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locativas
Resumo:
O objetivo desse artigo é pensar sobre o relacionamento entre a literatura eletrônica e a teoria literária. Nos
propomos essa discussão, tendo as narrativas locativas como exemplo, a partir das seguintes hipóteses: se a)
esses objetos eletrônicos podem ser tidos como literários; b) as teorias literárias que analisam a literatura
impressa são suficientes para pensar, perceber, entender, julgar como literário ou não, o que é eletrônico; e c)
propor um ponto de partida teórico para pensar o uso do computador como objeto de construção do literário.
A literatura eletrônica é um grande gênero que abarca obras específicas dos meios eletrônicos, essas são
construídas como software e executadas por meio do processamento eletrônico de dados. As narrativas
locativas são dessas obras eletrônicas em que os processadores dos dados são as mídias locativas, que são
aparelhos móveis com sistemas de posicionamento e de processamento de dados.
Introdução
1 Mestre em letras: linguagens e representações pela Universidade Estadual de Santa Cruz. Email:
vgorender@gmail.com
2 Professora doutora aposentada do programa de pós graduação em letras linguagens e representações da
3 A narratividade em um texto surge a partir de sentenças que indicam sucessão temporal de seus referents,
como no caso de eventos e acontecimentos evocados, diferente de sentenças que se referem a entidades que
existem simultaneamente, leis gerais, propriedades estáticas, ou para opiniões pessoais do narrador. O grau de
narratividade de um texto poderia então ser medido em proporção com as sentenças verdadeiramente
narrativas.
4 Um texto narrative deve criar um mundo e preenche-lo com personagens e objetos. Logicamente, essa
condição significa que um texto narrative é baseado em proposições sobre a existência de individuos e
proposições que atribuam propriedades a essa existência.
estruturalista define: A existência de uma história/discurso – acontecimentos/enredo; um
narrador ou pessoa que fala; personagens; espaço e tempo.
Definindo, elementarmente, “narrativa” como um tipo de texto, Ryan (2004, p. 15)
faz uma analogia entre ler uma narrativa e experimentar uma obra de arquitetura “in the case
of architecture a metaphorical interpretation may draw na analogy between the temporality of plot and the
experience of walkin through a building”. O tempo da narrativa torna-se o tempo do caminhar.
O mesmo tempo do caminhar que também existe nas narrativas locativas, o tempo do
concreto, de ir de um local a outro local.
Em seguida, trataremos brevemente do atual lugar da teoria literária, não nos
propomos aqui a atingir o estado da arte sobre o assunto. Algumas teorias nos
aprofundaremos mais enquanto outras pincelaremos brevemente, trataremos com maior
detalhes as teorias que julgarmos mais relevantes para o objeto em estudo.
Cada teoria, cada crítico literário, cada temporalidade específica define por meio de
critérios mais ou menos estáveis o que considera ou não literatura.
Sempre partindo de regras e conceitos específicos as escolas literárias constroem conceitos
que de acordo com Zilberman ( ) exercem a dupla função de definir o que é objeto literário
e ao mesmo tempo excluir o que não é objeto literário.
Para Zilberman ( ) o
Uma dessas teorias parece guiar muitos dos críticos e teóricos que se afastam das
teorias mais contemporâneas, como o pós-colonialismo ou desconstrução, é a teoria crítica.
Fazemos essa afirmação baseado na ideia, mesma, de que a separação construída pela teoria
crítica entre alta cultura e baixa cultura atinge os objetos literários a ponto de definir o que
é ou não literatura.
Fry (2009)
What is literature, how do we know when we see it, how do we define it?
(...) Definitions based on form, circularity, simethry, economy of form,
lack of economy of form, repetition, they are definitions based on
phsycological complexities, phsycological balancies, phsycological
harmony, sometimes phsycological imbalancies and desarmony, there are
also definitions which exists as somehow epistemological difference
between literature and other kinds of utterances, whereas most
utterances preport to be saying something true about the actual state of
things in the world, literare utterances are not under such obligation, the
argument goes and on properly to be understood as fiction making it up
as opposing to reffering
Fry (2009)
but at the same time, even as I rattle of this list of possibilities you may
find yourself na absurd of schepscism, and say ‘I can easy find
exceptions to all those rules, it is ridiculous to think that literature could
be define in anyone of those ways or even in a combination of all of
them, literature is many things and it simple can not be trapped in a
definition of that kind’ (...) it gives rise to a sense that possibly, after all,
literature just is not anything at all, in other words, that literature may not
be succeptible of definition (...) that it is rather wathever you say it is, or
more precisely whatever your interpretative community says it is
Definição é importante de qualquer forma.
Foucault (2001) vai além e, ao questionar o que é o autor, como consequência,
questiona o que é uma obra. O filósofo francês levanta questões como “o que é uma obra?
O que é, pois, essa curiosa unidade que se designa com o nome obra? De quais elementos
ela se compõe? Uma obra não é aquilo que é escrito por aquele que é um autor?”,
prossegue “se um indivíduo nçao fosse um autor, será que poderia dizer que o que ele
escreveu, ou disse, ou deixou em seus papéis, o que se pode relatar de suas exposições,
poderia ser chamado de obra?”. Termina afirmando que “a palavra ‘obra’ e a unidade que
ela designa são provavelmente tão problemáticas quanto a individualidade do autor”.
No subtópico seguinte, discutiremos a teoria literária que já alcança os objetos
eletrônicos, que já enxergam esse fenômeno como literário. Apresentaremos conceitos, e
algumas das diversas possibilidades de perceber a literatura eletrônica.
5 Uma obra digital é guardada em um local digital. As obras são mantidas no site da organização e em cds. Em
períodos específicos a ELO seleciona obras de cada gênero da literature eletrônica e cria um conjunto de
obras como numa exposição.
6 Programas específicos para Windows 95, por exemplo, não rodam em Windows 8 ou 10. A ELO cria
8 Usaremos sempre o termo literatura eletrônica para nos referirmos às obras em questão.
"um programa que desempenha atividades e aplicações (comerciais ou pessoais) específicas
para um usuário"(CAIÇARA JÚNIOR, 2007). Haunted London é um aplicativo disponível
apenas para iPhones que conta uma história de terror em Londres. Os autores apresentam
duas motivações para sua construção:
1) Apresentar um roteiro turístico menos usual da cidade de Londres.
2) Utilizar da fama de Londres como uma das cidades mais assombradas do mundo
para contar uma história de terror.
Ao analisar a narrativa locativa Haunted London, Gorender (2016) demonstra que a
história é contada principalmente por meio de texto em áudio. Existe pouco texto verbal,
outros formatos como vídeo e formatos específicos do instrumento como realidade
aumentada e GPs. O texto verbal aparece majoritariamente como instrução para a
recepção, como exemplo a tela inicial apresenta o texto "start walk".
Ricoeur (1994) afirma que a narrativa é a forma humana de organiza sua
experiência e sua relação com o tempo. Seja essa narrativa histórica, completamente
ficcional, ou ainda uma mistura de ambas existe sempre uma relação do homem com o
tempo. No gênero em discussão essa relação temporal é duplicada, pois existe o tempo
narrativo e o tempo de recepção, ou como trata Eco (1994) o tempo ficcional e o tempo de
leitura.
O destaque do tempo é relevante pois a recepção está relacionada com a interação
dos receptores com objetos do cotidiano. A leitura da história acontece no tempo
cronológico em que os leitores se movimentam pelos caminhos indicados, realizam as
tarefas orientadas. Concomitantemente a este tempo, que Gorender (2016) chamou de
tempo locativo, o tempo ficcional se desenrola e é organizado por meio da narrativa.
Além do tempo, Gorender (2016) também destaca o espaço nas narrativas locativas.
Esse autor destaca que no gênero discutido o espaço é híbrido:
a) Concreto: É o espaço geográfico físico pelo qual os receptores se movimentam
b) Virtual: É um espaço real em potência.
c) Narrativo: É o espaço em que a narrativa acontece.
Apesar do autor (2016) diferenciar essas três vertentes do espaço, reiteramos que
na verdade são facetas do mesmo espaço que se hibridiza no tempo da narrativa.
Eco (1994, p. 93) cita em uma de suas palestras um encontro com um leitor que
tentou transformar, nas palavras do semioticista italiano “a Paris ‘real’ num lugar de meu
livro e, dentre todas as coisas que poderiam encontrar na cidade, selecionaram somente os
aspectos que correspondiam as minhas descrições”. Na opinião desse autor, os leitores
buscaram somente os mesmos aspectos para que o mundo real correspondesse ao mundo
ficcional.
Eco (1994) explica que na leitura de ficção há o que Coleridge (2004, Chapter
XIV) definira como suspensão temporária de descrença. O poeta e crítico britânico
afirmara (2004, Chapter XIV) que “yet so as to transfer from our inward nature a human
interest and a semblance of truth sufficient to procure for these shadows of imagination
that willing suspension of disbelief for the moment, which constitutes poetic Faith”. Para
nós a suspensão da descrença trata das possibilidades de imersão e hibridação do real e
ficcional. Em que cada um permanece em separada, mas a leitura do universo ficcional
deixa de ser realizada em função do que acreditamos ser possível ou impossível no real.
Discutiremos mais a fundo essa questão num capítulo específico sobre as narrativas.
Nesse ponto, torna-se relevante para nós perceber que nas narrativas locativas a
necessidade de suspensão de descrença é atenuada pela semelhança – ou exatidão – do
espaço real e ficcional. Reid et al (2005) apresenta um experimento com a obra Riot! 1831,
baseado nos motins que aconteceram em uma praça pública na cidade britânica de Bristol
em 1831.
O experimento é um estudo sobre o que Reid et al (2005, p. 1) chamam de magic
moments, definido como “those moments which are deemed to be both moving and
memorable and thus are those that people really value” e ainda “you are tuning into history,
eavesdropping on a magic parallel world. It’s full of surprises, it’s funny, poignant, moving
and it brings history alive”. No nosso entendimento um estado de imersão completo na
história, que vai além da suspensão da descrença. Talvez, aqui apontamos uma
possibilidade, esse estado de imersão seja possível mesmo enquanto ocorra descrença.
Nesse estudo Reid et al (2005) recriaram, em um museu, o cenário da batalha.
Durante três semanas mais de 700 pessoas experimentaram a obra, e responderam a
questionários ao fim. Ao mesmo tempo em que um ambiente foi recriado, simulando a
realidade, as pessoas recebiam aparelhos com GPs e fones de ouvido em que sons de
batalha soavam constantemente. Torna-se óbvio perceber que o local em 1831 era diferente
do momento em que os pesquisadores apresentaram a obra. Entretanto, apesar de algumas
dificuldades, relacionadas a usabilidade e gênese do instrumento, os autores citados (2005)
perceberam pela análise dos questionários que existia o sentimento de “experimentar”
literatura.
Bibliografia