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PARA UMA TEORIA DOS JOGOS DESPORTIVOS COLECTIVOS

JULIO GARGANTA
Cumpre aos Jogos Desportivos Colectivos contribuir para a concretização dos objectivos
definidos pelas actividades de Educação Física e Desporto. Para os atingir, torna-se imprescindível
um ensino adequado, não obstante as dificuldades apresentadas pelos múltiplos componentes do
jogo e as escassas certezas existentes acerca do desenvolvimento metodológico da respectiva
formação técnica e táctica. Konzag, 1985

1.Introdução

Os Jogos Desportivos Colectivos (JDC), designação que engloba, entre outras, modalidades
como o Basquetebol, o Andebol, o Futebol e o Voleibol, ocupam um lugar importante na cultura
desportiva contemporânea.
Devido à riqueza de situações que proporcionam, os JDC constituem um meio formativo por
excelência (Mesquita, 1992), na medida em que a sua prática, quando correctamente orientada,
induz o desenvolvimento de competências em vários planos, de entre os quais nos permitimos
salientar o táctico-cognitivo, o técnico e o sócio-afectivo.
Não obstante a riqueza patenteada no alcance e na abrangência de conteúdos deste grupo de
desportos, a sua identidade e importância ressaltam, do nosso ponto de vista, de dois traços
fundamentais:

1 - O apelo à cooperação entre os elementos duma mesma equipa para vencer a oposição
dos elementos da equipa adversária. Entendendo a cooperação como o modo de comunicar através
do recurso a sistemas de referência comuns, que no caso vertente são essencialmente de natureza
motora (noção de equipa). Para cooperar levar de vencida a oposição dos adversários dever-se-á
desenvolver nos praticantes o espírito de colaboração e de entreajuda, podendo o jogo constituir-se
como um campo privilegiado para que os praticantes exprimam a sua individualidade, manifestem
as suas capacidades e simultaneamente aprendam a subordinar os interesses pessoais ao interesses
da equipa;
2 - O apelo à inteligência, entendida como a capacidade de adaptação a novas situações, isto
é, enquanto capacidade de elaborar e operar respostas adequadas aos problemas colocados pelas
situações aleatórias e diversificadas que ocorrem no jogo (noção de adaptabilidade).
O problema fundamental dos JDC, de acordo com Gréhaigne & Guillon (1992), pode ser
enunciado da seguinte forma: numa situação de oposição os jogadores devem coordenar as acções
com a finalidade de recuperar, conservar e fazer progredir a bola, tendo como objectivo criar
situações de finalização e marcar golo ou ponto. A partir deste entendimento coexistem três grandes
categorias de sub-problemas:
No plano espacial e temporal
No ataque - problemas de utilização da bola, individual e colectivamente, na tentativa de
ultrapassar obstáculos móveis não uniformes (adversários);
Na defesa - problemas na produção de obstáculos, com a finalidade de dificultar ou parar o
movimento da bola e dos jogadores adversários, no intuito de conseguir a posse da bola.

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No plano da informação
Problemas ligados à produção de incerteza para os adversários e de certeza para os colegas
de equipa. O aumento da incerteza para o adversário está ligado às alternativas propostas pelos
companheiros do portador da bola.
No plano da organização
Problemas na transição dum projecto individual para um projecto colectivo, dando o melhor
de si a equipa, isto é, integrando o projecto colectivo na acção pessoal.
Os JDC são actividades ricas em situações imprevistas às quais o indivíduo que joga tem que
responder. O comportamento dos jogadores é determinado pela interligação complexa de vários
factores (de natureza psíquica, física, táctica, técnica,...). Nesta medida, devem os jogadores
resolver situações de jogo que, dadas as diversas configurações, exigem uma elevada
adaptabilidade, especialmente no que respeita à dimensão táctico-cognitiva.
No decurso de um jogo surgem tarefas motoras de grande complexidade para cuja resolução
não existe um modelo de execução fixo (Faria & Tavares, 1992).
Sendo os JDC actividades férteis em acontecimentos cuja freqüência, ordem cronológica e
complexidade não podem ser previstas antecipadamente, aos jogadores é requerida uma
permanente atitude táctico-estratégica. Na construção de tal atitude, a selecção do número e
qualidade das acções depende obviamente do conhecimento que o jogador tem do jogo. Quer isto
dizer que a forma de actuação de um jogador está fortemente condicionada pelos seus modelos de
explicação, ou seja, pelo modo como ele concebe e percebe o jogo. São esses modelos que orientam
as respectivas decisões, condicionando a organização da percepção, a compreensão das informações
e a resposta motora.
Nesta medida, nos JDC a dimensão táctica ocupa o núcleo da estrutura de rendimento
(Konzag, 1991; Faria & Tavares, 1992; Gréhaigne. 1992), pelo que a função principal dos demais
factores, sejam eles de natureza técnica, física ou psíquica, é a de cooperar no sentido de
facultarem o acesso a desempenhos tácticos de nível cada vez mais elevado.

2. JDC: das concepções às metodologias

O desenvolvimento das diferentes modalidades desportivas tem sido influenciado por


diferentes correntes de pensamento e pelos conhecimentos provenientes de múltiplas disciplinas
científicas. Esses conhecimentos tiveram um impacto importante, primeiro nas modalidades
individuais como o Atletismo e a Natação e posteriormente nos JDC, através da transposição directa
de meios e métodos, sem ter em consideração a especificidade estrutural e funcional deste grupo de
desportos. Este facto conduziu a que ainda actualmente se sintam fortes influências desses
métodos, não apenas no plano energético-funcional, mas também no plano táctico-técnico. Uma das
conseqüências mais evidentes tem sido a obsessão pelos aspectos do ensino/aprendizagem
centrados na técnica individual (Bonnet, 1983), partindo-se do princípio que a soma de todos os
desempenhos individuais provoca um apuro qualitativo da equipa e também que o gesto técnico
aprendido duma forma analítica possibilita uma aplicação eficaz nas situações de jogo.
Desde os anos 60 que a didáctica dos JDC repousa numa análise formal e mecanicista de

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soluções pré-estabelecidas. O ensino destas modalidades tem freqüentemente consistido em fazer
adquirir aos praticantes sucessões de gestos técnicos, empregando-se muito tempo no ensino da
técnica e muito pouco ou nenhum no ensino do jogo propriamente dito (Gréhaigne & Guillon, 1992).
Nos anos 90, uma aula de abordagem dos JDC apresenta-se quase da mesma forma: 1ª
parte-aquecimento com ou sem bola (habitualmente sem bola); 2ª parte-corpo principal da aula,
onde são abordados os gestos específicos da actividade considerada, através de situações
simplificadas, com ou sem oposição; 3ª parte em função do tempo disponível, utiliza-se formas
jogadas (jogos reduzidos ou jogo formal).
Esta concepção, que privilegia a desmontagem e remontagem dos gestos técnicos
elementares e o seu transfere para as situações de jogo, não deve constituir mais do que uma das
vias possíveis no ensino dos JDC. Nesta perspectiva ensina-se o modo de fazer (técnica) separado
das razões de fazer (táctica).
Ora nos JDC o problema fundamental que se coloca ao indivíduo que joga é essencialmente
táctico. Trata-se de resolver em situação, várias vezes e simultaneamente, cascatas de problemas
não previstos a priori na sua ordem de ocorrência, freqüência e complexidade (Metzler, 1987).
Assim é conveniente que a técnica responda às situações do jogo, na medida em que o jogador
deve, numa situação de oposição, coordenar as acções com a finalidade de recuperar, conservar e
fazer progredir a bola, tendo como objectivo abeirar-se da zona de finalização e concretizar golo ou
ponto (Gréhaigne. 1992).
As dificuldades encontradas, a partir da identificação do processo de ensino/aprendizagem do
jogo com a aprendizagem dos gestos técnicos, têm provocado reacções que, na sua maioria,
conduziram ao entendimento do jogo a partir da noção de equipa. Para tal muito contribuíram vários
especialistas, de entre os quais nos permitimos destacar o romeno Leon Teodorescu e o francês
Claude Bayer. A partir das perspectivas destes autores, a equipa passa a constituir-se como
elemento central do processo de ensino/aprendizagem dos JDC. A noção de interacção, de relação
de forças entre os elementos constituintes do colectivo, adquire segundo esta perspectiva, a sua
verdadeira dimensão.
A equipa passa então a ser entendida como um microsistema social complexo e dinâmico
(Teodorescu, 1984), representando algo qualitativamente novo, cujo valor global não pode ser
traduzido pelo somatório dos valores individuais, mas por uma nova dimensão que emerge da
interacção que ocorre ao nível dos seus elementos constituintes.

3. A prática transferível nos JDC

Trazemos aqui um tema que tem preocupado os especialistas, no âmbito do ensino dos JDC.
A polêmica gerada em seu torno tem sido alimentada, no nosso entender, pela proliferação de
opiniões e convicções pouco fundamentadas e pela inexistência de conhecimentos provenientes de
estudos de cunho científico.
Basicamente, podemos considerar que existem dois tipos de atitudes face ao ensino dos JDC.
Uma em que se parte do princípio que cada JDC tem uma especificidade de tal forma elevada que o
seu ensino e treino devem ocorrer a partir da utilização de princípios, meios e técnicas que lhe são

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exclusivos. Outra que resulta da convicção de que, não obstante a especificidade de cada um dos
JDC, existem modalidades entre as quais é possível reconhecer semelhanças e, a partir daí,
construir situações que permitam a assimilação de princípios comuns, recorrendo a meios e até a
algumas técnicas comuns.
Essas semelhanças estruturais e funcionais permitem agrupar por exemplo, modalidades
como o Basquetebol, o Andebol e o Futebol.
Reportando-nos ao ensino dos JDC na escola, entendemos que tem grande pertinência a
questão colocada por Bayer (1985): como, face à diversidade de conteúdos e formas dos JDC,
elaborar um ensino coerente e uma abordagem pedagógica que evitem o subaproveitamento do
tempo disponível, a repetição dos conteúdos e assegurem o respeito pelos problemas específicos de
cada modalidade?
Para responder a esta questão, Bayer (1985) e Cecchiní (1985), propõem a denominada
prática transferível, alegando que desta forma o jovem, através duma prática multiforme, evitará
uma especialização precoce, assegurando-se a possibilidade de transferir as suas aquisições numa
actividade, para outra modalidade. A aprendizagem encontra-se assim facilitada logo que o jogador
perceba, numa estrutura do jogo, uma identidade com uma estrutura já encontrada e que ele
reconhece no mesmo ou noutro JDC.
Assim, ao nível do ensino dos JDC na escola, parece ser conveniente construir, nas fases
iniciais da aprendizagem, uma metodologia que favoreça a assimilação de princípios comuns aos
JDC estrutural e funcionalmente semelhantes (Garganta, 1991).
Neste caso, não se pretende obviamente esbater a especificidade de cada JDC, na medida em
a abordagem é, por um lado, de aproximação aos JDC semelhantes, no que se refere à assimilação
de princípios e regras de gestão, e por outro lado, de afastamento entre eles, na medida em que
não dispensa o recurso a técnicas e princípios que lhes são específicos.
Daqui se infere que a prática transferível deve ser construída, nos JDC, a partir das
similitudes encontradas com referência a determinados critérios. É possível encontrar diferentes
classificações para os JDC, em função das categorias que se pretende destacar (Quadro 1).

Quadro 1 - Classificação dos JDC em função de diferentes categorias de referência (Garganta, 1991).

Categoria considerada Classificação

Fontes Energéticas Aeróbicos, anaeróbicos, mistos


Ocupação do Espaço De invasão, de não invasão
Disputa da bola De luta directa, de luta indirecta
Trajectórias predominantes De troca de bola, de circulação de bola

No entanto entendemos que, ultrapassando um pouco a profusão de classificações importa


sobretudo identificar e reter os denominadores comuns que nos permitam definir as semelhanças
entre os diversos JDC e as singularidades que dão expressão às respectivas dissemelhanças.
Os denominadores comuns aos JDC podem ser encontrados num plano geral (Bayer, 1985):
existe uma bola, pela qual lutam as equipas; existe um terreno de jogo, onde se desenvolve o

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“confronto”; há um alvo a atacar e outro a defender, há regras a respeitar; existem colegas com
quem cooperar e adversários cuja oposição importa vencer.
Mas no plano específico é também possível encontrar denominadores comuns a determinados
JDC e bem assim agrupá-los de forma a possibilitar a sua inclusão num processo de ensino-
aprendizagem coerente.
Num universo tão vasto como é o dos JDC, as pontes ou ligações mais viáveis parecem ser
aquelas que podem estabelecer-se entre o Andebol, o Basquetebol e o Futebol (Crevoisier, 1984;
Garganta & Soares, 1986) porque:
No plano energético-funcional, são jogos que fazem apelo a esforços intermitentes, mistos
alternados (aeróbico-anaeróbico) e podem ser considerados actividades de resistência. em regime
de velocidade, de força e de coordenação táctico-técnica (Teodorescu, 1984).
Dum ponto de vista táctico-técnico, em todos estes jogos existe luta directa pela posse da
bola, há invasão do meio campo adversário e as trajectórias predominantes são de circulação da
bola.

4. Problemas fundamentais dos JDC

A aprendizagem dos procedimentos técnicos de cada um dos JDC constitui apenas uma parte
dos pressupostos necessários para que, em situação de jogo os praticantes sejam capazes de
resolver os problemas que o contexto específico (jogo) lhes coloca.
Mesmo quando nos reportamos ao contexto escolar, sustentamos que os JDC não devem ser
utilizados apenas como meio para o desenvolvimento de habilidades e capacidades variadas.
Paralelamente, importa ensinar esses mesmos jogos, com a sua lógica particular, as suas regras e
os seus códigos, enquanto referenciais importantes da cultura desportiva.
Desde os primeiros momentos da aprendizagem, é conveniente que os praticantes vão
assimilando um conjunto de princípios. Estes reportam-se não apenas ao modo como cada um se
relaciona com a bola, mas à forma de comunicar (com os colegas) e contra-comunicar (com os
adversários) passando pela noção de ocupação racional do espaço de jogo.
As capacidades de adaptação deverão ser solicitadas e estimuladas em situações ajustadas
ao nível de desenvolvimento do praticante e às exigências do jogo.
As estratégias mais adequadas para ensinar os JDC passam por interessar o praticante,
recorrendo a formas jogadas motivantes, implicando-o em situações problema que contenham as
características fundamentais do jogo. Deve, por isso, propor-se um jogo ou formas jogadas
acessíveis, isto é, com regras pouco complexas, com menos jogadores e num espaço menor, de
modo a permitir a continuidade das acções e elevadas possibilidades de concretização.

5. Indicadores e factores da qualidade do jogo

Os JDC possuem um sistema de referência com vários componentes em que se integram


todos os jogadores e com o qual se confrontam constantemente. Ambas as equipas formam dois
colectivos que planificam as suas acções e agem através de comportamentos sempre determinados

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pela relação de contraste: ataque-defesa ou defesa-ataque (Konzag, 1985).
O ensino dos JDC implica o conhecimento mínimo das modalidades que pretendemos
abordar. Esse conhecimento terá necessariamente que passar pela percepção clara de alguns
indicadores relativos a níveis de jogo diferenciados.
Do jogo que o praticante é capaz de realizar, devemos identificar os principais problemas e
enunciar os factores de evolução que possibilitam o acesso ao bom jogo.
Indicadores do jogo de fraco nível
Todos junto da bola (aglutinação)
Querer a bola só para si (individualismo)
Não procurar espaços para facilitar o passe do colega que tem a bola
Não defender
Estar sempre a falar para pedir a bola ou criticar os colegas
Não respeitar as decisões do árbitro
Factores de desenvolvimento de bom jogo
Fazer correr a bola (passar)
Afastar-se do colega que tem a bola
Dirigir-se para espaços vazios no sentido de receber a bola
Intencionalidade: receber a bola e observar (ler o jogo)
Acção após passe: movimentar para criar linha de passe
Aclaramento: afastar-se do colega que tem a bola e ocupar o seu espaço
Não esquecer o objectivo do jogo (golo, cesto)
Dos momentos iniciais (fase anárquica) até ao mais elevado nível da prestação desportiva
(fase de elaboração) é possível reconhecer várias fases em função das características reveladas
pelos praticantes, relativamente a três indicadores: estruturação do espaço de jogo, utilização dos
aspectos de comunicação na acção e relação com a bola (Figura 1).

Fases Comunicação na Acção Estruturação do Espaço Relação com a bola

Jogo Anárquico Abuso da verbalização, sobre Aglutinação em torno da Elevada utilização da visão
Centração na bola tudo para pedir a bola bola e subfunções central
Subfunções
Problemas na
compreensão do Jogo
Descentração Prevalência da verbalização Ocupação do espaço em Da visão central para a
A função não depende função dos elementos do periférica
apenas da posição da bola jogo
Estruturação Verbalização e comunicação Ocupação do espaço (táctica Do controlo visual para o
Consciencialização do gestual indivdual e de grupo) proprioceptivo
coordenação da funções
Elaboração Prevalência da comunicação Polivalência funcional Optimização das capacidades
Acções inseridas na motora Coordenação da acções proprioceptivas.
estratégia da equipa (táctica colectiva)
Fig. 1 - Fases dos diferentes níveis de jogo nos JDC (adap. Garganta. 1985)

6. Formas de abordagem dos JD

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Existem diferentes formas de ensinar os JDC, decorrentes de diversas interpretações e
sofrendo a influência, mais ou menos marcada, de várias correntes.
Pensamos poder sintetizar três formas didáctico-metodológicas de abordar o ensino do jogo
nos JDC. Cada uma delas, dado que utiliza processos diferentes, gera conseqüentemente distintos
produtos de aprendizagem (Figura 2).

Forma Centrada Forma Centrada no Jogo Formal Forma Centrada nos


Nas Técnicas (ensaio e erro) Jogos Condicionados
(solução imposta) (procura dirigida)
C Das técnicas analíticas para o Utilização exclusiva do jogo formal Do jogo para situações
A
jogo formal particulares
R
O jogo decomposto em O jogo não é condicionado nem O jogo é decomposto em
A
C elementos técnicos (passe, decomposto unidades funcionais; jogo
T
recepção, drible,...) sistemático de complexidade
E
R crescente
Í Hierarquização das técnicas A técnica surge para responder a situações Os princípios do jogo
S
(1ª técnica A, depois a B, etc) globais não orientadas regulam a aprendizagem
T
I
C
A
S

Acções de jogo mecanizadas, Jogo criativo mas com base no As técnicas surgem em
C
pouco criativas; individualismo; virtuosismo técnico função da táctica de forma
O
N comportamentos contrastando com anarquia táctica orientada e provocada
S
estereotipados
E
Problemas na compreensão do Soluções motoras variadas mas com Inteligência táctica: correcta
Q
U jogo ( leitura deficiente, inúmeras lacunas tácticas e interpretação e aplicação dos
Ê
soluções pobres) descoordenação da acções colectivas princípios do jogo;
N
C visualização da técnica e
I
criatividade nas acções de
S
jogo
Figura 2 - Formas metodológicas de abordagem dos JDC (adap. Garganta. 1985)

Até chegar ao jogo formal, há que resolver um conjunto de problemas passível de


hierarquização, em função da estrutura dos elementos de jogo: jogador, bola, colegas e adversários,
não esquecendo o objectivo do jogo, concretizar, marcar golo ou ponto.
Devido à complexidade do jogo, na medida em que o praticante tem que a um tempo,
referenciar vários elementos: bola, posição no terreno, alvo, colegas e adversários, impõe-se que a
aprendizagem dos JDC seja faseada e progressiva: do conhecido para o desconhecido, do fácil para
o difícil, do menos para o mais complexo.
Desta forma, no ensino do jogo deve, dum ponto de vista didáctico, atender-se a
determinadas etapas de referência que correspondem a diversos níveis de relação:
Eu-bola: atenção sobre a familiarização com a bola e seu controlo;
Eu-bola-alvo: atenção sobre o objectivo do jogo; finalização.
Eu-bola-adversário: combinação de habilidades; conquista e a conservação da posse da
bola (1x1); procura da finalização.
Eu-bola-colega-adversário: jogo a 2; passa e vai (desmarcacão de ruptura); passa e

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segue (desmarcação de apoio); contenção e cobertura defensiva.
Eu-bola-colegas-adversáríos: jogo a 3; criação e anulação de linhas de passe; penetração
e cobertura ofensiva.
Eu-bola-equipa-adversários: do 3x3... ao jogo formal; assimilação e aplicação dos
princípios de jogo, ofensivos e defensivos.
Pensamos não ser demais relembrar que o jogo é uma unidade e, como tal, o domínio das
diferentes técnicas (passe, condução. remate, etc.) embora se constitua como um instrumento sem
o qual é muito difícil jogar e impossível jogar bem, não permite necessariamente o acesso ao bom
jogo.
Na selecção ou construção dos exercícios para o ensino dos JDC deve exigir-se que eles
sejam de acessível execução, de clara explicação e compreensão, de fácil e rápida organização e não
muito exigentes do ponto de vista material.
A necessidade de fasear o ensino conduz inevitavelmente à divisão do jogo. No entanto, esta
divisão deve respeitar sempre que possível, aquilo que o jogo tem de essencial, ou seja, a
cooperação, a oposição e a finalização.
A construção das situações de aprendizagem deve partir duma hierarquização dos requisitos
para jogar, tendo em conta aquilo que o praticante já conhece e é capaz de fazer.
Como refere Sobral (1994), quem observar atentamente os exercícios que as crianças
repetem na iniciação aos jogos desportivos colectivos, sob a direcção de pessoas com as mais
diversas qualificações, há de reparar que grande pane daquele trabalho não tem nada a ver com a
modalidade e menos ainda com a natureza das próprias crianças.
Dever-se-á propor ao praticante, formas lúdicas com regras simples, com menos jogadores e
num espaço menor de modo a permitir a continuidade das acções e maiores possibilidades de
concretização. Se assim é, no intuito de traduzir o jogo para uma escala assimilável pelos
praticantes, parece-nos mais ajustado dividi-lo não em elementos (o passe, o remate, o
lançamento, o drible, ...) mas em unidades funcionais, em que a aprendizagem é referenciada a
princípios de acção e regras de gestão do jogo:
Estruturação do espaço
defensivo:
supressão do espaço (vantagem espacial e numérica)
jogo perto e longe da bola
ocupação equilibrada das zonas do terreno
ofensivo:
criação e ocupação de espaços (mobilidade)
jogo em profundidade e em largura
Comunicação na acção
defensiva:
contenção (parar o ataque)
conquista da posse de bola
fechar linhas de passe
entreajuda (cobertura defensiva; dobra)

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ofensiva:
comunicação motora: desmarcações (apoio e rotura)
superioridade numérica
Relação com a bola
Equilíbrio dos apoios
apreciação de trajectórias
exercitação da proprioceptividade
exercitação da visão periférica

8. Conclusão

A especificidade mais representativa dos jogos desportivos colectivos gravita em tomo do


conceito de equipa, entendida como um grupo de indivíduos reunidos para realizar um objectivo
comum previamente definido (Bayer, 1979).
O ensino dos JDC não deve sob pretexto algum circunscrever-se a transmissão de um
repertório mais ou menos alargado de habilidades técnicas (o passe. a recepção. o drible, ...), nem
à solicitação de capacidades condicionais e coordenativo-condicionais (Resistência, Velocidade,
Forca,...). Importa sobretudo desenvolver nos praticantes uma disponibilidade motora e mental que
transcenda largamente a simples automatização de gestos e se centre na assimilação de regras de
acção e princípios de gestão do espaço de jogo, bem como de formas de comunicacão e contra-
comunicação entre os jogadores.
Neste contexto, afigura-se assim importante partir duma concepção que articule aspectos
fundamentais como a oposição, a finalização, a actividade lúdica e os saberes sobre o jogo. O jogo e
o indivíduo que joga constituem o cerne da nossa atenção.
Nesta perspectiva, quem ao pretender ensinar os jogos desportivos colectivos nas suas
diferentes modalidades, optar por uma via estritamente técnica e analítica, deve ter a consciência de
que está a privar os praticantes dum conjunto de experiências lúdicas que só o jogo pode
proporcionar.
Assim na nossa perspectiva, o jogo deverá estar presente em todas as fases de
ensino/aprendizagem, pelo facto de ser simultaneamente o maior factor de motivação e o melhor
indicador da evolução e das limitações que os praticantes vão revelando.

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