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12/07/2019
Número: 0712777-43.2019.8.07.0000
Classe: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
Órgão julgador colegiado: Conselho Especial
Órgão julgador: Gabinete do Des. Waldir Leôncio Júnior
Última distribuição : 05/07/2019
Valor da causa: R$ 1.000,00
Relator: WALDIR LEONCIO CORDEIRO LOPES JUNIOR
Assuntos: Abuso de Poder
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? SIM
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM
Partes Advogados
DEFENSORIA PÚBLICA DO DISTRITO FEDERAL
(IMPETRANTE)
PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE CONTAS DO DISTRITO
FEDERAL (IMPETRADO)
Documentos
Id. Data da Documento Tipo
Assinatura
9874888 12/07/2019 Decisão Decisão
13:19
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios
PROCESSO: 0712777-43.2019.8.07.0000
DECISÃO
Cuida-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado pela Defensoria Pública do
Distrito Federal – DPDF contra ato comissivo atribuído a Excelentíssima Senhora Presidente do
Tribunal de Contas do Distrito Federal – TCDF, a qual presidiu a sessão de julgamento ocorrida no dia
4/6/2019, oportunidade em que a Corte Distrital de Contas, por unanimidade, de acordo com o voto do
Conselheiro Relator, determinou à Impetrante, no tocante ao cálculo da rubrica indenização de
transporte paga aos Defensores Públicos do Distrito Federal, dentre outras providências, que:
(...) promova o desconto dos dias de afastamento e dos dias em que o servidor não
comprovar a utilização de veículo próprio para a execução de atividades externas inerentes
ao exercício do Cargo de Defensor, observando-se, ainda, a razão de dias úteis do mês (e
não a razão de 30 dias) na apuração do valor do benefício; (...) (Decisão 1.908/2019; grifo
nosso)
Cumpre sublinhar que a Impetrante, de início, vindica a isenção das custas processuais, uma vez que
integra a estrutura orgânica do Distrito Federal, nos termos do inciso I do art. 4º da Lei 9.289/96.
Passo seguinte, realça que o art. 9º, parágrafo único, da Lei Complementar Distrital 828/2010 lhe autoriza
ingressar em juízo na defesa de suas prerrogativas institucionais. Registra, ainda, que o ato
impugnado não mais comporta recurso com efeito suspensivo, pois renunciou ao prazo recursal
previsto no Regimento Interno daquela Corte Administrativa.
Após breve escorço fático e jurídico da decisão impugnada por meio do presente writ, a Impetrante aduz
que o ponto nevrálgico a ser examinado resume-se à impropriedade dos fundamentos jurídicos invocados
pelo TCDF, uma vez que a Lei Complementar 681/2003 – aplicável à hipótese da percepção da
indenização de transporte por parte dos membros da Defensoria Pública do Distrito Federal, por força do
art. 53, § 1º, da Lei Complementar 828/2010 – apresenta-se especial em relação ao Estatuto dos
Servidores Públicos Civis do Distrito Federal (LC 840/2011, art. 106) e ao Decreto 13.447/1991.
A Impetrante minudenciou as normas que afirma reger a indenização de transporte. Em suma, afirma que
a indenização de transporte para os Defensores Públicos do Distrito Federal, por conta do princípio da
Nesse diapasão, evidencia que o Conselho Superior da Defensoria Pública editou, no dia 16 de junho de
2016, a Resolução 150, para regular no âmbito interno da DPDF a “indenização pelo uso de veículo
próprio para desempenho de suas funções” (LC 681/2003, art. 14).
Ressalta que a Resolução 150/2016, ao regulamentar o tema, conferiu alcance distinto do art. 106 do
Estatuto dos Servidores Públicos. Em resumo, afirma que o Estatuto dos Servidores Públicos (LC
840/2011, art. 106) vincula a indenização de transporte à execução de serviços externos, isto é, “
realizados fora do âmbito espacial onde ocorre a ordinária prestação do serviço”.
Por outro lado, nos termos da inicial, a LC 681/2003, tampouco a Resolução 150/2016, albergam a
exigência de que o trabalho seja externo, “contentando-se com a demonstração do nexo de pertinência
entre a despesa e o exercício da função, independentemente do local de sua ocorrência.” Essa
diferenciação feita, segundo alega a Impetrante, decorre do poder discricionário conferido à DPDF pelo
art. 14 da LC 681/2003.
Alega, ainda, que o controle do “nexo de pertinência entre a despesa e o exercício da função” feito pela
Corregedoria da DPDF é finalístico. Afirma, nessa senda, que nos assentos funcionais dos Defensores
Públicos são arquivadas “declarações de utilização de veículo próprio para realização das atividades
inerentes ao cargo e que os Defensores Públicos apresentam mensalmente um relatório das atividades
desempenhadas”.
Destaca que, esta Casa de Justiça, ao julgar recurso administrativo, reconheceu a utilização de veículo
próprio para o deslocamento ao local de trabalho (independente da prática de “serviços externos”)
como hipótese suficiente para o pagamento de auxílio-transporte “de natureza indenizatória.”
Sustenta que a Corte de Contas avançou indevidamente sobre a discricionariedade do Conselho Superior
da Defensoria Pública, vez que, pautou-se por critério divorciado daquele consagrado pelo titular da
competência normativa, o qual teria se pautado pelas especificidades inerentes às atribuições do cargo de
Defensor Público.
Explica que, embora o TCDF tenha chancelado a regulamentação feita pela Resolução 150/2016 do
Conselho Superior da DPDF, a Corte de Contas esvaziou o aludido ato regulamentar ao exigir a adoção
de formulário em que constem as atividades externas executas pelo Defensor Público, subtraindo, assim,
o exercício de competência regulamentadora conferida à instituição e, ainda, violando a autonomia
administrativa do órgão.
Assevera que a decisão prolatada pelo TCDF não permite à DPDF resguardar os princípios do
contraditório e da ampla defesa em relação aos Defensores Públicos, cujas esferas de direito serão
afetadas, sendo certo que, nos termos da Súmula Vinculante 3 do STF, os julgamentos dos Tribunais de
Contas também se sujeitam aos referidos princípios constitucionais.
Aduz que a indenização de transporte desvinculada de atividade externa é paga regularmente há 12 (doze)
anos, por isso, a exigência do TCDF colidiria com a regra do prazo de decadência consubstanciada no
art. 54, § 1º, da Lei Federal 9.784/1999.
Pede o deferimento de medida liminar, “sobretudo, por ter a autoridade coatora negado vigência a vários
dispositivos de ordem constitucional e infraconstitucional”. No tocante ao periculum in mora, sustenta
que a próxima folha de pagamento da Defensoria Pública encerra-se no dia 15/7/2019, de forma que não
há tempo hábil para que os setores administrativos da DPDF adequem-se às determinações do TCDF.
Além disso, afirma que a DPDF não dispõe de frota de carros suficientes para promover o deslocamento
dos Defensores Públicos em todas as circunscrições judiciárias, de forma que a suspensão do pagamento
da verba poderá importar prejuízo à continuidade do serviço público.
É o relatório.
Decido.
Ademais, embora a DPDF não esteja atuando na condição de custos vulnerabilis, aplica-se a ela a isenção
das custas processuais, nos termos do inciso I do art. 4º da Lei 9.289/1996, porquanto ela integra a
estrutura orgânica do Distrito Federal.
Superadas essas duas peculiaridades, cabe delimitar a vexatia questio apresentada por meio deste writ
constitucional.
A partir da análise perfunctória da inicial e da documentação acostada, verifica-se que a DPDF insurge-se
contra o entendimento da Corte Distrital de Contas que atrelou o pagamento da rubrica indenização de
transporte à execução de atividades externas, isto é, “realizados fora do âmbito espacial onde ocorre a
ordinária prestação do serviço”, inerentes ao exercício do cargo público.
Nessa quadra, infere-se que a DPDF, ao regular a matéria, decidiu conceder R$ 1.684,66 (um mil,
seiscentos e oitenta reais e sessenta e seis centavos), a título de indenização de transporte, a todos os
Defensores Públicos que não tenham à sua disposição veículo oficial para realizarem deslocamentos,
ainda que sejam da residência para o trabalho e vice-versa.
A par disso, a Impetrante contrapõe-se à forma de controle estipulada pelo TCDF para se aferir a
ocorrência dos fatos que justifiquem a indenização de transporte aos Defensores Públicos.
Conforme exposto alhures, a Impetrante afirma que a Corte de Contas ignorou o regramento específico
da carreira e está exigindo da DPDF a observância de regramento legal geral (LC 840/2011), violando,
pois, o critério da especialidade, aplicado para solucionar antinomias normativas aparentes.
Fixadas essas balizas, destaca-se que a nova Lei do Mandado de Segurança (Lei 12.016/2009), em seu art.
7º, inciso III, reza que, subsistindo fundamento relevante e receio de o ato impugnado resultar na
ineficácia da medida, poderá o juiz, de imediato, determinar a suspensão do ato que deu motivo ao
pedido.
Conforme consta da documentação anexada, o TCDF, por intermédio das Decisões 5.590/2015 e
719/2016, apontou, com relação à parcela de Indenização de Transporte, que:
2. os servidores da PGDF e da DPDF que perceberem a citada parcela devem declarar, sob
as penas da lei, a utilização de veículo próprio para realização de atividades que demandam
o seu pagamento, obrigação essa a ser contemplada em normativos próprios de ambas as
jurisdicionadas, “a serem elaborados no prazo de 90 (noventa) dias” (trecho acrescido pela
Decisão 719/2016);
3. seu pagamento não é devido ao ocupante de cargo em comissão, a não ser que
comprovadamente as suas atribuições exijam serviço externo;
Em outro decisum do TCDF, datado em 23 de agosto de 2016 (ID 9764246, p. 3-4), envolvendo a mesma
parcela remuneratória prevista nos arts. 12, III, e 14 da LC 681/20103, ao analisar recurso interposto
naquela Corte pela PGDF, a unidade técnica consignou:
32. Conforme dispõe o art. 14 da LC 681/2003, a indenização em debate é devida quando: (i)
ocorre uso de veículo próprio; (ii) para desempenho das funções do cargo. Estas regras
gerais, aliás, são idênticas às exigidas pelo art. 106 da LC 840/2011. Note-se que o Tribunal
não exigiu nada mais que essas regras para o controle da concessão desse benefício,
consoante se verifica dos itens VII.a.1 e VII.a.2 da Decisão 5590/2015, antes reproduzidos.
33. Deve-se repisar que o uso de dinheiro público não pode estar imune a controle, pena de
se revelar a desnecessidade de órgãos como as policiais judiciárias, o Ministério Público, os
Tribunais de Contas e as Controladorias internas. Decore do princípio republicano,
inclusive, a obrigação de o gestor público prestar contas dos recursos geridos.
34. Sendo isso de vulgar conhecimento, soa despropositado pretender-se ausência total de
controle do pagamento da indenização de transporte, assemelhando-o ao
auxílio-alimentação. Sobremais quando se trata de verba de natureza indenizatória, e sob
singela alegação de dispêndio precioso de tempo para informar minimamente os
deslocamentos.
35. Além disso, não há como anuir à alegação de que a indenização é inerente ao cargo de
Procurador. Trata-se de parcela indenizatória, só devida a servidor que (i) utilizou veículo
próprio (ii) para desincumbir-se das atribuições do cargo.
36. Assim, o servidor que desempenha internamente suas funções, seja por não atuar no
contencioso, seja por exercer cargo em comissão, entre outras que não exijam deslocamento
Cotejando a argumentação apresentada pela requerente com a fundamentação lançada pelo TCDF em
diversas decisões proferidas no decorrer dos últimos anos, observa-se – a partir de uma análise
superficial – que de seus argumentos não emerge justificativa capaz de determinar a suspensão do ato
administrativo questionado.
Ademais, verifica-se que o TCDF admite, por serem “vantagens dessemelhadas”, malgrado ambos
assumirem natureza indenizatória, o pagamento cumulativo de indenização de transporte com o
auxílio-transporte, sendo que este último tem como propósito específico – mediante contraprestação do
beneficiário – custear parcialmente as despesas realizadas nos deslocamentos das residências dos
servidores para os locais de trabalho.
Nessa trilha, vale destacar que o Acórdão 1.142.409 deste Sodalício, mencionado no bojo da impetração,
versa exclusivamente sobre o auxílio-transporte, rubrica que mais se harmoniza ao propósito exposto pela
requerente ao editar a Resolução 150/2016.
Vale dizer que não se vislumbra qualquer prejuízo a continuidade do nobre serviço público prestado pela
DPDF, uma vez que o deslocamento dos Defensores das respectivas residências aos locais de trabalho
enquadra-se no âmbito das despesas normais e ordinárias que oneram qualquer servidor público.
Outrossim, mister gizar que a decisão impugnada não impede a concessão da indenização de transporte,
tão somente exige que a Defensoria Pública exerça efetivo controle interno acerca do pagamento da verba
indenizatória, o que se coaduna com a função fim da Corte de Contas de promover os corretos e
necessários incentivos ao aperfeiçoamento do controle financeiro das instituições democráticas.
Cabe lembrar que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal consagra o entendimento de que não há
direito adquirido a regime jurídico referente à composição dos vencimentos de servidor público, portanto
não há falar em prazo decadencial diante do pagamento da mencionada verba indenizatória por mais de
12 (doze) anos. Lembrando, nessa quadra, que a decisão impugnada não determinou a cessação do
pagamento, apenas exigiu que o Órgão desenvolva efetivo controle financeiro.
Cumpre registrar, por fim, que a existência de reiteradas decisões da Corte de Contas desde o ano de
2015, traz dúvida sobre o cabimento do presente writ, considerando o prazo decadencial para a
impetração de 120 (cento e vinte dias), a qual será mais bem abordada quando do julgamento do mérito.
Publique-se.
Desembargador