formalmente
democráticas, que, não obstante, resultam em consagrar relações de
dominação abertas ou veladas (considere-se a idéia da “dependência
estrutural” do estado perante os interesses empresariais como algo inerente ao
capitalismo, ou o diagnóstico da “tecnoestrutura” formulado por John Kenneth
Galbraith anos atrás com respeito aos Estados Unidos).
22
um estado que não esteja restrito a responder à capacidade diferencial de
pressão por parte dos diversos focos privados de interesse e identidade. O
reconhecimento dessa exigência se reforça pela impossibilidade de dar
representação a todos os interesses, os quais em muitos casos não alcançam
jamais a capacidade de se mostrarem vocais e afirmativos (em parte
precisamente por não chegarem a se constituir em focos reais de identidade
coletiva).
VI
23
em que a deliberação coletiva se faz necessária e procurar criar as condições
para a atuação dos mecanismos de mercado, ou seja, nas quais as pessoas
possam agir por si mesmas, com a minimização simultânea também dos
custos “externos”. Os indispensáveis esforços de construção institucional e
“procedimentalização” serão então guiados, no nível mais abrangente, pela
idéia de que as decisões serão em princípio tomadas pelos próprios atores
dispersos, o que não tem por que ser lido, como se acaba de reiterar, como
significando que não se deva recorrer a procedimentos afins ao modelo
deliberativo sempre que possível. O equilíbrio no que se refere à preocupação
com os custos “internos”, de um lado, e com os custos “externos”, de outro,
será buscado por referência a princípios como o da “subsidiariedade” que se
costuma invocar nas discussões sobre o federalismo, o qual supõe que as
decisões serão transferidas para um nível mais “alto” (do nível dos indivíduos
para aquele de coletividades cada vez mais amplas e abrangentes) somente à
medida que a natureza dos problemas o exija.
24
bem como a adesão a normas que regulam e mitigam a busca por todos do
interesse próprio, assegurando assim que as transações e interações baseadas
no interesse possam ocorrer de maneira reiterada e duradoura sem degenerar
na situação hobbesiana de fraude generalizada e eventualmente de
beligerância.33 Essa solidariedade “rala” pode ser vista como a solidariedade
ou a sociabilidade possível “entre estranhos”, na fórmula sugerida por Bruno
Reis como uma espécie de correção e generalização do enunciado de Weber
segundo o qual as relações de mercado se dão “entre indivíduos que não são
companheiros, vale dizer, entre inimigos”.34
25
concreto da sociedade. De acordo com essa definição, a política teria a ver
com os problemas postos pela interação estratégica e a busca de auto-
afirmação ou de poder em qualquer contexto social concreto,
independentemente do conteúdo específico dos fins ou valores que podem ser
objeto de conflito ou cooperação em uma ou outra esfera de interação – fins
materiais ou “econômicos” ou fins relacionados com religião, classe, raça,
etnia, gênero, geração ou o que mais seja. Em outras palavras, a política,
entendida como o jogo dos interesses e sua eventual acomodação, não tem
conteúdo próprio e é socialmente ubíqua: ela penetra, mesmo se em forma
“larvar”, as relações sociais de qualquer tipo, dizendo respeito à “base social”
dos conflitos e aos focos potenciais ou atuais de solidariedade e identificação
grupal que se envolvem em tais conflitos – da mesma forma em que diz
respeito também à expressão organizacional dos conflitos e solidariedades no
nível convencionalmente referido como “político” ou “político-institucional”,
onde o fator de convergência representado por um estado apropriadamente
complexo e efetivo se afirma, como condição de que o jogo dos interesses não
leve a Hobbes. De novo, não há como deixar de assinalar o componente
“deliberativo” envolvido na aposta quanto a essa expressão organizacional (e
parlamentar) dos conflitos.
26
aspecto claramente paradoxal, do qual não parece haver como escapar: se
vamos ter a efetiva institucionalização ou penetração de uma cultura
democrática e pluralista, de modo a evitar a condição problemática em que os
indivíduos ou cidadãos deveriam ponderar judiciosamente suas ações a cada
passo, será necessário que uma ética amplamente compartilhada pela
coletividade como tal venha a operar rotineiramente; mas essa ética – como tal
inevitavelmente “convencional” – terá de ser de natureza tal que estimule a
autonomia individual e formas “pós-convencionais” de moralidade.
36
Ernest Gellner, Condições da Liberdade: A Sociedade Civil e seus Críticos, Rio de Janeiro, Jorge
Zahar Editores, 1996 (edição inglesa original de 1994).
37
Veja-se especialmente William Kornhauser, The Politics of Mass Society, Nova York, The Free
Press, 1959.
27
impondo-lhe uma identidade “sufocante”, o que se opõe à “moderna
concepção de liberdade”, que “inclui a exigência de que as identidades sejam
escolhidas e não atribuídas” (ou não “adscritas”, em correspondência com o
termo “adscrição” utilizado acima). Muitos desses traços negativos e
“sufocantes” são vistos por Gellner como estando presentes, ainda hoje, na
umma islâmica, a “comunidade geral baseada na fé compartilhada por todos e
na implementação de sua lei”, bem como na peculiar “umma secular do
marxismo”.38 Mas, do ponto de vista de nossas preocupações, é especialmente
interessante o fato de que Gellner, recorrendo a Fustel de Coulanges, não
hesita em incluir sob a caracterização negativa da sociedade comunal a própria
“cidade antiga” da Grécia e de Roma que propicia frequente referência
idealizada para a celebração das virtudes cívico-republicanas – e,
naturalmente, para muito da literatura “deliberativa”. Afinal de contas, como
nos foi lembrado recentemente também por Ellen Meiksins Wood,39 não havia
direitos civis em Atenas. E a “sociedade civil” de Gellner como modelo
positivo tem de ser contrastada também, o que é feito por ele de maneira
enfática, com a sociedade cívica dos sonhos de tanta gente. Na verdade,
Gellner critica explicitamente mesmo a visão idealizada da “sociedade civil” a
ser encontrada com frequência na literatura em que se deu a revivescência
atual do conceito, na qual – contrastando com seu uso clássico em Hegel, por
exemplo, para quem a sociedade civil é o espaço dos interesses e dos
particularismos, em oposição ao universalismo próprio do estado – ele é
associado com altruísmo, espírito público e civismo (em termos das categorias
de Kelly com respeito à cidadania, tratar-se-ia antes de uma espécie de
“sociedade cívica” do que propriamente de “sociedade civil”). É bem claro
que, além dos grupos de interesse propriamente, podemos ter também, como
participantes na sociedade pluralista, associações ou organizações orientadas
pela preocupação com assuntos públicos, e é supérfluo dizer que isso
naturalmente constitui, de certo ângulo, algo desejável e bom. Mas o fato de
que concepções divergentes (e militantes) do bem público sejam muitas vezes
propensas a se envolver pronta e intensamente em interações estritamente
estratégicas e mesmo beligerantes, em contraste com a tolerância que o
pragmatismo dos interesses tende a induzir, fala em favor da perspectiva de
Gellner. E essa perspectiva deve ser tida em conta especialmente diante da
38
Gellner, Condições da Liberdade, pp. 13-16, 30, 88-92. Como assinala Holmes, citando Geertz, o
que temos aqui é “’comunidade’ em sentido forte e antiliberal”, sentido este em que “cidadania e
comunidade são às vezes incompatíveis” e em que temos, como escreve Geertz, “o ameaçador
choque frontal entre lealdades primordiais e civis” (cf. Holmes, “Gag Rule or the Politics of
Omission”, pp. 28 e 29 e nota 16).
39
Ellen Meiksins Wood, Democracia contra Capitalismo: A Renovação do Materialismo Histórico,
São Paulo, Boitempo Editorial, 2003 (edição inglesa original de 1995).
28
pretensão, por alguns dos paladinos recentes da sociedade civil, de que, dado o
seu caráter “virtuoso”, esta última, funcionando como uma espécie de fonte
difusa de convergência e coesão, viesse a substituir e tornar dispensável o
próprio estado.
29
democrático-eleitorais das corporações “cumpridoras da lei”, cujas políticas
frequentemente afetam de maneira tão dramática a vida de tanta gente? É
possível lembrar aqui a perspectiva de Robert Dahl em alguns de seus
trabalhos, onde o autor, designando as grandes corporações como “pseudo-
privadas” justamente pelo impacto público de suas decisões, salienta a
necessidade de democratizar tais decisões por meio de alguma forma de
representação dos interesses afetados.41
VII
30
razões pelas próprias assimetrias entre os estados nacionais e a carência de um
substrato comunitário real na escala planetária), instituir o equivalente
funcional do estado no plano internacional envolveria a criação de foros de
debate e deliberação capazes de mostrar-se muito mais efetivos que os de que
dispomos atualmente.
42
Veja-se, por exemplo, Jonathan Simon, “Governing through Crime”, ms., janeiro de 1997.
31