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A finalidade do Estado em Kant

III Mostra de Pesquisa


da Pós-Graduação
PUCRS

Renato Capitani, Prof. Dr. Draiton Gonzaga de Souza (orientador)

Programa de Pós-Graduação em Filosofia, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, PUCRS.

Resumo

O trabalho ocupa-se com o problema da finalidade do Estado em Kant. Vincula a


filosofia jurídico-política com a moral no intuito de mostrar que o denominado liberalismo
kantiano, sem dúvida inegável, consiste num “mínimo político”, garantido por meio da
coerção, que constitui a condição de possibilidade da autonomia dos cidadãos. Incialmente,
demonstra que é possível agir por dever (eticamente) no domínio das leis jurídicas. Na
seqüência discorre sobre a autonomia na ética kantiana, sustentáculo de que a finalidade do
Estado, em Kant, é ética, no sentido de que o Estado garante, via coerção, o livre exercício
das liberdades externas (“liberalismo kantiano”), mas que é imprescindível, tendo em vista o
todo do projeto kantiano, ir além dessa mera ausência de conflitos entre os arbítrios. Isso
implica dizer que os cidadãos devem agir por respeito à lei (autonomia) jurídica.

Introdução

O trabalho procura discutir a finalidade do Estado em Kant. Essa discussão é feita a


partir de duas soluções possíveis à questão, quais sejam, a leitura liberal e a leitura que
sustenta a finalidade ética do republicanismo kantiano.

Metodologia

Leitura analítico-crítica das obras de Kant e dos principais comentadores.

III Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2008


Resultados (ou Resultados e Discussão)1

O republicanismo kantiano estabelece a priori os princípios que devem reger a


convivência humana no interior do Estado de direito. Trata-se do Estado da razão, do dever
ser de todo os estados históricos. Kant pensa numa sociedade para homens racionais,
potencialmente capazes de agir segundo a representação de leis.
A capacidade de ação racional não garante que os homens ajam racionalmente. Junto a
ela está a possibilidade de agir segundo às inclinações, ou seja, os homens são seres
imperfeitamente racionais que podem agir tanto racionalmente quanto motivados pelas
inclinações naturais. A ordem jurídica obriga os homens a agir como se fossem racionais. Esta
é a especificidade do direito: faz, através da coerção, com que as ações sejam conforme às leis
da razão, independentemente das intenções dos agentes.
Em Kant há dois tipos de legislação: a ética (interna) e a jurídica (externa). O
fundamental para os propósitos desse estudo é que não há diferença objetiva entre as leis
éticas e as leis jurídicas; a diferença entre ambas está no móbil da ação e não na objetividade
da lei. O direito nada prescreve de diferente ou contraditório em relação às leis éticas. De
outro modo, quanto à objetividade da lei, não há diferença entre ética e direito; no entanto,
não parece coerente afirmar que Kant exija, no direito, um móbil diferente da ética e que essa
é a principal distinção entre as duas legislações. Esse ponto é central. Enquanto possibilidade
o direito admite um móbil diferente da ética. Porém, isso não significa que, igualmente,
enquanto possibilidade, Kant exclua um cumprimento ético das leis jurídicas.
A república kantiana, à medida que é a única que está de acordo com os princípios do
direito (princípios racionais a priori), não tem na ação conforme às leis o seu escopo final.
Isso é o mínimo que se espera de seres racionais. A constituição republicana estabelece as
condições de possibilidade à autonomia dos cidadãos. As leis civis garantem o mínimo, a
saber, uma convivência sem conflitos; um livre exercício das liberdades externas que respeita
o direito de todos. Kant não nega a possibilidade de uma heteronomia política: cidadãos que
respeitam as leis civis simplesmente por que são coagidos a procederem dessa forma. Aquilo
que se denomina liberalismo, em Kant, identifica-se com esse mínimo exigido e garantido
pela constituição republicana, ou seja, a mera coexistência sem conflitos das liberdades

1
É preciso esclarecer que é muito difícil adequar um trabalho de filosofia a esse modelo de resumo padrão
oferecido pela organização da amostra. Diante disso, o que segue são apenas apontamentos, sem a necessária
fundamentação textual, da discussão realizada no trabalho. Portanto, a compreensão da pesquisa fica
comprometida sem o texto integral.

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externas. No entanto, essa leitura é unilateral, pois prescinde da noção de autonomia, ou seja,
desvincula o direito e a ética.
Que o filósofo deixa a critério de quem age escolher os seus próprios fins – apanágio
do liberalismo – é uma afirmação incapaz de gerar polêmica. Resta saber se qualquer fim é
adequado a seres racionais. A ação (escolha), para ser livre, deve ser racional e isso tem
implicações éticas, pois se trata de motivações internas.
Sustentar que o republicanismo kantiano tem como ideal supremo o cumprimento
ético das leis jurídicas, embora não desconsidere nem condene seu cumprimento
simplesmente por medo da coerção, significa que, numa perspectiva ideal, Kant espera o
máximo dos cidadãos republicanos, a saber, que sejam autônomos. Ser autônomo, grosso
modo, é ter as leis da razão (sejam éticas ou jurídicas) como móbiles das ações.
A função do Estado é garantir o exercício pacífico das liberdades externas. Em Kant, só há
liberdade quando a razão é obedecida. O filósofo estabelece a constituição republicana como
inteiramente fundamentada em princípios racionais; pode-se afirmar que a república é um
produto da razão pura prática, portanto uma idéia.

Conclusão

O republicanismo, enquanto constituição da razão, fundamenta-se na possibilidade


humana de ação racional, i. e., de ação livre, autônoma. Como essa possibilidade nem sempre
é desenvolvida, o que pode causar conflito no âmbito das relações das liberdades externas, o
republicanismo garante, via coerção, que os indivíduos ajam de acordo com as leis da razão,
independentemente de suas motivações interiores. Essa coexistência pacífica das liberdades
externas conseguida pela coerção é o que se denomina liberalismo em Kant. Entretanto, ao
que tudo indica, a mera ausência de conflitos nas relações das liberdades externas não
constitui a finalidade do Estado pelo simples fato de desconsiderar a liberdade como
autonomia. A finalidade do Estado é ética no seguinte sentido: são dadas as condições para
que o homem seja autônomo, i. e., para que aja racionalmente. Só faz sentido falar da
liberdade dos cidadãos republicanos quando esses agem por respeito às leis de sua própria
razão, o que caracteriza uma ação ética.

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Referências

ALMEIDA, Guido A. de. Liberdade e moralidade segundo Kant. Analytica. Rio de Janeiro, v.
2, n. 1, 1997, p. 175-202.

BOBBIO, Norberto. Direito e estado no pensamento de Emanuel Kant. Brasília: UNB, 1997.

GOMES, Alexandre. MERLE, Jean-Christophe. A moral e o direito em Kant. Belo Horizonte:


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HÖFFE, Otfried. Immanuel Kant. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

KANT, Immanuel. A paz perpétua e outros opúsculos. Lisboa: Edições 70, 1988.

______. La metafísica de las costumbres. Madrid: Tecnos, 1994.

SALGADO, Joaquim C. A idéia de justiça em Kant; seu fundamento na liberdade e na


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TERRA, R. A política tensa – Idéia e realidade na filosofia da história de Kant. São Paulo:
Iluminuras, 1995.

III Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2008

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