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FUDAMENTOS OE TEORIADG DELIEO IUAREZ TAVARES obrigado, civilmente, a reparar 0. dano ¢ ainda evitar danos maiores para a vitima; no estado de necessidade defensivo, a exclusao da ilicitude estende seus efeitos também ao direito civil (art. 929, CC) © Cédigo Penal dispde ainda que no pode invocar estado de ne- cessidade quem tenha o dever legal de enfrentar o perigo (art, 24, § 19). Essa norma, porém, deve ser interpretada em conformidade com a pré- pria esséncia do estado de necessidade. Quando o bem sacrificado for de menor valor do que o bem protegido, a despeito da existéncia de um dever legal de arrostar 0 perigo, o agente pode estar acobertado por essa causa - de justificagio. A ordem juridica nao pode obrigar, por exemplo, que um soldado bombeiro sacrifique a propria vida para salvar patriménio alheio. Quando dispde sobre o crime de omissio de socorta, 9 Cédigo Penal far ‘bem a ressalva de presté-lo “sem risco pessoal” (art. 135). +2. ALEGITIMA DEFESA O CGédigo Penal define, assim, a legitima defesa (art. 24): “En- tende-se em legitima defera quem, usando moderadamente dos meios necessdrios, repele injusta agressdo, atual ou iminente, a direito seu ou de ‘outrem”. Da mesma forma como no estado de necessidade, pode-se repartir a analise da legitima defesa em dois segmentos: da situacdo de defesa ¢ da agdo defensiva A situacao de defesa compreende a existéncia de-uma agressao injusta, atual ou iminente, a bem juridico do agente ou de terceiro, J42 acio defensiva consiste em repelir a agressao com o-emprego de meios necessirios ¢ moderados. Sao intimeros os fundamentos do exercicio da legitima defesa. Podem ser clencados os mais comuns: teoria do exercicio da autorute- Ja, teoria do instinto de conservagaio, teoria dos motivas justos, teoria da necessidade de protegao de bem juridieo, teoria da integridade do injuste, teoria da autonomia individual, teoria do direito prevalente ‘teoria preventivista ou funcional.** De acordo com a definigao do direito positive brasileiro eas deli- mitacées legais da legitima defesa, pode-se dizer que, aqui, praticamente, “08 argumentos mais coerentes se valem das teorias da necessidade, do direito prevalente ¢ da aurotutela, conforme sua adequagio 4 andlise do 373. Para uma anise miinvedosa destasteorizs, LUZON PENA, Diogo Manuel. Aypectos exencies deka fegicime densa, Buenos Aires: Back, 3002. p.6 €55. CAPITULO SECAE I ~ WAS Cats LEGAIS DE JUSTE caso. Assini, a andlise acerca do emptegs dos meios esté andorada na reoria da necessidade; o confronto entre direito do agredido e direita do agressor, em caso de provocacio, se situa sob a égide da teoria do direito prevalente; a compreensio acerca da arualidade da agressio ou mesmo da necessidade da reacao pode ser feita a partir da teoria da-autotutela. A. ASITUACAO DE DEFESA Pressuposto da situagao de defesa é a ocorréneia de uma agressio. ‘Compreende-se por agressio'o ato que lesa ou pée em perigo concreto 0 bem juridico. Por exemplo, A atira contra B; A diz palavras ofensivas contra B; A sequestra B; A subtrai uma coisa de B; A ameaga B. Diversamente do que ocorria no direito penal comum europeu, a agressio se estende a qualquer bem juridico, nao somente 4 vida ou & integridade corporal, Vé-se que, pela definigao legal, 0 Cédigo Penal néo condiciona a legitima defesa & ponderagao de bens e valores. Isso quer dizer que, em principio, todos os bens juridicos sio passiveis de protecdo por esse meio, Ha, porém, uma particularidade: quando se tratar de bens vinculados A funcionalidade administrativa, cujo exercicio é efetuado pelo Estado, por exemplo, nos crimes contra a administracio publica ou contra a existéncia ou a soberania de proprio Estado, ainda que sejam bens vinculades 3 pessoa, conforme o conceito personalissimo de bem juridico, sua defesa sera cometida aos agentes piiblicos, que, no caso, estéo autorizades a fazé-lo em face da nao identificagao direta da pessoa agredida. Assim, nfo cabe legitima defesa em favor do Estado, muito menos em favor de qualquer de seus interesses, como a seguranga nacional, a estabilidade da moeda ou as reservas cambiais. Ninguém poderd matar uma pessoa que esteja de posse de documentos que possam. implicar a estabilidade do regime e, entao, em face disso arguir em scu favor a legitima defesa, porque estaria protegendo o Estado, 0 regime ou o governo. Também nao cabe legitima defesa diante de agressio a bens da comunidade, salvo quando implique agressio a um bem pessoal.” Da mesma forma, nao se admite legitima defesa em favor da incolumidade ptiblica: nao atua em legitima defesa quem agrida uma pessoa embriagada para que essa nao se ponha na direcio de um vefculo endo venha a causar perigo pata os tran- seuntes. Diversa serd, no. entanto, a situagio, quando o motorista estiver 374, LUZON PENA, Diego Manuel. (Nota 373): p. 339. a mA DO DELITO: wUAREZ TAVARES préximo deatropelar uma pessoa; daf ha iminéncia de uma agressio, No conflito havido entre a suposta agtessao a direito do Estado ea liberdade individual, a solugio serd sempre em beneficio da pessoa € nao do ente coletivo. Um: policial pode-prender, assim, um espifio e, até, em casos extremes, trocar tiros com ele, mas isso nao ¢ de atribuicio do particular. Seguindo uma moderna orientacao, pode-se dizer também que nao € passivel de legicima defesa o bem que esteja submerido a outra forma especial de protegio. Por exemplo, o proprievétio nao atua em lepiti- ma defesa de seu patriménio ao ameacar o inquilino para que limpe o imével. Ha, aqui, um contrato de locagao que regulamenta ¢ disciplina direitos deveres das partes, o qual deve ser aplicado a0 caso, nio se justificando a conduta ameacadora do proprietirio.2™ A primeira condigao da agressio ¢ a de que seja injusta, Nesse senti- do, nio importaa espécic de dominio do proceso causal. Assim, a agressio pode ser realizada vanto por dolo quanto por culpa. Uma agresséo se diz injusta quando nao possa ser tolerada pelo agredido. A injustica da-agressio implica, inicialmente, sua ilicitude. A ilicitude da agressfio se pauta por toda ordem juridica. Seri injusta a agressio que configure um delito, um mero ilicito civil ou um ilicito administrativo. Os actos que excedem risco autorizado, que constituem elemento de um tipo de delito culposo, sao injustos nesse sentido. Entrecanto, serd também injusta aquela agressdo que ndo pode ser objeto de uma pretensio juridica, O direito, por exemplo, no auteriza a cobranca-de dividas de jogo: a ameaga sobre o seu pagamen- to 6, assim, injusta. HA que se observar que, algumas vezes, a agressio pode ser considerada substancialmente injusta.¢ formalmente licita. Seré injusta, desse modo, a agressio, mesmo que autorizada pelo Poder Judiciario, que submeta alguém a um constrangimento que cle ndo estava obrigado a suportar: 0 oficial de justica erra de enderega ¢ quer exccutar o mandade de busca e apreensio ém casa do vizinho. Este pode impedir o ato, sem que isso caracterize @ crime de resisténcia (art. 329, CP) ou, no mesmo exemplo, em que o agredido se vé na iminéncia de ser preso, por erro de nome do destinatdrio da ordem ¢ oferece resisténcia 4 prisio. Normalmente, a agressio ¢ cometida por agio, porque se encon- tra vinculada dirctamente ao perigo ou & lesio de bens do agredido. 375. KINDHAUSER, Ore, (Nowa 322). p14

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