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O contributo de Neil Smith


para uma geografia crítica
da gentrificação
Por Luís Mendes

RESUMO
Este artigo baseia-se na discussão e reflexão sobre as questões gerais inerentes ao Luís Mendes
paradigma marxista da Geografia e sua repercussão nos conceitos e metodologia luis.mendes@ceg.ul.pt
que Neil Smith utiliza, desde o final da década de 1970 até ao presente, para com-
Instituto de Geografia
preender e analisar a gentrificação enquanto processo de reestruturação urbana.
e de Ordenamento do
Vamos procurar interpretar este tema da geografia urbana à luz da contribuição de
Território da Universidade
Smith, dentro do quadro geral de posições normativas da Geografia Crítica que
de Lisboa. Mestre em
explica a realidade social e espacial no âmbito da Epistemologia e da Filosofia da
Estudos Urbanos pelo
Ciência em geral.
Departamento de Geografia
Palavras-chave: Gentrificação, Geografia Crítica, Geografia Marxista, Estudos da Faculdade de Letras da
Urbanos, Neil Smith. Universidade de Lisboa. É
Investigador Permanente do
Instituto de Geografia e de
ABSTRACT Ordenamento do Território
da Universidade de Lisboa.
This article is based on the discussion and reflection about the general issues inhe-
rent in the Marxist paradigm of Geography and its repercussion in the conceptu-
alisation and methodology that Neil Smith has used, since the end of the 1970s
until the present, to understand and analyse gentrification as a process of urban
restructuring. We will thus seek to interpret the theme of urban geography in the
light of Smith’s contribution, within the framework of general normative posi-
tions of Critical Geography that explains the social and spatial reality within the
Epistemology and the Philosophy of Science in general.
Key-words: Gentrification, Critical Geography, Marxist Geography, Urban Stu-
dies, Neil Smith.

nº 01 ▪ ano 1 | maio de 2010 ▪ e-metropolis 21


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INTRODUÇÃO no espaço e sobre ele. A produção do espaço urbano


é desenvolvida aqui, dentro da perspectiva aberta
Este artigo baseia-se na discussão e reflexão sobre pelo materialismo dialéctico. Ao propor a dialética
as questões gerais inerentes ao paradigma marxista socio-espacial, Richard Peet (1978) e Edward Soja
da Geografia e sua repercussão na conceptualização (1980) têm apoiado, aperfeiçoado e desenvolvido as
e metodologia que Neil Smith utiliza, desde o final ideias básicas da visão lefebvriana, bem como Smith,
da década de 1970 até o presente, uma contribuição princípio sempre presente na análise da reestruturação
de décadas que o autor representa para o desenvolvi- do espaço urbano.
mento do estudo da gentrificação. A proposta deste O espaço urbano não é imutável. Tal como o
trabalho é compreender e analisar o modo como, para sistema económico e social, ele transforma-se, pelo
este académico, a gentrificação é um processo de re- que as suas estruturas materiais e a organização mu-
estruturação urbana e de lutas de classe, um produto dam de feição. O sistema produtivo resulta da articu-
social de um modo específico de produção, marcado lação dos elementos de produção, consumo, circula-
pela reestruturação económica que é característica ção ou distribuição e gestão. Todos estes elementos
do capitalismo tardio e avançado, particularmente estão relacionados entre si e modelam o espaço, não
condicionado por um regime de acumulação de só porque se realizam mediante estruturas localizadas,
capital mais flexível, que lhe é subsidiário. Discutire- mas também pelas relações que mantêm, e que se ar-
mos as características básicas deste paradigma que ticulam no espaço geográfico. Assim, as modificações
a geografia da reestruturação do espaço urbano de na produção e apropriação do espaço urbano estão
Neil Smith mobiliza para explicar a gentrificação. sempre associadas às dinâmicas globais da economia,
Portanto, vamos procurar interpretar este tema da isto é, ao modo de produção capitalista subjacente,
geografia urbana à luz da contribuição de Smith, funcionando, em simultâneo, como uma forma de
dentro do quadro geral de posições normativas deste expressão espacial destas (talvez a mais importante
movimento crítico que explicam a realidade social e e visível) e, também, como um dos meios que pos-
espacial no âmbito da Epistemologia da Geografia e sibilitam a sua sustentação. Portanto, o espaço não é
da Filosofia da Ciência em geral. uma entidade neutra, vazia de conteúdo social. Cada
sociedade produz os seus espaços, determina os seus
ritmos de vida, modos de apropriação, expressando
1. A gentrificação e a produção social
a sua função social, pelas formas através das quais o
do espaço urbano no plano das lutas de
ser humano se apropria e que vão ganhando o signifi-
interesses e objectivos de classe
cado dado pelo uso. É o princípio do espaço como
Uma discussão teórica acerca dos princípios marxistas categoria social real, o espaço-resultado, construído
que orientam o estudo da gentrificação não poderá e em construção, o espaço real como demarcação de
menosprezar uma reflexão cara aos geógrafos radicais práticas sociais precisas, realidade que não prescinde,
em geral, e a Neil Smith em particular, ao nível em hipótese alguma, da vitalidade histórica que lhe é
das categorias centrais associadas ao pensamento imprimida por uma sociedade concreta.
geográfico, como é a produção social do espaço e a Neil Smith, o geógrafo crítico urbano que dedi-
relação sociedade-espaço. O conceito de produção cou grande parte da sua carreira ao estudo da gen-
social do espaço fica a dever-se à obra de referência de trificação, destaca nos seus textos uma clara pers-
Henri Lefebvre (1974), cujo contributo influenciou pectiva marxista pelo fato de, transversalmente aos
de forma determinante o universo teórico marxista argumentos que apresenta, supervalorizar com muita
e a produção científica da teoria social, incluindo a relevância a relação espaço-sociedade, a partir do de-
dos geógrafos David Harvey, Neil Smith, Allen Scott senvolvimento do conceito de modo de produção.
e Edward Soja, entre muitos outros. O enfoque À semelhança de Lefebvre (1974), também Smith
de Lefebvre visa menos ao processo de produção e nos seus escritos defende que cada sociedade, cada
mais à reprodução das relações sociais de produção modo de produção, produz um espaço dominante,
que, diz o autor, constituiu o processo central e que lhe é próprio e que se sobrepõe a todos os ou-
oculto da sociedade capitalista. E este processo é tros. O espaço social (urbano) é produto e produ-
essencialmente espacial. A produção das relações tor de relações de produção e de reprodução de uma
sociais de produção não ocorre somente na fábrica, dada sociedade. Reforça-se a componente social na
nem tampouco numa sociedade como um todo, de consubstanciação da análise geográfica. O espaço é
acordo com Lefebvre, mas no espaço como um todo. grandemente definido pela divisão espacial do tra-
As relações espaciais são geradas logicamente, mas balho como produto direto da morfologia social
tornam-se dialetizadas através da atividade humana hierarquizada e diferenciada, e cuja reprodução se

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encontra vinculada ao carácter social e histórico do espaço, numa concepção que não crê num espaço
capitalismo na produção do espaço. sem as marcas da sociedade que historicamente se
Revisitar o conceito de espaço é, atualmente, expressa em processos reais e mais complexos. Esta
fundamental. Primeiro porque as relações sociais é a proposta desenvolvida por Smith (1986a) e por
de produção têm uma existência social enquanto e- Harvey (1987): descortinar as formas concretas que
xistência espacial, isto é, projetam-se concretamente qualificam e determinam a relação sociedade-espaço
no espaço (Soja, 1989). Segundo, porque o encur- na base da gentrificação e cuja historicidade a define
tamento das distâncias, associado a uma importante como processo permanente de socialização do espaço
compressão espaço-temporal, decorrente do desen- urbano. Este mesmo processo segmenta-se em várias
volvimento acelerado dos meios de comunicação e áreas centrais defendidas e controladas por determi-
transporte, estimula estratégias globais, sob o signo nados grupos sociais de maior poder socio-económi-
da reestruturação do sistema econômico, no sentido co, definido e delimitado por relações de poder. Ain-
de alterações na organização da produção assentes na da a propósito da crítica que constrói em torno da
desintegração vertical, fragmentação das linhas de promiscuidade gerada entre este tipo de relações de
montagem e desenvolvimento de estratégias de sub- poder e o discurso de modernidade urbana associado
contratação (Harvey, 1989). Estas alterações são, em à gentrificação, Smith (1986a, 1992b) aplica a me-
última análise, responsáveis pelo processo de gentri- táfora do avanço da fronteira da colonização norte-
ficação, pois estimulam a desconcentração do capital americana do século XVIII sobre os territórios já
produtivo do centro para a periferia e estão na base previamente ocupados pela população indígena e faz
da formação do “rent gap”, como veremos adiante. o paralelo com a situação actual de “displacement”
Nesta perspectiva, surge a necessidade de supe- provocado pela gentrificação.
ração da noção de espaço como mero produto so- Neil Smith insere-se indubitavelmente na escola
cial, apenas como palco das relações sociais, ultra- de pensamento marxista quando procura expor e de-
passando a exterioridade que tal noção apresenta nunciar as injustiças e desigualdades sociais decor-
em relação à sociedade. O que, em última instân- rentes das bases econômicas do funcionamento do
cia, Neil Smith argumenta como fio condutor dos modo de produção capitalista, reforçando a ideia de
seus estudos é que a gentrificação no espaço urbano que as relações sócio-espaciais estruturadas pela gen-
central intervem na produção e organização do tra- trificação são reguladas pelas estruturas capitalistas e
balho produtivo, ao mesmo tempo que determina as que se enquadram como meios de reforçar e repro-
relações de produção, é também, simultaneamente, duzir a riqueza e o poder da classe dominante, por
produtora e produto, suporte das relações sociais e, via da exploração do trabalho da classe dominada. A
portanto, tem um papel importante no processo de mediação introduzida no espaço residencial urbano
reprodução geral da sociedade. Tem-se, com efeito, pela gentrificação, enquanto estratégia residencial
uma produção espacial que se manifesta sob as for- específica, detém uma responsabilidade grande na
mas de apropriação, utilização e ocupação de uma fabricação de determinados padrões de diferenciação
dada área, num momento específico que se revela social do espaço urbano que, em última análise, re-
no uso, como produto da divisão social e técnica do forçam a segregação sócio-espacial.
trabalho e que, no seio do processo capitalista, pro- A gentrificação é, por definição, um processo de
duz uma morfologia espacial “fragmentada” e hierar- “filtragem social” da cidade. Vem desencadear um
quizada, contribuindo para um aprofundamento da processo de recomposição social importante em bair-
divisão social do espaço urbano. Esta conclusão só ros antigos das cidades, indiciando um processo que
pode ser válida para um autor que defende o con- opera no mercado de habitação, de forma mais vin-
ceito marxista de modo de produção e o inscreve na cada e concreta nas habitações em estado de degrada-
explicação que tece em torno da reestruturação do ção dos bairros tradicionalmente populares. Corre-
espaço urbano. spondendo à recomposição (e substituição) social
Assim, o paradigma da geografia marxista encon- desses espaços – tradicionalmente da classe operária/
tra-se presente na terminologia de Neil Smith quando popular – e à sua transformação em bairros de classes
este reconhece importância ao objetivo de identificar média, média-alta – não se pode deixar de referir,
como as relações sociais entre classes, mediadas pelas por conhecimento deste processo de “substituição
estratégias residenciais encabeçadas pela gentrifica- social”, o reforço da segregação sócio-espacial, que
ção, variam no espaço urbano de forma a reproduzir na sua sequência parece aprofundar a divisão social
e sustentar os modos de produção e consumo capita- do espaço urbano (Smith e LeFaivre, 1984).
listas e a ordem social estabelecida. O autor valoriza a Smith (1996a, 2001, 2002, 2005) deixa claro que
possibilidade de se trabalhar uma relação sociedade- os projectos de regeneração urbana, que suportam a

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promoção ideológica da gentrificação, alimentam A partir desta perspectiva, os teóricos da acumu-


equívocos vários no que diz respeito às supostas in- lação de capital explicam que os processos de desen-
tenções iniciais de reabilitação habitacional e inte- volvimento da cidade ou urbanização são a manifes-
gração/fixação da população de menor estatuto sócio- tação espacial do processo de acumulação de capital.
econômico já anteriormente residente nos bairros da Na prática, os teóricos defensores desta tese ressaltam
cidade centro alvo de intervenção. De resto, nesses os aspectos estruturais desse processo e relacionam-
contextos, o “filtering up” que a gentrificação pres- nos com o desenvolvimento urbano. De todos os
supõe – pelo processo de substituição social que im- teóricos que trabalham neste veio, David Harvey e
plica, de classes de menor estatuto sócio-econômico Allen J. Scott destacam-se pelas suas tentativas de
pelas de maior – faz antever o acentuar dos traços de apreender a natureza inter-relacionada do desenvol-
segregação sócio-espacial nas áreas onde o fenômeno vimento capitalista e da forma espacial urbana. De
tem lugar. motor de crescimento, a cidade tornou-se um espaço
Nestes termos, ao mesmo tempo que produto so- organizado para o investimento de capital. As con-
cial e meio, o espaço é também instrumento da ação, tradições experimentadas no espaço construído são
meio de controle, logo, de dominação e de poder, reproduzidas por causa dos passos dados para con-
que produz simultaneamente uma hierarquia dos verter o capital financeiro no elo mediador entre o
lugares centrada no processo de acumulação, uma processo de urbanização (em todos os seus aspectos,
(re)centralização do poder. Sendo assim, ao procurar inclusive a edificação de ambientes construídos) e
uma análise que centralize a importância da relação as necessidades ditadas pela dinâmica subjacente do
dialética entre condições sociais diferenciadas no capitalismo.
espaço urbano e estruturas econômicas emergentes Este ponto introdutório obriga-nos a revisitar a
decorrentes da acumulação flexível, no contexto de relação entre a produção do espaço construído e as
globalização econômica, Neil Smith recorre a uma crises no processo de acumulação de capital estudada
argumentação e reflexão tipicamente marxista na por Harvey (1975, 1978, 1982, 1985). Este autor
medida em que se preocupa em demonstrar que a identifica três circuitos distintos de acumulação de
sociedade urbana se encontra estruturada com vista a capital. O circuito primário, que se refere à organiza-
permitir a perpetuação da produção de capital. ção do próprio processo produtivo, por exemplo,
com a aplicação de tecnologia e trabalho assalariado
para produzir bens em troca de lucro. O circuito
2. A gentrificação e a teoria de secundário, que implica investimento no ambiente
acumulação de capital: o movimento construído. Finalmente, o circuito terciário que diz
cíclico do capital e produção do espaço respeito ao investimento em ciência e tecnologia e
construído numa ampla gama de despesas sociais relacionadas,
Um pressuposto marxista marca transversal- principalmente, com os processos de reprodução da
mente todos os pontos dos contributos dos estudos força de trabalho. A competição entre capitalistas
geográficos críticos da gentrificação, levados a cabo resulta em superacumulação. No total é produzido
por Smith: as relações espaciais e capitalistas estão ar- capital em demasia, comparativamente à existência
ticuladas dialeticamente. Se as necessidades de capi- de oportunidades para empregar esse capital. Uma
tal se manifestam no espaço, as mudanças espaciais solução temporária para esse problema é uma mudan-
manifestam-se nas necessidades de capital. Todos os ça do fluxo de capital para outros circuitos. Quando
analistas urbanos marxistas que propõem estudos a isso é feito em relação ao circuito secundário, temos a
partir deste princípio teórico concordariam com a produção do ambiente construído. Por conseguinte,
ideia de que a análise da produção social do espaço na perspectiva de Harvey, o montante periódico de
requer uma crítica do processo de acumulação capi- investimento e a consequente valorização do ambi-
talista. A acumulação de capital – ou a produção de ente construído estão claramente indicados nos rit-
mais-valia – é a força que impulsiona a sociedade mos cíclicos do processo de investimento de capital
capitalista. Por sua própria natureza, a acumula- no espaço.
ção de capital necessita da expansão dos meios de A dinâmica dos ciclos de investimento e desinves-
produção, da expansão do tamanho da força de tra- timento do capitalismo explica os estágios na cons-
balho assalariada, da expansão da atividade de circu- trução do ambiente construído. Neil Smith (1979a,
lação na medida em que mais produtos se tornam 1979b), no fim dos anos 70, aplicou este princípio
mercadorias e da expansão do campo de controlo da de forma inovadora e crítica ao caso da gentrificação,
classe capitalista dominante (Smith, 1982a, 1982b, dando o mote para um salto teórico incontornável
1984; Harvey, 1985). no estudo deste processo. Até então, a maioria da

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literatura apenas incidia nos efeitos da gentrificação: imobiliário. Portanto, percebe-se que a partir do pós-
características sócio-econômicas e culturais dos “gen- guerra, o capital se tenha passado a dirigir preferen-
trifiers” enquanto migrantes, o desalojamento pro- cialmente para o setor da construção, em detrimento
vado pela sucessão residencial, as iniciativas estatais do setor tradicional da produção industrial, gerando
de redesenvolvimento urbano e os benefícios para a importantes recomposições na expansão e organiza-
cidade. Pouco esforço tinha sido feito para construir ção espacial da forma urbana (Gottdiener, 1985).
uma explicação histórico-política e comprometida O ambiente construído tornou-se o cenário de
com os então emergentes princípios da geografia altos e baixos cíclicos no mercado imobiliário, com
crítica e marxista, incidindo nas causas estruturais, a existência paralela de deterioração e de supercons-
em detrimento dos efeitos. Numa primeira fase de trução. Os dois fenômenos são produzidos pelo pro-
estudo da gentrificação predominavam análises des- cesso de construção na cidade sob relações sociais
critivas e isoladas sem qualquer esforço de contex- capitalistas e têm subjacente a ideia de que o cresci-
tualização e de enquadramento teórico do processo. mento urbano desigual é intrínseco à natureza capi-
Apresentando um carácter iminentemente empiricis- talista de desenvolvimento. Inaugura-se, assim, um
ta, as investigações recaíam sobre estudos de caso que novo ciclo: o da valorização/desvalorização do espaço
apenas focavam as transformações físicas e sociais em urbano nos mercados regionais de solo, com início
determinados bairros, entendendo-as como produto do processo de suburbanização.
da ação de alguns indivíduos autônomos, não con- Os processos de suburbanização e emergência
templando as diversas dinâmicas estruturais que a do “rent gap” são estudados por Neil Smith (1979a,
condicionam e que a moldam. Numa segunda fase 1979b, 1982a, 1987a, 1996c; Smith e Schaffer,
do estudo da gentrificação destacou-se a importân- 1986; Smith et. al. 2001) como predominantemente
cia da reabilitação urbana e as suas implicações ao responsáveis pela forma como o processo de reestru-
nível dos usos do solo e da valorização fundiária que turação urbana se apresenta nos dias de hoje. Isto
sucede aos processos de reabilitação (Smith e Wil- porque o movimento de saída de capital para a peri-
liams, 1986). Numa terceira fase, a análise deste feria provoca uma alteração inversamente proporcio-
fenômeno centrou-se nas esferas da produção e do nal dos níveis de renda do solo dos próprios subúr-
consumo. As explicações tenderam a dicotomizar-se, bios e dos bairros centrais. Enquanto o valor do solo
procurando, cada uma delas, privilegiar a supremacia nos subúrbios aumenta significativamente com o
de uma esfera em relação à outra no estudo do pro- crescimento de novas construções e infra-estruturas,
cesso de gentrificação. e com a consequente introdução nesses espaços de
Para Smith, e do ponto de vista da circulação do uma multiplicidade de atividades, o valor fundiário
capital, os “booms” imobiliários aliados à gentrifi- dos bairros centrais, ao invés, sofre uma progressiva
cação coincidem com a transferência do capital do diminuição, sendo cada vez menor a quantidade de
circuito primário de acumulação (a esfera produti- capital canalizado e investido na manutenção, repa-
va) para o circuito secundário (produção do ambi- ração e recuperação do parque habitacional destas
ente construído) em épocas de excesso de liquidez áreas no interior das cidades.
e problemas de acumulação registadas no processo Deste fenómeno resultou o que Neil Smith de-
produtivo. À luz deste princípio, Smith procura ex- nominou de emergência do “rent gap” nos bairros
plicar a reestruturação do espaço urbano como um centrais – acentua-se a diferença entre a atual renda
processo intimamente ligado à própria reestrutura- capitalizada face ao presente uso do seu solo, e a
ção da economia capitalista, mais precisamente, aos renda que potencialmente poderá a vir a ser capital-
ciclos macroeconómicos de evolução irregular que izada tendo em conta a sua localização central. É pre-
marcam o desenvolvimento das sociedades de capi- cisamente o movimento de saída de capital para os
talismo avançado. Segundo o autor, e à semelhança subúrbios e o consequente surgimento do fenómeno
do pensamento de Harvey, o desenvolvimento do “rent gap” no espaço urbano central que, segundo o
capitalismo resultou, em parte, na superprodução autor, cria maiores oportunidades econômicas para
das comodidades geradas, o que provocou uma inev- a reestruturação urbana dos bairros centrais e para o
itável quebra dos lucros no domínio da produção e, investimento público e privado, na reabilitação e re-
consequentemente, uma crise no seu interior. Deste cuperação do seu parque habitacional. Corresponde
modo, na sua concepção, esta crise do capitalismo só a um fenômeno de ocorrência quase universal em
conseguiu ser atenuada e superada por intermédio todas as cidades das sociedades de capitalismo avan-
de novas oportunidades e de novas formas de canali- çado.
zação do investimento para setores que permitissem A conclusão lógica da aplicação do princípio “rent
uma rápida e eficaz reprodução, designadamente, o gap” decorre do princípio da análise urbana marxista

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de que o desenvolvimento espacial desigual e a des- da população já existente, a modernização do tecido


valorização periódica do espaço construído (neste econômico, o aumento do emprego e o crescimento
caso, as áreas históricas do centro da cidade que se econômico; a verdade é que não deixa também de
vão degradando progressivamente) são “funcionais” funcionar como mecanismo de legitimação do poder
e produzidos intencional e deliberadamente para ga- instituído e da mobilização de grande investimento
rantir o futuro investimento de capital e a respectiva público que, em última análise, é desviado do auxílio
reprodução. Para cada “zona de crescimento” que aos mais carentes, funcionando como subsídio aos
representa uma área de intensa atração de investi- mais ricos (bancos, instituições financeiras, grandes
mento (subúrbios), existe uma “zona de transição” grupos econômicos e de construção civil, empreen-
(centro histórico), onde o capital fixo é desvalorizado dedores, governantes, etc.).
antes que os especuladores tirem vantagem do rede- Denota-se neste percurso o caráter impregnada-
senvolvimento. O desenvolvimento desigual é inten- mente ideológico, característico do marxismo, bem
sificado pela necessidade funcionalista do processo de como a necessidade do despontar de perspectivas de
acumulação de capital em desvalorizar os seus inves- futuro alternativas e a ideia de resistência política,
timentos passados, de forma a melhor se reproduzir intenções que se têm vindo a intensificar no discurso
por via de uma “destruição criativa” (Smith, 1982a, do autor. Como dedução preliminar destas inten-
1982b, 1984, 1987a; Smith, N. et al. 1989). ções, poderá dizer-se que Smith insiste nos princípios
Deste modo, com a fase de suburbanização do que estabelecem que na sociedade capitalista o con-
capital e com os investimentos canalizados para a pe- junto de leis que a regem é necessariamente burguês
riferia, certos bairros centrais da cidade, sofrendo um (sob domínio das classes dominantes, em termos so-
processo de desinvestimento nas suas áreas, passaram ciais e econômicos) e existe para servir os interesses
a capitalizar significativamente abaixo o seu poten- do capital e não da maioria social. O mesmo pode
cial valor de renda. Contudo, mais recentemente, a ser dito do Estado que, mesmo sob o disfarce libe-
procura de localizações para um investimento seguro ral e formalmente voltado (no sentido de discurso
e lucrativo em áreas metropolitanas, e face a um solo teórico) para o interesse de toda a sociedade, repre-
suburbano já saturado e mais dispendioso em ter- senta particularmente sob este modo de produção a
mos relativos, canalizou o capital público e privado dominação da “classe burguesa”, isto é, dos grupos
para aquelas áreas subvalorizadas (atendendo à sua de maior estatuto social e econômico e dos interesses
localização central), empreendendo-se ações (desde a do capital.
reabilitação à simples especulação imobiliária) visan- O poder central assegura uma forte estabilização
do a obtenção de lucros através da diferença entre do sistema territorial e reforça a sua capacidade de
a renda capitalizada real e a potencial. Em suma, o resistência à mudança social pois a administração
processo de gentrificação resulta, em parte, do desen- fomenta a hierarquia e a procura social através dos
volvimento irregular e flexível do mercado do solo processos de planejamento e das políticas urbanas
urbano, integrando-se no processo de acumulação de de regeneração da cidade centro3. As intervenções
capital. públicas que provocam valorização da cidade desen-
cadeiam mecanismos contraditórios de expulsão e de
3. Working-class residents can take reapropriação. As novas políticas urbanas traduzem
back control of their homes1: O discurso uma maior orientação para o mercado e para os con-
ideológico de crítica e intervenção social – sumidores, em detrimento das classes mais desfavo-
a denúncia dos mecanismos de legitimação recidas. O autor reconhece que, em larga medida,
do poder instituído no neoliberalismo o desenvolvimento de parcerias público-privado
urbano que neste quadro é frequente se desenhar, consti-
tui um verdadeiro subsídio aos mais ricos, ao tecido
Imbuído de um papel de intervenção e crítica social, empresarial mais poderoso e às funções e relações
Neil Smith (1995b, 1996a, 2001, 2002, 2005a) tem
denunciado já há algumas décadas, mas sobretudo
3
recentemente, que o discurso “regenerativo” da gen- A regeneração urbana surge materializada como conceito em
trificação no âmbito de políticas urbanas de valoriza- Inglaterra no início dos anos 80, como a forma privilegiada
desenvolvida pelo governo de M. Tatcher para a intervenção
ção da imagem da cidade2, ainda que vise a fixação nos tecidos urbanos obsoletos. São então criadas as “Enter-
prize Zones”, áreas específicas dentro das cidades inglesas
1
Smith (1996b): 358. para as quais é desenhado um pacote específico de medidas
2
A gentrificação dos novos produtos imobiliários e reestru- e incentivos. São igualmente criadas as “Urban Development
turação urbana, no quadro de um incremento da competi- Corporations”, entidades que materializam as parcerias e que
tividade inter-urbana e da ofensiva neoliberal nos governos asseguram o investimento privado necessário para a regenera-
urbanos. ção (Smith, 2001, 2002).

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estratégicas de controle, poder e dominação do es- reprodução social das classes de maior estatuto sócio-
paço urbano, condição fundamental na perpetuação econômico (Smith, 1993; Smith e Low, 2006).
da reprodução do capital, premissa essencial para o Defende-se que a mera crítica e o desperdício de
suporte do sistema de produção e consumo capita- esforço político em defender políticas que se ocu-
lista. Tudo isto à custa dos investimentos em serviços pam do limitar as causas da desigualdade esbarram
locais de consumo coletivo. É que se, em última em obstáculos de maior nível e de difícil superação,
análise, a atração e o crescimento propiciados pela pois as forças geradoras de formações sócio-espaciais
gentrificação a todos beneficiam, em primeiro lugar desiguais na estrutura urbana mantêm-se. Acresce-
ganham os promotores imobiliários, as empresas e se ainda o fato de que a classe operária, segundo
as instituições financeiras, muito frequentemente à Smith (1996b), se encontra alienada e pulverizada,
custa da expulsão dos residentes e das empresas mais desprovida de capacidade de mobilização: «The un-
débeis dos lugares requalificados, lançados por via fortunate truth is that the comparatively low levels
desta (des)valorização, num processo de exclusão. of working-class struggle since the Cold War (with
A seletividade dos investimentos favoráveis à re- the exception of those during the late 1960’s, and in
produção do capital implica o abandono, o esqueci- much of Europe during the early 1970’s) have meant
mento e a menor atenção à “cidade da maioria”, com that capital has had a fairly free hand in the struc-
particular gravidade para as áreas mais carentes onde turing and restructuring of urban space. This does
se concentram os mais desfavorecidos. É a emergên- not invalidate the role of class struggle; it means that
cia da cidade revanchista produzida pela ofensiva with few exceptions it was a lopsided struggle during
neoliberal e que Smith tem explorado mais recente- this period, so much so that the capitalist class was
mente (1996a, 2001, 2002, 2005a). O autor desven- generally able to wage the struggle through its eco-
dou, desta forma, a máscara social de compreensão nomic strategies for capital investment» (p.356).
e “bondade institucional” inerentes a estes recentes Daí a ideia decorrente da necessidade de uma
produtos imobiliários da nova gestão urbana, ar- revolução econômica e social que contribua para a
gumentando como estes promovem uma lógica de derrocada do capitalismo e sua substituição por um
controle social favorável à reprodução do capital e modo de produção que esteja organizado em torno
às classes dominantes. É neste aspecto que reside o dos princípios de igualdade e justiça social. Para o
fundamental do discurso político crítico do autor no marxismo, só a perspectiva de transformar o mundo
seu trabalho mais recente da última década. fornece a possibilidade de compreendê-lo. Só a visão
O seu contributo, tal como o paradigma marxista crítica permite apreender a essência dos processos
que o impregna, está ideologicamente vinculado e sociais. Só a inserção no movimento global propicia
assenta em questões com objetivos políticos bem de- o seu entendimento. Esta visão do objeto de estudo
terminados. O marxismo estabelece que a desigual- revela-se de forma muito evidente nos últimos
dade é inerente ao modo de produção capitalista. trabalhos de Neil Smith. A Geografia é proposta
A desigualdade produz-se inevitavelmente no pro- como elemento na superação da ordem capitalista.
cesso normal das sociedades capitalistas e não pode É desta ideia particularmente marxista e de forte
ser eliminada sem alterar de modo fundamental os intervenção crítica e social que Neil Smith partilha
mecanismos do capitalismo. Ademais, forma parte igualmente. Primeiro, quando se posiciona por uma
do sistema, o que significa que os detentores do transformação da realidade social, pensando a sua
poder têm interesses criados em manter a desigual- argumentação geográfica como uma arma política
dade social. Ao nível do redesenvolvimento urbano, nesse processo (Smith, 1998, 2000, 2005c). Segundo,
Smith enquadra-se perfeitamente neste contexto de quando não coloca dúvidas à necessidade da ação
pensamento. Nota como as ações de reabilitação e política de oposição da classe trabalhadora residente
regeneração urbana, no âmbito do processo de gen- nas áreas centrais da cidade ou de outros movimentos
trificação, determinadas, igualmente, pela neces- sociais urbanos, à hegemonia capitalista, representada
sidade de melhorar a imagem da cidade, de a tor- pela ofensiva da classe burguesa que para o autor
nar mais atrativa num quadro e cenário estratégicos a gentrificação encerra (Smith, 2008b). Terceiro,
de competitividade global entre cidades; implicam, quando reforça uma importante componente social,
muito frequentemente, a expulsão de habitantes crítica e ideológica, consubstanciada na análise
de menor estatuto sócio-econômico das áreas cen- geográfica dos processos de (re)produção social do
trais, condenados, doravante, a uma marginalidade espaço urbano, a nível multiescalar desde o local ao
sócio-espacial, algo diretamente correlacionado com global (Marston e Smith, 2001; Cowen e Smith,
modelações ideológicas que visam a manutenção da 2009).

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ARTIGOS

CONSIDERAÇÕES FINAIS
primeira é de que a ação sócio-espacial dos “gentri-
Poucas correntes acadêmicas no seio da teoria fiers” tende a ser subordinada à estrutura econômica.
social e espacial podem reivindicar uma continui- A segunda, e que deriva em parte da primeira, tem
dade, um crescimento e uma acumulação literária que ver com o fato destes autores privilegiarem uma
significativos ao longo de todo o século XX como abordagem causal unidimensional, insistindo em ex-
o marxismo. São vários os sentidos em que se pode plicações de tipo materialista. É atribuída uma im-
considerar Marx como um teórico social clássico portância explicativa bastante exagerada aos aspec-
típico. Mas aquele que diz mais respeito à análise tos instrumentais e coercivos das estruturas sobre a
social urbana refere-se aos conceitos-chave de modo agência.
de produção, de alienação e de luta de classes que De acordo com Hamnett (1991, 1992), a teo-
tiveram uma enorme influência no desenvolvimento ria urbana de índole marxista de Neil Smith é capaz
da teoria sócio-espacial ao longo do passado século. de oferecer explicações convincentes acerca do efeito
O marxismo fundou e ajudou a estabelecer uma rica das estruturas materiais, bem como das causas das
e sofisticada tradição na geografia da dinâmica do desigualdades sócio-espaciais produzidas pelo avanço
modo de produção capitalista, centrada na discussão da fronteira da gentrificação na paisagem urbana e
dos processos estruturais (que mais tarde seriam fun- dos conflitos que daí derivam, mas as suas explicações
damentais como argumentos da produção social do da estrutura repousam essencialmente em princípios
espaço de Lefebvre, como vimos anteriormente), utilitaristas e instrumentais que não permitem aos
como a concentração monopolista, a expansão im- aspectos culturais e subjetivos da produção do espaço
perialista e o papel comprometido e regulador do urbano ocupar uma posição mais regular nas análises
Estado no planejamento e economia urbanos. Para realizadas. A visão marxista relaciona-se, desta feita,
além dos estudos urbanos, o marxismo teve ainda com um certo determinismo econômico, sobrevalo-
uma influência profunda na evolução do pensamen- rizando a posição explicativa dos fatores considera-
to geográfico, quer na forma como se analisam os dos econômicos na evolução dos processos sociais,
processos de mudança histórica de longa duração nos espaciais e políticos.
territórios, quer nos estudos do desenvolvimento do Mesmo assim, ainda que seja verdade que certas
Terceiro Mundo (Smith, 1979c). formulações marxistas parecem conduzir a uma ten-
Todavia, a partir da última década do século XX, tativa de explicar a mudança social e espacial por de-
a influência do marxismo tem vindo a diminuir. As terminismos econômicos e tecnológicos, uma análise
causas disso são altamente complexas e, em grande mais atenta da produção literária neste domínio pos-
medida, estão mais relacionadas com dinâmicas so- sibilita a verificação de que para os teóricos urbanos
ciais contemporâneas do que com deficiências in- marxistas os movimentos de reestruturação urbana
telectuais intrínsecas à teoria marxista. Tais dinâmi- são explicados fundamentalmente pelas configura-
cas incluem a vigorosa permanência do capitalismo ções que as trocas sociais assumem num determinado
enquanto sistema social, o fracasso das sociedades so- momento histórico. Assim, quer a cidade capitalista
cialistas e comunistas da Rússia e da Europa de Leste moderna, quer a pós-moderna, são ambas essencial-
e as críticas ambientalistas que o Ocidente tem da mente modeladas pelas formas dominantes que o
Natureza enquanto domínio que deve ser totalmente trabalho pode assumir e pela divisão social do espaço
manipulado e dominado. Tornam-se, no final do urbano que produz.
século XX, claras as limitações teóricas do marxismo A maior parte dos autores da gentrificação ainda
enquanto paradigma dominante na geografia, em influenciados pelo marxismo admite que a superes-
geral, e nos estudos urbanos, em particular. Primeiro, trutura também influencia a infra-estrutura. A base,
nem Marx, nem a tradição subsequente de estudos alimentada pelas relações sociais de produção e pelas
marxistas, conseguiram resolver o problema do dua- forças produtivas, constitui o fundamento da estru-
lismo da estrutura e da agência. turação das diversas formações sociais e das compo-
Se bem que apesar das limitações marxistas exista nentes ideológicas e políticas da superestrutura. Os
um reconhecido mérito por parte da comunidade fatores políticos e ideológicos, embora mantenham
científica das ciências sociais e humanas pela aná- uma relativa autonomia e detenham também uma
lise que os autores marxistas fazem de como o poder capacidade de retorno sobre a economia, podendo
econômico influencia a ordem social através dos até ser dominantes em algumas formações sociais,
mecanismos políticos e econômicos, muitas vezes são, contudo, determinados, em última instância,
através de estruturas profundas, a verdade é que as pela infra-estrutura (Smith, 1987b, 1992a, 1999).
respostas avançadas por este paradigma na análise Esta posição, partindo do pressuposto materialista de
urbana da gentrificação apresentam duas falhas. A que é a economia que determina a consciência social,

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ARTIGOS

quer na vertente política, quer na vertente ideológi- sedutora estratégia: extinguir a metanarrativa ao
ca, além de reforçada pelas considerações elaboradas desconfiar da totalidade do modelo moderno e dos
de Althusser, encontra realmente alguma fundamen- regimes singulares de verdade. É, simultaneamente,
tação nos escritos de Marx e Engels. a sua maior fraqueza.
Na atualidade, todavia, não reúne unanimidade Persiste a incapacidade da condição pós-moderna
entre os marxistas, sendo mesmo de destacar que, se afirmar enquanto bloco teórico coerente e único,
por parte não só de críticos do marxismo, como o que nos leva a considerar que a teoria sócio-espacial
também de alguns neomarxistas, se têm desenvolvi- pós-moderna se caracteriza mais pelas modas e pela
do contributos que defendem que este determinismo fragmentação do que pelo crescimento contínuo.
deve ser ajustado tendo em conta a diversidade con- Ainda assim, em nada esta conclusão pareça con-
temporânea de níveis de estruturação da produção trariar o espírito pós-moderno, pois os movimen-
sócio-espacial, levando à necessidade de enveredar tos críticos mais característicos têm sobretudo con-
por abordagens pluricausais, para as quais o binômio testado “a grande teoria” ou as “grandes narrativas”
base-superestrutura se encontra ultrapassado. É claro modernas, afirmando o caráter necessariamente in-
que os autores marxistas não desejam, acima de tudo, completo e fragmentado de todo o conhecimento,
colocar uma ênfase tão simplista nos fatores materi- salientando a diversidade e a diferença de interpre-
ais, existindo mesmo um conjunto de teóricos ulte- tações, por oposição a princípios universais e tota-
riores que, apesar de fortemente influenciados pelo lizadores. Neil Smith (1981, 1992c, 1994, 2005b,
paradigma marxista, rejeitam o excessivo determinis- 2006, 2008a) apela para os perigos que este rela-
mo do modelo base-superestrutura, afirmando que tivismo científico pode acarretar na defesa de uma
os dispositivos estruturais não explicam satisfatoria- suposta neutralidade no conhecimento geográfico.
mente a produção do espaço urbano e da vida social Não se estabeleceu, contudo, nenhum programa co-
por este mediada. É o caso de Manuel Castells, Allen erente e auto-sustentado de pesquisa, nem se conhe-
Scott, Doreen Massey, Mark Gottdiener, David Har- ce uma continuidade de trabalhos posteriores, em-
vey, Michael Dear, Edward Soja, entre outros. bora tenham surgido contributos interessantes. Uma
No entanto, se o conceito de modo de produção contradição fulcral no pensamento pós-moderno
é rejeitado, também não é claro o que surge no seu subsiste. Se a modernidade é dominada pela ideia de
lugar. Se bem que a um nível mais epistemológico esclarecimento progressivo e se define como a era da
se tenham produzido importantes reflexões que de- superação, então, a asserção de uma superação crítica
fendem que a análise marxista deve implicar uma da metafísica ocidental pela condição pós-moderna é
abordagem mais desprendida para com a noção de uma contradição em si mesma. Não está disponível
determinação material, a verdade é que o argumento nenhum sistema alternativo de pensamento, nenhu-
perde pertinência se não se souber com que regu- ma linguagem alternativa, que nos permita superar
laridade e graus aquela se manifesta. Perante este im- os erros da modernidade.
passe conceptual, defende-se nas ciências sociais e Em suma, o marxismo continua a fornecer uma
humanas o “cultural turn”, de que o “político” e o base teórica sólida e pertinente na análise dos pro-
“cultural” são relativamente autônomos, o que acaba cessos de mudança sócio-espacial urbana. Parece
por conduzir as investigações a problemas de inde- hoje inegável que considerar as práticas individuais
terminação. A condição pós-moderna ao defender e sociais como simples reflexo de determinantes es-
que a(s) verdade(s) apenas têm um caráter proba- truturais de uma sociedade é um mecanicismo que
bilístico, aproximativo e provisório, arrasta para a nada tem a ver com a dialética inerente à evolução
Geografia a noção da flexibilidade cultural com que dos processos espaciais. Se bem que as estruturas se-
o conhecimento deve ser interpretado. As ideias tra- jam preenchidas e ativadas pelos indivíduos e pelos
çadas por este saber baseiam-se em posições culturais grupos sociais com motivações e interesses próprios,
dinâmicas, flexíveis, não definitivas, em permanente estes elementos não deixam, todavia, de ser condi-
estado de projeto e reconfiguração, não se excluindo cionados pela organização sócio-econômica e por um
a possibilidade de serem transitórias, de se configura- modo de produção específico. Portanto, considerar
rem como uma mera passagem para outras necessari- as práticas sociais e individuais de forma atomizada
amente diferentes e igualmente dignas de validade. e “desligadas” dos mecanismos estruturais que regem
Corrobora-se, assim, que todas as interpretações as formações sócio-espaciais, é, no entendimento de
da gentrificação poderão ser válidas, não podendo Smith (1986b, 1987c, 1990) um postulado da ideo-
afirmar-se que uma o é em total e absoluto, única logia liberal que reconhece no indivíduo um agente
e verdadeira. Essa é, afinal, a grande potencialidade histórico autônomo, sem atender às forças materiais
epistemológica da pós-modernidade e a sua mais que não só estruturam a sociedade e o espaço, como

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ARTIGOS

também condicionam a ação dos agentes sociais. tura social, e não um conjunto independente, ou
Mas, a este respeito, é também cada vez mais relativamente autônomo, de relações espaciais. To-
evidente que nenhuma explicação da gentrificação é das as abordagens marxistas até Lefebvre rejeitavam
satisfatória se não incluir referências cruzadas, quer a necessidade de uma teoria distinta do espaço, em
da tese da oferta, quer da do consumo. Além disso, favor de uma análise política e econômica das rela-
nenhuma destas perspectivas consegue ser coerente ções sociais desenvolvidas espacialmente, com base
e, por si só, dar resposta ao problema epistemológico na luta classista. Compartilhavam a crença de que os
colocado pela gentrificação nos estudos urbanos dos processos de desenvolvimento capitalista são materi-
últimos 40 anos, sem aludir às dimensões explicati- alizados no espaço, quase que através de uma corre-
vas e argumentos uma da outra (Smith, 1995a). O spondência unívoca com as formas reais do ambiente
que também confirma que as velhas oposições entre construído.
holismo e individualismo, estrutura e agência, ma- Na obra lapidar de Lefebvre de 1974, “La Pro-
terialismo e idealismo, podem ser vistas como pro- duction de l’Espace”, culmina a visão ontológica do
blemas quando abordadas em termos concretos e no autor de mais de uma década de análise da condição
âmbito de situações sociais específicas localizadas no urbana contemporânea que demonstra que o espaço
tempo e no espaço. não pode ser reduzido apenas a uma localização, às
Estas dicotomias, especialmente aquela que é relações sociais da posse de propriedade, ou ao mero
primária a todas as outras, a do materialismo vs. ide- desdobramento/reflexo das estruturas econômicas,
alismo, resume uma questão elementar da filosofia da políticas e ideológicas. Aqui Lefebvre formula uma
ciência, mas também da epistemologia da geografia, abordagem marxista do espaço que difere drastica-
delineando tradicionalmente duas grandes correntes mente da dos seus contemporâneos. O espaço re-
de entendimento da realidade sócio-espacial. As múl- presenta uma multiplicidade de preocupações sócio-
tiplas implicações destas duas formas de pensamento materiais. No espaço figuram proeminentemente as
permitem-nos compreender algumas transformações relações sociais de produção. É por meio do espaço
recentes do social e do espaço, inerentes à gentrifica- que a sociedade se reproduz, pois este é simultanea-
ção. Alguns teóricos utilizam com rigor a dissociação mente um meio de ações sociais – porque as estru-
entre uma posição idealista e uma posição materi- tura – e um produto dessas ações. Ele recria continu-
alista, sendo muitos os que aprofundam o estudo das amente as relações sociais, reproduzindo-as; mas estas
características de cada abordagem. A leitura “mate- também ajudam a produzi-lo em primeiro lugar. Ele
rialista dialética” de Lefebvre (1947) conduz-nos à é ao mesmo tempo objeto material ou produto, o
formulação de um esquema representativo da relação meio das relações sociais, e o reprodutor destas. É
entre as diferentes concepções filosóficas associada à simultaneamente o local geográfico da ação e a pos-
grande questão materialismo vs. idealismo. A pro- sibilidade social de engajar-se na ação. Esta ideia é
posta da dialética de Lefebvre é a de romper com fundamental para a noção de práxis sócio-espacial de
essa dicotomia ao realizar a efectiva interação sujeito Lefebvre, que representa potencialidades tremendas
vs. objecto, reconhecendo a realidade como a própria de encarar o espaço como instrumento político me-
ação conjunta e concomitante (práxis sócio-espacial) diante as necessidades de luta urbana contra o avanço
entre consciência e matéria. A vida-realidade é bem da fronteira da gentrificação4, como vimos no último
mais complexa do que a objetividade da filosofia ma- ponto deste artigo.
terialista nos faz crer. Desta forma, Lefebvre, ao basear a multiplici-
A visão lefebvriana de espaço socialmente pro- dade da articulação sociedade-espaço numa relação
duzido remete-nos – no estudo da gentrificação en- dialéctica, deixa o princípio para a transformação
quanto processo de reestruturação urbana – para a revolucionária da sociedade através da expropria-
articulação entre o sistema de organização social na ção do espaço, a liberdade de usar o espaço, cum-
sua totalidade e a organização do espaço, sob o signo prindo o direito existencial à cidade. Em “Le Droit
do contributo de uma abordagem marxista que leve à la Ville” Lefebvre (1968) faz a apologia da extin-
em conta a necessidade de considerar os vários níveis ção do sistema de relações de propriedade – onde
de organização social, inclusive o político e o cul-
tural, tanto quanto o econômico. Segundo a análise
4
urbana marxista, a transformação do espaço está vin- Não esqueçamos que no pensamento de Lefebvre (1970) a
culada diretamente às transformações da sociedade práxis sócio-espacial é elevada à categoria de atividade radical
de resistência ao lado de outros esforços para reorganizar as
produzidas pelo esforço de acumulação de capital e relações sociais, onde a transformação da sociedade moderna
pela luta de classes. Esta perspectiva argumenta que numa sociedade humanista deve ocorrer sob a forma de “re-
a análise do espaço é uma mera expressão da estru- volução urbana”.

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