You are on page 1of 12

INVESTIGAÇÃO DE INCÊNDIO NO BRASIL 

Publicado em 21/02/2010
Seção: 

No artigo produzido pelo Doutor George Cajaty Barbosa Braga e pela Perita de
Incêndio Helen Ramalho de Oliveira Landim ambos do Corpo de Bombeiros Militar do
Distrito Federal. Públicado no Capítulo XXII do livro "A segurança contra incêndio no
Brasil". Coordenação de Alexandre Seito e outros. encontramos importantes
informações sobre a atividade de investigação científica nos incêndios.

1 INTRODUÇÃO

Muitos poderiam se perguntar o porquê de se realizar a investigação de um incêndio.


A principal razão é descobrir a razão de sua causa e, então, promover ações,
informações, recomendações e até mesmo mudanças na legislação de proteção
contra incêndio e pânico, para evitar que outras situações similares aconteçam.
Devido ao incêndio ser um problema de grande magnitude em todo mundo, com
perdas diretas avaliadas em 0,1% do produto interno bruto (PIB) para países como
Japão, Espanha e Polônia, até quase 0,3% do PIB para países como Áustria e
Noruega, e mortes de até 4.300 pessoas, em 2003, nos Estados Unidos da América
[The Geneva Association Newsletter, 2006], é que a investigação desse tipo de
ocorrência mostra toda sua importância. Este é um assunto muito amplo e exige
estudos aprofundados. A capacitação dos investigadores de incêndio tem de ser
consistente e a prática no combate e na investigação permitirá a estes o
desenvolvimento de sua condição de investigadores. Antes de começar a averiguar
um incêndio, o investigador precisa ter grandes conhecimentos sobre o
comportamento do fogo. O presente capítulo não pretende, nem é capaz de esgotar o
conteúdo. Deixarão de serem abordadas as particularidades dos incêndios florestais e
de veículos. Para buscar um maior conhecimento sobre investigação de incêndios,
duas fontes essenciais são o –

Kirk’s Fire Investigation, de John D. DeHaan, e o NFPA 921Guide for Fire and
Explosion Investigations, da National Fire ProtectionAssociation.

2 ATUAÇÃO DO INVESTIGADOR DURANTE O INCÊNDIO

Para muitos, a investigação de um incêndio pode ser somente para determinar se foi
criminoso ou não. Entretanto, investigações de incêndio têm um sentido mais amplo,
que chega até mesmo à engenharia de segurança contra incêndio. Por meio das
investigações de incêndio é possível saber se um determinado produto tem defeito de
fabricação capaz de originar um incêndio ou que uma determinada prática também
concorra para este tipo de ocorrência. Com base neste conhecimento, ainda muito
incipiente no Brasil, é possível melhorar produtos e atualizar normas de proteção
contra incêndio, buscando sempre um aumento da segurança da população. Apesar
do início da investigação poder ocorrer em qualquer tempo, quanto mais cedo for
iniciada, mais informações sobre o seu desenvolvimento e comportamento serão
obtidas. De acordo com o 

Kirk’s Fire Investigation [DEHAAN, 2005], a atuação do   investigador inicia antes


mesmo da extinção do incêndio, uma vez que este pode obter informações mais
precisas sobre o sinistro quando ainda está sendo combatido.

2.1 DURANTE O INCÊNDIO


A presença do investigador na cena do incêndio durante o combate sempre permitirá
a obtenção de valiosas informações sobre o seu desenvolvimento, bem como sobre
como o ambiente pode ter sido alterado devido à ação dos bombeiros. Ele poderá
aproveitar também começar a relacionar as testemunhas e os bombeiros a serem
entrevistados e os eventos que estão se sucedendo durante o desenvolvimento e a
extinção do incêndio.

2.2 IMEDIATAMENTE APÓS A EXTINÇÃO DO INCÊNDIO

Assim que o acesso ao local do incêndio estiver seguro, embora o ambiente ainda
esteja com altas temperaturas, o investigador poderá colher as primeiras impressões
de dentro do local sinistrado. Neste momento ainda não se iniciou a operação de
rescaldo, que é o resfriamento de pontos quentes do ambiente, a fim de evitar a
reignição do incêndio. Por isso mesmo, em decorrência da preservação da cena,
poderá revelar importantes informações a respeito do sinistro.

2.3 DURANTE O RESCALDO

É importante que o trabalho de rescaldo seja o mais criterioso possível, diminuindo ao


máximo a quantidade de material removido e até mesmo catalogando o exato local
onde ele se encontrava antes de ser retirado. É nesta fase onde boa parte das
evidências é destruída, podendo dificultar, ou até mesmo tornar impossível, a
investigação do incêndio. Apesar de muitos bombeiros terem noção da importância da
preservação do local, a presença do investigador neste momento reforçará o
procedimento, podendo até mesmo orientar a ação realizada pelos bombeiros.

2.4 APÓS O RESCALDO

É a partir deste momento que o investigador tem condições de trabalhar de uma forma
mais abrangente e completa. Nesta fase é possível verificar os padrões de queima,
bem como a situação do local após o incêndio, procurando evidências que o ajudarão,
em conjunto com as entrevistas com testemunhas e bombeiros, a reconstruir a cena e
buscar o local de origem do fogo, sua causa e como o fogo se propagou. Uma das
informações primordiais que o investigador deve buscar é o que iniciou o incêndio,
tentando compreender e correlacionar os fatos que ocorreram antes e como o
incêndio se propagou. Estas informações serão de importância ímpar para a proteção
contra incêndio, pois uma investigação bem feita pode fazer com que normas e
procedimentos sejam revistos e atualizados.

3 MÉTODO CIENTÍFICO DA INVESTIGAÇÃO DE INCÊNDIO

Todo investigador de incêndio precisa desenvolver suas atividades em conformidade


com uma metodologia que lhe permita apontar, de forma criteriosa, a causa do
incêndio. Isso exige organização, conhecimento e dedicação, definindo suas ações
antes mesmo de iniciá-las. Laudos periciais são, não raras vezes, subsídios de
decisões judiciais. A metodologia utilizada no laudo permitirá ao magistrado, bem
como a todo cidadão a quem possa interessar, a compreensão dos fatos que
culminaram com o sinistro. Por isso mesmo, não basta ao perito somente conhecer
bem o assunto. É igualmente necessário que saiba se expressar de forma clara e
concisa a respeito da investigação. A seguir serão abordadas as principais ações a
serem desenvolvidas na investigação de incêndios.

3.1 PRESERVAR A CENA


Nenhum local de incêndio pode ser devidamente periciado se o cenário original não
for mantido para os investigadores. A perícia de incêndio apresenta uma grande
desvantagem na preservação dos vestígios em relação a outros tipos de perícia.
Enquanto que, em exames de balística, as provas, geralmente, se mantêm após o
evento, os vestígios decorrentes do incêndio já foram duramente testados pela ação
direta das chamas e do calor e o que resta é, não raras vezes, insuficiente para a
determinação da causa. Não obstante, a ação dos bombeiros durante o combate
também deteriora a preservação total das provas, seja pela ação da água durante a
extinção, seja pela movimentação dos escombros para resfriamento dos pontos de
calor, durante o rescaldo. Os investigadores de incêndio precisam ser pessoas com
atenção apurada, com conhecimento técnico aprofundado sobre como se processa o
incêndio, com suas características e comportamento padrão, além de saber analisar
corretamente os vestígios coletados na cena do incêndio. A cena do precisa ser
preservada até uma investigação completa do sinistro, o que pode levar dias, senão
meses. 

Segundo Pedersen, a investigação de incêndio segue uma cadeia cronológica de


eventos, estabelecido pelas testemunhas, pelo cenário do incêndio e por testes
laboratoriais, 

3.2 DEFINIR A METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO

Ao chegar ao local do incêndio, o investigador deve, primeiramente, delimitar o


cenário a ser analisado, ou seja, o objeto da investigação, bem como relacionar, o
mais detalhadamente possível, os óbitos ou as lesões em vítimas (se houver). A
avaliação permitirá formular um plano estratégico de trabalho, onde os dados
coletados devem possibilitar ao investigador o preparo de um relatório. Constituem
ações metodológicas de uma investigação:

 coleta de informações;
 coleta de amostras para análise;
 escavação dos escombros;
 inspeção das instalações elétricas (disjuntores, fusíveis, condutores e
terminais);
 registro fotográfico;
 inspeção visual das áreas atingida e adjacentes;
 verificação da existência de múltiplos focos.
 reconstituição da cena (com os escombros e com os materiais não

queimados);

    Em todas as ações acima citadas, deve-se primeiramente delimitar quem


participará da atividade (testemunhas e bombeiros a serem entrevistados, por
exemplo), quando e como será realizada a ação.

É importante lembrar que incêndios com vítimas devem ser periciados


emconjunto com a perícia criminalística, a fim de que os trabalhos em campo
não prejudiquem uma ou outra perícia. Isso exige esforços em conjunto de
mais de uma instituição e, provavelmente, demandará mais tempo de trabalho
dos investigadores envolvidos.

 O investigador deve buscar coletar o maior número possível de dados sobre o


evento, por meio de observação direta, medições, fotografias, testes
laboratoriais, estudos de caso e entrevistas às testemunhas. Estas deverão ser
qualificadas no relatório, com o maior número de dados a respeito, inclusive
endereço e telefone de contato e sua condição de testemunha do incêndio (se
proprietário, observador, vizinho, bombeiro, etc.).

3.3 COLETAR O MAIOR NÚMERO DE DADOS POSSÍVEL

O investigador deve buscar coletar o maior número possível de dados sobre o


evento, por meio de observação direta, medições, fotografias, testes
laboratoriais, estudos de caso e entrevistas às testemunhas. Estas deverão ser
qualificadas no relatório, com o maior número de dados a respeito, inclusive
endereço e telefone de contato e sua condição de testemunha do incêndio (se
proprietário, observador, vizinho, bombeiro, etc.). As informações obtidas das
testemunhas devem ser coletadas primeiramente de forma livre, deixando que
o indivíduo fale tudo o que se lembra sobre o evento para, somente depois,
serem feitas as perguntas julgadas importantes. Dessa forma, é possível
analisar possíveis contradições nos depoimentos e a confrontação destas com
os vestígios ou até mesmo sanar possíveis dúvidas dos investigadores. O
relato dos bombeiros envolvidos no combate também é muito importante para
o laudo, uma vez que estes são testemunhas oculares do comportamento do
incêndio. Por serem os primeiros agentes públicos a chegar ao local e ainda
por poderem alterar a cena original por necessidade do combate ao incêndio,
os bombeiros podem informar aos investigadores dados importantes como:
quebra de janelas, abertura de portas ou feitas nos tetos e paredes, técnicas e
procedimentos de combate adotados, inclusive de ventilação (uma vez que
esta afeta sobremaneira o comportamento do calor e das chamas).
Conseqüentemente, a integração entre os investigadores de incêndio e os
combatentes que atuaram no incêndio deve ser a maior possível. É importante
que, nos casos de coleta de depoimentos de vítimas hospitalizadas ou em
condição de trauma psicológico decorrente do incêndio, os investigadores se
assegurem, pela medida do bom senso, que estas estejam em condições de
falar a respeito. Medicações fortes podem alterar o quadro mental da vítima e
dificultar ou confundir lembranças a respeito do sinistro. A análise de toda a
edificação, inclusive das áreas não atingidas, deve ser considerada pelos
investigadores. Isso porque, em alguns casos, a fonte de calor que originou o
incêndio não se encontra no ambiente sinistrado, podendo ter sido trazida por
meio de fossos de ventilação, sistema de ar condicionado, dutos técnicos,
escadas ou janelas.

3.4 ANALISAR OS DADOS

Todo levantamento de dados sobre o incêndio visa assegurar, de forma


objetiva, se os vestígios, inclusive o depoimento das testemunhas, são
verídicos e harmônicos entre si. O investigador precisa utilizar sua experiência
e conhecimentos a fim de  oncatenar os vestígios coletados e definir o
comportamento do incêndio. É importantíssimo que este conheça bem como
se comporta o incêndio nos diversos tipos de edificação, a fim de melhor
compreender os vestígios encontrados na cena do incêndio. Por isso mesmo,
em vários países, investigadores de incêndios são bombeiros com grande
experiência de combate. A análise do comportamento do incêndio será
abordada mais adiante.

3.5 LEVANTAR TODAS AS HIPÓTESES POSSÍVEISRELACIONADAS À


ORIGEM DO FOGO E AO SEU DESENVOLVIMENTO
Depois da análise dos dados obtidos, os investigadores devem relacionar, uma
a uma, todas as hipóteses possíveis quanto à causa que estejam em
conformidade com os vestígios e com o relato das testemunhas. Em princípio,
na investigação onde não foi possível estabelecer qual foi o comportamento do
fogo,nenhuma hipótese pode ser descartada. Todas as possibilidades devem
serconsideradas, a fim de que não restem dúvidas, ao final dos trabalhos, de
como seoriginou o sinistro.É importante lembrar que um mesmo
comportamento desenvolvido pelo calore pelas chamas pode admitir mais de
uma possibilidade de causa.

3.6 TESTAR AS HIPÓTESES LEVANTADAS

Por método dedutivo e levando-se em consideração experiências anteriores,


as hipóteses devem ser testadas uma a uma, em comparação com o
comportamento do incêndio e com os vestígios existentes. Esta fase visa
excluir todas as outras possibilidades de causa que não possuem sustentação
nos vestígios. É uma fase que demanda tempo e esforço por partes dos
investigadores e pode exigir uma coleta de dados adicional, novas informações
das testemunhas e o desenvolvimento ou a alteração das hipóteses.
Conseqüentemente, os passos 4, 5 e 6 se repetem até não haver discrepância
entre as hipóteses e for possível apontar a causa. Tudo o que não puder ser
comprovadamente eliminado deve continuar sendo considerado como possível
e os investigadores necessitam admitir também esta condição.

3.7 SELECIONAR A HIPÓTESE PROVÁVEL

Também conhecida como a fase da conclusão ou opinião dos investigadores,


este passo visa levantar a hipótese provável, baseada em uma confrontação
harmônica entre os vestígios coletados e as informações das testemunhas.
Quando uma hipótese consistente é confrontada harmonicamente com as
evidências e, conseqüentemente, pode se tornar a hipótese final, o laudo pode
apontar a causa do incêndio. Se isso não for possível, a causa deve ser
considerada indeterminada ou, como adotada oficialmente por algumas
instituições, causa não apurada.

4.1 CARACTERÍSTICAS DA QUEIMA

O incêndio inicia-se em um determinado ponto, conhecido como foco inicial, e


assume, normalmente, uma queima radial e ascendente. O ambiente em que o
foco inicial se encontra é denominado zona de origem do incêndio.

Geralmente, o incêndio se propaga em forma de raio, do centro para fora,


quando o vento não é significativo. Conseqüentemente, as marcas de queima
no foco inicial são mais profundas exceto se as chamas se propagarem para
um material mais combustível.

  Investigações de incêndio delimitam primeiramente a zona de origem do


incêndio para, a partir daí, determinar o foco do incêndio. Por isso mesmo, o
investigador deve analisar a cena do incêndio, primeiramente, de forma macro,
o mais externo possível para somente após iniciar o trabalho de delimitação da
zona de origem e, posteriormente, do foco do incêndio.

  Os vestígios gerados em um incêndio generalizado apresentam marcas de


queima superficial em todos os materiais existentes no ambiente, uma vez que
todo ele esteve envolto em chamas, além de maior destruição da parte
superior do ambiente, dadas as altas temperaturas atingidas na camada de
fumaça.

 4.2 COMPREENSÃO DA DINÂMICA DO INCÊNDIO

A compreensão da dinâmica do incêndio permite aos investigadores analisar


corretamente seus vestígios. Apesar de cada incêndio possuir particularidades,
há um padrão de comportamento entre os incêndios ocorridos em ambientes
com características construtivas e cargas de incêndio semelhantes. De acordo
com Lilley [LILLEY, 1997], uma boa compreensão das fases de um incêndio
pode ajudar ao investigado a entender o que aconteceu em um incêndio.

Fase inicial

�� Marcas de fuligem por chama nas paredes.

o É fácil verificar o padrão de queima em “V” no foco inicial.


o É fácil encontrar o foco inicial e, conseqüentemente, a causa.
o A maioria dos vestígios ainda está intacta.

 Fases crescente e totalmente desenvolvida

 Nestas fases o incêndio torna-se mais intenso na medida em que mais


materiais participam da queima. Estas são as fases de maior produção de
chamas, onde a temperatura no teto está acima de 700oC.   O que o
investigador pode verificar em um incêndio que foi combatido ainda nestas
fases:

o Marcas de fuligem por chama nas paredes.


o Padrão de queima em “V” mais evidente em materiais combustíveis,
como paredes de madeira.
o A carbonização é maior na zona de origem se comparada com outros
ambientes adjacentes.
o O exame dos objetos no ambiente sinistrado ajuda a identificar mais
facilmente a zona de origem do fogo.
o Derretimento de metais leves, como alumínio.

4.2.1 Edificações de alvenaria

Edificações em concreto ou tijolo apresentam-se, geralmente,


compartimentadas por paredes do mesmo material, como o caso de
residências, apartamentos e escritórios. Sua carga de incêndio, normalmente,
consiste em mobiliário de madeira e estofados, além de equipamentos
eletro-eletrônicos. A queima apresenta-se rápida, porém restrita ao foco
inicial ou a um compartimento, haja vista a delimitação do calor e das chamas
pelo teto (comumente em laje de concreto) e pelas paredes. Os pontos
atingidos somente pela fumaça apresentarão bastante fuligem, geralmente,
nas paredes adjacentes ao foco do incêndio, na parte superior e no teto. A
fuligem é trazida pela fumaça e suas marcas são de manchas uniformes
escuras. Pontos onde houve chamas apresentam marcas claras, em maior
profundidade. Não é raro o descolamento do material de revestimento da
parede pela ação do calor. Edificações compartimentadas por gesso
acartonado (de madeira costumam apresentar combustão mais rápida,
causada pela deteriorização do material com o calor.

4.2.2 Edificações de madeira

 Edificações de madeira típicas de favelas são constituídas, normalmente, de


telhado de fibrocimento e paredes de madeirite, que é de fácil combustão. É
comum o abastecimento irregular de energia elétrica (gatos) ou uso cotidiano
de velas, o que aumenta o risco de um sinistro. Apesar de a carga de incêndio
aproximar-se bastante da carga de incêndio das edificações em alvenaria de
concreto ou tijolo, a queima aqui apresenta-se extremamente agressiva,
atingindo altas temperaturas em um espaço de tempo reduzido.
Conseqüentemente, os vestígios para a perícia também são drasticamente
reduzidos ou comprometidos face o alto grau de destruição da edificação. A
fumaça e os gases quentes produzidos pela combustão sobem, atingem o teto
e espalham-se para os lados. Ao se deparar com as paredes, a fumaça desce
em movimento circular, aquecendo os materiais presentes no ambiente por
convecção e radiação térmica, enquanto as chamas do foco inicial continuam
propagando o incêndio radialmente por condução. Se o processo não for
interrompido, em alguns minutos, o ambiente estará envolvido em chamas pela
generalização do incêndio, também conhecido como flashover.  Testes
laboratoriais japoneses mostraram que, para a propagação das chamas em um
compartimento, o material de acabamento da edificação influenciará
significativamente no teto e pouco nas paredes. No caso da edificação em
madeirite, este processo inicia também a destruição do telhado (que, apesar
de não propagar chamas, é pouco resistente ao calor e trinca, caindo no
ambiente) e a combustão das paredes, levando a uma carbonização
do material atingido e a destruição total do ambiente.

4.2.3 Tipos de causa de incêndio

As causas possíveis de incêndios são mais comumente tipificadas em:


fenômeno termoelétrico, fenômeno natural, fenômeno químico, origem
acidental e ação pessoal. A ação pessoal pode ser ainda subdividida em
acidental, intencional ou indeterminada. Algumas instituições adotam a
indicação de causa decorrente de ação de criança. Existe ainda a situação em
que a causa não pode ser apontada.

4.2.3.1 Fenômeno termoelétrico

Compreende todo incêndio causado por mau funcionamento da corrente


elétrica: centelhamento, desconexão parcial, sobrecarga, contato imperfeito,
grafitização, curtocircuito e sobretensão.

4.2.3.2 Fenômeno natural

Representa todo incêndio cuja causa está relacionada com comportamentos


da natureza ou anomalias da edificação: queda de raio, vendaval,
deslizamento, desmoronamento, terremoto. Este tipo de causa também
comporta a combustão natural, como o exemplo do fósforo branco.

4.2.3.3 Fenômeno químico

Toda causa de incêndio relacionado a uma reação química, espontânea


ou induzida é tipificada nesta causa. Geralmente, envolve uma reação
exotérmica, ou seja, com liberação de calor, causado pela combinação de
substâncias químicas.

4.2.3.4 Origem acidental

  Compreende toda causa relacionada a defeitos de funcionamento, fagulha ou


acidente. Isso compreende possíveis deficiências de maquinários e
equipamentos, o que permite, por meio do levantamento de dados desta
origem, solicitar, junto aos fabricantes, a correção de mau funcionamento de
eletrodomésticos e eletro-eletrônicos.

 4.2.3.5 Ação pessoal intencional

 Também conhecido como incêndio criminoso, este tipo de evento envolve dolo,
ou seja, intenção de causar o incêndio. Geralmente, é caracterizado pela presença de
múltiplos focos iniciais, comportamentos de queima anômalos ou presença de agentes
aceleradores, mais comumente, hidrocarbonetos (gasolina, álcool, querosene). Pontos
com agentes aceleradores apresentam, na maior parte das vezes, marcas de queima
em maior profundidade e seus vestígios podem ser analisados por meio de testes
laboratoriais. Para isso, é necessário que o perito saiba coletar e acondicionar
corretamente a amostra, sob pena de perder os traços deixados pelo agente
acelerador. Investigação de incêndio que envolva ressarcimento de prejuízo por meio
de seguro deve considerar esta possibilidade até que possa descartada pelos
vestígios. Incêndios criminosos com intenção de receber o valor assegurado não são
tão raros quanto deveriam.

 4.2.3.6 Ação pessoal acidental

É toda origem de incêndio decorrente de ação humana sem dolo, ou seja,


sem intenção de causar dano. Geralmente, é conseqüente de negligência,
imprudência ou imperícia. Ex: velas esquecidas acesas, cigarros mal
apagados.

4.2.3.7 Ação pessoal indeterminada

É toda origem, comprovadamente, relacionada à ação humana, porém


sem elementos que possam comprovar se a intenção foi dolosa ou
acidental. Em todo tipo de ação pessoal, os investigadores devem ser
apresentar qual o agente causador do incêndio: se chama aberta (chama
de vela, de fósforo, de chama de fogão, etc.), material incandescente
(cigarro, faísca, etc.) ou superfície aquecida. Exemplo de superfície
aquecida: vazamento de gás liquefeito de petróleo (GLP) em contato com
o forno do fogão aquecido.

4.2.3.8 Causa decorrente de ação de criança

O fogo costuma atrair a atenção de crianças e, por conseqüência,


incêndios envolvendo ação de crianças também são comuns. Este tipo
de classificação, à parte das outras ações pessoais, visa um
levantamento de dados que permita desenvolver campanhas educativas
junto à sociedade para prevenção de incêndios que envolvam crianças.
Incêndios deste tipo costumam causar queimaduras, quando não levam a
óbito, uma vez que o mais comum é que brinquem próximas a sofás ou
camas, que queimam fácil e rapidamente devido à sua carga de incêndio.
O mais comum é o uso de fósforo, mas isqueiros também são utilizados.
Geralmente, a classificação de ação de criança em um laudo pericial é
abaixo de oito anos de idade. Nestes casos, é comum encontrar: palitos
de fósforo na zona de origem do incêndio ou espalhados pelo local;
ausência da caixa de fósforos ou do isqueiro da residência no local de
costume; dificuldade de obter informações mais precisas sobre
o incêndio, principalmente da mãe da criança envolvida, por proteção.

4.2.3.9 Causa não apurada

Todas as vezes em que os vestígios existentes não puderem sustentar a


causa apontada, depois de seguida a metodologia, o laudo deve
apresentar causa não apurada, ainda que os investigadores saibam o que
causou o sinistro.
5 PRINCIPAIS INFORMAÇÕES A SEREM OBTIDAS PARACONFECÇÃO DO
LAUDO PERICIAL

Existem dados considerados essenciais em um relatório, seja ele pericial ou


técnico. Estes devem ser capazes de informar as principais características do
local sinistrado, do incêndio e das vítimas, se houver. Quanto mais
informações existirem no laudo, mais este tende a ser eficiente pelo
detalhamento do ocorrido.

5.1 DADOS DA EDIFICAÇÃO

Constituem dados essenciais do local: endereço completo; tipo de


edificação (se residencial, comercial, mista, industrial, escolar, de
concentração de público, etc.); área total da edificação em metros
quadrados; área atingida pelo incêndio em metros quadrados (todos os
compartimentos atingidos, inclusive por fuligem); área atingida somente
pelas chamas; número de pavimentos da edificação e qual(is) deste(s)
foram atingido(s) pelo incêndio; tipo de material construtivo
predominante (concreto, tijolo, madeira, madeirite, vidro, etc); se era
abastecida por energia elétrica ou não; tipo de cobertura (laje, telhado,
etc.); tipo de piso. Nas investigações de incêndios florestais, a área
queimada é mensurada em hectares.

5.2 DADOS DO INCÊNDIO

Constituem dados essenciais do incêndio: data e hora do evento; data e


hora  da realização da perícia; descrição da zona de origem do incêndio;
descrição do foco  do incêndio; descrição de como o incêndio se
propagou e de como foi a atuação dos  bombeiros (viaturas empregadas,
quantidade de agente extintor utilizado, tempo de combate e dificuldades
encontradas); relação das vítimas (quantidade, idade, condição, motivo
da lesão ou óbito e se eram bombeiros em serviço); relato
das  testemunhas (quem são, o que viram, o que presenciaram, etc.);
considerações  finais (principais observações em relação às possíveis
causas levantadas e a correlação dos elementos obtidos, de forma que
seja possível compreender o que ocorreu e porque não seria outra causa
senão a apontada); determinação da causa  do sinistro.

6 SIMULAÇÃO COMPUTACIONAL DE INCÊNDIO

Na tentativa de determinar a origem de um incêndio, freqüentemente se faz


necessária a realização de testes e ensaios que permitam determinar o cenário
mais provável. Uma ferramenta importante e muito atual é o modelamento
computacional de incêndio, onde se busca comparar o evento real com a
simulação de várias causas e cenários diferentes. Obviamente, a
simulação não traz em si todas as respostas sobre oincidente, pois é
apenas mais uma ferramenta, mas a sua utilização pelo investigador,
em conjunto com o seu conhecimento em engenharia de proteção contra
incêndio e do método científico de investigação de incêndio, faz com que
possam ser obtidos resultados bem consolidados. A simulação permite a
verificação das condições a que um local pode ter sido submetido
quando da ocorrência de um incêndio, calculando dados importantes
como:temperatura, concentração de gases como oxigênio e monóxido de
carbono, tempo para acionamento dos detectores de fumaça e calor e
dos  outros. O objetivo é o de encontrar a causa mais provável do
incêndio, mas também permite verificar se o projeto arquitetônico da
edificação foi negligente quanto àsegurança contra incêndio ou se há
falha nos sistemas de detecção e supressão, o que permitiria mudanças
necessárias nas normas e códigos de proteção contra incêndio e pânico
para evitar que um incêndio similar não aconteça no futuro. Embora todo
o embasamento físico e matemático das leis de conservação que
governam a transferência de calor, dinâmica de fluidos e combustão já
ser conhecido há mais de um século, foi apenas recentemente que o
modelamento numérico de incêndio começou a ser possível. Foi criada,
então, uma nova realidade na área de investigação de incêndio, fazendo
com que fosse possível simular situações que poderiam ter realmente
ocorrido, em comparação com as evidências físicas encontradas no
incêndio real. O primeiro modelo a atingir uma grande aplicabilidade,
devido à sua simplicidade física e computacional, foi o de duas camadas.
Ele é um modelo para simulação de incêndio em ambientes construídos e
divide o espaço em dois volumes: a camada superior quente e a camada
inferior fria (ver figura 8). Ele permite o cálculo de distribuição de fumaça,
bem como altura da camada de fumaça e a sua temperatura através
dos compartimentos de uma edificação durante um incêndio [JONES et
al., 2005]. Um exemplo de ferramenta computacional utilizada para
realizar este cálculo é o CFAST, do National Institute of Standards and
Technology

Mais recentemente, foram introduzidos modelos baseados em


dinâmica computacional de fluidos (CFD). Estes modelos se utilizam das
equações deconservação das massas, espécies, momento e energia,
dividindo-se o ambiente estudado em várias células.  

Um exemplo de programa que utiliza este tipo de modelo é


o Simulator equações de Navier-Stokes apropriada para baixa
velocidade, com fluxotermicamente dirigido e com ênfase no transporte
de calor e fumaça dos incêndios.

Este tipo de programa permite que sejam avaliadas a dinâmica de um


incêndio e o movimento da fumaça por meio de informações sobre
temperatura, densidade, pressão, velocidade e composição química em
cada célula [MCGRATTAN, 2006]. O programa que permite visualizar em
três dimensões os resultados obtidos pelos cálculos do FDS é o
Smokeview.  Entrando na sua versão 5, o FDS tem se tornado uma
ferramenta poderosa para ainvestigação de incêndios. Desde 1999, ele
vem sendo utilizado em alguns casos de Camada SuperiorCamada
inferior grande repercussão nos Estado Unidos para avaliar a dinâmica
do incêndio, como nos ocorridos em Cherry Road/DC, que vitimou dois
bombeiros [MADRZYKOWSKI e VETTORI, 1999] e na boate  duzentos
ficaram feridas [GROSSHANDLER et al., 2005].
No Brasil, atualmente está se começando a utilizar o FDS e o Smokeview
como ferramenta de auxílio à perícia, como no incêndio ocorrido em 2007
no Distrito Federal e que vitimou duas crianças, deixando seriamente
ferido mais uma pessoa.  O modelo computacional foi comparado com as
marcas de queima encontradas na cena do incêndio e com as
informações prestadas pelas testemunhas e bombeiros. Quando os
modelos foram executados, as marcas de queima apresentadas no
incêndio real ficaram extremamente próximas às marcas verificadas no
caso do cenário com a fonte de calor próxima ao berço.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal - CBMDF, Laudo de


investigação de incêndio, 2003.

DEHAAN J. D.,

FORNEY G.P.,

Seminar / National Institute of Standards and Technology 2005.

GROSSHANDLER, W.; BRYNER, N.; MADRZYKOWSKI, D.; KUNT, K.

Technical Investigation of The Station Nightclub Fire, National Institute of


Standards and Technology

JONES, W.; PEACOCK, R.D.; FORNEY, G.P.; RENEKE, P.A.

Consolidated Model of Fire Growth and Smoke Transport, National


Institute of Standards and Technology

LILLEY, D. G., Fire investigation: Origin, Cause, and Responsibility,


Proceedings of the 32nd Intersociety - Energy Conversion Engineering
Conference, Volume 1, pág. 631-635, 1997.

MADRZYKOWSKI, D.; VETTORI, R.,  Cherry Road N.E MCGRATTAN K.,


Editor,  National Institute of Standards and Technology 6467, 2000.

Explosion Investigation PEDERSEN, K.S., 2005.

The Geneva Association Newsletter, World Fire Statistics

You might also like