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25/06/2019 Nós, o lixo marxista.

Por Vladimir Safatle | Combate Racismo Ambiental

Nós, o lixo marxista. Por Vladimir Safatle


 4 de janeiro de 2019    Brasil, Destaque Combate Racismo Ambiental

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É preciso calar quem não se contenta com a vida imposta pelo novo governo

Na Folha

Tomou posse o primeiro governo eleito de extrema direita do Brasil. Com ele, não há negociação alguma
possível. Nem ele procura alguma forma de negociação com aqueles que não comungam com seus credos,
que não louvam seus torturadores e que não acham que “é duro ser patrão no Brasil”.

Não há razão alguma para se enganar e acreditar em certa normalidade: a lógica que irá imperar daqui
para a frente é a da guerra. Pois isso não é um governo, é um ataque.

Já o discurso do sr. Jair Messias foi claro. Questões econômicas e sociais estiveram em segundo plano
enquanto as duas palavras mais citadas foram “deus” e “ideologia”. Deus estava lá, ao que parece, para nos
livrar da “crise moral” por que passa a República brasileira.

Isso, diga-se de passagem, há de se conceder ao sr. Jair Messias: vivemos mesmo uma crise moral
profunda. Ela está instalada no cerne do governo brasileiro.

Pois como justificar um governo cujo ministro da Justiça ganhou seu cargo como prêmio por ter colocado o
candidato mais popular a presidente nas grades e pavimentado a estrada para a vitória de seu atual chefe?

Como descrever um governo que já nasce com ministros indiciados e um réu confesso que se escarnece da
população brasileira ao afirmar “já ter se acertado com deus” a respeito de seus malfeitos?

Como descrever um presidente cujo motorista foi pego em operações financeiras absolutamente suspeitas
e se negado duas vezes a comparecer à Justiça sem sequer ser objeto de condução coercitiva?

Mas o destaque evidente é mais nova luta do Estado brasileiro contra a “ideologia”.

Enquanto uma de suas primeiras medidas governamentais foi diminuir o valor previsto do aumento do
salário mínimo, mostrando assim seu desprezo pela sorte das classes economicamente mais vulneráveis, o
sr. Jair Messias convocava seus acólitos à grande cruzada nacional para lutar contra o socialismo, retirar
das escolas o lixo marxista e impedir que a bandeira brasileira seja pintada de vermelho.

Alguns podem achar tudo isso parte de um delírio que normalmente acomete leitores de Olavo de
Carvalho. Mas gostaria de dizer que, de certa forma, o atual ocupante da Presidência tem razão.

Sua sobrevivência depende da luta contínua contra a única alternativa que nunca foi tentada neste país,
que nunca se acomodou nem às regressões autoritárias que nos assolam nem aos arranjos populistas que
marcaram nossa história.

Pois ninguém aqui tentou expropriar meios de produção para entregá-los à autogestão dos próprios
trabalhadores, ninguém procurou desconstituir o Estado para passar suas atribuições a conselhos
populares, aprofundando a democracia direta, nem levou ao extremo necessário a luta pelo igualitarismo
econômico ou social que permite a todos os sujeitos exercerem sua liberdade sem serem servos da miséria
e da espoliação econômica.

Ou seja, a verdadeira latência da sociedade brasileira —que poderia emergir em situações de crise como
esta— é um socialismo real e sem medo de dizer seu nome.

A sociedade brasileira tem o direito de conhecê-lo, de pensar a seu respeito, de tentar aquilo que nunca
conheceu sequer a sombra. Ela tem direito de inventá-lo a partir da crítica e da autocrítica do passado.

https://racismoambiental.net.br/2019/01/04/nos-o-lixo-marxista-por-vladimir-safatle/ 1/2
25/06/2019 Nós, o lixo marxista. Por Vladimir Safatle | Combate Racismo Ambiental

Mas contra isso é necessário calar a todos que não se contentam com a vida tal como ela nos é imposta
por essa associação macabra de militares, pastores, latifundiários, financistas, banqueiros, iluminados por
deus, escroques que tomaram de assalto o governo e que sempre estiveram dando as cartas, de forma
direta ou indireta.

Assim, quando Jair Messias fala que irá lutar contra o lixo marxista nas escolas, nas artes e nas
universidades, entendam que essa luta será a mais importante de seu governo, a única condição de sua
sobrevivência. Pois ele sabe de onde pode vir seu fim depois de ficar evidente o tipo de catástrofe
econômica e social para a qual ele está nos levando.

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