You are on page 1of 6

A filosofia tem o seu berço na Grécia do séc. VI a.C.

em que os primeiros filósofos procuravam responder à questão


sobre a origem e estrutura do universo, rompendo com as explicações mitológicas.
A Grécia desta época é palco de um conjunto de transformações que contribuem para que se estabeleçam as
condições geográficas, históricas e culturais que vão traduzir-se no “milagre grego”:
- Prosperidade económica aliada aos frequentes contactos com outros povos e culturas,
- Investimento na cultura, na educação e na política.
No séc. V a.C. vigorava em Atenas um regime democrático que, por um lado convidava à intervenção directa dos
cidadãos nas decisões politicas da cidade (pólis) e, por outro, fomentava a competitividade de interesses na luta pelo
poder político que se conquistava pela retórica, entendida como a arte de seduzir e convencer;
Com o advento da democracia, o cidadão é convidado a expressar livremente as suas opiniões, fazendo valer as suas
teses para se defender na praça pública (Ágora) e nos tribunais, bem como para conquistar o poder político.
Neste contexto, surgem os sofistas que usam a retórica com o objectivo de vencer causas políticas, ou outras, a troco
de dinheiro.

A retórica considera o discurso nas suas múltiplas manifestações, como meio de persuasão,
Preocupa-se mais com o conquistar a adesão do auditório do que com a verdade;
Serve-se da linguagem comum e tira partido da sua polissemia e ambiguidade;
Pretende modificar as crenças, as atitudes e o comportamento do auditório.

Técnicas retóricas
1. O orador pode usar diferentes estratégias, em função
2. das características do auditório:
3. partir de exemplos e invocar situações reais ou fictícias
4. usar comparações para facilitar a compreensão da mensagem
5. apelar à imaginação do auditório e usar imagens apelativas (caso da publicidade)
6. repetir uma frase (um slogan) para vincar uma ideia
7. usar diferentes gestos e modelações de voz
8. usar figuras de estilo: ironia, metáforas, analogia e metonímias.

Características da Sofística
Para os Sofistas (Górgias e Protágoras) o bem, a verdade e a justiça eram conceitos subjectivos e relativos, por isso
mesmo, ensinavam aos seus alunos técnicas de discurso sem qualquer preocupação pelo conteúdo das teses em
disputa, o importante era convencer e sair vencedor.
Eram contemporâneos dos filósofos marcantes da época – Sócrates e Platão, com os quais vão entrar em conflito.
Tinham objectivos práticos: preparar os jovens para a disputa politica e jurídica;
Preocupavam-se mais com a forma do que com o conteúdo do discurso;
Os mestres da oratória e da eloquência faziam da retórica uma técnica de dar beleza e encanto ao discurso, para
melhor conseguirem convencer.
Transformando o discurso numa arte de sedução, a sofística transformou-se num instrumento de manipulação.
Desenvolveram a retórica ( arte de bem falar );
Tinham uma postura relativista quanto à questão do saber e da verdade, privilegiando a opinião ou “doxa”

Apreciação critica aos Sofistas


Os Sofistas e o uso que deram à retórica – vencer convencendo, independentemente da verdade, da justiça e do bem,
fez com que durante séculos a filosofia os rotulasse como homens sem princípios e oportunistas.
No entanto, é justo realçarmos o mérito dos Sofistas, entendidos como pensadores livres do contexto da Grécia
Antiga:
- Contribuíram para que o Homem fosse tema cultural de reflexão contribuindo para a vertente antropológica da
filosofia;
- Mostraram a importância da formação cultural do Homem, que se impõe e resolve conflitos pela disputa verbal e
não pela violência física;
- Questionaram a tradição como fonte de autoridade;
- Introduziram o relativismo e o subjectivismo na questão dos valores e do conhecimento.

Persuasão e manipulação – os dois usos da retórica

PERSUASÃO
É o bom uso da retórica; traduzido pela tentativa de levar um auditório a aderir a uma tese ou acção;
Não se impõe nada, dá-se liberdade aos ouvintes para reflectirem e decidirem individualmente;
O orador procura ajudar a ultrapassar as limitações da racionalidade do auditório;
Há uma relação de igualdade entre orador e ouvintes, estes são respeitados por aquele.
Os objectivos da argumentação estão definidos e são claros, há transparência;
Fomenta-se o espírito crítico e a autonomia de cada um; 1
O orador vê os ouvintes como seres iguais a si e aceita a decisão deles;
A persuasão é moralmente aceitável porque há um uso racional da palavra e "o outro" é visto como um outro "eu".

MANIPULAÇÃO
É o mau uso da retórica;
Consiste em fazer com que outros aceitem ou realizem algo contra os seus melhores interesses;
Há uma imposição, tentando evitar a reflexão e a liberdade de decisão dos ouvintes;
O manipulador procura usar a seu favor as limitações da racionalidade do auditório;
Há uma relação vertical, desigual, em que os ouvintes são usados como instrumentos ao serviço do manipulador;
Os objectivos são escondidos ou apresentam-se de forma confusa para não suscitar reflexão, não há transparência;
O manipulador tenta evitar o espírito crítico e procura desviar as atenções do próprio tema que se devia debater,
anulando ao máximo a autonomia dos ouvintes e a sua capacidade de avaliação da situação;
Na manipulação há um desprezo claro pela individualidade e liberdade de decisão dos ouvintes;
O manipulador vê os ouvintes como seres inferiores, que ele usa em proveito próprio;
A manipulação é moralmente inaceitável porque há má fé e desrespeito pelos outros, os quais são considerados como
meios ao serviço de alguém com objectivos ocultos.

Alguns exemplos de manipulação

O Nazismo: o ditador Adolfo Hitler, foi o primeiro a integrar a retórica em gigantescos espectáculos de propaganda,
produzindo um poderoso efeito hipnótico sobre os auditórios.
Os discursos de Hitler eram cuidadosamente ensaiados. Modelações no tom de voz, gestos dramáticos, olhares
acutilantes, e expressões faciais acentuavam os momentos mais importantes nos seus discursos. Os discursos
abordavam de forma muito emocional quase sempre os mesmos temas: o ódio aos judeus, o desemprego e o orgulho
ferido da Alemanha. Os locais eram decorados de forma a acentuar a sua presença. As paradas militares, bandeiras e
símbolos conferiam à sua figura e palavras uma dimensão sobrenatural

Censura: a informação é manipulada não apenas tendo em vista omitir factos relevantes, mas também deformar o
conteúdo da informação veiculada de modo a que a mesma se ajuste às ideias dos censores. Em Portugal a censura foi
um dos instrumentos mais utilizados pela ditadura (1926-1974) para a manipulação da opinião pública: a informação
que era autorizada era previamente mutilada. A restante era simplesmente proibida.

Propaganda: a informação é forjada de forma provocar a uma adesão imediata a certos estímulos, explorando para
tal as emoções ou os medos das pessoas. Durante a 1ª. Guerra Mundial (1914-1945), as técnicas de propaganda aos
serviços dos Estados tornaram-se enormes máquinas de mobilização de massa, dotadas de enormes recursos técnicos,
que foram depois eficazmente aplicados e desenvolvidos pelos diferentes regimes totalitários.

Karl Popper, no início da década de 90, acusou a televisões de estarem a destruir os regimes democráticos.
Afirmando:

1. A finalidade das televisões não é a educação ou a melhoria das pessoas, mas apenas o lucro.
2. Aquilo que oferecem às pessoas não é o que é melhor para a sua educação, mas apenas aquilo que as seduz e as
mantém presas aos ecrans de televisão, fazendo desta forma subir as audiências. A receita que utilizam é sempre a
mesma: sexo, violência, sensacionalismo, etc. Uma receita que cansa, por isso mesmo obriga-as a um reforço
continuo das suas doses diárias (mais sexo, mais violência, mais sensacionalismo…).
3.Com o aumento do número de canais de televisão, cresceu também o número de pessoas mediocres ou gente sem
escrúpulos ligadas à produção de programas televisivos. Gente que apesar da sua enorme influência social, trabalha
na mais completa impunidade e sem qualquer controlo democrático.
4. As pessoas mais vulneráveis a esta influência nefasta da televisão são as que possuem um nível de formação e
maturidade insuficiente para estabelecerem uma distinção entre a ficção e a realidade.

O bom uso da retórica (persuasão) é o que caracteriza a filosofia e o mau uso da retórica (manipulação) é o que
caracteriza os sofistas.

Argumentação
É a actividade social, intelectual e discursiva que, utilizando um conjunto de razões bem fundamentados
(argumentos), visa justificar ou refutar uma opinião e obter a aprovação e a adesão de um auditório, com o intuito de
alterar o seu comportamento.

• É pessoal e supõe sempre um auditório disposto a ouvir/discutir os argumentos apresentados.


• É essencialmente comunicação, diálogo, discussão, mesmo no caso de um diálogo íntimo (digo a mim
mesmo: Não cedas ao teu mau génio)
• É uma arte que visa exercer um poder sobre o auditório (fazê-lo aceitar uma tese ou uma nova perspectiva
ou conduzi-lo a uma acção imediata ou futura). 2
• O poder é exercido através do discurso racional/emocional e não pela força.
• Utiliza uma língua natural (por exemplo: português), tirando partido de palavras e expressões equívocas.
• Coloca-nos no domínio do verosímil – o que pode ser verdadeiro – ou preferível – o que é, provavelmente o
melhor.
Está sempre situada num contexto preciso: visa um auditório concreto e particular.

Os elementos da comunicação argumentativa: ethos, pathos e logos


A comunicação argumentativa é um jogo de poder entre ethos, pathos e logos

Ethos é a dimensão do orador


Pathos - refere-se à dimensão do
auditório
Logos - dimensão do próprio discurso

Michel Meyer, um especialista contemporâneo refere estes três pontos de vista:

1º O ponto de vista do orador: o que se impõe como determinante é a vontade de agradar, de persuadir, de seduzir, de
convencer, e pouco importa se isso é conseguido através de belos discursos ou de argumentos racionais – O ethos do
orador.
O ethos do orador consiste no poder persuasivo que lhe advém do seu prestígio, da sua autoridade moral ou
científica, das virtudes do seu carácter, das potencialidades da sua personalidade e mesmo do seu aspecto físico
encanto ( “charme”) ou beleza natural.

2º O ponto de vista do auditório: o que conta é a decifração das intenções e, por conseguinte, o carácter do orador, a
inferência que temos o direito de fazer a partir daquilo que é enunciado literalmente. – O pathos do auditório
O pathos do auditório é aquilo a que Aristóteles chamou a “disposição dos ouvintes”. Refere-se às emoções
despertadas nos ouvintes e consiste na receptividade com que estes escutam o orador, pois é do mais elementar bom
senso que, quando pretendemos persuadir uma pessoa, não devemos hostilizá-la.

3º O terceiro ponto vista: o do médium [meio], quer seja a linguagem quer seja a imagem, isto é, a mensagem. Aqui,
o que conta são as marcas do implícito, o sugerido, os tipos de discurso utilizados, a narração – O logos da
linguagem.

Assim, por detrás das definições de retórica esconde-se uma estrutura muito precisa: a relação entre si e outrem
( ethos e pathos) via (através de) uma linguagem (logos)

Michel Meyer afirma: “ Se colocarmos a tónica no pathos, obtemos a retórica-manipulação. Se a colocarmos no


logos, obtemos uma visão lógica e argumentativa, até mesmo linguística da retórica, independentemente dos efeitos
de adesão do auditório e dos valores veiculados pelo orador. Finalmente, se a retórica é analisada a partir do ethos,
teremos uma retórica em que se torna determinante o papel dos sujeitos e da sua “moral” o mesmo acontecendo de
uma maneira geral às suas intenções, quer sejam manipuladoras ou não.

Orador Mensagem Auditório


Ethos Logos Pathos
Objectivo: persuadir o auditório. Argumentos racionais Objectivo: ponderar a aceitação da
Quer argumentar (serve-se de do orador organizados em mensagem.
demonstração racional e/ou prova discurso. Designa a disposição emocional
factual) dos ouvintes para:
Quer seduzir (emotividade da • Escutar e analisar os
mensagem – serve-se de argumentos;
procedimentos comunicativos: • Decifrar as intenções do
carisma do orador, elegância da orador,
mensagem, humor, etc.) • Decidir como responder.
Justificar-se implica argumentos (logos), mas também levar o outro em conta (pathos), para lhe agradarmos, para nos
fazermos aceitar ou porque o queremos manipular (ethos). 3

Argumentação: Análise e comentário de texto

Torna-se fundamental respeitar um conjunto de regras, na análise e comentário de texto, de modo a que a
identificação das teses em confronto possa ser realizada com precisão e clareza, especificando sempre o tema central
do texto e argumentando criticamente acerca das questões colocadas e seguidamente apresentando posições reflexivas
autónomas com elaboração pessoal de uma resposta que apresente de modo fundamentado a defesa de uma
perspectiva própria.

Regras a respeitar:

1- Distinção entre premissas e conclusão.


2- Apresente as suas ideias por uma ordem natural.
3- Parta de premissas fidedignas (fortes, credíveis).
4- Use uma linguagem precisa, específica, concreta.
5- Evite a linguagem tendenciosa.
6- Use termos consistentes.
7- Limite-se a um sentido para cada termo.
8- Use mais do que um exemplo.
9- Dê exemplos representativos.
10- A informação de fundo é essencial.
11- Verificar se existem contra-exemplos.
12- As fontes devem ser citadas.
13- Verificar se as fontes a que se recorre estão informadas, são isentas, imparciais e credíveis.
14- Compare as fontes.
15- Tenha em atenção que os ataques pessoais não desqualificam uma fonte.
16- Ver se o argumento explica como a causa conduz ao efeito.
17- A conclusão sugere a causa mais provável?
18- Ter em atenção que os factos associados não estão necessariamente relacionados (algumas correlações
são apenas coincidências.
19- Factos correlacionados podem ter uma causa comum.
20- Qualquer um de dois factos correlacionados pode causar o outro.
21- As causas podem ser complexas.
22- Explore os argumentos de todas as posições.
23- Avalie e defenda cada premissa do argumento.
24- Reveja e repense os argumentos à medida que surgem.
25- Explique as questões colocadas pelos argumentos.
26- Faça uma afirmação ou uma proposta precisa.
27- Desenvolva completamente os seus argumentos.
28- Considere objecções possíveis.
29- Considere alternativas.
30- Na elaboração de um ensaio argumentativo siga o seu esboço.
31- A introdução deve ser breve.
32- Apresente os seus argumentos um por um.
33- Clarifique os argumentos apresentados.
34- Sustente as objecções com argumentos.
35- Não afirme mais do que mostrou.
36- Elabore uma conclusão final fundamentada relativamente à posição defendida ao longo do
desenvolvimento crítico-reflexivo, no que respeita à posição argumentativa por si defendida.

Retórica e democracia na actualidade


A retórica não utiliza só o discurso oral ou escrito, mas também o discurso visual (publicidade comercial em
televisão, outdoors, cartazes de propaganda política, campanhas de opinião, filmes, etc.)
Enquanto forma democrática de resolver questões a retórica ou argumentação apresentam os seguintes aspectos
positivos:
- Recusa do dogmatismo ( verdades absolutas)
- Defesa de uma pluralidade de perspectivas conducentes à tolerância e à humildade intelectual
- Não concordamos com o racismo, com o fanatismo religioso
- Promove o exercício do diálogo, que, sem vidência, põem em disputa diferentes argumentos, teses, na busca de
consensos colectivamente aceites
- Fomenta a participação como direito e um dever de um cidadão que se quer empenhado, tolerante, livre, responsável
e crítico

Características da Filosofia
Hoje, é feita a reconciliação entre filosofia e retórica ( bom uso da retórica ), esta é um instrumento da procura da
verdade como ela é entendida na verdade – plurívoca, biodegradável, renovável.
4
É a verdade possível na busca do preferível de consensos partilhados intersubjectivamente. A verdade é a tarefa do
filósofo autónomo, crítico, humilde e tolerante.
A Filosofia encara a argumentação como um meio na busca da verdade com o intuito ou finalidade de conseguir o
efectivo conhecimento da realidade (ser).

- Tem objectivos de investigação;


- É o meio de procurar a verdade e o aperfeiçoamento dos seres humanos:
- Utiliza a linguagem e a eloquência ( valorizar mais a forma do que o conteúdo) como instrumentos mas não como
objectivos finais;
- Subordina os instrumentos à verdade e ao saber, tornando-os solidários do bem;
- Defende um uso da linguagem descomprometido com os instrumentos mundanos;
- Desenvolver a dialéctica ( relação/dialogo);
-Segundo Platão e a escola Pitagórica, proporcionava a salvação através do conhecimento e de uma ascese espiritual;
-Visa o esclarecimento e a compreensão;
- Privilegia a sabedoria “Sofia”.
Hoje, é feita a reconciliação entre filosofia e retórica ( bom uso da retórica ), esta é um instrumento da procura da
verdade como ela é entendida na verdade – plurívoca, biodegradável, renovável.
É a verdade possível na busca do preferível de consensos partilhados intersubjectivamente. A verdade é a tarefa do
filósofo autónomo, crítico, humilde e tolerante.
A Filosofia encara a argumentação como um meio na busca da verdade com o intuito ou finalidade de conseguir o
efectivo conhecimento da realidade (ser).
5

You might also like