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A INFLUÊNCIA DA RELAÇÃO AFETIVA

NO PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO
Caroline Saback Muniz - Pedagoga Valença – BA
A relação afetiva em sala de aula é um tema que tem despertado bastante interesse no
âmbito educacional. Cada vez mais é indissociável o poder da afetividade em sala como ajuda no
sucesso ou fracasso no processo de escolarização. Tanto alunos como professores percebem esta
importância, mesmo que esta percepção seja de forma implícita.
O ritmo de vida mudou muito nos últimos anos, e alguns professores não conseguem
acompanhar estas mudanças, ou simplesmente se negam a enfrentar os avanços tecnológicos,
influenciando direta ou indiretamente na metodologia a ser aplicada, o que muitas vezes dificulta no
processo de ensino e aprendizagem. Estes avanços tecnológicos roubam cada vez mais a atenção dos
nossos alunos e se o professor não tiver “jogo de cintura” não consegue obter sucesso nos seus
objetivos educacionais.
Esta proximidade com o aluno é uma das formas da influência da relação professor aluno
no processo de escolarização. Através de uma aproximação agradável, utilizando a mesma linguagem
que nossos alunos usam e despertando o interesse, podemos prender a atenção deles e assim,
competir com a tecnologia e a globalização.
Existe como forma de influência na relação professor-aluno também a carência do aluno, a
necessidade de atenção, o tratamento individualizado (pois cada aluno já vem com experiências,
costumes e saberes próprios), a preocupação com a homogeneização da compreensão dos assuntos
passados para a turma (já que cada aluno tem o seu ritmo de compreensão), dentre outros.
Portanto, há a necessidade também, de um esclarecimento maior sobre os aspectos afetivos
envolvidos no processo de escolarização, em virtude das constantes confusões que se costuma fazer
entre compromisso, sentimentos, emoções, preconceitos, que estão presentes em qualquer relação
social. Tal esclarecimento contribui para um melhor entendimento sobre todos os fatores afetivos que
interferem no processo ensino-aprendizagem na medida em que pode subsidiar formas de administrar
todos esses fatores.
Para se falar sobre a relação afetiva entre os professores e os alunos, seria imprescindível,
antes de mais nada, se falar sobre a diferença existente entre professores e educadores. Professores,
há aos milhares. Mas professor é profissão, não é algo que se define por dentro, por amor. Educador, ao
contrário, não é profissão; é vocação. E toda vocação nasce de um grande amor, de uma grande
esperança. (Alves, 1986) Segundo Alves (1986) realizamos um salto de educadores para professores,
assim como também o realizamos de pessoas para funções. É função do professor ajudar ao educando
a tornar-se um sujeito social e reflexivo perante as leis e decisões que são apresentadas
“democraticamente” para que possam, assim, se posicionar e criticar buscando o aperfeiçoamento da
sociedade (Freire, 2000). Partindo desse pressuposto, o educador passa a ser, freqüentemente, um mau
funcionário, pois o ritmo do mundo do educador não segue o ritmo do mundo da instituição,
pois, ser educador vai além de cumprir obrigações e horários.

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“Eu diria que os educadores são como velhas árvores. Possuem uma face, um nome, uma
estória a ser contada. Habitam um mundo em que o que vale é a relação que os liga aos alunos, sendo
que cada aluno é uma “entidade” sui generis, portador de um nome, também de uma estória, sofrendo
tristezas e alimentando esperanças. E a educação é algo para acontecer neste espaço invisível e denso,
que se estabelece a dois. Espaço artesanal.
Mas os professores são habitantes de um mundo diferente, onde o “educador” pouco
importa, pois o que interessa é um “crédito” cultural que o aluno adquire numa disciplina identificada por
uma sigla, sendo que, para fins institucionais, nenhuma diferença faz aquele que a ministra. Por isto
mesmo professores são entidades “descartáveis”, da mesma forma como há canetas descartáveis...”
(Alves, 1986 p 13)
Sendo assim, notamos o quanto a identidade de um sujeito foi substituída pela função, onde
o que somos é automaticamente o que fazemos e cada vez mais o que importa para o professor é a
quantidade de conteúdos que ele consegue passar para os seus alunos que, como diz Freire (2000)
sofrem com a tirania da autoridade, pois os alunos bem comportados são aqueles que ficam pregados
nas cadeiras a aula inteira, calados sem questionar, tirar dúvidas, aprofundar o assunto.
Apesar de que há, também, aqueles professores que agem com os alunos deixando-os
“livres demais”. Essa liberdade excessiva termina por tornar-se licenciosidade e a conseqüência é a falta
do “controle” da turma, onde o professor não consegue nem manter o respeito dentro da sala, gerando
uma “indisciplina coletiva”. Freire (2000) complementa Alves (1986) que diz:
“Seria possível, então, compreender que a polaridade entre duas classes de pessoas, uma
inexistente e heróica, outra existente e vulgar, mas antes uma dialética que nos racha a todos, pelo
meio, porque todos somos educadores e professores, águias e carneiros profetas e sacerdotes,
reprimidos e repressores... E eu pensaria que o acordar mágico do educador tem então de passar por
um ato de regeneração do nosso discurso, o que sem dúvida exige fé e coragem: coragem para dizer
em aberto os sonhos que nos fazem tremer.” (Alves,1986)
Portanto, para que se compreenda a importância da relação professor aluno, é importante
também que se compreenda a importância de ser educador, a missão que o educador tem de “orientar”
o educando para a vida em sociedade.
Em pesquisa feita através de textos descritivos sobre como seria um bom professor, os
alunos confirmam a importância dessa proximidade. Os resultados descritos adiante foram para
classificar os adjetivos atribuídos aos professores pelos seus alunos, por se tratarem de vivências
distintas.
Foram analisadas 15 redações no Colégio Público transcrevendo os adjetivos que eles
acham mais importantes no professor. Podemos observar que os alunos pontuam que uma boa
professora tem que ser “legal”, “amiga” e “atenciosa”, comprovando o que já foi citado, demonstrando
assim, ao nosso ver, a importância dada pelo aluno à relação de afeto que existe entre eles e seus
professores, confirmando o que disseram Gadotti (1985), Freire (1987), entre outros. Outros adjetivos
foram citados, apenas uma vez, tais como: “paciente”, “jovem”, “dedicada”. Houve redações em que os
alunos citaram mais de um adjetivo. Um outro aspecto observado nas redações dos alunos foi que na
sua avaliação de uma "boa professora" referiram-se, também, ao seu trabalho. Outras descrições, sobre
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o trabalho da professora, apareceram apenas uma vez, como: “pontual”, “rigorosa”, “utiliza diálogo em
sala”, “sério”, “interessante”, “aulas divertidas”, “excelente”, “de responsabilidade”, “cansativo”. Podemos
observar que os alunos também se preocupam com os aspectos metodológicos utilizados pelo
professor, tendo citado mais vezes "explica muito bem", "atende aos pedidos dos alunos, sendo exigente
na hora certa" e "explica quantas vezes precisar", evidenciando a questão da confiança e do diálogo
com professor para tirar suas dúvidas, pois estes alunos sabem que não terão uma resposta negativa ou
até mesmo “opressora”.
Alguns trechos das redações evidenciavam aspectos da relação entre professor e aluno,
que corroborou o que disseram Freire(apud Gadotti, 1994), Libâneo(1994) e Gadotti(1994). Abaixo estão
citados alguns desses trechos.
"A profissão de professora é como o trabalho de uma mãe, ensinar o caminho do bem para
seus filhos".
No trecho a seguir a relação da professora com o aluno é comparada à relação mãe-filho.
"Uma professora legal e muito bonita, não só por causa dos seus olhos, nem por causa dos
seus cabelos e sim porque ela me dá atenção".
Há atribuição de uma importância ao fato de, na relação, a professora dispender uma
atenção ao aluno, o que o atrai não são seus dotes físicos, mas a maneira como o atende.
"Gosto do seu jeito de ensinar porque gosta de conversar com seus alunos. Isso é a melhor
coisa que um aluno espera de uma professora, que seja uma professora amigável e gentil". "Conversar"
é apontado por este(a) aluno(a) como uma importante função na tarefa de ensinar, acrescida da
amigabilidade e gentileza. "É esperta e gosta de ver seus alunos sabendo do assunto que ela dá.
Fazendo isso creio que os alunos se identificam com ela. E assim fica mais fácil de aprender português".
Nesta fala nota-se perfeitamente que o afeto é facilitador da aprendizagem quando satisfaz
as necessidades dos alunos. Com isso pode-se supor que, se não forem satisfeitas essas necessidades
poderá haver dificuldades. Para este(a) aluno(a) o fato da professora se importar com seu conhecimento
da matéria não só motiva como facilita a aprendizagem e apresenta-se como uma forma de
identificação.
"... [a professora] tem que cobrar mais de nós para que fiquemos cientes de que [ela] que é a
professora". Fica clara a necessidade do posicionamento do professor para que o aluno se posicione na
relação (como apontaram Silva e Tunes, 1999), o que também denota uma necessidade afetiva de
tomada de posição, caso contrário, há dificuldades, inclusive de identificação.
Estas frases foram extraídas e expostas, para uma melhor compreensão e comparação com o
que foi citado no trabalho. Podemos através delas observar que alguns alunos fizeram associações
entre o trabalho do professor e o trabalho materno, entretanto a maioria relacionou este trabalho com os
aspectos metodológicos e afetivos. Predominaram estes últimos, demonstrando que os alunos têm uma
percepção mais apurada tanto para o método de trabalho do professor, quanto para questões afetivas.
Se considerarmos que “trabalho materno” tem conotações afetivas, concluímos que os aspectos
relacionados ao afeto predominaram nos conteúdos das redações dos alunos. Ainda que os alunos
tenham sido orientados para não se identificar, observa-se que houve apenas redações referentes a

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aspectos positivos. Isso no nosso entender tem origem no constrangimento em falar coisas negativas
sobre os professores.
Na Escola Particular os alunos priorizaram as brincadeiras educativas e a comparação dos
assuntos dados pelos professores com o cotidiano vivido por eles como melhor método para se ensinar
e naturalmente para se aprender.
Alguns adjetivos foram citados apenas uma vez, tais como: “Alegre”, “legal”, “simpático”,
“atencioso”, “descontraído”, “chato”, “estressado”. Assim como algumas características pessoais como:
“não é criativo”, “não conversa”, “não brinca”. Houve redações em que os alunos citaram mais de um
adjetivo para definir os professores. É importante observar que adjetivos negativos foram mais citados,
demonstrando que alunos da rede particulares não têm constrangimento, medo ou vergonha de fazer
críticas aos professores. Um outro aspecto apontado pelos alunos na avaliação da professora referia-se
ao seu trabalho. Nota-se que os alunos da Escola Particular gostam de participar das aulas, desde que
esta seja diferente, animada. Outras descrições apareceram apenas uma vez, como: “Conduz bem a
aula”, “Compara os assuntos com a realidade”, “ético”, “não usa a prática na sala”, “dá o assunto de uma
vez só”, “só fala e escreve no quadro”. É importante ressaltar que o professor que passa muitos
exercícios é considerado por estes alunos como um mau professor. Podemos observar que, tanto os
alunos da escola particular, assim como os da pública, também se preocupam com os aspectos
metodológicos utilizados pelo professor, visto que os citaram mais vezes.
Alguns trechos das redações, citados abaixo, evidenciavam aspectos da relação entre
professor e aluno.
“A aula se torna chata quando o professor mima só uma pessoa, a que ele mais gosta, fica
puxando o saco.” Este trecho demonstra que os alunos da Escola Particular, ao contrário dos alunos da
Escola Pública, não têm uma carência afetiva acentuada, abolindo, portanto, atitudes de bajulação.
“Professor Marcelo* é um porre, chato, não brinca, não conversa, só chega e dá o assunto,
precisa de diálogo.”
Este aluno esclarece o que foi citado no primeiro capítulo por Gadotti (1994), demonstrando
que o professor não tem mais tempo para dar atenção aos seus alunos e que estes sentem falta deste
tipo de comportamento.
“Chato porque ele dá muitas respostas aos alunos, ele faz algumas brincadeiras
impróprias.”
Este trecho evidencia uma confusão entre brincar (ter uma aproximação afetiva com o aluno) e
brincar (no sentido licencioso da palavra).
“Sabe ensinar sem ter preferidos na sala de aula.”
“Professor legal, [aquele que] dá aulas com dinâmicas, que conversa com os
alunos.”
“Professor chato é aquele que não dá espaço para o aluno se expressar, ou seja, que tem a
sua aula cansativa e não uma que possa ter a participação do aluno.” Este último trecho explicita o que
Freire (1987) chama de “educação bancária”, onde o professor fala e os alunos escutam.
Este resultado corrobora com alguns pontos citados no inicio desde artigo isto é, os alunos
como observadores, ao avaliarem o professor, comparam-no com a família e preocupam-se com o modo
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como este professor se comporta, leciona (metodologia), e com a relação deles com este professor. Na
Escola Pública esta comparação se evidenciou de forma mais explícita. Já na Escola Particular, os
alunos preferem aulas com brincadeiras, divertidas, o que pode também ser considerado como uma
forma de aproximar a escola com a vida familiar. Os alunos da Escola Particular não temem ao falar de
professores, citando nomes inclusive. É perceptível através dos textos a diferença da necessidade de
diálogo, de aproximação com o professor, entre alunos da escola Pública e alunos da escola Particular.
Este resultado também demonstra que os alunos têm opiniões sobre como pode haver uma
melhora nas aulas por eles assistidas, emitindo seus pareceres sobre que aspectos causam maior
motivação para a aprendizagem, e que, portanto, podem diminuir as dificuldades de aprendizagem,
dentre outros problemas comuns nas situações de ensino.
BIBLIOGRAFIA
ALVES, Rubens. Conversas com quem gosta de ensinar. São Paulo: Cortez, 1986.
AQUINO, Julio Gropa. Indisciplina na Escola: alternativas teóricas e práticas. 7° edição. São
Paulo: Summus, 1996.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17° edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
_______. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e
Terra, 1996. p. 23-51
_______. Pedagogia da indignação: Cartas pedagógicas e outros escritos. 1 reimp. São Paulo:
UNESP, 2000.
GADOTTI, Moacir. Pedagogia: Diálogo e conflito. São Paulo: Cortez, 1985.
_______. Convite à leitura de Paulo Freire. São Paulo: Scipione, 1991.
_______. Pensamento pedagógico brasileiro. São Paulo: Ática, 1994.
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.
SCOZ, Beatriz.Psicopedagogia e realidade escolar: o problema escolar e de aprendizagem. 7°
edição. Petrópolis: Vozes, 1994.
SILVA, Elzamir Gonzaga e Tunes, Elizabeth. Abolindo mocinhos e bandidos: o professor o
ensinar e o aprender. Brasília: EDUNB, 1999.

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