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INTRODUÇÃO E REVISÃO DA LITERATURA (79.632.032). A médio e longo prazo, o gênero feminino pode-
Atualmente a maioria dos cirurgiões-dentistas tem difi- rá responder pela maior parte da odontologia no Brasil8.
culdade quanto ao fluxo de pacientes no consultório, sen- Recentes estudos avaliaram as alterações no mercado de
do uma das principais causas a situação sócio-econômica e trabalho oriundas das mudanças na realidade social. Jun-
cultural da população, além também da má distribuição dos queira et al.13, em 2005, compararam dados estatísticos do
profissionais no país. Conselho Federal de Odontologia (CFO), Instituto Brasileiro
Há sete anos, 12 mil formandos eram lançados no mer- de Geografia e Estatística (IBGE) e Secretaria de Estado da
cado de trabalho a cada ano1,2,3, e, hoje, são lançados apro- Saúde de São Paulo, para descrever as discrepâncias regionais
ximadamente 9 mil profissionais, mostrando que houve uma na concentração de cirurgiões-dentistas, mostrando que as
diminuição no interesse pelo curso. Não se trata mais de uma regiões Sul e Sudeste do país, que concentram a maior parte
escolha individual, mas de problemas coletivos como: baixa da renda do Brasil, abrigam não só o maior número de univer-
remuneração da profissão; perda de prestígio social da Odon- sidades, mas também o maior número de cirurgiões-dentistas,
tologia; escassez de empregos; taxas de regulamentação da demonstrando números distintos dos descritos pela Organi-
profissão; impostos, entre outros. zação Mundial da Saúde (OMS). Outro dado discrepante co-
Mesmo com a falta de interesse de vestibulandos em escolher mentado refere-se ao acesso restrito de parte da população
como carreira a odontologia, hoje há no Brasil 219.778 cirurgiões- ao serviço, a maioria não tem condições econômicas de pagar
dentistas, localizados principalmente na Região Sudeste4. pelo tratamento, e o serviço público não consegue atender
No passado, a pós-graduação era um diferencial competi- a toda esta demanda. Os autores propõem como solução a
tivo, mas, atualmente, com o número de cursos Lato e Stricto interiorização, com o objetivo de reduzir estas discrepâncias
Sensu se multiplicando de maneira vertiginosa, todo profis- regionais, assim como a busca por outros setores do mercado
sional tem a possibilidade de se especializar. No território pouco explorados.
brasileiro, distribuídos de forma desigual, existem 397 cursos Também sugerindo a interiorização, Paranhos et al. 17
de especialização credenciados (em andamento nas entidades (2008) avaliaram as modificações que ocorreram no mercado
de classe) e 433 cursos de especialização reconhecidos (em de trabalho do cirurgião-dentista quanto à distribuição de
andamento nas faculdades), nas diferentes especialidades profissionais clínicos gerais e ortodontistas, a partir de 1967,
odontológicas4. nos estados brasileiros, visando melhorar a compreensão dos
A especialização é inegavelmente importante1, porém, rumos da profissão. Concluíram que todas as capitais brasi-
parte da população ainda prefere o clínico geral, por gerar leiras apresentam índices maiores (menor número de habi-
uma relação de confiabilidade e adaptação entre o cirurgião- tantes por cirurgião-dentista) que o recomendado pela OMS,
dentista e o paciente5. diferentemente do interior dos estados, onde se observou a
A globalização resultou em uma competitividade para todas proporção menor que 1:1.500. O mercado de trabalho para o
as profissões contemporâneas1. Assim, a emulação e a seleti- especialista em ortodontia também mostrou-se mais promis-
vidade se transformaram em fatores presentes na vida profis- sor no interior, principalmente nas regiões Norte e Nordeste.
sional, fazendo com que o cirurgião-dentista, cada vez mais, Dessa forma, o presente trabalho buscou avaliar, na região
torne-se um empreendedor e diligente, possuidor de qualida- Sudeste do Brasil, as modificações que ocorreram no merca-
des técnicas e científicas, que desenvolvam competências ad- do de trabalho do cirurgião-dentista, quanto à distribuição
ministrativas3. Porém, um mercado saturado responde pouco a de profissionais das diferentes especialidades odontológicas,
todos os esforços que os cirurgiões-dentistas realizam. analisando também a relação quanto ao gênero, além de ava-
O estudo do mercado profissional tem aumentado de for- liar a relação cirurgião-dentista/habitante e especialista/ha-
ma considerável. Alguns autores6,7,11 investigaram a melhor bitante, visando melhorar a compreensão dos rumos da pro-
opção para a escolha do local de trabalho, proporcionando fissão, sugerindo campos de atuação profissional.
subsídios aos profissionais quando da instalação dos seus
consultórios. O conhecimento do perfil atual do profissional, MATERIAIS E MÉTODOS
suas ansiedades com relação ao mercado de trabalho odon- Os dados utilizados para a elaboração deste trabalho fo-
tológico e as expectativas relacionadas à profissão que exer- ram obtidos no site do Conselho Federal de Odontologia 4, e
cem 9, local de atuação profissional, atendimento a convênios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística15, bem como
e docência10, somados à crescente queda da remuneração do dos relatórios emitidos pelo CFO. Através dos relatórios emi-
cirurgião-dentista e o aumento da assistência odontológica tidos pelo CFO, obteve-se os números de cirurgiões-dentistas
suplementar no mercado, também são preocupações da nossa e de especialistas por Estado da Região Sudeste do Brasil, dos
categoria profissional12 últimos cinco anos.
Realmente, o perfil profissional vem sendo alterado, e o No site do IBGE15 foram colhidas informações relativas à
aumento da participação feminina no mercado de trabalho população residente nos diferentes estados da região Sudes-
odontológico parece seguir a tendência demográfica, que, te, e, a partir dos dados coletados, foram calculadas as re-
há aproximadamente dez anos, apontava uma pequena dife- lações especialista/habitante e cirurgião-dentista/habitante,
rença entre a população masculina (77.447.541) e a feminina comparados com o índice recomendado pela OMS, avaliando
assim o mercado profissional odontológico. sional são fundamentais1,13 e um dever para o cirurgião-den-
tista, previsto no Código de Ética Odontológica16. O número de
RESULTADOS E DISCUSSÃO cursos de especialização na Região Sudeste era de 28.717 e,
O Quadro 1 apresenta a situação da relação cirurgião- em cinco anos, praticamente duplicou, chegando atualmente
dentista/habitante na Região Sudeste do Brasil, demonstran- em 588 cursos (Quadro 2), mostrando mais uma vez a má dis-
do que todos os estados possuem proporção maior do que a tribuição do ensino. O Ministério da Educação (MEC) é um dos
sugerida pela OMS (1:1.500). Um dos fatores deste resultado, responsáveis por este fato, pois promoveu a mercantilização
já previsto, é a grande quantidade de faculdades de odontolo- do ensino no Brasil, autorizando a abertura indiscriminada de
gia nesta região, mostrando a má distribuição do ensino. novos cursos18.
A abertura de novos cursos teve um grande crescimento Assim, os quatro estados desta região possuem 56,16% dos
perto dos anos 1990, chegando a 170 cursos. Hoje, há 188 especialistas do Brasil, nas diferentes áreas reconhecidas pelo
cursos, a maioria concentrada nesta região, em especial no Conselho Federal de Odontologia, conforme mostram os Qua-
Estado de São Paulo (Quadro 1). Esta má distribuição é um dros 3, 4, 5 e 6. O presente trabalho ainda mostra que São Paulo
dos fatores que favorece a difícil situação da Odontologia na tem um número de especialistas maior do que Espírito Santo,
Região Sudeste, disparidade já relatada em outros estudos13. Rio de Janeiro e Minas Gerais somados.
Vários trabalhos mostram esta imparidade vivida pela A proporção especialista/habitante também é exposta nos
Odontologia1,6,7,8,12,13,14. Grande parte dos profissionais, ao se Quadros 3, 4, 5 e 6, mostrando que a procura é maior por algu-
formar, procura grandes centros ou acaba se fixando próximo mas especialidades, em particular a endodontia e ortodontia,
à região onde cursou a graduação 13. Um dos motivos pode que lideram o ranking, sendo as mais procuradas nos quatro
ser a facilidade ou a busca, cada vez maior, por cursos de estados. Em contrapartida, a prótese bucomaxilofacial, a odon-
especialização. togeriatria, a patologia bucal, a odontologia do trabalho e a
De fato, a especialização e a constante capacitação profis- estomatologia são as especialidades menos procuradas, com-
QUADRO 2
Número de faculdades de Odontologia e de cursos de especialização, reconhecidos e credenciados, nos estados da Região Sudeste do Brasil
preendendo campos de atuação que podem ser explorados. O 2. O mercado de trabalho para o especialista nesta região
tratamento das manifestações bucais em pacientes submetidos apresenta menor concorrência nas áreas de prótese bucoma-
à quimioterapia e/ou radioterapia está ganhando espaço no xilofacial, odontogeriatria, patologia bucal, odontologia do
mercado odontológico, reafirmando assim que a estomatologia trabalho e estomatologia;
é uma especialidade ainda promissora19. 3. O número de profissionais clínicos gerais e especialistas
O Gráfico 1 mostra o número total de especialistas por gê- do gênero feminino tem aumentado consideravelmente, o que,
nero no Brasil, predominando o feminino em quase todas as es- a médio e longo prazo, demonstra que a odontologia no Brasil
pecialidades (Gráfico 2). Este fato demonstra que as mulheres poderá ser desempenhada na maior parte por mulheres.
estão se tornando a maioria no mercado odontológico12. Os resultados do presente trabalho confirmam que o ci-
rurgião-dentista, antes da instalação de seu consultório ou
CONCLUSÃO clínica odontológica, deve realizar um levantamento da pro-
Com base nos resultados encontrados na presente pesqui- porção de habitantes/profissionais para a escolha adequada
sa pode-se concluir que: do local, buscando a interiorização, melhorando assim as
1. Nenhum Estado da Região Sudeste do Brasil apresenta chances de sucesso profissional.
o índice recomendado pela OMS, sendo que a maioria apre- Estudos como este são recomendados para cada cidade da
sentou proporção maior que a preconizada, que é de 1:1500; região onde se pretende atuar.
QUADRO 3
Proporção de crescimento do número de especialistas no Estado do Espírito Santo
QUADRO 4
Proporção de crescimento do número de especialistas no Estado de Minas Gerais
GRÁFICO 1
Proporção de cirurgiões-dentistas especialistas por gênero no Brasil
5000
5034
4902
NÚMERO DE CDs
3249
4332
4000
3868
3760
3414
3000 MASCULINO
2653
FEMININO
2453
2323
2000
2209
1957
1691
1443
1000
555
172
160
1124
158
141
34
13
527
198
267
464
854
408
288
126
140
81
271
81
105
632
979
0
CIRURGIA E TRAUMATOLOGIA
BUCO-MAXILO-FACIAIS
DENTÍSTICA
ENDODONTIA
ODONTOLOGIA LEGAL
ODONTOPEDIATRIA
ORTODONTIA
PATOLOGIA BUCAL
PERIODONTIA
PRÓTESE BUCO-
MAXILO-FACIAL
PRÓTESE DENTÁRIA
IMPLANTODONTIA
ESTOMATOLOGIA
SAÚDE COLETIVA
RADIOLODIA ODONTOLÓGICA
E IMAGINOLOGIA
DISFUNÇÃO TÊMPORO-
MANDIBULAR E DOR-OROFACIAL
ODONTOLOGIA DO TRABALHO
ODONTOGERIATRIA
ORTOPEDIA FUNCIONAL
DOS MAXILARES
ESPECIALIDADES ODONTOLÓGICAS
GRÁFICO 2
Proporção de cirurgiões-dentistas, em cada especialidade, por gênero no Brasil
QUADRO 6
Proporção de crescimento do número de especialistas no Estado de São Paulo
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