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A Súmula Vinculante, prevista na EC 45/2004 , e regulada pela lei 11.

417/ 2006, mais


do que relevância jurídica, é um mecanismo de intrínseca relevância social, alardeado,
por seus defensores, como a solução tardia, porém, definitiva para a nefasta crise que há
tanto assola o Poder Judiciário, este que, por mais idôneo se pretenda mostrar, padece
de mau aparelhamento crônico. E nesse sentido, a ineficácia ”endêmica” de um poder
esvazia por completo a sua legitimação de existência.

Sem sombra de dúvida, opinião compartilhada por parte maciça dos juristas, a inserção
da súmula vinculante em nosso sistema legal representa o maior advento jurídico desde
a promulgação da Carta Magna de 1988. Contudo, a grandiosidade de uma reforma não
necessariamente resplandece resultados positivos, ou, no caso em exame, benéficos à
manutenção de um regime democrático pautado na tripartição dos poderes.

Súmula vinculante, em seu conceito formal, é o dispositivo que faculta ao STF, cúpula
suprema do Poder Judiciário, de ofício ou por meio de provocação, mediante a votação
de 2/3 dos seus membros, em reiteradas decisões de matéria constitucional, editar
súmulas de suas decisões, as quais, quando publicadas, vinculam todos os órgãos do
Judiciário, bem como da administração pública, direta e indireta, em todas as esferas,
Federal, Estadual e Municipal.

Com o advento deste mecanismo, erigiu-se, então, ao STF, a atípica função legiferante,
uma vez que lhe cabe agora, não apenas a interpretação da norma, mas a interpretação
extensiva da norma, sua validade e eficácia de forma coercitiva.

Esse mecanismo, como já asseverado, trará soluções imprescindíveis ao Judiciário, uma


vez que proporcionará, em tese, segurança jurídica, uniformização da jurisprudência,
celeridade processual, facilitará o trabalho dos magistrados de primeira instância, bem
como desafogará o já tão assoberbado Supremo Tribunal Federal.

Todavia, esse mecanismo, não obstante o potencial benefício que poderá trazer, busca,
ou minimamente possibilita, em última análise, a concentração do poder e o controle
institucional sobre a democracia. Bom que se traga ao contexto, que referido
mecanismo deverá repousar nas mãos de apenas 11 ministros, os quais, diga-se de
passagem, são escolhidos pela cúpula do Poder Executivo do País, e possuem
vitaliciedade. Nas palavras de Miguel Reale, “Não há norma sem que haja
interpretação”, e a interpretação coercitiva, imposta ou vinculante (para os que apreciam
eufemismos), se consubstancia, a bem da lógica, em governança reflexa.

Sobre a luz de um prisma constitucional, temos que o uso do mecanismo em exame,


este que se trata de uma subversão do instituto da “Stare Decisis” (common law), fere
substancialmente a tripartição dos poderes, vez que aglutina sob o crivo do Judiciário,
funções especificas dos Poderes Legislativo e Executivo. Em colóquio, materializa fim
inconstitucional, calcado em sofisma de soluções que já se encontram insertas, pelos
institutos devidos, em nosso arcabouço legal, os quais, como de praxe em nossa
incipiente República, nunca são empregados de forma coerente. É medida que somente
poderá ser devidamente utilizada no momento em que a sociedade, como há muito se
espera, .tiver condições de manifestar-se política e institucionalmente de forma a
exercer a coerção sobre os agentes públicos e todos os que estão investidos de tamanhos
poderes.
Daniel Ferri de Menezes é advogado do Departamento do Contencioso Cível
Estratégico da Azevedo Sette Advogados em São Paulo.

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