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Apontamentos - História da Idade Moderna

A periodização histórica, tal como a entendemos (História da Idade Antiga, História da Idade Média, Historia
da Idade Moderna e História da Idade Contemporânea), tem como base a evolução histórica da Europa e
são períodos temporais meramente convencionais;

Os limiares de cada período são fictícios, podendo variar, consoante a história de cada país europeu;

Balizas cronológicas da Idade Moderna:

Início:

• Conquista de Ceuta pelos portugueses – 1415;


• Tomada de Constantinopla pelos Turcos – 1453;
• Descoberta da América por Cristóvão Colombo – 1492;
• Viagem de Vasco da Gama à Índia – 1497;
• Afirmação do Renascimento (quattrocento italiano);
• Crises do século XIV como marco estrutural em que termina a Idade Média e surge a
• Idade Moderna.

Fim:

• Revolução Francesa (1789);


• Início do século XIX (Portugal e Espanha);
• Mais tarde (Europa central e de leste).

Capítulo I

O Homem do Século XVI

No século XVI ocorreram mudanças climatéricas na Europa, que iniciaram uma “pequena idade glacial”,
que se viria a prolongar até meados do século XIX;

A dependência do homem em relação ao clima era maior do que hoje;

A habitação

A casa era distinta no campo ou na cidade e variava ainda, consoante o estrato social do seu proprietário;
Predomínio da madeira sobre a pedra ou o tijolo, nas cidades da Europa central e do norte; Na Europa
ocidental predominava o tabique (madeira e adobe), a cobertura era de colmo ou de telha; As janelas de
vidro surgem nas cidades a partir do século XVI, o ladrilho e o sobrado constituíam o chão das casas mais
ricas e o aquecimento com lareira era raro, sendo o mais vulgar o uso de braseira;
No mundo asiático, ligava-se o adobe com o bambu. Na cidade, a casa pobre era uma casa térrea,
constituída por dois compartimentos: a “casa dianteira” (“cómodo da frente”) e a câmara ou sobrado
(“cómodo traseiro”) que podia encontrar-se na traseira daquela ou num piso superior. A “casa burguesa”
cresce em altura, com uma parte térrea, constituída pela loja ou oficina e, nos pisos superiores a residência
do artesão ou do mercador e dos trabalhadores; No campo, a habitação associava pessoas e animais.

A demografia e a economia

A Europa do século XVI permanecia, em grande parte, não habitada pelo homem; a floresta, os baldios, as
charnecas dominavam os campos cultivados e permaneciam como fonte de riqueza para o homem:
forneciam lenha, caça, frutos silvestres, etc. Os campos, permanentemente cultivados, eram rotativamente
deixados em pousio. Os adubos eram naturais, provindo dos excrementos humanos e animais. Por vezes,
os campos cresciam à custa da floresta e dos pântanos. O vento e a água eram as grandes forças de
energia motriz. Excepcionalmente, o carvão de pedra e a madeira produziam igualmente energia, aplicada
ao aquecimento ou à indústria.

Os transportes

O cavalo e o dromedário eram os animais destinados ao transporte terrestre, enquanto os diversos tipos de
barcos faziam a circulação nos rios, mares e oceanos.

A alimentação

Os regimes alimentares eram os tradicionais, alterados na Europa do período moderno pela divulgação do
consumo do arroz, a partir do Mediterrâneo, ou pela introdução na dieta alimentar e consequente
vulgarização de produtos do continente americano, como a batata, o milho maiz, o tomate e o peru. O pão,
a carne, o peixe, os mariscos, os lacticínios, os vegetais, as gorduras animais (manteiga, banha e óleo de
peixe) e vegetais (o azeite) eram comuns na Europa, mesmo entre os pobres. Como bebidas, para além da
água, usava-se o vinho, a cerveja, a cidra.

A peste

As doenças que atacavam o homem moderno eram várias: umas provocadas pelas carências alimentares;
outras pelas deficientes condições higiénicas; outras de carácter infecto-contagioso, geradoras de
epidemias, as designadas “pestes”. Como prevenção às epidemias, propunha-se a fuga, o isolamento dos
doentes, a quarentena e as queimas de ervas odoríferas, como o alecrim.

A segurança

O homem deste período era violento. A agressividade manifestava-se no fanatismo das guerras religiosas,
no modo como assistia às condenações como se se tratasse de um espectáculo, no seu comportamento
perante a dor física.
Perspectiva sobre a morte

A morte era entendida como uma passagem para uma outra vida e era preparada pelo testamento.

A estrutura familiar

A família prolongava-se nos filhos. À grande natalidade correspondia também uma grande mortalidade
infantil que tenderia a diminuir, ainda no período moderno.

A noção do tempo

A noção do tempo era relativa e tinha como base o calendário natural: a sucessão dos dias e das noites, as
estações dos anos e a sua relação com o calendário agrícola ou o relacionamento com as festividades
cristãs. No entanto, no período moderno divulgam-se os relógios que tinham começado a surgir na Europa
no século XIV.

A língua

É no século XVI que as línguas europeias se começam a codificar, através das primeiras gramáticas. Para
a divulgação do texto escrito contribuiu a imprensa, inventada no século anterior. Os algarismos substituem
a numeração romana, assim como o experimentalismo começa a questionar conhecimentos que vêm da
Antiguidade.

Capítulo II

O meio económico: reconstrução e expansão

A riqueza de um reino, de um senhorio ou de uma família media-se pelo número de indivíduos que
possuíam. A natalidade era limitada pelo número de mulheres, pela sua idade fisiológica e pela duração
prolongada do aleitamento. O intervalo inter genésico entre os partos, tidos por uma mulher, era de cerca
de dois anos. A mortalidade feminina no parto e no período pós-parto era grande, devido à falta de higiene
e à quase ausência de cuidados médicos.

A mortalidade feminina e masculina eram elevadas, cifrando-se a esperança média de vida à volta dos 40
anos. As fomes e as pestes continuam a ser as grandes destruidoras da população, vitimando idosos e
crianças. Apesar disso, os séculos XV e XVI assistiram a um crescimento demográfico que permitiu à
Europa conhecer novos arroteamentos de terras e, nomeadamente ao mundo mediterrânico, expandir-se
para outros continentes. Estes séculos ficaram conhecidos pela grande movimentação populacional: a
mobilidade dos camponeses para novas aldeias e novas terras; a expulsão de judeus e mouros da
Península Ibérica. A densidade demográfica rondaria os 30 habitantes por km2, sendo a França e a
Península Itálica as regiões mais povoadas e o Norte da Europa o mais fracamente habitado.

O século XVI conheceu a duplicação da população de grande parte das cidades europeias.
A indústria conquistou o campo, ao mesmo tempo que a burguesia investia na aquisição de terras no termo
da cidade. Os costumes comunitários persistiam no campo que era o abastecedor da cidade. A
diferenciação entre campo e cidade não era tão nítida como hoje, vivendo no mundo urbano trabalhadores
rurais do termo, para além de a própria cidade conter, em si, hortas, pomares, almuínhas e, nas ruas,
circularem animais domésticos e gado.

A agricultura mantinha-se como a principal actividade económica e dois anos agrícolas maus tornavam-se
numa catástrofe. A fome, provocada pelos maus anos agrícolas, exigia uma rápida importação de cereais
de outras regiões. O comércio dos cereais, nomeadamente do trigo, era definido por rotas regionais ou por
rotas entre reinos ou continentes diferentes, como aquelas que traziam os cereais do norte de África para a
Europa mediterrânica. Os preços dos cereais eram fixados pelas autoridades urbanas ou pelo próprio rei.
Apesar da importância dos cereais no tráfego comercial, este era alimentado pelas especiarias, pelos
produtos industriais, como os têxteis e outros, pelas madeiras, etc. A floresta era fonte de riqueza e apoio
para uma série de pequenas industrias, que iam desde o carvão à madeira.

Na cidade, uma parte importante do comércio residia na venda dos produtos manufacturados pelos
artesãos. Os artesãos de um ofício ou mester reuniam-se numa corporação de mestres e companheiros, a
qual regulamentava o ofício e definia o preço dos artefactos produzidos. Os ofícios tal como os artesãos
tinham uma hierarquia que se traduzia pela localização no espaço urbano, pelo salário, pelo prestígio social
e político dos seus artífices, ou pela permanência, sob seu controlo, de outros ofícios afins.

Uma das indústrias mais importantes era a têxtil que definiu zonas de produção, como a Flandres, a
Inglaterra, Florença ou a Espanha. Esta última era com a Inglaterra uma zona produtora de lã. A produção
têxtil conhecia uma associação entre factory system e domestic system. O início do período moderno
marcou o princípio da produção da seda europeia, nomeadamente nas cidades italianas.

Neste período surgiu também a indústria hulhífera, na Europa central, levando ao aparecimento do alto-
forno a fole, movido por meio de rodas de água, para a produção do ferro fundido. A exploração das minas
de cobre e de prata deu origem a uma indústria capitalista, associada a nomes de famílias banqueiras
alemãs, como a dos Fugger de Augsburgo. Pela primeira vez, extraiu-se a prata dos outros metais, como o
cobre, através da técnica do mercúrio.

O início da modernidade está ligado ao aparecimento da indústria do livro impresso, graças à invenção da
imprensa com caracteres móveis por Guttemberg, em meados de Quatrocentos.

O mar é a grande via de comunicação e de comércio, sendo as estradas usadas pelos correios ou pelos
indivíduos em pequenas comitivas.

Os mercados situavam-se nos agregados urbanos, espaço, por excelência, das trocas, quer periódicas,
como as feiras e os mercados, quer diárias nas tendas e lojas, e eram regulamentadas pelas autoridades
municipais ou senhoriais. As feiras eram protegidas pelo senhor da terra e, as mais importantes, pelos
soberanos, como as de Medina del Campo, em Espanha, ou as de Genebra e Lyon, em França. Em certas
cidades havia a bolsa de mercadorias, como em Anvers (Antuérpia), em 1533.
A moeda distinguia-se: a moeda circulante (ouro, prata e bolhão ou cobre) e moeda de conta ou moeda
padrão. Esta última era, em França, a libra tornesa (de Tours) ou a libra parisiense (de Paris) que circulava,
cunhada em escudos ou outras espécies áureas, em pistola e tostões de prata, e em espécies subsidiárias
de cobre ou de bolhão (liga de prata e outros metais inferiores em que estes constituíam a maior
percentagem).

A paridade entre o ouro e a prata era fixa e determinada pelo poder emissor, na generalidade o rei,
podendo também ser por um senhor que usufruísse do direito de lavrar moeda própria no seu senhorio.

A circulação das espécies monetárias era universal, ou seja, ultrapassava os limites territoriais do reino ou
senhorio que a emitia, pois valia consoante o ouro, prata ou cobre que continha; ou seja, a moeda era
instrumento de troca mas era também uma mercadoria. O cambista ou cambiador era o avaliador das
espécies nos vários mercados. Na segunda metade do século XV, aumentou a circulação e a reserva de
ouro na Europa, devido à drenagem deste metal de África para a Europa, quer, via rotas caravaneiras que
de Tombuctu traziam o ouro para os portos do norte de África, quer via Portugal que atingiu as fontes do
ouro do Sudão.

A abundância de ouro levou a uma depreciação deste metal perante a prata e conduziu à exploração de
novas minas e novas técnicas para a obtenção de prata, na Hungria e na Áustria. Esta situação só seria
alterada com a chegada do ouro, mas sobretudo, da prata americana, a partir de 1530, trazidos pelos
espanhóis.

A partir do século XIII, os mercadores europeus conheceram a letra de câmbio e o “recâmbio”, para
substituir a moeda, nos negócios de longa distância. Cédulas, empréstimos e rendas eram outras formas de
crédito. Os capitalistas desta época eram mercadores cambistas que emprestavam dinheiro a crédito e que
exerciam as funções de bancos de depósito, como os Médicis, os Fugger, os Weltzer.

A partir de 1520, a Europa entrou em recessão: os preços subiram, nomeadamente os agrícolas,


provocados pela entrada excessiva de metais preciosos não acompanhada pelo aumento do consumo; os
rendimentos em espécie tornaram-se um valor-padrão, em detrimento da moeda; o objectivo do lucro
imediato levou ao investimento nos negócios e ao recurso ao crédito; este entrou em crise, levando à
falência de algumas das grandes casas bancárias; os produtos ultramarinos invadiram a Europa, detendo o
rei de Portugal, entre 1504 a 1540, uma parte importante deste comércio, tendo-lhe sucedido a Espanha, a
partir de 1550.

A Europa dividia-se em áreas de influência geográfica e mercantil: o Mediterrâneo; a fachada atlântica; o


Báltico e a Europa central. No mundo mediterrânico sobressaíam as cidades italianas, nomeadamente
Génova e Veneza; na fachada atlântica, dominavam Lisboa com a Casa da Mina e a Casa da Índia e
Sevilha, com a Casa de Contractación; no mundo báltico, temos as cidades hanseáticas com Lubeck e
Dantzig; na Europa central, sobressaíam com Augsburgo, Nuremberga que se encontrava na rota de
Veneza, Frankfurt e Colónia, eixos para a Flandres e para Leipzig, no Báltico. O desenvolvimento do
comércio e dos seus monopólios levou à afirmação dos Estados, que obrigou os soberanos a socorrerem-
se do crédito dos banqueiros endividando-se.
Capítulo III

Humanismo e Renascença: A Renovação da Europa

A Renascença é uma evolução natural dos finais da Idade Média e não um corte com esta época da
humanidade. O seu limiar inicial remonta ao renascimento urbano dos séculos XII e XIII, para alguns
autores. No entanto, convencionou-se relacioná-la com a maturidade do renascimento italiano, nos meados
do século XV e inícios do XVI.

A Renascença, iniciada na Itália, procurava retomar o pensamento e as formas da expressão plástica da


Antiguidade greco-romana. A Renascença está directamente relacionada com o Humanismo, movimento
que situava o homem no centro das preocupações espirituais e dos estudos e arrasta a uma nova
concepção do mundo.

O aparecimento do livro impresso e a decadência das universidades contribuíram para as mutações


intelectuais que caracterizaram o humanismo e a Renascença. O poder da imprensa leva à criação da
censura, por parte dos soberanos e da Igreja, a qual é entregue, na generalidade, às universidades. A maior
parte dos livros versava temas religiosos (Bíblia e A Imitação de Cristo), seguindo-se as obras de literatura,
direito e ciência.

Divulgou-se o ensino elementar, nas escolas paroquiais, sendo gratuito para os mais carenciados. Versava
o ensino da leitura, da escrita e do cálculo. O ensino intermediário desenrolava-se em colégios, onde
ensinavam professores laicos e eclesiásticos. Neles também residiam alunos das faculdades das Artes.
Outros substituíam as universidades nas cidades onde estas não existiam.

As universidades mantiveram a sua organização medieval, agrupando mestres, estudantes e agentes


diversos. Os estudantes estavam reunidos em “nações”. À sua frente estava o reitor eleito, o conselho da
universidade e a assembleia de professores. Os soberanos e a Igreja concediam-lhe privilégios e isenções.
As faculdades superiores eram as de Teologia, Direito (canónico e/ou civil) e Medicina a que se acedia
depois de frequentar a faculdade das Artes. O ensino universitário tem por base o pensamento escolástico,
em crise nesta época, devido à querela dos universais, entre realistas e nominalistas.

Florença, no tempo dos Médicis, foi a cidade do humanismo, destacando-se o escritor Lourenço Valla, o
filósofo neoplatónico Marsílio Ficino, o arquitecto Brabante, o escultor Donatello e os pintores Botticelli e
Ghirlandaio.

Roma sucedia a Florença, cujo humanismo fora interrompido pelo fanatismo de Savonarola. Os papas
Alexandre VI, Júlio II e Leão X tornaram-se os grandes papas do Renascimento italiano. Bramante, Miguel
Ângelo e Rafael deram o nome à basílica de S. Pedro, no Vaticano. O homem, como criação de Deus, era o
centro do universo.

Ao Renascimento italiano, corresponde o ideal do homem, definido por Baldassarre Castiglione, o cortesão.
O Renascimento teve em Veneza características excepcionais, afirmadas pelo pensamento aristotélico e
averroísta de Pomponazzi, embora se tivesse tornado o principal centro de arte, após o saque de Roma de
1527.

A mobilidade dos universitários e das gentes da Igreja fez irradiar os ideais do humanismo e a estética da
Renascença italiana para outros reinos da Europa ocidental e respectivas universidades. Entre esses
humanistas, temos Erasmo de Roterdão, o português Damião de Góis, o francês Rabelais, o inglês Thomas
Moore, autor da Utopia, o holandês Dürer, entre outros. Também os humanistas da Europa ocidental
estudavam e dominavam o latim, o grego e o hebraico, mas distinguem-se dos italianos pela preocupação
com a política e com a religião. Lefebvre d’Etaples e Erasmo renovaram o sentimento religioso, através do
misticismo, o primeiro, e do ideal humano da Antiguidade, o segundo.

Não houve humanismo na Europa mas humanismos que, em alguns locais, afirmaram os nacionalismos e
renovaram as línguas nacionais. Humanistas houve que se afirmaram no campo da ciência (astronomia,
matemática), da filosofia, da medicina, como Leonardo da Vinci, em Itália, o polaco Copérnico, defensor da
teoria heliocêntrica, ou os médicos Ambroise Pare e Vesálio.

A literatura italiana renovou-se com Ariosto que integrou o romance de cavalaria no espírito do
Renascimento, ou com Maquiavel, autor do primeiro tratado político. A arte e a literatura do final do
Renascimento integraram um estilo designado por maneirista. No período maneirista renovou-se a música
religiosa com Palestrina.

Contemporâneo da Renascença artística italiana foi o gótico flamejante na Europa ocidental que deu estilos
nacionais, como o manuelino, em Portugal, e o plateresco ou isabelino, em Espanha. Com o incentivo às
línguas nacionais, ocorreu a tradução da Bíblia do latim para as línguas faladas, iniciada na Alemanha com
Lutero.

A Renascença atingiu também os países do leste europeu e Constantinopla, onde dominavam os turcos. A
Renascença foi um fenómeno europeu que exerceu uma acção mais profunda na Itália e se expandiu por
toda a Europa, apoiando-se nas tradições locais, tornando-se num agente de unificação da cultura
europeia.

Capítulo IV

A Reforma

A Reforma foi uma cisão dentro da cristandade ocidental que teve causas religiosas, morais, económicas,
sociais e políticas e foi, também, uma renovação dentro da Igreja romana, vulgarmente designada por
Contra-Reforma, para se distinguir da Reforma protestante.
Entre as causas religiosas, encontramos: a angústia do homem do final da Idade Média, perante o pecado e
a morte; a individualização da religião e o misticismo; os movimentos contestatários de Roma que
rejeitavam a tradição católica e afirmavam o primado da Bíblia, como fundamento da fé, aplicavam a
metodologia crítica aos textos sagrados e permitiam a livre interpretação destes, independentemente dos
conhecimentos teológicos dos fiéis, mas permaneciam submissos à Igreja; a importância do pensamento
erasmiano entre os humanistas e os críticos.

Entre as causas morais, anotamos: a dissolução dos costumes do clero, em toda a sua hierarquia; a
indistinção entre o político e o religioso, entre as hierarquias eclesiásticas.

Entre as causas económicas, sociais e políticas, temos: o crescente desenvolvimento económico da


burguesia e do capitalismo comercial; o empobrecimento do mundo rural (camponeses e pequena nobreza
terratenente), devido aos maus anos agrícolas e às fomes, gerador das revoltas dos camponeses contra a
miséria, na Europa central; a expansão nas diversas camadas sociais do erasmismo; a fragmentação
política, em principados e senhorios eclesiásticos, do Sacro Império que não permitia uma centralização
forte do poder imperial perante o fisco pontifical, como a colecta das indulgências.

A Reforma, dita protestante, foi conhecida por vários movimentos: luteranismo, calvinismo, presbterianismo,
anabaptistas, anglicanismo, entre outros. Teve como antecedentes os movimentos contestatários do final
da Idade Média, como os de Wiclif, na Inglaterra, os de João Huss, conhecidos por hussitas, os taboristas,
os valdenses e outros.

A cisão reformista iniciou-se com Martinho Lutero e teve as seguintes fases:

• 1517 (31/10) Afixação em Wittenberg das 95 teses contra Roma e a colecta das indulgências;
• 1519 Disputa de Leipzig;
• 1520 Publicação das obras de Lutero;
• 1520 (25/12) Queima da bula Exsurge domini;
• 1521 Assembleia de Worms, onde Lutero recusou retratar-se, foi excomungado, expulso do Império e
se refugiou em Wartburgo:

O pensamento de Lutero radicou-se nos seguintes princípios: a salvação dos homens era mérito de Jesus
Cristo; as obras eram inúteis à salvação; o sacerdócio era universal; os sacramentos actuantes na graça de
Deus em cada homem eram o baptismo, a comunhão e a confissão ou penitência; a acção da
predestinação na salvação de cada cristão.

Lutero reclamou: a formação de Igrejas nacionais autónomas, para o que contou com o apoio dos príncipes
alemães; a extinção das ordens mendicantes; a extinção do celibato eclesiástico; a comunhão sobre as
duas espécies; medidas contra o luxo e a usura.

O luteranismo organizou-se e ocupou um espaço geográfico na Alemanha: associou-se ao catolicismo


contra os camponeses e a pequena nobreza alemã, seguidores do pensamento reformista e social de
Munzer, em 1525; os príncipes alemães associaram-se e formaram a liga de Smalkalde, em 1531; a paz de
Augsburgo era o reconhecimento, por parte do imperador Carlos V, da existência oficial das Igrejas
luteranas nacionais, obrigando os súbditos a seguir a religião do príncipe.

Aparecem outros movimentos reformistas como os sacramentários de Zwingli, defensores dos seguintes
princípios: predestinação; recusa do baptismo e da comunhão como sacramentos.

Ou os anabaptistas e mennonitas que: submetiam a Igreja ao poder político; reconheciam o primado da


conversão pessoal pelo que só admitiam o baptismo de adultos; rejeitavam a autoridade do Estado e a
propriedade individual.

A segunda vaga dos movimentos reformadores atinge a França, a Inglaterra e a Escócia, principalmente.
Nesta segunda fase, temos o movimento pregado por Calvino que atingiu a França (cuja Igreja era nacional,
no respeitante à disciplina eclesiástica, desde a Concordata de Bolonha, em 1516), cuja realidade política,
social e religiosa era diferente do Império, e outras regiões.

Os princípios do calvinismo são: a revelação encontra-se nas Escrituras (Antigo e Novo Testamentos); a
predestinação; a fé é fonte de salvação; o baptismo e a ceia são testemunhos da graça de Deus, mas não
fonte de graça divina.

A cidade de Genebra tornou-se o balão de ensaio da concepção político-religiosa do estado calvinista. O


calvinismo estendia-se pela França, fundava as primeiras Igrejas e convocava o primeiro sínodo nacional,
em 1559. Nesse mesmo ano, John Knox levava o calvinismo para a Escócia e substituía o catolicismo pelo
presbiteranismo. Em 1534, Henrique VIII, por razões políticas, abandonava Roma, tornando-se pelo Acto de
Supremacia o chefe supremo da Igreja inglesa.

A Reforma inglesa (anglicanismo) assentou nos seguintes princípios: o rei era o chefe supremo da Igreja,
rejeitando-se o Papa e Roma; extinguiu-se o clero regular, passando os seus bens para a coroa; o rei
nomeia os bispos como chefe supremo da Igreja anglicana; o culto aproximou-se do católico, depois de
uma afinidade ao calvinismo no respeitante ao dogma.

Ao mesmo tempo a Igreja católica fazia a sua Reforma, que se caracterizou como Contra Reforma; a
reforma disciplinar e doutrinal (Concílio de Trento), a renascença católica e a missionação.

Instrumentos dessa Contra Reforma católica foram o Santo Ofício, as novas ordens religiosas, como a dos
jesuítas de Santo Inácio de Loyola. A Companhia de Jesus formava, nos seus Colégios, os seus padres,
dentro dos ideários humanista e teológico católicos e, posteriormente, abriu colégios para leigos.

O Concílio de Trento, iniciado em 1545 e terminado em 1563, definiu o dogma e restaurou a disciplina
eclesiástica: o dogma baseia-se na Escritura e na tradição; a interpretação das Escrituras pertence à Igreja;
a hierarquia eclesiástica (papa e bispos) detém o poder confiado por Cristo a S. Pedro e aos apóstolos; a
justificação do homem vem da graça divina e são os sacramentos que lha conferem; as obras e a fé
intervêm na salvação de cada cristão; afirmação da presença de Cristo, pela transubstanciação, no pão e
no vinho da Eucaristia; os sacerdotes são educados em seminários e os monges em clausura; implementa-
se a catequização dos cristãos; precisou-se a legislação canónica sobre o casamento.

A renascença católica realizou-se com as novas ordens, a sua pregação e o seu ensino: os colégios dos
jesuítas dedicaram-se ao ensino masculino e à missionação; as ursulinas investiram no ensino feminino; S.
Filipe Néri criou o Oratório, ordem devotada à oração e à actividade apostólica; Sta Teresa de Ávila fundou
as carmelitas reformadas e abriu novos caminhos ao misticismo cristão; renovaram-se os estudos
teológicos.

Os espaços geográficos da Reforma protestante encontram-se no centro e norte da Europa, enquanto a


Reforma católica se localizou à volta do Mediterrâneo. As duas Reformas antagonizaram-se pois as noções
de liberdade e de tolerância religiosas eram, com raras excepções, inexistentes na época. Destes
movimentos, o luterano foi o mais retrógrado em relações ao capitalismo.

Na cultura, permaneceram os métodos humanistas. Na arte, a reforma calvinista foi iconoclasta, enquanto
os demais protestantes apenas aceitavam a imagem de Cristo.

Capítulo V

As Sociedades Europeias

A sociedade moderna assentava em princípios diferentes daqueles que hoje regulam as nossas
sociedades.

A religião estava presente em todos os actos da vida familiar e pública, marcando os princípios que regiam
a sociedade. A sociedade defendia as diferenças sociais, prevalecendo a ideia de igualdade perante Deus e
a morte. A sociedade era obra de Deus que a criou una e diferente nas suas funções, à semelhança do
corpo humano onde cada órgão e membro desempenham funções diversas mas necessárias.

A sociedade estava dividida em três ordens ou estados: clero, nobreza e povo. Cada estado tinha funções
diferentes mas solidárias umas com as outras: o clero rezava; a nobreza defendia e o povo trabalhava. Se o
privilégio definia os estados mais poderoso, a riqueza, definida pela posse da terra e/ou pelo dinheiro,
marcava os indivíduos dentro de cada estado.

Numa sociedade de ordens, os grupos sociais encontravam-se hierarquizados segundo a honra, a estima, a
dignidade, vinculadas a determinadas funções pelo conjunto dos habitantes. A sociedade de ordens ou de
estados não era estanque, havendo uma mobilidade de uma ordem inferior para outra superior, por mérito
ou riqueza próprios e pela vontade do rei.
A hereditariedade era importante porque ela permitia à família sobreviver, na vida e no pós-morte: as
gerações eram solidárias entre si. A importância da família encontrava-se não só na transmissão do nome
ou de uma terra, mas na aprendizagem de um ofício.

A segunda metade do século XV e o primeiro quartel do século XVI foram marcados pelo crescimento
demográfico e por uma certa mobilidade social. Nas cidades, uma burguesia capitalista afirmava-se nos
sectores têxtil e mineiro e investia uma parte do seu capital na aquisição de bens fundiários.

Sobre os camponeses, aumentava os direitos em espécie e em dinheiro, assim como apareciam novas
formas de arrendamento dos campos. A opressão sobre os camponeses, assim como as prédicas
igualitárias dos lolardos, taboritas e anabaptistas, alimentaram as revoltas dos camponeses e dos homens
dos ofícios contra a miséria, a partir de 1520-1530. Os camponeses permaneceram oprimidos com os
direitos banais e os direitos feudais, para além do dízimo à Igreja, enquanto os lavradores trabalhavam em
propriedades suas ou arrendadas à nobreza ou ao clero.

Na cidade, a situação dos mesteirais variava com o ofício e a sua importância na economia. A instrução era
apanágio do clero e de um grupo de burgueses que enveredava pela magistratura, os letrados ou legistas.
A nobreza caracterizava-se pela posse da terra e pela residência no senhorio ou na corte, com excepção da
nobreza italiana que residia nas cidades, embora fosse também terratenente.

Capítulo VI

Os Estados Europeus

Os estados modernos definiram-se pela afirmação das consciências e das línguas nacionais, das fronteiras
territoriais, da realeza perante os senhores feudais, da administração central, pelo desenvolvimento do
comércio e pelo incremento da instrução, graças à imprensa.

Observou-se a decadência do imperador perante o papa e as realezas e da superioridade do papa (poder


teocrático) perante os reis. Os papas mantiveram o poder espiritual, o direito de condenar uma heresia ou
um rei herético, o direito de apelar às cruzadas e o de árbitros em questões internacionais (ex: o Tratado de
Tordesilhas, entre Portugal e a Espanha, em 1494).

O poder real era também de origem divina, governando os reis “pela graça de Deus”, sendo ungidos pela
Igreja do reino. Os reis rodeavam-se de conselheiros que iam procurar à alta nobreza e clero e aos letrados.
Concorriam com o papa na nomeação de bispos e abades, indigitando àquele a nomeação das
personalidades por si escolhidas. O rei era o supremo suserano na hierarquia social, devendo subordinar-se
aos privilégios, direitos e liberdades dos súbditos, ao direito e ao costume do reino. O rei convocava as
cortes, os estados gerais ou o parlamento sempre que necessitava consultar os três corpos do reino ou
pedir-lhes ajuda financeira para guerras, casamentos ou outras necessidades.
Senhores feudais e cidades gozavam de privilégios e direitos consuetudinários, para além de autonomia
administrativa nos seus territórios. O absolutismo consistia na ausência de controlo da acção do soberano e
não na ausência de limites à autoridade real. O príncipe surgia como árbitro das tensões dos diversos
estados ou ordens sociais ou dentro da mesma ordem, como a oposição entre famílias de poderosos e
respectivas clientelas.

O poder real serviu-se, a seu favor, da oposição entre nobres e burgueses pela partilha do poder político,
uma vez que era à burguesia nacional ou estrangeira que os soberanos iam buscar os seus banqueiros. A
privação com o poder real permitiu a alguns burgueses ascenderem, pelo favor régio, à nobilitação, embora
só passadas algumas gerações estes novos nobres se pudessem cruzar com a nobreza de sangue. A
integração passava também pela adopção de uma das funções do nobre: a carreira das armas.

A monarquia francesa: tinha limites geográficos diferentes da actual França; o soberano era um suserano
entre suseranos e exercia o poder numa parte do seu território, o domínio real; outros senhores feudais
eram soberanos de outros territórios, como o imperador ou o rei de Navarra que, neste caso, estavam numa
situação de vassalos do rei de França; outros eram membros da família real, como os Bourbon, os Valois,
etc; a Corte era o centro da governação e era itinerante; o rei tinha a coadjuvá-lo na governação o conselho
do rei, constituído pelos pares de França e os grandes oficiais da Coroa, membros de direito, para além de
outros dignitários convocados pelo soberano; na generalidade, o rei funcionava diariamente com alguns
conselheiros apenas, os membros do chamado conselho restrito ou secreto; alguns desses dignitários eram
o chanceler, o condestável, o almirante e o grão-mestre; entre os oficiais da administração, destacavam-se
os secretários de Estado; nas províncias, os bailios e os senecais tinham funções militares, judiciárias e
administrativas, delegando o exercício da justiça nos seus lugares-tenentes, magistrados; o exercício era
constituído por oficiais permanentes e por uma maioria de mercenários, recrutados em momentos de
guerra. A nobreza era por excelência o corpo guerreiro; o aparelho judiciário era constituído pelo Grande
Conselho, tribunal que julgava em ultima instância e presidido pelo rei, e pelos parlamentos, tribunais
provinciais ou regionais que tinham abaixo de si os tribunais das bailias e dos senescais; a administração
fiscal e financeira era gerida pelos tribunais de contas; as finanças ordinárias eram designadas domínios e
as extraordinárias designavam-se impostos, os Estados Gerais, convocados pelo soberano, reuniam com
os representantes dos três corpos do reino; com Francisco I e Henrique II assistiu-se ao reforço da
administração real e à afirmação do nacionalismo.

A monarquia inglesa: era territorialmente constituída pela Inglaterra e pelo País de Gales e, por uma
pequena parte costeira da Irlanda; a Escócia só virá a ser integrada na monarquia inglesa depois da morte
de Maria Stuart, com Isabel de Inglaterra; o rei governava coadjuvado por um conselho privado, constituído
pelo chanceler, tesoureiro, guarda do selo privado e por dignitários convocados por ele, para o efeito; à
frente de cada condado estava o xerife; em Westminster, tinham sede os três tribunais do reino; a câmara
do rei geria as finanças reais; o Parlamento era a sede das três ordens do reino que deviam ser consultadas
pelo soberano, no que respeitava ao lançamento dos impostos e à política externa; o rei de Inglaterra
tornou-se o chefe da igreja anglicana, pelo Acto de Supremacia.
Capítulo VII

A Política Estrangeira e as relações entre os povos

No período moderno, a política externa assentava, para além das relações entre as famílias dinásticas, nas
relações entre os povos.

O avanço turco para o Ocidente conduziu à conquista de Constantinopla, em 1453, à conquista dos Balcãs
e da zona danubiana, e aos primeiro e segundo cercos de Viena, em 1529 e 1532. A conquista da Europa
balcânica pelos turcos isolou esta cristandade, reflectindo-se o seu domínio, durante cerca de três séculos.
Aliás, o reflexo deste domínio, ainda hoje, permanece nas populações da ex-Jugoslávia.

O estado russo substituiu o império romano do Oriente, no que respeita à unificação da cristandade
ortodoxa e à sua protecção contra os infiéis, consolidação que teve por base o casamento de Ivan III com a
princesa bizantina Sofia Paleólogo, sobrinha do último imperador de Constantinopla (Bizâncio). A unificação
territorial da Rússia foi efectuada pelo príncipe de Moscovo, Ivan III, que a estendeu para norte, até ao
Árctico, e para Oriente, até ao rio Ob. As principais cidades deste novo reino eram Moscovo, tornada o
centro religioso da cristandade ortodoxa, Novgorod, a cidade-empório comercial, e Pskov, centro de
comércio.

A Rússia estruturava-se socialmente num sistema feudal, onde os grandes senhores, os boiardos, se uniam
ao soberano por laços vitalícios e a quem ele remunerava com a doação de terras. O Conselho dos
Boiardos instituiu-se em conselho régio. Os camponeses estavam ligados à terra e aos seus senhores, não
os podendo abandonar.

A outra força que se afirmava a Oriente era a do infiel turco otomano. O poder turco residia no seu exército,
constituído pelos spahis, os cavaleiros, e os janízaros, a infantaria, e na sua armada de galeras, movida a
remos por cativos cristãos. Os janízaros eram um corpo especial, constituído por antigos cristãos,
apanhados em crianças e educados no islamismo, que eram forçados ao celibato. Fanáticos, eram as
tropas de elite.

Os tributos em que assentava eram pagos pelas populações não islâmicas do seu território (cristãos e
judeus), e pelos tributos dos príncipes vassalos do sultão turco. O sultão era coadjuvado na governação por
um grão-vizir e por vizires, que formavam o divã. Paxás governavam as províncias.

No seu avanço para Ocidente, os Otomanos conquistaram Alepo, Damasco, Jerusalém, Cairo e Alexandria
e declaravam-se os protectores das cidades santas de Meca e de Medina. O sultão turco tornou-se
protector de Argel, alargando o seu poder até à Mauritânia. No seu avanço no Mediterrâneo europeu, os
turcos atacaram Veneza que acabou por negociar com o sultão uma paz e um livre comércio com o Oriente.
O sultão tornou-se califa.

Os espanhóis saíam vitoriosos contra os muçulmanos do norte de África, ao conquistarem Melila e Orão. A
diplomacia cristã com o Islão vencia em Veneza e em Roma, onde o papa recebia um embaixador do
sultão. No entanto, a guerra tornava-se um dos flagelos da cristandade, que se constituía em nações, que
faziam remontar as suas origens, dentro da tradição humanística, aos heróis greco-romanos.

Nasceram, nesta época, os primeiros imperialismos, como o francês que se afirmou com a candidatura de
Francisco I ao Império, enquanto o império alemão, de origem medieval, se estendia, com os Habsburgos, à
Espanha e ao império americano e asiático desta, com Carlos V (Carlos I de Espanha). Igualmente
nasceram os imperialismos marítimos dos reinos peninsulares (Portugal e Espanha).

Entre 1494-1529, ocorreram as guerras de Itália que se identificaram com as tentativas de conquista de
estados italianos pelos reis de França e que se estendeu aos suíços e outros reinos, aliados do papa Júlio
II, e ao Império. A paz com a França, no tempo do papa Leão X e de Francisco I, levou à Concordata de
Bolonha. A paz com os suíços foi assinada em Friburgo e designada por “paz perpétua”, que permitia ao rei
de França recrutar mercenários entre eles.

A guerra que se viria a alastrar à Espanha, ligada ao Império, terminaria com a derrota da França em Pavia
e com o Tratado de Madrid, em 1526. Em 1527, os aliados mudavam de campo, tendo Roma e Inglaterra
passado para o lado da França contra Carlos V. Os soldados deste invadiram a Itália e entraram em Roma
e saquearam-na.

A paz de Cambrai punha fim ao conflito, deixando a França com a Borgonha e a Espanha mantinha a
hegemonia sobre a Itália (1529). Os problemas do imperador com os príncipes luteranos reiniciaram a
guerra, pois estes receberam o apoio do rei de França, Henrique II. Em 1555-56, Carlos V divide o Império
por Filipe II de Espanha e Fernando II. A este coube os territórios do Império, enquanto aquele ficou com a
Espanha e o seu império ultramarino, e os Países Baixos, ao mesmo tempo que casava com a inglesa
Maria Tudor, filha de Henrique VIII. Nova guerra de França para reconquistar o norte de Itália, conduziu à
sua derrota, pela paz de Careau-Cambrésis, que levou ao abandono do Piemonte e de Sbóia e à
manutenção da conquista de Calais.

A Europa conhecia um novo equilíbrio e novas potências: a Espanha, a França e a Inglaterra. A Oriente
mantinha-se o equilíbrio turco que avançara para a Hungria e a dividira, enquanto no Mediterrâneo central o
Islão ameaçava a Europa mediterrânica. As guerras de Itália tiveram como consequência a mudança da
arte da guerra em terra e no mar. O século XVI viu consolidar-se a diplomacia como uma arte política.

Capítulo VIII

Transformações do Quadro Económico, Social e Mental

A Europa atravessou, de 1530 a 1620, um período de expansão económica, acompanhado de inflação e de


alta de preços. A alta de preços atingiu, na primeira fase, até 1575, os preços agrícolas. A alta de preços
esteve relacionada com o excesso de moeda em circulação, provocada pela vinda do ouro e da prata
americanos para Espanha e Europa.
Os metais preciosos americanos não ficavam reduzidos à Espanha, onde a fraca economia, apesar do
crescimento demográfico, levava à sua expulsão para outras regiões da Europa, como a França, das quais
a Espanha era economicamente dependente. Por outro lado, artesãos franceses emigravam para Espanha
onde os salários eram mais altos do que em França.

A França estabeleceu uma nova moeda de conta ou moeda padrão, o franco de prata que valia 1/3 do
escudo de ouro. Como moeda subsidiária (de troco), lavrava o bolhão ou bilhão (liga de prata e metais
inferiores em que a prata entrava em fraca percentagem). Em 1578, o bolhão foi substituído pelo cobre. Em
Espanha, a moeda inflacionada (o bolhão) expulsava as espécies de prata da circulação provocando
quebras nos salários e carestia dos géneros, apesar dos tabelamentos, nomeadamente, dos cereais. A
Inglaterra conseguiu, em 1561, uma reforma monetária sem prejudicar a economia nacional.

Desde os finais do século XV, surgiu uma nova teoria e prática económicas: o mercantilismo. O
mercantilismo defendia o desenvolvimento das manufacturas e exportação dos seus produtos; incentivo à
agricultura; suspeição, quanto à ociosidade e ao luxo que tinha por base importações; as importações não
deviam ultrapassar, no seu custo, as exportações. Ortiz, em Espanha, Laffemas, em França e Gresham, na
Inglaterra, foram defensores das doutrinas mercantilistas. Na sequência destas teorias, os soberanos
defenderam o proteccionismo. Os monopólios régios acompanharam estas teorias: os metais preciosos e a
pimenta foram monopólio dos reis de Portugal; as minas e pedreiras, dos reis de França; os reis de
Espanha incentivaram a produção de lã castelhana e tinham o monopólio dos metais americanos.

A Inglaterra protegeu as manufacturas, criando “companhias” em substituição das corporações. A França


regulamentou os ofícios e, em Espanha, Carlos V proibia a exportação do linho, do cânhamo, do couro, das
peles, das sedas, dos ferros e dos minérios de ferro. Os reis de Inglaterra desenvolveram pouco o
proteccionismo, promulgando antes Actos de Navegação que, a partir de 1651, reservarão aos seus navios
uma parte do comércio de importação.

O mercantilismo não teve sucesso em todas as partes onde foi aplicado, nem em todas as medidas que
defendia. A economia capitalista comercial continuava limitada pela Igreja que proibia o empréstimo a juro
e, por consequência, o adiantamento monetário com juro, o depósito. Preferia-se o recâmbio ou seja, o
acordo convencionado entre dois parceiros desde o início da operação. O capitalismo invadiu o campo.

Perante a decadência dos impérios comerciais peninsulares, novos estados tomavam parte no comércio
ultramarino, tendo por base companhias comerciais e a teoria mercantilista. Estas companhias
especializavam-se numa região geográfica como a Companhia das Índias Orientais e tinham a protecção
dos soberanos.

Novos produtos, para além da pimenta, foram trazidos do Oriente, como as sedas, as porcelanas, os
algodões, as madeiras, os tapetes. Os franceses foram os iniciadores deste comércio triangular (Espanha –
França – Levante turco), ou seja, prata – tecidos – produtos do Oriente, seguindo-se-lhes os ingleses e os
holandeses. Da América, aos metais seguiu-se o açúcar do Brasil e das Antilhas, a partir de 1570.
A expansão económica foi acompanhada pelo avanço da técnica, como a primeira máquina de tricotar ou a
fabricação de meias de seda em tear, ou como o avanço da siderurgia, devido às armas de fogo que levou
Nef a falar de uma primeira revolução industrial em Liége, na Suécia e na Inglaterra. A lenha é substituída
pelo carvão de hulha. O desenvolvimento económico aconteceu na Inglaterra e na Holanda, e menos na
França e no Império, por causa das guerras de religião. Entretanto, o mundo mediterrânico entrava em
decadência, apesar de um breve vislumbre económico em Génova, como centro bancário. Amesterdão
afirmou-se uma metrópole económica, durante o século XVII e, em 1609, criou a Bolsa de Amesterdão.

O século XVII revelou-se igualmente um século de crises, marcado por grandes fomes, epidemias e guerras
que provocaram grandes mortandades e uma grave quebra demográfica. Os preços sofreram uma descida
que se acentuaria a partir da segunda metade da centúria, sem qualquer benefício social. A crise atingiu,
primeiro, as regiões do centro europeu que tinham sofrido a expansão do século XVI, excepto a Holanda, e
chegou mais tarde às regiões mediterrânicas. A crise teve a sua origem na escassez de metais preciosos,
que fugiam da circulação por entesouramento ou para a joalharia, ou por aquisição de produtos de luxo que
os levavam para o Oriente. A expulsão da circulação europeia, juntava-se a diminuição da produção dos
metais preciosos americanos.

A recessão económica (fase B de Simiand) marcou a evolução de uma sociedade que continuava a ser
marcadamente rural, apesar do desenvolvimento das cidades e dos empreendimentos coloniais. As
riquezas fundiárias, com excepção dos Países Baixos. A posse da terra continuava a ser motivo de
consideração social e prestígio.

Nos países marcados pela Reforma, onde os bens da Igreja tinham sido secularizados, os soberanos
distribuíram uma parte pela nobreza ou venderam a maioria à burguesia endinheirada e a lavradores ricos.
Também nos países católicos, como a França, ocorreu uma mudança nas terras da Igreja que viu um quinto
delas ser dado pelos reis, em pagamento de serviços, durante as guerras contra os protestantes ou
huguenotes.

Sob a acção dos novos proprietários, a agricultura passava a ser um investimento para dar lucro. Para além
da nova face da agricultura, esta conheceu novos terrenos obtidos pelos arroteamentos de pauis, feitos por
técnicos holandeses, em regiões do Potou e da Inglaterra. Tornando-se a alimentação um dos objectivos
prioritários, acrescia à produção cerealífera a criação de gado. Os pastos cresceram à custa das terras
agrícolas em Inglaterra ou no sul da Itália. O mundo campesino vivia de salários baixos que não
acompanhavam a subida dos preços e eram sobrecarregados pelo peso dos impostos reais e das corveias
senhoriais. As condições deste grupo social agravaram-se durante o século XVI e, sobretudo, no início do
seguinte.

Na Inglaterra, as práticas comunitárias tendiam a desaparecer e levavam ao aparecimento de um


proletariado agrícola que era absorvido pelo desenvolvimento da indústria. Na França, os camponeses
perdiam a capacidade de compra, devido ao empobrecimento, ao fisco real e às guerras. Na Europa de
leste, os camponeses caíam na servidão.
Cresceu o número de pobres válidos nas cidades, devido à migração para os centros urbanos. Nas cidades,
a burguesia detinha o grande comércio e a banca, assim como alguma indústria. Os pequenos lojistas e os
artesãos tiveram uma evolução muito diversa, ao sabor dos preços das matérias-primas, da evolução dos
salários e dos preços dos objectos fabricados. O esquema familiar manteve-se, sendo o grande número de
filhos uma riqueza, quando atingem a idade de aprendizagem do ofício familiar.

A partir de meados do século XVI, ampliou-se o fosso entre os mestres de um ofício e os companheiros, ou
seja, os artesãos especializados, tornando-se difícil a ascensão deste a mestre. A regulamentação dos
ofícios, restringindo os ofícios livres, dificultaria a ascensão económica e social dos companheiros ou dos
artesãos de tenda aberta. O título de mestre tornou-se mais fácil dentro de uma família de mestres,
enquanto os companheiros se reuniam em confrarias com funções de defesa de salários e trabalho, uniões
que, por vezes, conduziam a greves. A miséria atingiu este proletariado urbano, constituído por
companheiros, assalariados diversos e camponeses migrados para a cidade, cujo recuso era a
mendicidade e a caridade, praticada por outros com o fim de atingir a salvação eterna. A média burguesia
afirmava-se socialmente pelo exercício de cargos administrativos.

Os estados sociais evoluíam de uma sociedade de ordens para uma sociedade de classes, onde as
diferenças sociais dentro dos mesmos grupos eram significativas. A riqueza traduzia-se no comportamento,
na moda, nos adornos, na habitação e na alimentação. Para lutar contra o luxo excessivo e contra a
indiferenciação social, os soberanos promulgavam as pragmáticas contra o luxo. A miséria de uns e a
riqueza de uma minoria conduziu a revoltas sociais. Mas as tensões sociais também se fizeram sentir entre
burgueses e nobres.

A nobreza pressionada pela ascensão e riqueza da burguesia afirmava-se como uma ordem e defendia o
seu status, acentuando comportamentos e mentalidade que assentavam na pureza de sangue, na honra e
no desprezo pelo trabalho. Da burguesia saiu uma nova nobreza de gente que ascendeu por mérito à
nobilitação, ou seja, a quem os soberanos concederam títulos, ou que os adquiriram por funções junto da
corte. Esta nova nobreza tentava imitar a nobreza de sangue, aproximando-se dela por casamento ou pelo
ofício das armas. A nova nobreza de letrados tendia a afirmar-se como um quarto estado ou ordem: a
nobreza de toga.

A modificação social de uma sociedade de ordens para uma sociedade de classes foi bem visível na
Holanda e na Inglaterra, onde o peso dos negócios obtivera uma consideração semelhante à da terra
noutras regiões da Europa. As ordens saíram reforçadas, a nível de mentalidade e de estatuto, com a
publicação do Tratado das Ordens de Loyseau, em 1611. O fechamento da nobreza como ordem tornava a
mobilidade social mais discreta no século XVII. As convulsões sociais da primeira metade do século XVII
assentaram não só em questões religiosas, mas também em questões de natureza politica e social. A luta
contra o peso do fisco real acendeu-se contra os agentes colectores de impostos e os representantes do
rei, em França. Aqui a revolta era contra o Estado.

A segunda metade do século XVI e a primeira metade do século XVII afirmavam-se pela crise do
humanismo e da consciência europeia. As Reformas tinham provocado uma crise de irreligião na
consciência do homem deste período. A arte evoluíra do classicismo ao maneirismo e deste ao barroco. A
sociedade afirmava-se pela violência e pelo medo. De ambos era reflexo a perseguição às feiticeiras, como
agentes do demónio, que, na generalidade, acabavam na fogueira.

Capítulo IX

Guerras de religião e crise política do fim do Século XVI

A partir de 1560, a Europa dividiu-se em dois campos: católicos e reformados. A tolerância religiosa era
praticamente inexistente, estando a religião de um indivíduo ou povo determinada pela religião do rei ou do
príncipe. A tolerância apenas se aplicava à nobreza, na França. As guerras de religião alastraram na
Europa central, abrangendo a França e os Países Baixos.

As guerras de religião em França (1562-1598). Uma parte da nobreza francesa aderiu ao protestantismo,
arrastando consigo vassalos e camponeses. O protestantismo estendeu-se também às principais cidades
de França. Por detrás das facções religiosas, protestante e católica, estavam facções políticas, adversárias
dos de Guise. Catarina de Médicis, regente durante a menoridade de Carlos IX, praticou uma política de
tolerância, onde procurou reconciliar os adversários políticos. Tendo convocado os Estados Gerais, um dos
procuradores do povo reclamou a liberdade religiosa e propôs o confisco dos bens da Igreja, para sanear a
economia. Um dos expoentes dessa política foi o Édito de Tolerância de Janeiro de 1562, que outorgava
aos protestantes a liberdade de culto fora das cidades. Apesar do édito, os campos extremaram-se:
huguenotes, chefiados por António de Bourbon e Conde, e os católicos pelos de Guise. A guerra alastrou.
Depois do assassinato de Francisco de Guise, Catarina promulgou o Édito de Pacificação de Amboise,
menos favorável aos protestantes que o do ano anterior: o culto reformado mantinha-se onde já existia; os
senhores com direito a justiça usufruíam de liberdade de culto tal como os seus vassalos; nos demais
casos, o culto protestante ficava restrito aos arrabaldes de uma cidade por bailiado. À tentativa frustrada de
rapto do rei por Conde e do massacre dos chefes católicos seguiu-se de novo a guerra. O Édito de Saint
Germain (1570) deu aos huguenotes, durante dois anos, quatro praças fortes. O almirante de Coligny
tentou, junto de Carlos IX, uma aliança protestante contra a Espanha. A matança de S. Bartolomeu foi
ordenada pelo rei de França contra os chefes protestantes. Por fim, Carlos IX e Henrique III, sucedia-lhes o
rei de Navarra, Henrique casado com Margarida de Valois e que seguia a fé reformada. Filipe II de Espanha
apoiava os de Guise que tinham formado a Liga Católica e queria colocar a filha no trono de França. Isabel
de Inglaterra apoiava os protestantes. Henrique IV renegou o protestantismo e prometeu conservar a
religião católica. Em 1598, publicou o Édito de Nantes, onde permitiu a liberdade de culto em todos os
lugares, com excepção de Paris ou onde a corte estivesse. Reconhecia-se o direito de acesso a todos os
ofícios e cargos por parte dos protestantes. A paz de Vervins foi assinada entre a França e a Espanha,
mantendo as cláusulas de Cateau-Cambrésis.

As guerras de religião nos Países Baixos (1566-1609). A oposição religiosa teve consequências de
separação política, numa região unida entre si por uma espécie de federação. Os católicos eram apoiados
por Filipe II, senhor dos Países Baixos, depois de Carlos V, o qual estava representado no local por
Margarida de Parma. Em 1566, a nobreza moderada aliou-se aos calvinistas, contra a política dos
representantes do rei de Espanha e senhor dos Países Baixos. Os calvinistas levantaram-se contra a
religião católica e atacaram igrejas e mosteiros a que respondeu Filipe II com o envio do duque de Alba e a
ocupação do aparelho político, contra os privilégios e liberdades da província. À sublevação religiosa
sucedeu a sublevação política contra os espanhóis, a partir de 1572. A resistência tinha como cabecilha
Guilherme de Orange. A pacificação de Gand concedia a liberdade religiosa às duas províncias calvinistas.
D. João de Áustria acabou por aceitar a pacificação de Gand e a partida das tropas espanholas. As
províncias católicas rebelaram-se contra a chefia de Guilherme de Orange e constituíram a União de Arras
que previa a reconciliação com Filipe II. As províncias do norte, calvinistas, responderam com a União de
Utreque. Em 1609, Filipe III reconhecia a independência destas ultimas, designadas as Províncias Unidas.
Os Países Baixos católicos foram dados à infanta D. Isabel e ao seu marido, o arquiduque Alberto. As
guerras político-religiosas provocaram a decadência económica da região, com o aparecimento de
Antuérpia (Anvers), como centro económico a qual foi substituída por Amesterdão, a norte, nas Províncias
Unidas (Holanda). A Igreja empobreceu com o confisco dos seus bens que não lhe foram restituídos, para
pagamento da guerra. No plano cultural, a figura mais proeminente foi Montaigne. No plano político, a
teorização levava à ideia de contrato entre o povo e o rei e à teoria da monarquia absoluta, desenhada por
Jean Bodin, na sua obra A República: o rei era limitado pela lei de Deus e pela lei natural.

Capítulo X

Europa Mediterrânea e Europa do Noroeste

Os finais do século XVI assistiram ao crescente poderio da Espanha, no mundo mediterrânico e da


Inglaterra, na Europa do noroeste. Filipe II unificou a Península sob a União Ibérica e avançou na direcção
do Mediterrâneo, onde combateu os turcos, vencendo-os em Lepanto, e dos Países Baixos, onde lutou
contra os calvinistas. Dominou uma parte da Itália: o sul com o reino de Nápoles, a Sardenha e a Sicília, e o
norte com o Milanado. O palácio do Escorial foi o símbolo do seu governo.

Filipe II, com a ascensão ao trono de Portugal, ligou o império português do Oriente, as ilhas atlânticas, o
litoral africano e o Brasil ao império espanhol das Américas, mas começou com ele o início da decadência
espanhola. Da América espanhola continuam a vir carregamentos de metais preciosos, para Sevilha. A
coroa, por via dos asientos, encontrava-se em deficit perante os mercadores genoveses, seus credores.
Filipe II declarou a bancarrota em 1557, 1575 e em 1596. Para evitar a carestia proibiu a exportação de
cereais. A Espanha manteve-se exportadora de lã em bruto, graças ao apoio que dava aos produtores que
constituíam a Mesta, para Itália e importava tecidos italianos e franceses. O artesanato estava nas mãos
dos mouriscos.

A rival de Espanha foi a Inglaterra, com quem a coroa espanhola desenvolveu uma política de casamento:
Henrique VIII casou com uma princesa espanhola de quem teve uma filha e sucessora, Maria Tudor, que,
por sua vez, casou com Filipe II. A Inglaterra era um reino onde a criação de gado, a produção de lã, a
cultura de cereais prevaleciam mas onde o comércio marítimo e as indústrias estavam em desenvolvimento.
A sucessora de Maria Tudor, católica, foi Isabel, que professava a fé anglicana e se manifestou a adversária
mais poderosa de Filipe II, agindo politicamente no continente ao lado dos huguenotes franceses e dos
calvinistas holandeses. Contra ela fez este a Armada Invencível, em 1588, que foi derrotada nos mares do
Norte. Face ao Parlamento, afirmou-se como um poder absoluto. No seu reinado, consolidou-se o
anglicanismo que aceitava o dogma calvinista e conservava a liturgia católica. Uma insurreição católica no
norte de Inglaterra foi sufocada, ao mesmo tempo que uma seita protestante, os puritanos, contestavam a
pompa e a riqueza da igreja anglicana.

Economicamente, a Inglaterra era um reino agrícola que arrancou, neste governo, para um império
comercial marítimo, graças aos corsários, como Francis Drake, que atacavam os galeões espanhóis e
portugueses, ao aumento demográfico e ao desenvolvimento da indústria. O desenvolvimento da indústria
acompanhou a utilização do carvão de pedra (a hulha), energia abastecedora dos altos-fornos, enquanto o
comércio marítimo lançava os barcos dos mercadores ingleses nas rotas do império português do Oriente.
Os ingleses constituíam companhias comerciais que tendiam ao monopólio, tais como a Companhia
Moscovita ou a Companhia das Índias Orientais.

Esta actuação era incentivada pela política real que proibia as importações de têxteis do continente. No
comércio marítimo, a Inglaterra tornou-se rival da Holanda que no século XVII teria em Amesterdão um
centro de economia-mundo, na expressão de Braudel.

O desenvolvimento da indústria têxtil aumentou as “enclosures”, ou seja os campos fechados para a criação
de gado lanígero e levou à migração para as cidades de muitos camponeses que viviam na mendicidade ou
eram absorvidos pela indústria. Para evitar a mendicidade, a Inglaterra promulgava a lei dos pobres de
1601. A Renascença chegava tardiamente a Inglaterra. Desta época é Shakespeare.

Com a morte de Isabel, sem descendência directa, sucedeu no trono inglês Jaime I da Escócia, o filho de
Maria Stuart, rainha católica da Escócia, mandada decapitar na Torre de Londres, por Isabel. A Grã-
Bretanha ficava unida num reino único (País de Gales, Inglaterra e Escócia), enquanto a Irlanda, católica,
se rebelava contra o domínio inglês.

O início do século XVII assistiu à assinatura dos primeiros tratados de paz, após as guerras de religião:
(1598) paz entre Henrique IV de França e Filipe II; (1604) paz entre Jaime VI e Filipe III; (1609) paz entre as
Províncias Unidas (Holanda) e Filipe III. O domínio da Europa do Noroeste sucedia à Europa mediterrânica
de que a Espanha de Filipe II fora a última protagonista.

Capítulo XI

As margens da Europa Ocidental

Ivan IV, o terrível, procedeu a reformas na Rússia de que se salientam o estabelecimento do primeiro
nobiliário de famílias nobres (boiardos), ficando a hierarquia social estabelecida pela ligação destas famílias
à família real de Moscovo; os grupos sociais estavam definidos em relação às funções que cada um
preenchia junto do czar; a duma dos boiardos (o conselho) e a assembleia nacional sofreram um
apagamento durante o reinado de Ivan IV; o seu governo caracterizou-se por uma expansão territorial que
levou à dominação dos tártaros da Crimeia e à conquista de Astracã, com a consequente abertura da
Rússia aos portos da Ásia; o mundo rural caracterizava-se por uma grande mobilidade, indo as aldeias
sendo integradas na administração russa à medida que esta avançava territorialmente.

A sociedade russa não era uma sociedade feudal: os boiardos mantiveram as suas terras desde que fiéis
ao czar; as terras confiscadas aos boiardos revoltosos eram dadas em pagamento de serviços a uma
nobreza de funcionários que se tornara hereditária. A Rússia tinha poucas cidades e uma população urbana
escassa, quase não existindo uma burguesia. Os artesãos eram na sua maioria estrangeiros e residiam nos
arrabaldes de Moscovo.

A maior parte da sua população era constituída por camponeses que pagavam os impostos e serviam no
exército. Uma parte destes eram agricultores livres, rendeiros de terras, e a maioria era constituída por
camponeses ligados à terra, sem a poder abandonar.

Cristãos ortodoxos, os russos tinham no clero, nos monges, um grupo social politicamente poderoso, tanto
mais que Moscovo se tornara num patriarcado, no tempo do czar Fedor.

Após um período de revoltas e perturbações sociais, ascendeu ao trono da Rússia Miguel Romanov que
iniciara a restauração do estado russo. Com os Romanov, a sociedade hierarquizou-se numa sociedade de
ordens, adstritas ao serviço do Estado: o clero, uma nobreza terratenente com funções militares e uma
pequena nobreza miserável que se dedicava ao comércio ou ao artesanato ou eram soldados; alguns
comerciantes e artesãos ao serviço do czar; e a maioria dos camponeses tornada serva, ligada à terra em
que vivia, pela lei de 1646. Territorialmente, a Rússia perdeu o acesso aos portos que a ligavam aos mares,
pelo que o grupo de mercadores estrangeiros, sitos em Moscovo, cresceu de importância junto da corte do
czar. Os cossacos entravam para a obediência do czar, em meados do século XVII, criando uma
aristocracia.

A Polónia, encravada entre a Rússia e a Europa ocidental, seguia o culto católico. Constituía uma
monarquia rural, onde a aristocracia vivia da terra e da caça. As cidades eram habitadas por uma maioria
de estrangeiros, alemães ou judeus, que detinham o comércio e o artesanato.

A partir de finais do século XVI, a Polónia entrava em decadência, apesar de ter agregado o grão-ducado
da Lituânia, em 1569, e ter atravessado um curto período de apogeu em que se abriu à cultura ocidental e
ao movimento da Renascença. Um dos grandes nomes da história da humanidade é o polaco Copérnico,
professor na universidade de Cracóvia. Na fase decadente, a Polónia teve uma família real de origem
sueca, com Varsóvia por capital. Consolidaram o cristianismo católico e encabeçaram cruzadas contra os
turcos, mas sem sucesso. As invasões da Suécia e da Rússia deixaram a Polónia decadente e
territorialmente fragilizada.
A Escandinávia tinha contactos com a Europa ocidental através das cidades hanseáticas, nomeadamente
Lubeck. Os hanseáticos foram substituídos na Suécia pelos holandeses, que lhe exploram e exportam o
ferro e o cobre. A Dinamarca era um reino que desenvolvia a criação de gado e os lacticínios. A Noruega
exportava madeiras para a construção naval e peixe. Os reinos nórdicos eram monarquias (electiva a da
Dinamarca), em que o soberano era o chefe da religião luterana e a nobreza o grupo social preponderante.

Capítulo XII

Inglaterra e Províncias Unidas entre as Sociedades de Ordens e as Sociedades de Classes

Na Inglaterra:

Jaime I Stuart iniciou a união pessoal da Inglaterra e da Escócia, ao suceder ao trono por morte de Isabel.
Jaime I e seu filho Carlos I governaram como reis absolutistas, tal como Isabel, convocando poucas vezes o
Parlamento, constituído pela Câmara dos Lordes e a Câmara dos Comuns. Reuniam o conselho privado.

A administração local estava entregue aos deputados-tenentes, aos xerifes e aos juízes de paz, nomeados
pelo rei entre poderosos que defendiam o interesse do seu grupo social. As finanças reais tinham por base
os bens da coroa e os impostos autorizados pelo Parlamento. Em caso de dificuldade financeira preferiam
recorrer a empréstimos a convocar o Parlamento. Em 1605, uma conjura católica, a Conspiração da
Pólvoras, reuniu o reino à volta do rei.

No entanto a política externa não lhe foi favorável, ao fazer a paz com a Espanha que rompeu em 1625.
Carlos I desenvolveu uma politica externa activa pelo que convocou o Parlamento, em 1628, para solicitar
subsídios. Os parlamentares apresentaram-lhe a Petition of Right onde o censuravam por lançar impostos
sem autorização do Parlamento e o acusavam de prisões arbitrárias de súbditos seus. Aceitou a petição,
mas em 1629 voltava a governar sem o Parlamento. A este período, os ingleses chamaram-lhe a “tirania”.

Restaurou a liturgia católica na igreja anglicana o que provocou uma cisão entre os súbditos, tendo alguns
puritanos emigrado para a América do Norte. Também a Escócia foi afectada pela imposição religiosa da
estrutura anglicana que foi rejeitada pela Escócia presbiterana. A guerra com a Escócia e a necessidade de
dinheiro levou Carlos I a convocar o Parlamento, em 1640.

Iniciou-se um período de guerras civis no reino que foram acompanhadas pelas revoltas dos irlandeses
católicos, no Ulster. O Parlamento impôs a Carlos I a Grande Admoestação, onde lhe impunha a escolha de
conselheiros da confiança do Parlamento.

Carlos I tentou opor-se-lhes e prender os cabecilhas parlamentares, mas foi obrigado a fugir de Londres
que se sublevara. Os ingleses dividiram-se em dois partidos: os Cavaleiros, partidários do rei, e os Cabeças
Redondas, partidários do Parlamento. A má preparação militar era nítida em ambos os campos, até à
chegada de Olivier Cromwell, à frente do grupo parlamentar. Puritano fanático organizou e disciplinou o
exército dos Cabeças Redondas. Carlos I foi derrotado. Fugiu para a Escócia onde viria a ser entregue ao
Parlamento de Londres.

Entretanto novas seitas de cariz social surgiram levando o Parlamento a votar a declaração que dava ao
povo a soberania, imediatamente a seguir a Deus. A Câmara dos Comuns passou a exercer o poder
supremo da nação. Carlos I foi condenado à morte em 1649.

O Parlamento aboliu a realeza e suprimiu a Câmara dos Lordes. Cromwell venceu a Irlanda e a Escócia,
derrotando o exército realista de Carlos II, filho de Carlos I. A Holanda de Guilherme de Orange opôs-se à
República de Cromwell.

A economia inglesa, durante os dois Stuarts, continuou a desenvolver-se, quer internamente na indústria,
quer a nível de comércio marítimo com as Índias. Nobres e negociantes participavam deste
desenvolvimento. Da burguesia ascendeu um novo corpo de nobres rurais que adquiriram os bens
secularizados da Igreja, no tempo de Jaime I. A aristocracia terratenente, os landlords, detinha a
administração central.

Camponeses e proletários urbanos viviam na miséria e eram permeáveis aos descontentamentos sociais e
religiosos. O puritanismo alastrou na Inglaterra, durante os Stuart. Com o estabelecimento da República,
Cromwell governou através do exército, nomeadamente o Conselho dos generais. Hostilizou a ideia de
igualdade política, mas afirmou a ideia de igualdade religiosa no seio do povo de Deus.

Em 1651, o Parlamento votou o Acto de Navegação, segundo o qual todos os produtos coloniais deviam ser
importados em navios ingleses e os produtos europeus em navios ingleses ou de seus países de origem.
Dissolveu o Parlamento em 1654 e dividiu as ilhas britânicas em onze circunscrições militares. Em 1657, o
Parlamento ofereceu-lhe a coroa que recusou, mas aceitou as insígnias reais e o direito de nomear um
sucessor. Em 1654 assinou a paz com os holandeses que reconheceram o Acto de Navegação. Os
ingleses atacaram as Antilhas e conquistaram a Jamaica. À sua morte, em 1658, sucedeu-lhe Ricardo
Cromwell que abdicava ao fim de seis meses. Em 1660, o Parlamento chamava o rei Carlos II ao poder.

Nas Províncias Unidas:

Enquanto os Países Baixos espanhóis decaíam, as Províncias Unidas, a norte, cresciam economicamente,
ao mesmo tempo que lutavam contra a Espanha. Expandem-se, chegando ao Oriente onde concorreram e
suplantaram os portugueses, ocuparam Curaçao e o nordeste brasileiro. Em 1648, derrotavam os
espanhóis que lhes reconheciam a independência. Em 1654, os holandeses entregavam o Brasil a Portugal,
mas mantinham a Malásia, o Ceilão, o Cabo, Surinã e Curaçao. Expandiam-se para a América do Norte,
onde fundavam Nova Amesterdão ou Nova York.

Os holandeses, com Amesterdão à cabeça, dominaram economicamente o século XVII, fazendo de


Amesterdão um centro de economia-mundo, no dizer de Braudel. Para além do comércio marítimo e da
pesca, os holandeses tornavam-se um povo agrícola e criador de gado. Criaram a Companhia das Índias
Orientais e a Companhia das Índias Ocidentais. Amesterdão tinha um banco de câmbio e de depósito,
fundado em 1609, que se tornou um banco de crédito. Possuía uma bolsa.

A Amesterdão afluíram os cristãos novos portugueses e espanhóis que criaram uma activa e rica
comunidade judaica. A rivalidade económica e marítima conduziram ao direito internacional marítimo.
Grotius defendeu a ideia do maré liberum, contra a tese antiga do maré clausum. As Províncias Unidas
tornaram-se uma terra de liberdade política e religiosa, ao mesmo tempo que grandes nomes da cultura
apareciam, como o judeu Bento Espinosa. A união da França e da Inglaterra destruíram o poderio
económico da Holanda que se viu forçada a entregar Nova Amesterdão aos ingleses.

Pelo tratado de Nimégue, em 1678, a Holanda salvaguardou a sua independência territorial encabeçada
pela família Orange, mas a hegemonia comercial passou para a Inglaterra.

Capítulo XIII

O destino das grandes monarquias: Espanha e França

Espanha:

Viveu no século XVII o chamado “século de ouro”, apesar de nele ter tido origem a decadência da Espanha.
A primeira metade do século caracterizou-se por uma quebra demográfica, provocada pelas epidemias, as
guerras, como a da Catalunha, pela expulsão dos mouros e pela emigração para outras paragens,
nomeadamente a América.

A economia caracterizou-se pelo crescimento da criação de gado à custa das terras cerealíferas, da
diminuição da produção vinícola, de uma indústria têxtil mais marcada pela exportação da lã em bruto do
que tecida e por uma indústria de produção da seda e por um comércio que conhecia o seu apogeu nas
feiras de Medina del Campo e em Cádis como termo da rota americana.

A sociedade estava marcada pela preponderância do alto clero e da alta nobreza que se definia pela
primogenitura e pela concentração dos morgadios no primogénito; pelos letrados; pelos fidalgos, nobres
não primogénitos; pelos burgueses e pelo campesinato onde abundavam os jornaleiros.

A Espanha era uma monarquia absoluta, onde o poder dos favoritos reais era bastante importante. Os reis
governavam com um conselho e convocavam escassamente as cortes dos diferentes estados que
constituíam a coroa espanhola. Aumentaram os impostos e a inflação foi galopante.

A Espanha sofreu uma longa e desgastante guerra com a França: o conde-duque de Olivares, primeiro-
ministro de Filipe III, enfrentava o cardeal Richelieu, primeiro-ministro de Luís XIII. Em 1640 eclodiram
revoltas separatistas em Portugal, na Catalunha, em Aragão e na Andaluzia. A Catalunha declarou-se
súbdita de Luís XII de França até 1652. Portugal tornou-se independente e foi reconhecido como tal em
1668.

No tempo de Filipe IV, rebelou-se contra o domínio espanhol a Itália espanhola. Apesar da Inquisição, a
cultura e as artes desenvolveram-se dando nomes como Cervantes, na literatura, Velásquez e Greco, na
pintura.

França:

A França viveu entre 1598 e 1661, um período de guerra civil, crises económicas e sociais. Henrique de
Navarra abjurou o calvinismo para se tornar rei de França e afirmou-se como um rei católico. Governou
como um rei absoluto, sem convocar os Estados Gerais. Alterou a concepção da administração ao leiloar os
cargos que se tornavam propriedade de quem mais desse por eles, deu origem a um quarto estado que
veria os mais altos titulares nobilitados, originando uma nobreza de toga.

O Édito de Nantes, que permitia o culto reformado, foi aplicado com muitas dificuldades em todo o reino. A
guerra religiosa tinha deixado o reino desgastado economicamente. Os camponeses viviam na miséria e
nas cidades crescia a mendicidade. O banditismo proliferava.

Henrique IV tomou as seguintes medidas: promulgou o édito sobre os ofícios de 1581; encorajou a
agricultura, protegendo os camponeses e reduzindo-lhes os impostos, assim como incentivava a nobreza
rural a gerir os seus domínios; secou pântanos; restaurou as vias; incentivou a uma indústria nacional de
produtos de luxo de modo a evitar a importação, como a da seda. A criação de uma Companhia das Índias
Orientais falhou.

Henrique IV teve como conselheiros Sully, que sanearia a moeda, e Laffemas que defendia as teorias
mercantilistas.

As reformas não agradaram e a instabilidade social cresceu, agravada com a insatisfação religiosa.
Henrique IV foi assassinado, em 1610, quando se preparava para apoiar os protestantes contra a Espanha,
deixando o filho menor, o futuro Luís XIII.

Sucedeu-se um período de regência encabeçado pela rainha viúva Maria de Médicis, italiana, que ensaiou
a paz com a Espanha, casando Luís XIII com Ana de Áustria.

Vários partidos se digladiaram até à subida ao trono do rei que, em 1624, chamaria Richelieu para o
Conselho e faria dele ministro.

Richelieu desenvolveu a política de Henrique IV contra a Espanha, apoiando os Países Baixos e as revoltas
que, na Península, procuravam a autonomia da coroa espanhola, como Portugal ou a Catalunha.
Aproximando-se da Inglaterra, casando a irmã do rei com Carlos I de Inglaterra. Lutou contra os
protestantes franceses, dominando-os e permitindo que o Édito de Nantes pudesse ser executado com
moderação. Com mão férrea disciplinou a nobreza francesa, centralizou a administração e controlou a
opinião pública. Reestruturou o exército (código Michau) e a marinha. Investiu nas teorias mercantilistas,
seguindo o pensamento de Laffemas. Os franceses ensaiaram a sua colonização americana povoando o
Quebec. Richelieu aplicou o Concílio de Trento em França. No seu testamento político dissertou sobre as
ideias absolutistas, sendo o rei considerado a imagem viva de Deus, prestando apenas perante Este contas
dos seus actos de governante.

As revoltas populares foram constantes perante o aumento sucessivo de impostos, a carestia, as fomes, as
epidemias, ao mesmo tempo que as intrigas da corte, instigadas pela rainha, apoiada pela Espanha
rebentavam continuamente. Sucedeu-lhe como ministro de França o cardeal Mazarino.

À morte de Luís XIII e na menoridade do futuro Luís XIV, criou-se um conselho de regência em que
tomavam parte, entre outros, Mazarino e a rainha viúva. Ana de Áustria fez o Parlamento anular o
testamento de Luís XIII e o conselho de regência, ficando a governar com Mazarino.

Entre 1648 e 1652, a França mergulhava de novo na guerra civil, agravada por uma crise económica, onde
os camponeses, artesãos e pequena burguesia se revoltavam contra os impostos, contra a fome e o
desemprego. A Fronda tal como outros movimentos similares manifestou-se contra o poder real e integrou
nesta revolta a nobreza togada, os parlamentos. A Fronda exigiu a abolição dos impostos criados a partir de
1635, afastamento dos oficiais colectores dos mesmos, mas mantinha-se leal ao rei e aos parlamentos.

O não cumprimento do acordado por parte da rainha regente e a fuga de Paris com o rei, a população e o
Parlamento de Paris revoltavam-se contra Mazarino. A paz foi feita entre ambos, ao mesmo tempo que a
nobreza chefiada por Conde se revoltava. A paz voltaria à França com a maioridade de Luís XIV.

Capítulo XIV

A Europa dilacerada (1609-1661)

A Reforma, no Império, provocou a secularização de muitos bens da Igreja, permitindo impulsionar a


agricultura. O trigo e a madeira das florestas eram trocados por sal e por peixe. Os holandeses participavam
deste comércio com as cidades hanseáticas e com as cidades alemãs.

Politicamente, a Reforma ajudou a independência dos diversos principados, tornando-se o Império um


principado federalizador da nação alemã. No acto da eleição, o imperador obrigava-se a aceitar a limitação
dos poderes fora do seu território. O Império separava-se religiosamente, tendo alguns príncipes se
convertido ao luteranismo, outros ao calvinismo, como o eleitor palatino, e tendo outros permanecido
católicos, como os duques da Baviera e os arquiduques da Áustria.

A cisão religiosa iria provocar no início do século XVII a criação da União Evangélica, protestante, que se
aliou à Inglaterra, às Províncias Unidas e à França, contra a Liga Católica, liderada por Maximiliano da
Baviera e aliada à Espanha. A Boémia era um reino, governado pelos Habsburgo, mas onde graças à Carta
de Majestade, as diversas seitas protestantes viviam em liberdade religiosa. A revolta dos príncipes
protestantes da Boémia, contra o imperador conduziu a uma nova guerra religiosa. De facto, ao darem a
coroa ao eleitor palatino, chefe da Liga Evangélica, os senhores, nobreza e cidades da Boémia, tornavam o
grupo protestante maioritário no colégio dos eleitores, enfraquecendo a causa católica. A Europa dividiu-se
nos esforços de guerra e de paz. Para esta última contribuíram a França e a Inglaterra.

Os católicos, encabeçados pela Baviera, e pelo imperador Fernando II, venceram Frederico V, eleitor do
Palatino. Os checos foram duramente tratados, tendo uma parte da sua nobreza perdido os bens a favor
dos alemães. A Carta de Majestade foi abolida.

A realeza tornava-se hereditária na casa dos Habsburgo e o catolicismo voltava a ser a religião do estado.
O Palatinado foi dado ao duque da Baviera que passou a deter a dignidade eleitoral que pertencera a
Frederico V, que foi expulso do Império. A Suécia protestante, onde reinava Gustavo Adolfo, entrou na luta,
invadindo o império e tornando-se aliada dos príncipes protestantes. Ao lado do Imperador continuava a
Espanha. A invasão sueca acabaria na morte do soberano sueco e na paz entre os príncipes alemães e o
Imperador que ratificava com eles a dissolução das ligas.

A Guerra dos Trinta Anos estendeu-se para além do continente europeu e revestiu a luta da Suécia com o
Império e a da França contra a Espanha, com poder na Europa central, graças ao apoio que dava ao
imperador. Os franceses usaram contra a Espanha não só as armas, mas apoiavam as revoltas
autonomistas na Península e em Itália. A guerra terminou pelo Tratado de Vestefália de 1648. Para além da
paz entre a França e o Império e entre a França e a Espanha, as Províncias Unidas obtiveram a
independência face à Espanha e os cantões suíços separavam-se do Império. A Suécia ficava com poder
sobre a Pomerânia ocidental, a cidade de Wismar e os bispados de Bremen e de Verden. Do tratado de
Vestefália emergia uma nova ordem imperial, com a autonomia dos diversos estados e com a obtenção por
parte dos calvinistas do mesmo estatuto que os católicos e os luteranos.

A guerra franco-espanhola terminou com o Tratado dos Pirinéus em 1659. A França passava à situação de
árbitro dos reinos seus vizinhos. A guerra trouxe as condições gerais de miséria, quer nos campos, quer
nas cidades, com consequências na diminuição de natalidade, na propagação da fome e das epidemias.

Capítulo XV

O difícil nascimento da Europa Clássica

Entre os finais do século XVI e o início do XVII, fixaram-se as ortodoxias católicas e reformadas. A Igreja
católica reorganizou-se e disciplinou-se. Publicou-se o catecismo romano, o novo breviário e o novo missal.
As novas ordens religiosas tiveram uma acção importante na educação católica e humanística e na
missionação. Incentivou-se uma formação para os sacerdotes, criando os seminários. A caridade teve uma
acção social. Desenvolveu-se uma corrente mística de que Sta. Teresa de Ávila e S. João da Cruz foram
exemplos. A mística, o rigorismo e o pessimismo conduziram, em França, ao jansenismo, que teve algumas
das suas proposições condenadas por Roma.
O espírito científico despertou. Desenvolveu-se a astronomia, a matemática, a física, a medicina. Nomes
como Galileu, Kepler, Harvey, Bacon celebrizaram-se. Na arte desenvolveu-se o Barroco. Na política,
afirmou-se o Absolutismo.

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