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xcelentíssimo senhor desem- nistro José Delgado, no sentido de
bargador Federal Frederico conclamar a todos para uma luta de
José Leite Gueiros, presidente mudança de mentalidade, de coloca-
da mesa; excelentíssimo senhor mi- ção em prática das nossas idéias, pos-
nistro José Augusto Delgado, do Su- so assegurar que não estarei errado em
perior Tribunal de Justiça, senhoras já prever que este evento está sendo e
e senhores. será sempre considerado um marco na
história deste país, porque sairemos
Em primeiro lugar, gostaria dispostos a buscar para o futuro um
de agradecer a gentileza do convite posicionamento diferente, a efetividade
que me foi formulado pelos da prestação jurisdicional que todos os
organizadores do evento, o Centro de brasileiros tanto estão almejando e
Estudos Judiciários do Conselho da aguardando de seus mandatários, que
Justiça Federal (CJF) e a Universidade modifiquem a prestação jurisdicional
Federal Fluminense (UFF), na pessoa brasileira para que possamos ter, real-
do querido amigo, professor e Juiz mente, efetividade.
Ricardo Perlingeiro que tão bem sou-
be organizar este evento que está se O INSTITUTO BRASILEIRO DE
revelando de bastante sucesso e, por DIREITO PROCESSUAL E A EVOLUÇÃO
certo, marcante na história deste tema DO DIREITO PROCESSUAL NO BRASIL
da execução contra a Fazenda Públi-
ca no Brasil. O Instituto Brasileiro de Direito
Processual (IBDP) é, na linguagem da
Antes de iniciar, gostaria de as- moda, uma organização não-governa-
sociar-me ao ministro José Delgado na mental – o que antes se chamava mais
homenagem que Sua Excelência fez simplesmente de associação de fins ci-
aos nordestinos. Sou baiano e fico fe- entíficos e culturais. Fundado em 1958,
liz em saber que o desembargador pelo eminente professor Alfredo
Frederico Gueiros é natural do Recife, Buzaid, seu primeiro presidente, dele
sendo cidadão carioca certamente por participaram desde o início renomados
opção emocional, pois aquela cidade juristas, como os professores paulistas
é maravilhosa. Temos, portanto, uma Luís Eulálio de Bueno Vidigal, José
mesa de nordestinos. Frederico Marques, Moacyr Amaral San-
tos, os gaúchos Alcides de Mendonça
Tenho absoluta certeza de que, Lima e Galeno Lacerda e o mineiro Cel-
sobretudo depois das palavras do mi- so Agrícola Barbi. Alguns já nos deixa-
Execução contra a Fazenda Pública 143
ram, outros ainda estão nos brindan- ram e promoveram um novo impulso
do com os seus conhecimentos, como ao Direito Processual, renovando o Ins-
é o caso do professor Celso Neves, de tituto e ampliando o desafio de reno-
São Paulo. Na época de sua fundação, var a legislação. Nessa época foi reali-
os debates sobre o Direito Processual zado em São Paulo um importante en-
visavam a aprimorar as categorias fun- contro chamado “Participação e Proces-
damentais, estabelecendo-se, assim, a so” –, percebeu-se que a evolução an-
base científica do processo, ocasião em terior da dogmática e ciência do Pro-
que se iniciou a segunda fase do Direi- cesso Civil foi muito forte, importante
to Processual no Brasil, a denominada e positiva, mas os tempos já haviam se
fase científica, que redundou no proje- passado e era necessária uma nova di-
to do próprio Alfredo Buzaid, concluí- nâmica para o Direito Processual. Co-
do no início da década de 1960, mas meçou-se a falar em instrumentalidade
que esperou que seu autor fosse, mui- e efetividade do processo, tema tão
to depois, Ministro da Justiça, para que bem desenvolvido pelos professores
tivesse apoio político suficiente para José Carlos Barbosa Moreira e Cândi-
que o Congresso Nacional aprovasse do Rangel Dinamarco.
o projeto.
Hoje, vivemos uma época em
O IBDP já nasceu com o objeti- que consideramos a necessidade de
vo de repensar a ciência do Direito Pro- partir para uma quarta fase do Direito
cessual e o ordenamento posto no sis- Processual: já tivemos o nascimento
tema legislativo. Unir ciência e direito do Direito Processual no início do sé-
positivo sempre foi um grande desa- culo, a fase metodológica-científica e
fio. E foi com esse objetivo que, em o período instrumental. Agora, estamos
1986, operou-se grande renovação, partindo para a concretização de uma
pois verificou-se que a legislação não verdadeira reformulação das institui-
atendia mais ao que reclamava a dou- ções processuais. Talvez aí, não sei
trina. Nessa ocasião, os estudos do Di- se interpreto bem, mas, atendendo à
reito Processual apontavam para a postulação do ministro José Delgado,
efetividade e instrumentalidade do pro- precisamos deixar um pouco de lado
cesso; para o acesso à justiça, para a até mesmo a terceira fase em que se
participação no processo. Foi assim que “fala” de efetividade e instrumen-
um dos fundadores do Instituto, o pro- talidade, e partir para a fase em que
fessor Celso Neves e a força renovado- possamos, realmente, “praticar ”
ra de Ada Pellegrini Grinover se junta- efetividade e instrumentalidade.
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norma, mas no Brasil temos que estar semelhante dirigida àqueles que devem
criando leis para obrigar as pessoas a cumprir esses mesmos precatórios. O
cumprirem a lei. Se formos pensar um presidente do Tribunal tem que ficar
pouco, já que estamos falando de pro- atento para saber se há algum equívo-
posta legislativa, comecemos com essa co. Como o volume de trabalho é mui-
reflexão, com essa autocrítica que faço to grande, tem de confiar em assesso-
das atividades do IBDP em tantas mu- res, mas a responsabilidade criminal é
danças legislativas, muitas delas para dele. Esse é o primeiro alerta.
obrigar o juiz, a Fazenda ou o advoga-
do a cumprir a lei. Temos uma lei que É verdade que faço uma
dispõe sobre o que tem de ser feito; autocrítica, porque no IBDP não temos
outra para dizer “cumpra-se a lei ante- feito outra coisa a não ser propostas
rior”; outra para dizer que, se não cum- de leis. Começamos por aquelas que
prir, é crime; outra para dizer que, em os senhores conhecem, que é a cha-
decorrência desse crime há outra con- mada Reforma Processual Civil de
seqüência (porque muitas vezes o cri- 1994/1995, que o IBDP realizou em
me não é apurado ou a pena é alterna- conjunto com a Escola Nacional da Ma-
tiva) e assim por diante. gistratura. Temos trabalhado também,
como trabalhamos alguns anos antes,
A primeira reflexão que faço, com a Lei da Ação Civil Pública, com o
não obstante o tema específico de hoje, Código de Defesa do Consumidor e
é a de que tenhamos a convicção de outros institutos legislativos que estão
que alguma mudança legislativa preci- em vigor, mas, sobretudo, a marca dos
sa ser feita, mas cuidado com ela. Aon- últimos anos tem sido a reforma dos
de vamos parar por estar sempre mu- códigos de processo.
dando a lei, com o objetivo de fazer
simplesmente com que a lei anterior Atualmente, estamos trabalhan-
seja obedecida? do com três projetos de lei elaborados
e encaminhados pelo Instituto ao Con-
Um exemplo interessante: Te- gresso Nacional. Para os senhores te-
mos, hoje, na Constituição Federal uma rem uma idéia, há um decreto do Pre-
norma que deixa os juízes perplexos, sidente da República, determinando
sobretudo os presidentes dos tribunais. que todas as comissões, a maioria no-
Eles podem ser responsabilizados cri- meada no Ministério da Justiça para a
minalmente se não atenderem à ordem reforma legislativa tenham que ter um
dos precatórios, mas não existe norma advogado da União como seu integran-
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te, sendo que um decreto anterior di- política (que sabem exercer em ou-
zia que nenhum projeto ou estudo po- tras situações) para obter do Congresso
deria ser feito em qualquer um dos Nacional e da própria administração
ministérios sem que fosse verificado, pública uma reação positiva à situa-
de início, o atendimento aos interesses ção da Fazenda devedora, da Fazen-
da Fazenda Pública; decreto, também, da com sentença transitada em julga-
do Presidente da República, que só fal- do? Onde estão esses empresários cre-
ta dizer: “Só legislaremos em causa dores que já demonstraram o quanto
própria”. sabem fazer lobby na hora do orça-
mento e não estão se movimentando
Tive a oportunidade de dizer, há com relação a este tema?
poucos dias, em reunião com o minis-
tro Pedro Parente e sua assessoria: Concordo, mais uma vez, com o
Vocês estão sendo excelentes auxilia- ministro José Delgado, quando diz que
res do Chefe de Governo. O Chefe de falta no país que as associações – tenho
Estado, no entanto, está precisando de certeza de que Sua Excelência, ao se re-
assessores, porque, agindo na defesa ferir à Associação dos Magistrados e à
de curtíssimo prazo dos interesses do OAB, não está estendendo essa crítica a
Governo, deixam, às vezes, de atender outras que não estão aqui ouvindo,
aos interesses do Estado e que não mas eu a estenderia – e outros segmen-
necessariamente são coincidentes. tos da sociedade também se mobilizem
para uma efetividade da jurisdição no
É essa a realidade política em que diz respeito à chamada execução
que vivemos hoje. Falarmos sobre mo- contra a Fazenda Pública.
dificações de leis, sem atentarmos para
a realidade política, é fazer um dis- O IBDP E
curso utópico. Temos que pensar si- AS REFORMAS LEGISLATIVAS
tuação atual e respondermos à minha
primeira reflexão: é necessário que Por nomeação do então minis-
haja, agora, uma alteração legislativa? tro José Carlos Dias e, depois, nas pror-
Qual mudança deve ser feita? Deve- rogações, pelo atual ministro José
mos pensar também se é politicamente Gregori, o IBDP também está promo-
adequado assumir uma responsabili- vendo estudos para a reforma do Có-
dade que não é nossa. A pergunta é: digo de Processo Penal. Estão sendo
Por que os credores da Fazenda Pú- apresentados ao governo diversos an-
blica não estão exercendo a pressão teprojetos de lei que irão promover evo-
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lução e eficácia da justiça penal. A res- dante, até fiquei antipatizado, porque
peito dos meios alternativos de solu- cobrei: “Onde está a comissão que tra-
ção dos conflitos civis, há duas sema- tará do direito do menor? A comissão
nas, foi realizado um grande debate em que tratará do sistema penal?” As nos-
São Paulo sobre a mediação obrigató- sas associações estão no Congresso
ria no processo civil. No campo do Di- Nacional todos os dias; sabem tudo a
reito Processual Civil, foram apresen- respeito da questão remuneratória, da
tados três projetos de lei: os Projetos lei da mordaça, da aposentadoria, das
de Lei nos 3.474, 3.475 e 3.476. Passa- garantias que estão querendo retirar,
da a eleição municipal – o chamado re- sobretudo do Ministério Público, e,
cesso branco –, teremos a primeira reu- quando muito, da questão da súmula
nião com o relator na próxima sema- vinculante. Ou seja, em toda essa ques-
na. Por sinal, foi este o motivo da men- tão pessoal e funcional, as associa-
cionada reunião com o Chefe da Casa ções funcionam muito bem. Mas as
Civil. Porque, nesse quadro político, associações precisam lutar, também,
quando o relator de um projeto de lei pelos temas jurídicos não relaciona-
é do grupo que apóia o governo, o pro- dos às carreiras jurídicas; têm que
jeto somente é examinado depois da cuidar deste, da execução contra a
orientação da Casa Civil. Quando o Fazenda Pública, do contrário, gran-
relator é da oposição, acontece o con- de parte do serviço judiciário estará
trário: a Casa Civil vigia os passos se- desmoralizado.
guintes, mas não aquele inicial. Tudo
isso é importante, porque, se pensa- A REFORMA CONSTITUCIONAL
mos em reforma legislativa, temos de DO PODER JUDICIÁRIO
saber como as coisas acontecem.
A reforma do Poder Judiciário
Reafirmo a minha concordân- começou em 1992, com a proposta do
cia a respeito do movimento das as- então deputado Hélio Bicudo, vice-pre-
sociações. Lembro-me bem, ministro feito eleito de São Paulo, que apresen-
José Delgado, de que, durante a As- tou a Proposta de Emenda Constituci-
sembléia Nacional Constituinte, a nossa onal (PEC) nº 96 que, por questão re-
Associação do Ministério Público se gimental, foi arquivada. O regimento
reuniu para formar comissões para prevê algumas possibilidades de arqui-
fazer o trabalho de lobby no Congresso vamento, sobretudo, quando não há in-
Nacional a respeito dos postulados do teresse político na continuidade do exa-
Ministério Público. Fui uma voz discor- me de alguma proposição legislativa.
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PETRÔNIO CALMON FILHO: Procura-
dor de Justiça do MPF-DF, Professor de
Direito Processual do IESB, Doutoran-
do em Direito Processual pela USP e
Secretário-Executivo do Instituto Brasi-
leiro de Direito Processual.