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Revista "Catolicismo", n° 51, março de 1955 (www.catolicismo.com.

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CONSIDERAÇÕES SOBRE A CULTURA CATÓLICA

Atendendo ao pedido constante de carta que publicamos em outro local,


reproduzimos a seguir a conferência que nosso colaborador Prof. Dr. Plinio
Corrêa de Oliveira preferiu a 13 de novembro do ano findo no Seminário
Central de S. Leopoldo, Rio Grande do Sul, a convite do Revmo. Pe.
Leonardo Fritzen, S. J., Reitor daquela Casa:

Agradeço emocionado, a saudação amável do ilustre Reitor desta Casa, e o


acolhimento afetuoso que de vós estou recebendo.

A atmosfera que aqui se respira evoca anos saudosos e fecundos de minha vida, os
tempos já distantes em que cursava o Colégio S. Luiz, de São Paulo. Passando
quase todo o meu curso secundário em convívio com a Companhia de Jesus, meu
espírito se voltou desde cedo para a consideração dos valores espirituais que Santo
Inácio legou à sua milícia, minhas primeiras lutas espirituais foram travadas sob a
influência dos Exercícios, abriu-se na Congregação a minha alma para a piedade
mariana, entusiasmou-se meu coração no estudo do que pela Igreja fizeram os
Santos que na Companhia floresceram, e alentou-se se minha vontade na devoção
ao Sagrado Coração de Jesus, que Jesuítas eminentes haviam propagado por todo
o Brasil. Posso dizer com sinceridade que quanto mais vivo, tanto mais se radica
em mim a veneração a todos estes valores. Compreendereis pois facilmente,
quanto me sinto tocado num ambiente como este, em que me é fácil discernir nos
mestres, nos alunos, por assim dizer no ar e nos próprios muros aquela influência
formativa que modelou em seus albores e em suas camadas mais internas o meu
próprio espírito.

Ademais, estou aqui num Seminário, e considerando-vos, a vós, jovens, que por
vocação divina ireis servir a Santa Igreja nas fileiras sagradas do Clero, chamados
alguns para a vida religiosa em Institutos beneméritos, e a grande maioria para as
nobres lides do Clero secular, não posso deixar de me sentir empolgado. Como bem
acentuou o Revmo. Pe. Reitor, em vossas fileiras está representado quase todo o
Brasil, desde as margens do Amazonas até as cochilhas gloriosas deste Rio Grande,
passando pelo indômito Pernambuco, terra de meus maiores, e pelo São Paulo
invicto, minha terra natal. Deixastes lares, esperanças terrenas, prazeres, riquezas
talvez, para vos preparardes para o serviço de Deus. Vosso sacrifício é grande por
certo, mas vossa missão ainda maior. Nosso país vive em circunstâncias que
colocam nas mãos do Clero - muito mais nitidamente do que em outras épocas -
não só o destino eterno de nossos contemporâneos, mas de certo modo o de
muitas e muitas gerações vindouras, e ipso facto a grandeza da pátria brasileira
nos séculos que estão por vir. Não é preciso dizer mais, para vos manifestar com
quanta simpatia vos vejo aqui reunidos, ávidos de ouvir uma palavra para a qual a
generosidade do Pe. Reitor suscitou uma expectativa imerecida. Acabo de me
referir à grandeza de vossa vocação, excelsa em todos os tempos mas tão
particularmente grande nos dias que correm. Isto me conduz naturalmente ao tema
que foi proposto para minha palestra, a cultura católica. Comecemos pois a
considerá-lo.
O que é a cultura? A esta pergunta, têm sido dadas respostas bem diversas,
inspiradas umas na filologia, outras em sistemas filosóficos ou sociais de toda sorte.
Tal é o cipoal de contradições que em torno deste vocábulo, e outro conexo, que é
"civilização", se estabeleceu, que congressos internacionais de sábios e professores
se têm especialmente reunido para lhes definir o conteúdo. Como sói acontecer, de
tanta discussão não nasceu a luz...

Não seria possível na exigüidade desta palestra enunciar as teses e os argumentos


das diversas correntes, afirmar por sua vez nossa tese e justificá-la, para tratar
depois da cultura católica. Entretanto, podemos considerar seriamente o assunto,
tomando a palavra "cultura" nos mil significados de que ela se reveste na
linguagem de tantos povos, classes sociais e escolas de pensamento, e começando
por mostrar que em todas estas acepções a "cultura" contém sempre um elemento
basilar invariável, isto é, o aprimoramento do espírito humano.

No âmago da noção de aprimoramento, está a idéia de que todo homem tem em


seu espírito qualidades susceptíveis de desenvolvimento, e defeitos passíveis de
repressão. O aprimoramento tem pois dois aspectos: um, positivo, em que significa
crescimento do que é bom, e outro negativo, ou seja, a poda do que é mau.

Muitos modos de pensar e de sentir correntes, a respeito da cultura, se explicam à


vista deste princípio. Assim, não temos dúvida em reconhecer o caráter de
instituição cultural a uma universidade, a uma escola de música ou teatro, ou
mesmo a uma sociedade destinada ao fomento do jogo de xadrez ou da filatelia. É
que estas entidades ou grupos sociais têm como objetivo direto o aprimoramento
do espírito, ou pelo menos visam fins que de si aprimoram o espírito. Entretanto,
podemos conceber uma universidade, ou outra instituição cultural, que trabalhe
virtualmente contra a cultura, o que se dá quando, pelo efeito de erros de qualquer
ordem, sua ação deforma os espíritos. Poder-se-ia por exemplo fazer esta
afirmação a propósito de certas escolas que, levadas de um entusiasmo exagerado
pela técnica, incutem em seus alunos o desprezo por tudo quanto é filosófico, ou
artístico. Um espírito que adora a mecânica como valor supremo e faz dela o único
firmamento da alma, nega toda certeza que não tenha a evidência das experiências
de laboratório e rejeita desdenhosamente todo o belo, é sem dúvida um espírito
deformado. Como deformado seria o espírito que, movido por um apetite filosófico
imoderado, negasse qualquer valor à musica, à arte, à poesia, ou mesmo a
atividades mais modestas mas que também exigem inteligência e cultura, como a
mecânica. E de universidades que plasmassem segundo alguma destas orientações
falsas os seus alunos, diríamos que exercem uma ação anti-cultural, ou propagam
uma falsa cultura.

Na acepção corrente, reconhece-se que jogar esgrima é um exercício de certo valor


cultural, porque supõe qualidades de destreza física, vivacidade de alma, elegância.
Mas o senso comum se mostra intenso a reconhecer caráter cultural ao box, que
tem em si algo de aviltante para o espírito, pelo fato de ter por alvo de golpes
maciços e brutais a face do homem. Em todas estas acepções, e em tantas outras
ainda, a linguagem corrente inclui na noção de cultura a idéia de aprimoramento da
alma.

Cultura e Instrução

À primeira vista é menos clara no conceito geral, a distinção entre instrução e


cultura. Mas, bem analisadas as coisas, vê-se que tal distinção existe, e repousa
sabre um fundamento sólido.
Diz-se de uma pessoa que leu muito, que é muito culta, pelo menos
comparativamente a outra que lê pouco. E, entre duas pessoas que leram muito, a
que mais leu presume-se ser a mais culta. Como de si a instrução aprimora o
espírito, é natural que, salvo razões em contrário, se repute mais culto quem for
mais lido. O perigo de um erro neste assunto nasce do fato de que muitas pessoas
simplificam inadvertidamente as noções e chegam a considerar a cultura como
mera resultante da quantidade de livros lidos. Erro palmar, pois a leitura é
proveitosa, não tanto em função da quantidade como da qualidade dos livros lidos,
e principalmente em função da qualidade de quem lê, e do modo por que lê.

Em outros termos, em tese a leitura pode fazer homens instruídos: tomamos aqui a
palavra instrução no sentido de mera informação. Mas uma pessoa muito lida,
muito instruída, ou seja, informada de muitos fatos ou noções de interesse
científico, histórico ou artístico, pode ser bem menos culta do que outra de cabedal
informativo menor.

É que a instrução só aprimora o espírito em toda a medida do possível, quando


seguida de uma assimilação profunda, resultante de acurada reflexão. E por isto
quem leu pouco, mas assimilou muito, é mais culto do que quem leu muito e
assimilou pouco. Em via de regra, por exemplo, um guia de museu é muito
instruído dos objetos que deve mostrar aos visitantes. Mas não raras vezes ele é
pouco culto: limita-se a decorar, e não procura assimilar.

Como se Adquire a Cultura

Tudo quanto o homem apreende com os sentidos ou a inteligência, exerce um


efeito sobre as potências de sua alma. Deste efeito, uma pessoa pode libertar-se
mais, ou menos, ou até inteiramente, conforme o caso, mas em si cada apreensão
tende a exercer sobre ela um efeito.

Como já dissemos, a ação cultural consiste positivamente em acentuar todos os


efeitos aprimoradores, e negativamente em frear os outros.

Bem entendido, a reflexão é o primeiro dos meios desta ação positiva. Mais, muito
e muito mais do que um rato de biblioteca, um repositório vivo de fatos e datas,
nomes e textos, o homem de cultura deve ser um pensador. E para o pensador o
livro principal é a realidade que ele tem diante dos olhos; o autor mais consultado,
ele próprio, e os demais autores e livros, elementos preciosos mas nitidamente
subsidiários.

Contudo a mera reflexão não basta. O homem não é puro espírito. Por uma
afinidade que não é apenas convencional, existe um nexo entre as realidades
superiores que ele considera com a inteligência, e as cores, os sons, as formas, os
perfumes que atinge pelos sentidos. O esforço cultural só é completo quando o
homem embebe todo o seu ser, por estas vias sensíveis, dos valores que sua
inteligência considerou. O canto, a poesia, a arte têm exatamente este fim. E é por
um acurado e superior convívio com o belo ( retamente entendida a palavra, é claro
) que a alma se embebe inteiramente da verdade e do bem.

Cultura Católica

Para que uma cultura esteja alicerçada sobre bases verdadeiras, é pois necessário
que contenha noções exatas sobre a perfeição do homem - quer nas potências da
alma, quer nas relações desta com o corpo - sobre os meios pelos quais ele deve
alcançar esta perfeição, os obstáculos que encontra; etc..
É bem de ver que a cultura, assim conceituada, deve ser toda ela nutrida pela seiva
doutrinária da Religião verdadeira. Pois é à Religião que compete ensinar-nos no
que consiste a perfeição do homem, a via para alcança-la, e os obstáculos que se
lhe opõem. E Nosso Senhor Jesus Cristo, personificação inefável de toda a
perfeição, é assim a personificação, o modelo sublime, o foco, a seiva, a vida, a
glória, a norma, e o encanto da verdadeira cultura. O que equivale a dizer que a
cultura verdadeira só pode ser baseada na verdadeira Religião, e que só da
atmosfera espiritual criada pelo convívio de almas profundamente católicas pode
nascer a cultura perfeita, como o orvalho se forma naturalmente da atmosfera
sadia e viva da madrugada.

Isto se demonstra também à luz de outras considerações.

Dizíamos pouco antes que tudo quanto o homem vê com os olhos do corpo ou os
da alma é susceptível de o influenciar. Todas as maravilhas naturais de que Deus
encheu o universo são feitas para que ao considerá-las a alma humana se
aprimore. Mas as realidades que transcendem os sentidos são intrinsecamente mais
admiráveis do que as sensíveis. E se a contemplação de uma flor, uma estrela ou
uma gota de água pode aprimorar o homem, quanto mais o pode fazer a
contemplação do que a Igreja nos ensina sobre Deus, seus Anjos, seus Santos, o
Paraíso, a graça, a eternidade, a Providência, o inferno, o mal, o demônio, e tantas
outras verdades. A imagem do Céu na terra é a Santa Igreja, a obra prima de
Deus. A consideração da Igreja, seus dogmas, seus Sacramentos, suas instituições,
é por isto mesmo um supremo elemento de aprimoramento humano. Um homem
que, nascido nos subterrâneos de alguma exploração de minério, nunca tivesse
visto a luz do dia, perderia com isto um elemento de enriquecimento cultural
precioso, e quiçá capital. Muito mais perde, culturalmente, quem não conhece a
Igreja, da qual o sol não é senão uma figura pálida no sentido mais literal deste
adjetivo.

Entretanto há mais. A Igreja é o Corpo Místico de Cristo. Circula nela a graça, que
nos vem da Redenção infinitamente preciosa de Nosso Senhor Jesus Cristo. Pela
graça, o homem é elevado à participação da própria vida da Santíssima Trindade.
Basta dizer isto, para afirmar o incomparável elemento de cultura que a Igreja nos
dá abrindo-nos as portas da ordem sobrenatural.

O mais alto ideal de cultura está pois contido na Santa Igreja de Deus.

Culturas não Católicas

Pode o homem elaborar fora da Igreja uma cultura verdadeira? Distingo.

Ninguém poderia afirmar que os egípcios, os gregos, os chineses não foram


possuidores de autênticos e admiráveis elementos de cultura. Entretanto, é
inegável que a cristianização do mundo clássico veio propiciar a este valores
culturais muito mais altos.

S. Tomás ensina que a inteligência humana pode, de per si, conhecer os princípios
da lei moral, mas que em conseqüência do pecado original os homens facilmente se
desviam do conhecimento desta lei, pelo que se tornou necessário que Deus
revelasse os Dez Mandamentos. Ademais, sem o auxílio da graça ninguém pode
praticar duravelmente na sua íntegra a Lei. E se bem que a graça seja dada a todos
os homens, sabemos que os povos católicos, com a superabundância de graças que
recebem na Igreja, são os que conseguem praticar todos os Mandamentos.
De outro lado, uma sociedade humana só está em seu estado normal quando a
generalidade de seus membros observa a lei natural. E daí se segue que, se bem
que povos não católicos possam ter produções culturais admiráveis, são sempre
gravemente falhos em alguns pontos capitais, o que tira à sua cultura a integridade
e plena regularidade, pressuposto necessário de tudo quanto é exímio ou mesmo
simplesmente normal.

A cultura verdadeira e perfeita só na Igreja se encontra.

Ireis, meus caros Seminaristas, plasmar para a Religião verdadeira e pois para a
plenitude da cultura, este nosso povo jovem, de imensos recursos inaproveitados, a
quem tocará a liderança do mundo futuro, por alguns séculos certamente. Estes
séculos, esta influência mundial serão de Cristo, Senhor Nosso, se fordes Padres
segundo o Coração de Jesus, inteiramente formados na escola de Maria.

Tudo quanto vos acabo de dizer redunda em afirmar quanto reverencio vossa
esplêndida missão, o muito que de vós espera meu coração de católico, o muito
que vos amo por terdes deixado tudo para seguir esta gloriosa vocação.

Ajude-vos Maria Santíssima a implantar em nossa pátria sua realeza recentemente


proclamada pelo Sumo Pontífice: ut adveniat regnum Christi, adveniat regnum
Mariae.

Melhores votos não vos poderia apresentar como católico, como brasileiro, como
amigo!

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"CONSIDERAÇÕES SOBRE A CULTURA CATÓLICA"

A respeito da conferência do Prof. Dr. Plinio Corrêa de Oliveira que publicamos


neste número, recebeu esta folha a seguinte carta altamente expressiva, assinada
por 56 alunos do Seminário Central de S. Leopoldo:

"Sr. Redator

Os infra-assinados vimos pedir a V. S. o favor de inserir oportunamente nas


colunas de CATOLICISMO a notável conferência, que a todos nos empolgou, do
Prof. Dr. Plinio Corrêa de Oliveira, proferida no salão nobre do Seminário Central de
S. Leopoldo, aos 13 de novembro deste ano. Esse impressionante trabalho versou
sobre a Cultura no seu sentido mais vasto e profundo, e nele se espelhou, uma vez
mais, o seguro e penetrante saber social, histórico, filosófico e teológico do grande
colaborador de CATOLICISMO, que nos honrou com sua visita e nos edificou com
sua palavra. Muito gratos."

Consideraciones sobre la cultura católica

Plinio Corrêa de Oliveira (*)


¿Qué es la cultura? A esta pregunta se han dado respuestas
muy distintas, unas inspiradas en la filosofía, otras en sistemas
filosóficos o sociales de todo tipo. Es tal la maraña de contradicciones
que se ha establecido en tomo a este vocablo, y a otro conexo, que
es el de "civilización", que se han reunido congresos internacionales
de sabios y profesores específicamente para definir su contenido.
Como suele suceder, de tanta discusión no nació la luz...
No sería posible en la exigüidad de este artículo, enunciar las
tesis y los argumentos de las diversas corrientes, afirmar a su vez
nuestra tesis y justificarla, para tratar después de la cultura católica.
Sin embargo, podemos considerar seriamente el asunto tomando la
palabra "cultura" con los mil significados de que se reviste en el
lenguaje de tantos pueblos, clases sociales y escuelas de pensa-
miento, y comenzando por demostrar que en todas estas acepciones,
la "cultura" contiene siempre un elemento básico invariable, que es el
perfeccionamiento del espíritu humano.
En la médula de la noción de perfeccionamiento, está la idea
de que todo hombre tiene en su espíritu cualidades susceptibles de
desarrollo, y defectos pasibles de represión. Así pues, el
perfeccionamiento tiene dos aspectos: uno positivo, en el que
significa crecimiento de lo que es bueno, y otro negativo, o sea, la
poda de lo que es malo.
Muchas maneras de pensar y de sentir corrientes, a respecto
de la cultura, se explican a la vista de este principio. Así pues, no
tenemos duda al reconocer el carácter de institución cultural a una
universidad, a una escuela de música o teatro, o incluso a una
sociedad destinada al fomento del juego de ajedrez o de la filatelia.
Es porque estas entidades o grupos sociales tienen como objetivo
directo el perfeccionamiento del espíritu, o por lo menos persiguen
fines que de por sí perfeccionan el espíritu. Sin embargo, podemos
concebir una universidad, u otra institución cultural, que trabaje
virtualmente contra la cultura, lo que se da cuando, por efecto de
errores de cualquier tipo, su acción deforma los espíritus.
Por ejemplo, se podría hacer esta afirmación a propósito de
ciertas escuelas que, llevadas de un entusiasmo exagerado por la
técnica, infunden en sus alumnos el desprecio de todo cuanto es
filosófico o artístico. Un espíritu que adopta la mecánica como valor
supremo y hace de ella el único firmamento del alma, niega toda
certeza que no tenga la evidencia de las experiencias de laboratorio y
rechaza desdeñosamente todo lo hermoso, es sin lugar a dudas un
espíritu deformado. Como sería deformado el espíritu que, movido
por un apetito filosófico inmoderado, negase todo el valor a la mú-
sica, al arte, a la poesía, o incluso a actividades más modestas que
también exigen inteligencia y cultura, como la mecánica. Y de las
universidades que plasmasen según alguna de estas falsas orienta-
ciones a sus alumnos, diríamos que ejercen una acción anticultural, o
que propagan una falsa cultura.
En la acepción corriente, se reconoce que hacer esgrima es
un ejercicio de cierto valor cultural, porque supone cualidades de
destreza física, vivacidad de alma, elegancia. Pero el sentido común
se muestra reacio a reconocer carácter cultural al boxeo, que tiene en
sí algo tan degradante para el espíritu, por el hecho de tener por
blanco de golpes contundentes y brutales el rostro del hombre. En
todas estas acepciones, y en tantas otras también, el lenguaje co-
rriente incluye en la noción de cultura la idea de perfeccionamiento
del alma.
A primera vista es menos clara en el concepto general, la
distinción entre instrucción y cultura. Pero, bien analizadas las cosas,
se ve que tal distinción existe, y reposa sobre un sólido fundamento.
De una persona que leyó mucho se dice que es muy culta,
por lo menos comparativamente con otra que lee poco. Y entre dos
personas que leyeron mucho, se presume que la que más leyó es
más culta. Como de suyo la instrucción perfecciona el espíritu, es
natural que, salvo razones en contra, se reputa más culto quien fuere
más leído. El peligro de un error en este asunto nace del hecho de
que muchas personas simplifican inadvertidamente las nociones y
llegan a considerar la cultura como mera resultante de la cantidad de
libros leídos. Error craso, pues la lectura es provechosa, no tanto en
función de la cantidad como de la calidad de los libros leídos, y
principalmente de la calidad de quien lee, y del modo como lee.
En otros términos, en tesis la lectura puede hacer hombres
instruidos: tomamos la palabra instrucción en el sentido de mera
información. Pero una persona muy leída, muy instruida, es decir,
informada de muchos hechos o nociones de interés científico,
histórico o artístico, puede ser menos culta que otra de caudal
informativo menor.
Es que la instrucción solamente perfecciona el espíritu en
toda la medida posible, cuando es seguida de una asimilación
profunda, resultante de una apurada reflexión. Y por esto quien leyó
poco, pero asimiló mucho, es más culto que quien leyó mucho, pero
asimiló poco. Como norma general, por ejemplo, un guía de museo
está muy instruido de los objetos que debe enseñar a los visitantes.
Pero no raras veces él es poco culto: se limita a aprender de memo-
ria, y no procura asimilar.
Todo lo que el hombre aprehende con los sentidos o la
inteligencia, ejerce un efecto sobre las potencias de su alma. De este
efecto, una persona puede librarse más o menos, o incluso
enteramente, según el caso, pero en sí cada aprehensión tiende a
ejercer un efecto sobre ella.
Como ya hemos dicho, la acción cultural consiste
positivamente en acentuar los efectos perfeccionantes, y ne-
gativamente en frenar los otros.
Claro está, la reflexión es el primer medio de esta acción
positiva. Pero mucho más que un ratón de biblioteca, un depósito
vivo de hechos y fechas, nombres y textos, el hombre de cultura
debe ser un pensador. Y para el pensador, el libro principal es la
realidad que tiene ante los ojos; el autor más consultado, él mismo, y
los demás autores y libros, elementos preciosos pero nítidamente
subsidiarios.
Con todo, la mera reflexión no es suficiente. El hombre no es
un puro espíritu. Por una afinidad que no es solamente convencional,
existe un nexo entre las realidades superiores que él considera con la
inteligencia, y los colores, los sonidos, las formas, los perfumes que
alcanza con los sentidos. El esfuerzo cultural sólo es completo cuando
el hombre embebe todo su ser, por estas vías sensibles, de los
valores que su inteligencia ha considerado. El canto, la poesía, el arte
tienen exactamente ese fin. Y por medio de una convivencia
perfeccionada y superior con lo hermoso (rectamente entendida la
palabra, claro está) es como el alma se embebe enteramente de la
verdad y del bien.
Así pues, para que una cultura esté fundamentada sobre
bases verdaderas, es necesario que contenga nociones exactas sobre
la perfección del hombre –ya en las potencias del alma, o en las
relaciones de ésta con el cuerpo– sobre los medios por los cuales
debe alcanzar esta perfección, los obstáculos que encuentra, etc.
Es evidente que la cultura bien conceptuada, debe estar
completamente nutrida por la savia doctrinal de la Religión
verdadera. Pues es la Religión a quien le compete enseñarnos en qué
consiste la perfección del hombre, la vía para alcanzarla, y los
obstáculos que se le oponen. Y Nuestro Señor Jesucristo, personifica-
ción inefable de toda la perfección, es así la personificación, el
modelo sublime, el foco, la savia, la vida, la gloria, la norma y el
encanto de la verdadera cultura. Lo que equivale a decir que la
cultura verdadera sólo puede estar basada en la verdadera religión, y
que solamente puede nacer la cultura perfecta de la atmósfera
espiritual creada por la convivencia de almas profundamente
católicas, como el rocío se forma naturalmente de la atmósfera sana
y viva de la madrugada.
Esto se demuestra también a la luz de otras consideraciones.
Antes hemos dicho que todo cuanto el hombre ve con los
ojos del cuerpo o con los del alma es susceptible de influenciarle.
Todas las maravillas naturales de las que Dios llenó el universo están
hechas para que al considerarlas el alma humana se perfeccione.
Pero las realidades que transcienden los sentidos son intrínsecamente
más admirables que las sensibles. Y si la contemplación de una flor,
una estrella o una gota de agua puede perfeccionar al hombre,
cuanto más lo puede hacer la contemplación de lo que la Iglesia
enseña sobre Dios, sus Angeles, sus Santos, el Paraíso, la gracia, la
eternidad, la Providencia, el infierno, el mal, el demonio, y tantas
otras verdades. La imagen del Cielo en la tierra es la Santa Iglesia,
sus dogmas, sus Sacramentos, sus instituciones, es, por ello mismo,
un supremo elemento de perfeccionamiento humano. Un hombre
que, nacido en los subterráneos de alguna explotación minera, no
hubiese visto nunca la luz del día, perdería con esto un elemento de
enriquecimiento cultural precioso, y tal vez capital. Pierde mucho
más, culturalmente, quien no conoce la Iglesia, de la que el sol no es
más que una figura pálida en el sentido más literal de este adjetivo.
Sin embargo, hay más. La Iglesia es el Cuerpo Místico de
Cristo. En ella circula la gracia, que nos viene de la Redención
infinitamente preciosa de Nuestro Señor Jesucristo. Por la gracia, el
hombre es elevado a la participación de la misma vida de la
Santísima Trinidad. Basta decir esto para afirmar el incomparable
elemento de cultura que la Iglesia nos da abriéndonos las puertas del
orden sobrenatural.
Así pues, el más alto ideal de cultura está contenido en la
Santa Iglesia de Dios.
¿Puede el hombre elaborar, fuera de la Iglesia, una cultura
verdadera? Distingamos.
Nadie puede afirmar que los egipcios, los griegos, los chinos,
no fueran poseedores de auténticos y admirables elementos de
cultura. Sin embargo, es innegable que la cristianización del mundo
clásico vino a propiciar a éste valores culturales mucho más altos.
Santo Tomás enseña que la inteligencia humana puede, de
por sí, conocer los principios de la ley moral, pero que como
consecuencia del pecado original los hombres fácilmente se desvían
del conocimiento de esta ley, por lo que se hizo necesario que Dios
revelase los Diez Mandamientos. Además, sin el auxilio de la gracia
nadie puede practicar durablemente en su integridad la Ley. Y si bien
que la gracia sea dada a todos los hombres, sabemos que los pueblos
católicos, con la superabundancia de gracias que reciben en la
Iglesia, son los que consiguen practicar todos los Mandamientos.
Por otra parte, una sociedad humana solamente está en su
estado normal cuando la generalidad de sus miembros observa la ley
natural. Y de ahí se deduce que, si bien los pueblos no católicos
pueden tener producciones culturales admirables, siempre tienen
graves fallos en algunos puntos capitales, lo que le quita a su cultura
la integridad y plena regularidad, presupuesto necesario de todo
cuanto es eximio o incluso simplemente normal.
La cultura verdadera y perfecta solo se encuentra en la
Iglesia.

(*) “Catolicismo”, N. 51, marzo de 1955 (www.catolicismo.com.br).


Conferencia que nuestro colaborador Prof. Dr. Plinio Corrêa de
Oliveira hizo el 13-11-1954 en el Seminario Central de San Leopoldo,
Río Grande do Sul (Brasil), por invitación del Revmo. Pe. Leonardo
Fritzen, S. J., Rector de aquella Casa

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