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AULAS CURSO ÊNFASE – 2019

MAGISTRATURA E MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

DIREITO INTERNACIONAL

Prof.º Anderson Silva (Juiz Federal)


Indicação de Livro: PORTELA, Paulo Henrique. Direito Internacional Público e Privado.

Sumário

Introdução à Prova .................................................................................................................. 3


INTRODUÇÃO AO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO – DIP (Aula 1)............... 4
1.1 – CONCEITO DE DIP ..................................................................................................... 4
1.2 – FUNDAMENTO DO DIP ............................................................................................. 4
1.3 – DIREITO INTERNACIONAL vs. DIREITO INTERNO ............................................ 5
FONTES DE DIP (Aula 2 e 3) ............................................................................................... 7
2.1 – ASPECTOS GERAIS .................................................................................................... 7
2.2 – ART. 38 DA CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA – ECIJ ............................... 7
2.3 – CLASSIFICAÇÃO DAS FONTES DE DIP ................................................................. 8
2.4 – FONTES EM ESPÉCIE ................................................................................................ 8
2.4.1 – Convenções Internacionais ......................................................................................... 8
2.4.2 – Costumes Internacionais ............................................................................................. 9
2.4.3 – Princípios Gerais de Direito ....................................................................................... 9
2.4.4 – Atos Unilaterais dos Estados ...................................................................................... 9
2.4.5 – Decisões das Organizações Internacionais ............................................................... 10
2.4.6 – Jus Cogens ................................................................................................................ 10
2.4.7 – Obrigações Erga Omines .......................................................................................... 11
2.4.8 – Soft Law .................................................................................................................... 11
2.4.9 – Jurisprudência e Doutrina ......................................................................................... 11
2.4.10 – Equidade ................................................................................................................. 12
DIREITO DOS TRATADOS (Aula 3 – 7) ........................................................................... 13
3 – NOÇÕES PRELIMINARES .......................................................................................... 13
3.1 – ELEMENTOS BÁSICO DOS TRATADOS .............................................................. 13
3.2 – Classificação dos Tratados .......................................................................................... 16
3.2 – PROCESSO DE ELABORAÇÃO DOS TRATADOS ............................................... 17
3.2.1 - Negociação ................................................................................................................ 17
3.2.2 – Assinatura ................................................................................................................. 17
3.2.3 – Ratificação ................................................................................................................ 18
3.2.4 – Vigência Internacional.............................................................................................. 18
3.2.5 – Registro e Publicação ............................................................................................... 19
3.3 – ADESÃO ..................................................................................................................... 19
3.4 – RESERVAS ................................................................................................................. 19
3.5 – EMENDAS .................................................................................................................. 20
3.6 – EFEITOS ..................................................................................................................... 21
3.7 – INTERPRETAÇÃO .................................................................................................... 21
3.8 – SUSPENSÃO .............................................................................................................. 22
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3.9 - EXTINÇÃO ................................................................................................................. 22


3.9.1 – Denúncia ou Retirada ............................................................................................... 23
3.3 –DOS TRATADOS NO DIREITO BRASILEIRO........................................................ 23
3.1 – COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL ..................................................................... 23
3.2 – PROCESSO DE INCORPORAÇÃO .......................................................................... 24
3.2.1 – Exposição de Motivos .............................................................................................. 24
3.2.2 – Mensagem ................................................................................................................. 25
3.2.3 – Decreto Legislativo................................................................................................... 25
3.2.4 – Ratificação ................................................................................................................ 26
3.2.5 – Decreto Presidencial ................................................................................................. 26
3.3 – PECULIARIDADES DOS TRATADOS DE DIREITOS HUMANOS ..................... 26
3.4 – HIERARQUIA DOS TRATADOS NO DIREITO BRASILEIRO ............................. 26
3.5 – DENÚNCIA DE TRATADOS.................................................................................... 28
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Introdução à Prova

Nas provas de primeira fase dos concursos JF e MPF, temos 10 questões de direito
internacional público e privado. Nas segundas fases, igualmente, se tem observado um
crescimento na cobrança pelos examinadores. Na fase oral, inevitavelmente todas as matérias
são cobradas, de forma que o concurseiro deve estar preparado.
Na prova objetiva, tanto no MPF quanto na JF, entre 70 a 80% das provas são compostas
pela literalidade da lei e dos tratados internacionais. O restante da prova, se divide na cobrança
da posição doutrinária e jurisprudencial (no geral, do STF e do STJ, ou, menos frequentemente,
os precedentes mais conhecidos e sedimentados das cortes internacionais).
Em uma visão analítica das provas objetivas dos últimos 5 anos destes concursos, os
assuntos de maior incidência são:
1. Tratados (13,5%): processo de 8. Extradição (4,9%): fundamento,
incorporação, hierarquia no ordenamento e extradição de nacionais, procedimento;
reserva; 9. Nacionalidade (4,5%): naturalização,
2. Migrantes (8,4%): deportação, expulsão, perda, estatuto da igualdade;
asilo, refúgio; 10. Homologação de sentença estrangeira
3. Normas indiretas de DIPRI (7,2%): (4,3%): requisitos, ordem pública,
qualificação, casamento, bens, obrigações; procedimento;
4. Sequestro internacional de crianças 11. MERCOSUL (4,1%): estrutura
(6,2%): objeto, procedimento, exceções à institucional, solução de controvérsias;
regra do retorno; 12. Processo Civil Internacional (4,1%):
5. Estado (5,4%): imunidade de execução e competência internacional, litispendência,
de jurisdição; aplicação do direito estrangeiro;
6. Domínio público internacional (5%): mar 13. Fontes de DIP (3,3%): art. 38 da ECIJ,
territorial, zona econômica exclusiva e costume, princípios gerais do direito, atos
espaço aéreo; unilaterais/decisões;
7. Prestação internacional de alimentos (5%): 14. Outros (24,1%).
vigência e aplicabilidade da Convenção de
NY e de Haia, autoridade central,
procedimento;
Sendo assim, no estudo para as duas carreiras, deve-se antes da ênfase a estas matérias.
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INTRODUÇÃO AO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO – DIP (Aula 1)

Nesta matéria, há três questões essenciais que necessitam ser entendidas como
premissas para o entendimento de toda a disciplina: conceito, fundamento de DIP e a relação
entre a ordem jurídica internacional e a nacional.

1.1 – CONCEITO DE DIP

No enfrentamento desta questão, a doutrina usualmente elenca três critérios para definir
o DIP:
(a) critério do sujeito: para este, o DIP seria o ramo do direito que regula a relação entre os
sujeitos de direito internacional;
(b) critério das matérias reguladas: aqui, o DIP seria o ramo responsável pelas normas de
regulação dos assuntos que ultrapassam o direito interno/doméstico:
(c) critério das fontes: segundo este, o DIP é o ramo do direito regulado por normas
jurídicas internacionais.
Para a maioria dos autores, a definição completa de DIP não seria encontrada pelo
acolhimento de um ou outro critério, sendo necessário a análise conjunta dos três. Sendo assim,
o DIP seria o ramo do direito que estuda as normas jurídicas oriundas de fontes internacionais,
que regulam as relações entre sujeitos internacionais, em questões que ultrapassam os limites
de direito interno de cada Estado.

1.2 – FUNDAMENTO DO DIP

Este ponto busca elucidar a questão sobre o porquê as normas internacionais se mostram
obrigatórias. Para isto, temos duas teorias: a teoria voluntarista e a teoria objetivista.
Para a Teoria Voluntarista, as normas de DIP apenas vinculam os Estados porque eles
apresentam seu consentimento. Logo, se os Estados não concordassem na vinculação das
normas internacionais, eles não poderiam ser obrigados a assentirem. Sobre isto, vale salientar
ainda a distinção apresentada por Francisco Rezek, para quem existe dois tipos de
consentimento:
(a) Consentimento Criativo: aquele empregado para a criação de novas normas;
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(b) Consentimento Perceptivo: aquele que reconhece a existência de normas anteriores,


sem as quais a convivências internacional seria impossível. Como exemplo, temos o
princípio do pacta sunt servanda.
Em contraponto, para a Teoria Objetivista, as normas internacionais vinculam os
sujeitos de DIP independentemente de sua vontade, dada a essencialidade de sua aplicação para
a boa convivência internacional. Assim, imaginando o surgimento de um novo Estado, ele
estará vinculado à observância de uma plêiade de regras como, por exemplo, da proibição do
emprego de trabalho escravo, a observância do direito internacional humanitário nos conflitos
armados e etc.
Vale salientar que hoje a tendência é a predominância da teoria objetivista.

1.3 – DIREITO INTERNACIONAL vs. DIREITO INTERNO

Para tratar desta questão, a doutrina indica a existência de algumas correntes para
explicar o relacionamento entre o direito internacional e o direito interno.
Desta feita, para a Teoria Dualista, tal como idealizada por Triepel, o Direito
Internacional e o Direito Interno são ordens jurídicas absolutamente separadas e independentes.
Assim sendo, para que uma norma internacional pudesse produzir efeitos na ordem doméstica
de determinado Estado, seria necessário que tal regra fosse submetida a procedimento de
internalização, ou seja, seria necessário que o Tratado fosse incorporado à ordem jurídica
nacional como uma lei.
Com algum diferencial, Anzilotti apresentou depois a Teoria Dualista Moderada,
segundo a qual, embora as ordens jurídicas internacionais e internas sejam distintas, para que
um tratado internacional passe a produzir efeitos em âmbito doméstico, basta que seu texto
passe por um procedimento simples de incorporação, sem a necessidade de submissão a todo o
processo legislativo.
Em contraponto à teoria dualista e sua respectiva variação, temos a Teoria Monista,
preconizada por Hans Kelsen, para quem o direito internacional e o direito interno representam
uma única ordem jurídica. Sendo assim, a mera aprovação de um tratado já bastaria para ele
produzisse efeitos na ordem jurídica nacional. No entanto, dentro desta teoria, vale observar a
existência de três subdivisões.
Assim, segundo a Teoria Monista Internacionalista, por mais que o direito
internacional e o doméstico pertençam a uma única ordem jurídica, o certo é que, na ocasião de
conflito entre uma norma de direito internacional e outra de direito nacional, a primeira deve
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prevalecer. No sentido inverso, a Teoria Monista Nacionalista preconiza que as normas de


direito interno devem prevalecer sobre as normas de direito internacional no caso de conflito.
Como um meio-termo, a Teoria Monista Moderada afirma que, como as leis internacionais e
as nacionais encontram-se no mesmo patamar hierárquico, na ocasião de conflito de leis, devem
ser aplicadas as regras de antinomia (regra da especialidade e da anterioridade).
Alguns autores agora vêm trazendo a ideia de Monismo Dialógico, afirmando que o
conflito entre o monismo e o dualismo, tal como em sua concepção clássica, não mais é
suficiente para tratar das atuais questões práticas. Assim, notadamente nas questões de Direitos
Humanos, deve ser aplicada a ideia de um monismo dialógico, cujo cerne defende a aplicação
da norma mais benéfica à proteção da pessoa humana – conforme o princípio pro homine –
independente de a norma ser oriunda da ordem internacional ou interna.
No Brasil, pode-se dizer que prevalece a aplicação da Teoria Dualista Moderada,
conforme decidido reiteradamente pelo STF (ADI-MC 1480 e CR 8279-AgR). Desta feita, a
aplicação das normas de um tratado internacional na ordem doméstica demanda um
procedimento de internalização/incorporação.
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FONTES DE DIP (Aula 2 - 3)

2.1 – ASPECTOS GERAIS

Fonte são os meios dos quais emanam as normas jurídicas. Na dogmática jurídica, então,
notadamente considerando em seu aspecto formal, as fontes têm o papel de determinar o que é
direito.
Em DIP, conforme a doutrina tradicional, a regra é que as fontes não têm hierarquia
entre si. Porém, não se pode esquecer que em duas situações há determinada hierarquia entre
as normas no âmbito do direito internacional:
(a) jus cogens (art. 53 e 64 da CVDTE): o conjunto de normas internacionais em
relação as quais não se admitem derrogação, podendo ser modificadas apenas por
normas de mesma natureza. Desta forma, a norma trazida em tratada que contrarie jus
cogens é nula.
(b) Carta das Nações Unidas: pelo art. 103 da Carta, os Estados-parte da organização
não pode aprovar tratados cujo teor contrarie as regras trazidas pela Carta.

2.2 – ART. 38 DO ESTATUTO DA CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA – ECIJ

Eis o teor do dispositivo:


A Corte, cuja função é decidir de acordo com o direito internacional as controvérsias que lhe
forem submetidas, aplicará:
a. as convenções internacionais, quer gerais, quer especiais, que estabeleçam regras
expressamente reconhecidas pelos Estados litigantes;
b. o costume internacional, como prova de uma prática geral aceita como sendo o direito;
c. os princípios gerais de direito, reconhecidos pelas nações civilizadas;
d. sob ressalva da disposição do Artigo 59, as decisões judiciárias e a doutrina dos juristas
mais qualificados das diferentes nações, como meio auxiliar para a determinação das regras
de direito.
A presente disposição não prejudicará a faculdade da Corte de decidir uma questão ex aequo
et bono, se as partes com isto concordarem.

De início, vale salientar que, por mais que o artigo mencione “a Corte” como o
destinatário da norma, a doutrina e a jurisprudência internacional veem no art. 38 como uma
regra geral sobre fontes de DIP, a ser aplicada ao direito internacional como um todo.
A primeira fonte trazida ali são as convenções internacionais. Neste quesito, para que
o tratado em questão seja aplicado no caso concreto, mostra-se necessário que ambos os Estados
litigantes devem reconhecer a convenção.
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Em seguida, o ECIJ menciona os costumes internacionais como fonte de direito. Ali,


tal como é conceituado, para que seja considerado como fonte, a prática deve ser considerada
geral, isto é, empregada por todos; e também ser aceita como direito, de forma que o povo a
considere como sendo uma regra, muito embora não escrita.
Outra fonte trazida são os princípios gerais de direito. Trata aqui a ECIJ, dos princípios
que, de uma forma geral, são reconhecidos pelo direito interno das nações e, por isso, podem
ser empregados em âmbito internacional.
Como meio auxiliar para a determinação das regras de direito – e não propriamente uma
fonte de DIP, portanto – a ECIJ menciona as decisões judicias e a doutrina de direito
internacional. Ou seja, na falta das fontes anteriores, estas duas podem ser alegadas para a
solução do caso concreto.
Por fim, a ECIJ menciona a possibilidade de solução da questão ex aequo et bono, o
que significa que a controvérsia será resolvida por meio de um juízo de equidade. Para tanto,
será necessário que as partes envolvidas concordem.

2.3 – CLASSIFICAÇÃO DAS FONTES DE DIP

Há se salientar que o rol de fontes não se esgota na previsão do art. 38 da ECIJ e, por
isso, a primeira classificação, que diz respeito à previsão estatutária, afirma que as fontes
podem ser:
(a) Estatutárias: as previstas na ECIJ, sendo que estas se subdividem entre principais
(convenções internacionais, costumes internacionais e princípios gerais de direito) e
auxiliares (jurisprudência e doutrina)
(b) Extra-estatutárias: as que não estão previstas no art. 38 da ECIJ, tais como atos
unilaterais dos Estados e decisões das organizações internacionais, entre outras.
Doutra banda, quanto ao acordo de vontades, as fontes podem ser convencionais, se
resultam de consenso – aqui enquadrando-se basicamente os tratados; ou não-convencionais,
que são as demais fontes.

2.4 – FONTES EM ESPÉCIE

2.4.1 – Convenções Internacionais


Tratados são acordos de vontade firmados por determinados sujeitos de direito
internacionais em forma escrita e com conteúdo juridicamente vinculante.
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Devido a importância do tema, aulas específicas serão direcionadas a tratar desta fonte.

2.4.2 – Costumes Internacionais


Trata-se de uma prática reiterada dos sujeitos internacionais, aceita como sendo
obrigatório. Neste conceito, como se vê, podemos identificar dois elementos importantes:
(a) objetivo/material, que é a reiteração;
(b) psicológico/subjetivo, que é a concepção de obrigatoriedade da prática. Este último
elemento, a propósito, é o que marca a diferença entre costume e uso, pois a prática
reiterada sem noção de obrigatoriedade é chamada de uso.
Não há que se falar em processo de incorporação de costumes internacionais, de forma
que a prática reiterada acaba veiculando os sujeitos internacionais independentemente de sua
manifestação de vontade.
Por fim, quanto aos costumes, vale tratar da Teoria do Objetor Persistente (persistente
objector), segundo a qual, se um sujeito internacional se opõe, desde o nascedouro do costume,
à sua aplicação, não será por ele vinculado. Esta tese fora aplicada na resolução do Caso das
Pescarias (1951) pela ECIJ, embora, na atualidade, a doutrina internacionalista majoritária não
aceite a sua aplicação, justamente pela tendência objetivista, que defende que algumas normas
de DIP são vinculantes aos Estados independente da manifestação de sua manifestação de
vontade.

2.4.3 – Princípios Gerais de Direito


São normas dotadas de maior grau de abstração e generalidade que são acolhidas pela
maioria das ordens jurídicas domésticas dos Estados. Dentre eles, podem ser citados o princípio
do pacta sunt servanda, da coisa julgada, da vedação ao enriquecimento ilícito entre outros tão
populares quanto.
Cite-se que não se pode confundir este conceito de princípios gerais de direito com o
que se concebe como sendo princípios gerais DO direito internacional, entre os quais podem
ser citados o da autodeterminação dos povos, da igualdade jurídica entre os Estados e o da não-
intervenção.

2.4.4 – Atos Unilaterais dos Estados


São manifestações inequívocas de vontade dos Estados que geram efeitos jurídicos
vinculantes. São exemplos destes, o reconhecimento de Estado e de Governo, renúncia e
denúncia de tratado.
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Sobre os atos unilaterais, eles podem ser classificados em expressos e tácitos, conforme
se manifeste esta vontade estatal. Sem prejuízo, estes atos unilaterais podem ser
autonormativos, quando eles geram obrigações para o declarante, ao passo que os
heteronormativos têm o condão de vincular e criar direitos também outros sujeitos de direito
internacional.

2.4.5 – Decisões das Organizações Internacionais


São manifestações pelas OI que produzem efeitos jurídicos externos, além do âmbito
destes sujeitos internacionais, que vinculando-as e, às vezes, os seus membros, tal como é
exemplo as Resoluções do Conselho de Segurança da ONU.

2.4.6 – Jus Cogens


Segundo a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, jus cogens representa um
conjunto de normas internacionais, aceitas e reconhecidas pela comunidade internacional dos
Estados, da qual nenhuma derrogação é permitida e que só pode ser modificada por norma
posterior de mesma natureza. Desta feita, podemos destacar duas características básicas da
norma de jus cogens: inderrogabilidade e superioridade.
Nesses termos, eis o art. 53 da Convenção:
Art. 53. É nulo um tratado que, no momento de sua conclusão, conflite com uma
norma imperativa de Direito Internacional geral. Para os fins da presente Convenção,
uma norma imperativa de Direito Internacional geral é uma norma aceita e
reconhecida pela comunidade internacional dos Estados como um todo, como norma
da qual nenhuma derrogação é permitida e que só pode ser modificada por norma
ulterior de Direito Internacional geral da mesma natureza.

Desta forma, a norma que vier em confronto com norma de jus cogens será inquinada
de vício de nulidade. Aliás, ainda que haja alteração na norma de em questão, haverá a nulidade
subsequente, conforme manda o art. 64 da Convenção:
Art. 64. Se sobrevier uma nova norma imperativa de Direito Internacional geral,
qualquer tratado existente que estiver em conflito com essa norma torna-se nulo e
extingue-se.

Sobrevindo a nulidade, o art. 71 da mesma Carta determina as providências a serem


determinadas pelos sujeitos de DI, bem como as respectivas consequências jurídicas:
Art. 71.
1. No caso de um tratado nulo em virtude do artigo 53, as partes são obrigadas a:
a)eliminar, na medida do possível, as conseqüências de qualquer ato praticado com
base em uma disposição que esteja em conflito com a norma imperativa de Direito
Internacional geral; e
b)adaptar suas relações mútuas à norma imperativa do Direito Internacional geral.
2. Quando um tratado se torne nulo e seja extinto, nos termos do artigo 64, a extinção
do tratado:
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a)libera as partes de qualquer obrigação de continuar a cumprir o tratado;


b) não prejudica qualquer direito, obrigação ou situação jurídica das partes, criados
pela execução do tratado, antes de sua extinção; entretanto, esses direitos, obrigações
ou situações só podem ser mantidos posteriormente, na medida em que sua
manutenção não entre em conflito com a nova norma imperativa de Direito
Internacional geral.

Diante destes fatos, pode-se afirmar que muitos autores elencam o jus cogens como uma
das fontes de DIP. Outros partidários, porém, indicam jus cogens não como uma fonte do
direito, mas sim como uma característica que revestem determinadas normas, dada a
importância de seu conteúdo, ainda que seja uma norma consuetudinária.
São normas de jus cogens a proibição a escravidão e do genocídio, as normas de Direito
Internacional Humanitário dos conflitos armados.

2.4.7 – Obrigações Erga Omines


São obrigações que vinculam todos os sujeitos internacionais, não se confundindo com
as normas de jus cogens, apresentadas como um conceito mais amplo. De fato, estas obrigações
não são dotadas de superioridade e de inderrogabilidade. Como exemplo, temos o direito de
passagem inocente.

2.4.8 – Soft Law


Tratam-se de normas jurídicas internacionais caracterizadas por um reduzido grau de
imperatividade, situando-se entre um conselho e uma norma jurídica tradicional, sendo tomadas
por normas programáticas por assim dizer. Para exemplificar, podem ser citadas as declarações,
códigos de conduta e recomendações.
Muitos citam as soft law como fonte de DIP, enquanto que outros mencionam como
sendo uma característica de determinadas normas.

2.4.9 – Jurisprudência e Doutrina


Pelo ECIJ (art. 38), jurisprudência e doutrina são taxadas não como fontes de DIP, mas
como meios auxiliares de resolução de controvérsias.
De fato, muito embora as decisões de cortes internacionais não sejam vinculantes, elas,
sem dúvida, exercem grande influência em cenário internacional. Pela mesma razão,
considerando que os ensinamentos dos estudiosos de DIP não são dotados de imperativos,
muitos autores relutam em considerar a doutrina como fonte do direito.
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2.4.10 – Equidade
Trata-se de trazer justiça ao caso concreto, aparando as arestas da Lei.
Prevista no art. 38 do ECIJ, a aplicação da equidade apresenta-se mais como meio de
integração de lacunas normativas, dependendo, para tanto, da anuência das partes envolvidas
para que seja aplicada. Em que pese isto, alguns autores a relacionam como fonte de DIP, e não
como meio auxiliar.
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DIREITO DOS TRATADOS (Aula 3 – 7)

3 – NOÇÕES PRELIMINARES

Atualmente, existem duas Convenções sobre Direito dos Tratados: a Convenção de


Viena (1969) e a Convenção de Viena de (1986), sendo que esta segunda, embora ainda não
tenha entrado em vigor por não ter alcançado ainda o número mínimo de ratificações, é também
aplicada.
Nesses termos, ambas as convenções trazem o conceito de tratado, sendo descrito como
“um acordo internacional concluído por escrito entre Estados e regido pelo Direito
Internacional, quer conste de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos,
qualquer que seja a sua denominação específica” (art. 2, 1, a da CV/69). Diante destes termos,
a doutrina em massa lança críticas ao conceito entabulado pela Convenção, principalmente
tanto porque limita aos Estados o poder de celebrar de Tratados, excluindo indevidamente os
demais sujeitos de direito internacional, como também por mencionar elementos que são
desnecessários a um Tratado. Sendo assim, a doutrina adequa o conceito de Tratado,
sintetizando a “acordo de vontades entre determinados sujeitos internacionais, na forma escrita
e com conteúdo juridicamente vinculante”.

3.1 – ELEMENTOS BÁSICO DOS TRATADOS

Considerando o conceito trazido pela doutrina acerca dos Tratados, podemos citar
quatro Elementos Básicos:
(a) acordo de vontade;
(b) forma escrita;
(c) conteúdo juridicamente relevante;
(d) celebrado entre sujeitos internacionais competentes para tanto, segundo as normas
de DIP;
Assim, a princípio, deve-se ter em mente que só existe Tratado se houver consenso,
pois, em última ordem, ele representa um contrato, estabelecendo deveres e obrigações às partes
que o ratificam.
Sem prejuízo, o tratado deve necessariamente ser celebrado na forma escrita, sendo,
portanto, um documento solene. Em adendo, considerando que os tratados estão situados no
mundo do direito, ele produzirá efeitos e obrigações jurídicas, e não puramente morais.
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Diferente dos tratados os chamados Acordos de Cavalheiros (gentleman’s agreement),


enquanto acordos celebrados entre chefes de Estado/Governo, não são considerados Tratados
porque não constituem obrigações jurídicas, mas puramente morais.
Por fim, aquele consentimento deve ser apresentado por sujeitos de direito capazes e
legítimos para tanto. De pronto, há que se esclarecer que nem todos os sujeitos de DIP podem
celebrar tratados, mas apenas aqueles que, pela Convenção de Viena, são capazes.
São eles:

 Estados
De fatos, os Estados são sujeitos jurídicos por excelência e, portanto, são aqueles que
mais comumente celebram tratados na ordem jurídica internacional. No entanto, algumas
normas de legitimidade devem ser observadas, tal como enuncia o art. 7º da CV/69:
Art. 7º.
1. Uma pessoa é considerada representante de um Estado para a adoção ou
autenticação do texto de um tratado ou para expressar o consentimento do Estado em
obrigar-se por um tratado se:
a) apresentar plenos poderes apropriados; ou
b) a prática dos Estados interessados ou outras circunstâncias indicarem que a
intenção do Estado era considerar essa pessoa seu representante para esses fins e
dispensar os plenos poderes.
2. Em virtude de suas funções e independentemente da apresentação de plenos
poderes, são considerados representantes do seu Estado:
a) os Chefes de Estado, os Chefes de Governo e os Ministros das Relações Exteriores,
para a realização de todos os atos relativos à conclusão de um tratado;
b) os Chefes de missão diplomática, para a adoção do texto de um tratado entre o
Estado acreditante e o Estado junto ao qual estão acreditados;
c)os representantes acreditados pelos Estados perante uma conferência ou organização
internacional ou um de seus órgãos, para a adoção do texto de um tratado em tal
conferência, organização ou órgão.
Como resta claro da leitura do dispositivo, o certo é que os Estados participam das
tratativas que envolvem a ratificação de um tratado por meio de representantes. Estes, por sua
vez, salvo as exceções apresentadas na CV, devem ser dotados de uma carta de plenos poderes,
uma espécie de procuração que o dota de legitimidade para atuar em nome da nação. Com este
documento, o indivíduo em questão é denominado plenipotenciário. Há casos, porém, em que
a apresentação desta carta é dispensada:
(a) chefes de Estado, Chefes de Governo e os Ministros das Relações Exteriores, para a
realização de todos os atos relativos à conclusão de um tratado;
(b) os Chefes de missão diplomática, para a adoção do texto de um tratado entre o Estado
acreditante e o Estado junto ao qual estão acreditados;
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(c) os representantes acreditados pelos Estados perante uma conferência ou organização


internacional ou um de seus órgãos, para a adoção do texto de um tratado em tal
conferência, organização ou órgão.

 Organizações Internacionais e Blocos Regionais


Aqui, as normas para celebração de Tratados são extraídas da Convenção de Viena de
1986 sobre Direito dos Tratados entre Estados e Organizações Internacionais. Vale relembrar
que, apesar de aplicado aos casos concretos, tal convenção ainda não entrou em vigor em âmbito
internacionais, haja vista não ter alcançado ainda o número mínimo de ratificações.
Outro ponto de suma importância quanto a legitimidade das OI em celebrar tratados é
que esta capacidade é parcial e derivada. Parcial porque as OI não podem celebrar tratados
sobre qualquer assunto, mas apenas sobre aqueles vinculados a sua finalidade institucional; e
derivada porque decorre da capacidade dos Estados que as integram.

 Santa Sé
Trata-se do órgão de cúpula da Igreja Católica apostólica Romana, que vem celebrando
tratados há séculos, razão porque já não se contesta a sua legitimidade. Neste caso, os tratados
celebrados pela Santa Sé são chamados concordatas.

 Beligerantes
São grupos armados que contestam uma ordem jurídica em vigor e, por isso, se entregam
às armas. São tratados como sujeitos jurídicos internacionais em razão do fato de que eles
devem respeitar as regras de direito internacional humanitário sobre conflitos armados, e,
também, como forma de promover a paz ou um armistício por meio de Tratados, a ordem
jurídica internacional também lhes confere a legitimidade para celebrá-los.

 Unidades Subnacionais
As unidades federadas, a depender da ordem constitucional de cada Estado,
eventualmente podem celebrar tratados internacionais.
O Brasil, por exemplo, não permite isto, pois diz a Constituição que é a União que
representa os Estados, Municípios e DF em âmbito internacional. Diferentemente, as unidades
federadas brasileiras podem celebrar contratos internacionais.
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3.2 – Classificação dos Tratados


Bilaterais
Quanto ao
Mutalizáveis: aqueles cujo descumprimento do tratado
número de
Multilaterais por uma parte não enseja a sua extinção.
partes
Não-mutalizáveis
Quanto à Abertos: permite o ingresso de um terceiro sujeito que não participou das
possibilidade tratativas iniciais da celebração do tratado.
de adesão Fechados
Tratados-contrato: aqueles que, além de acarretar obrigações recíprocas,
são constituídos por partes cujos interesses são divergentes – uma parte quer
vender e o outro quer comprar.
Quanto à Tratados-lei: são aqueles que geram regras de comportamento para os
natureza das sujeitos internacionais. Esta distinção foi utilizada há muito no CJ 6147, do
normas STF, em que se considerou que a competência da Justiça Federal para julgar
as causas envolvendo tratados internacionais apenas abrange tratados-
contrato, e não tratados-lei – que podem ser julgados na justiça comum
estadual.
Quanto à Tempo determinado
duração Tempo indeterminado
Forma solene: tratados em que o consentimento é dado tanto na fase de
Quanto ao assinatura e na de ratificação;
procedimento Forma simplificada: aqui o consentimento é apresentado unicamente na
fase da assinatura.
Estáticos: aqueles que, embora os efeitos perdurem no tempo, são
Quanto à instantaneamente produzidos e exauridos, tal como ocorre com um tratado
execução no que firma fronteira entre Estados.
tempo Dinâmicos: aqueles que preveem uma execução que se prolonguem no
tempo.
Totais: aqueles que produzem efeitos em todo o território do Estado-parte.
Quanto à Parciais: conforme a antiga cláusula colonial, quando se era possível que
execução no determinado tratado se aplicava somente à “metrópole” e não à “colônia”,
espaço hoje é possível que o tratado se aplique apenas a alguns entes federativos,
conforme se estipule a cláusula federal.
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3.2 – PROCESSO DE ELABORAÇÃO DOS TRATADOS

Sobre esse assunto, vale ressaltar que a doutrina ainda não tem consenso quanto as fases
que abarcam a criação e processualística da criação dos tratados, podendo-se encontrar
variações tanto quanto ao número de ritos, como também no nome que é dada a cada uma destas
fases. Porém, com alguma segurança, é possível sedimentar cinco fases de elaboração dos
tratados, conforme entendimento majoritário da doutrina de DIP:
(a) negociação;
(b) assinatura ou consentimento provisório;
(c) ratificação ou consentimento permanente;
(d) vigência internacional;
(e) registro e publicidade.

3.2.1 - Negociação
Tudo começa com a negociação, momento em que as partes ajustam os termos do
tratado, com o estabelecimento dos direitos, obrigações e deveres que dali advirão com a
aprovação de seu texto.
Esta fase termina com a Adoção do Texto (art. 9º, CV/69) e com a Autenticação do
Texto (art. 10, CV/69).
A Adoção do Texto é a declaração elaborada por todas as partes pelas partes que afirma
que o texto do tratado está em sua redação final, inalterável. Conforme dita o art. 9º da CV/69,
nos tratados bilaterais a adoção do texto deverá ser afirmada por ambas as partes signatárias,
enquanto que, nos tratados bilaterais, salvo disposição em contrário, ele deverá ser adotado por
no mínimo 2/3 dos signatários.
Já a Autenticação do Texto é o ato pelo qual as partes afirmam que o texto é original e
autentico, mostrando-se mais como uma formalidade de protocolo.
Até aqui, nenhum dos participantes da negociação tem qualquer obrigação com relação
ao texto adotado e autenticado.

3.2.2 – Assinatura
Trata-se do ato através do qual os sujeitos internacionais manifestam seu consentimento
provisório. Na prática, o normal é que o texto do tratado seja adotado e autenticado e, logo em
seguida, seja aberto para assinaturas.
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Em regra, esta assinatura não significa o comprometimento da parte com os termos do


tratado, o que só ocorrerá verdadeiramente com a ratificação. No fim, é como se o sujeito esteja
declarando que está de acordo com os termos do tratado, o que normalmente fica sujeito a
trâmites na seara doméstica de cada Estado.
A assinatura, porém, acarreta alguns efeitos jurídicos aos signatários, quais sejam:
(i) a impossibilidade de alteração unilateral do texto, salvo se reaberta a fase de negociações;
(ii) impedimento de atos que frustrem o objeto e a finalidade do tratado, conforme dita o art. 18
da CV/69. Logo, embora o sujeito não esteja obrigado à ratificação do tratado, ele não pode
atuar de encontro aos objetivos do seu texto.

3.2.3 – Ratificação
É o ato pelo qual os sujeitos internacionais declaram seu consentimento definitivo em
relação ao tratado. Ou seja, é aqui em que o sujeito de fato assume os deveres e obrigações que
estão veiculados no texto do Tratado.
Algumas características desta fase de ratificação são importantes e sujeitas a algumas
confusões, razão porque é bom destacá-las:
(a) ato do Poder Executivo, na pessoa do chefe de Estado ou do Chefe de Governo, e
não do Poder Legislativo – que só entrará em cena no processo de internalização do
tratado;
(b) ato discricionário, pois a mera assinatura do tratado não obriga a ratificação, que,
como ato de soberania, se sujeita a um juízo de conveniência e oportunidade;
(c) expresso, de forma que o ato de ratificação se classifica como ato solene,
inadmissível a ratificação tácita;
(d) irretratável, a partir da ratificação, é impossível voltar atrás, de modo que apenas as
modalidades de retirada do tratado é que desobrigam a parte aos termos do tratado.
Na prática, em se tratando de Tratados bilaterais, a ratificação ocorrerá por meio da troca
de instrumentos ou notas diplomáticas informando do consentimento definitivo. Já nos tratados
multilaterais, estes instrumentos de ratificação são depositados em algum lugar, no geral na
sede de uma organização internacional ou outro local pré-estabelecido no texto.

3.2.4 – Vigência Internacional


Em geral, se se está falando de tratados bilaterais, acarreta desde já a vigência
internacional, o que é excepcionado eventualmente pelo estabelecimento de regra de vigência
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diferida. Por outro lado, nos tratados multilaterais, como regra, a vigência internacional de seu
texto depende de uma quantidade mínima pré-estabelecida de ratificações.
Como se indicou, os tratados podem ter vigência contemporânea, quando o tratado entra
em vigor tão logo depositada a última ratificação necessária ou; pode ter vigência diferida,
opção em que as partes estabelecem que o Tratado entrará em vigor após o cumprimento de um
termo ou data, como uma espécie de vaccacio legis.
Cite-se que, segundo o art. 25 da CV/69 é possível que haja a aplicação provisória dos
tratados, quando eles poderiam ser aplicados ainda antes da vigência internacional. Contudo,
saliente-se que o Brasil opôs reserva a este dispositivo, de forma que para nós, é impossível a
aplicação provisória dos tratados.

3.2.5 – Registro e Publicação


Hoje, não mais se admite tratados secretos, tal como no passado se via com alarmante
frequência. Esta forma de publicidade ocorrerá através do registro, na ONU, na OEA ou em
outra organização, enquanto que a publicação ocorrerá em sítios de acesso ao público,
geralmente na internet.
Interessante aqui é a redação do art. 102 da Carta da ONU, segundo o qual o tratado que
não tenha sido registrado nos sistemas da Secretaria Geral da ONU, não poderá ser invocado
perante os órgãos desta organização internacional.

3.3 – ADESÃO

Pode acontecer de, após passada todo este processo, uma parte que não tenha participado
da fase de negociação do seu texto deseje participar e ratificá-lo. A este processo, dá-se o nome
de adesão. Este procedimento, porém, apenas ocorre em tratados multilaterais abertos.

3.4 – RESERVAS

As reservas são definidas no art. 2º.1, d da CV/69, sendo o ato pelo qual o contratante
exclui ou modifica o sentido de algumas determinadas cláusulas convencionais. Desta forma,
pode-se afirmar que há a reserva exclusiva, por meio da qual o signatário veta uma disposição
do tratado, abstendo-se de cumpri-la, o que ocorreu quando o Brasil opôs reserva ao art. 25 da
CV/69. Doutra banda, a reserva interpretativa acarreta em uma declaração do contratante
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afirmando que aceita a cláusula, porém, determina que ela seja compreendida em determinado
sentido.
A oposição de reservas deve ser feita entre o período das assinaturas e na ratificação ou
também no ato da adesão. No caso, porém, em que a reserva é feita no ato da assinatura, devem
ser confirmadas quando do consentimento definitivo/ratificação.
Cabe esclarecer que, como regra, as reservas são plenamente possíveis. Contudo, o art.
19 da CV/69 impõe três exceções:
(a) quando o tratado veda reservas;
(b) quando o tratado admite apenas reservas apenas em disposições determinadas;
(c) quando as reservas são incompatíveis com o objeto e a finalidade do tratado.
Por questão de lógica, as reservas também são impossíveis de serem opostas quando de
tratados bilaterais, porque, do contrário, esta seria uma manobra utilizada por uma ou ambas as
partes para se absterem de cumprir os termos por eles mesmos contratados.
Uma vez oposta a reserva pelo contratante, o normal é que ela não demande a aceitação
dos demais contratantes, de acordo com o art. 20 da CV/69. Todavia, a aceitação ou objeção,
expressa ou tácita, da reserva será necessária se isto resultar do fato de o tratado ser celebrado
por um número restrito de signatários ou se tal decorrer de seu objeto e fim. Em se tratando de
ato constitutivo de organização internacional, a oposição de reserva também dependerá de
aceitação pelos demais.
Segundo o art. 21 da CV/69, a reserva impõe alguns efeitos jurídicos. São eles:
(i) as reservas não modificam o tratado no que tange às outras partes em suas relações entre si;
(ii) as reservas modificam o tratado nas relações entre as partes que formularam as reservas e
as que as aceitaram;
(iii) as disposições objeto de reserva não se aplicam à relação entre a parte que a formulou e a
que ofereceu objeção sem se opor a entrada em vigor do tratado;
(iv) o tratado em sua integralidade não se aplica entre a parte que formulou reserva e a parte
que ofereceu objeção opondo-se a entrada em vigor do tratado.

3.5 – EMENDAS

São os atos de alteram, acrescentam ou suprimem parte de um tratado. De acordo com


a sistemática adotada pela CV/69, há um duplo regime jurídico a ser adotado (art. 40), isto é,
para aqueles contratantes que não participaram da edição da emenda, submetem-se ao seu texto
original, enquanto que as partes que criaram do adendo, deverão a ele se submeter.
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3.6 – EFEITOS

Os efeitos dos tratados são abordados a partir do art. 34 da CV/69.


Entre os pactuantes, o principal efeito que o tratado produz é o dever de cumprir as
obrigações nele contidas, o que invoca o famoso princípio do pacta sunt servanda e o princípio
da boa-fé.
Agora, por mais que a regra seja que um contrato/tratado apenas produza efeito entre os
pactuantes, o certo é que alguns efeitos são produzidos em relação a terceiros (aqueles que nem
ratificaram e nem aderiram ao Tratado). Conforme manda os art. 35 e 36 da CV/69, são as
hipóteses:
(i) em caso de situações jurídicas objetivas: aqui, talvez o melhor exemplo seja o do tratado que
fixe limites entre nações. Nessa circunstância, mesmo os sujeitos que não participaram do pacto,
sofrerão os efeitos e estarão vinculados a esta divisão;
(ii) tratado anterior que vincula uma das partes: pode acontecer de, em razão de um tratado
anterior que vincule uma das partes, um terceiro seja também afetado. Um exemplo é o da
cláusula da nação mais favorecida, comum nos tratados comerciais, segundo o qual um Estado
A se compromete junto a um Estado B – através de tratado que contenha a cláusula – a
proporcionar a melhor situação comercial possível no caso de o primeiro ter concedido
condição mais favorável a um Estado C. Logo, o Estado B, por mais que não faça parte do
tratado firmado entre A e C, será beneficiado;
(iii) previsão de direitos para terceiro Estado (art. 36, CV/69): a Convenção admite que um
Tratado preveja direitos para Terceiro, que deverá consentir expressa ou tacitamente em
titularizar este direito;
(iv) previsão de deveres para terceiro Estado (art. 35, CV/69): o melhor exemplo é a
circunstância em que, no âmbito de um tratado bilateral, um terceiro Estado é indicado como
depositário dos instrumentos de ratificação. Neste caso, o consentimento do terceiro Estado
deve ser expresso e escrito.

3.7 – INTERPRETAÇÃO

Os art. 31 e 32 da CV/69 trazem algumas regras específicas de intepretação dos tratados,


que elencam uma regra geral interpretativa e meios suplementares.
A regra geral é a de que os Tratados devem ser interpretados segundo a boa-fé,
observando o sentido comum de seus termos, em seu contexto, à luz de sua finalidade.
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É possível ainda se recorrer a meios suplementares, com o fim de (i) confirmar a


interpretação alcançada pela utilização dos meios gerais, ou quando esta chegar a um resultado
(ii) absurdo ou (iii) ambíguo. Não há lista de meios suplementares de interpretação, no entanto,
a CV apresenta um exemplo, que é recorrer aos chamados trabalhos preparatórios de negociação
na fase preliminar de elaboração dos tratados.

3.8 – SUSPENSÃO

Trata-se da paralisação temporária dos efeitos do Tratado.


Com efeito, o art. 57 da CV/69 admite a suspensão em vista de previsão convencional,
quando, no próprio texto do pacto, uma circunstância pré-estabelecida tem o poder de paralisar
sua vigência.
Igualmente, é possível que por vontade de todas as partes (art. 57) ou por vontade de
algumas partes (art. 58) entrem em consenso sobre a suspensão, caso em que ela apenas gerará
a paralisação para aqueles que aquiesceram.
A conclusão de tratado posterior, cujo texto preveja a paralisação dos efeitos de um
tratado anterior, segundo determina o art. 59, também pode ensejar em suspensão.
Por fim, o art. 60 aborda a hipótese em que a violação substancial do tratado gera a
suspensão, caso em uma das partes viola uma cláusula essencial do pacto, quando o tratado será
suspenso com relação a ela.
Neste assunto, porém, mais importante é o art. 63, cuja redação informa que o
rompimento das relações diplomática/consulares entre Estados não afeta os efeitos dos tratados
firmados entre eles, salvo quando a manutenção destas relações for essencial ao cumprimento
do pacto. Eis o teor:
Art. 63. O rompimento de relações diplomáticas ou consulares entre partes em um
tratado não afetará as relações jurídicas estabelecidas entre elas pelo tratado, salvo na
medida em que a existência de relações diplomáticas ou consulares for indispensável
à aplicação do tratado.

3.9 - EXTINÇÃO

São oito as causas de extinção dos Tratados, abordadas entre os arts. 54 e 63 da CV/69,
são elas:
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(a) Previsão convencional (art. 54), caso em que o próprio tratado impõe uma solução
de término de seus efeitos, seja em razão do transcurso do tempo, seja pela verificação
de uma condição pré-estabelecida;
(b) vontade das partes (art. 54);
(c) denúncia ou retirada (art. 56);
(d) por conclusão de tratado posterior que preveja a extinção de um anterior (art. 59);
(e) violação substancial do tratado (art. 60);
(f) impossibilidade fática ou juridicamente superveniente de cumprimento do tratado
(art. 61);
(g) mudança fundamental das circunstâncias, conhecida pela cláusula rebus sic
standibus (art. 62). Nesse caso, a extinção do tratado deve obedecer a alguns parâmetros:
(i) as circunstâncias devem ser contemporâneas à celebração do tratado; (ii) a mudança
deve essenciais/relevantes; (iii) a mudança deve atingir os fundamentos mais
importantes do tratado e (iv) imprevisível;
(h) superveniência de jus cogens (art. 63).

3.9.1 – Denúncia ou Retirada


Trata-se da hipótese em que o pactuante manifesta o seu interesse de se retirar do
Tratado. Segundo a CV/69, a denúncia obedecerá a um pré-aviso de 12 meses, período em que
será possível a retratação da denúncia.
Cite-se que, apesar de ser a regra, nem sempre será possível a denúncia. São os casos:
(i) tratados de vigência estática, cujos efeitos são produzidos e exauridos tão logo haja a
celebração;
(ii) tratados normativos de elevado valor social e moral (Francisco Rezek);
(iii) tratados que não preveem a possibilidade de retirada ou denúncia.

3.3 –DOS TRATADOS NO DIREITO BRASILEIRO

3.1 – COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL


Segundo a redação combinada dos arts. 21, I; 84, VIII e 49, I, todos da CF, cabe à União,
enquanto pessoa jurídica de direito público, representar o Estado brasileiro em âmbito
internacional. Neste âmbito, é competência privativa (portanto, delegável) do Presidente da
República a celebração de tratados e acordos internacionais. Por suposto, após a conclusão dos
trâmites de ratificação ou adesão ao tratado, será de competência exclusiva (portanto,
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indelegável) do Congresso Nacional a definitiva decisão de internalização do acordo em âmbito


doméstico.
Com isto, vejamos a redação dos dispositivos constitucionais:
Art. 21. Compete à União:
I - manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações
internacionais;

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:


VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do
Congresso Nacional;
Parágrafo único. O Presidente da República poderá delegar as atribuições
mencionadas nos incisos VI, XII e XXV, primeira parte, aos Ministros de Estado, ao
Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União, que observarão os
limites traçados nas respectivas delegações.

Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:


I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que
acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional;

3.2 – PROCESSO DE INCORPORAÇÃO


Como o direito brasileiro veio a adotar a Teoria Dualista Moderada, certo é que as
ordens jurídicas de direito internacional e interno são estruturas diferentes e inconfundíveis, de
forma que, para que uma norma internacional possa viger no Brasil, é necessário que se submeta
ao procedimento de incorporação ou internalização. Segundo o STF (CR 8279 e ADI-MC
1480), este processo, levado a cabo pelo CN, tem por fases:
(a) Exposição de Motivos;
(b) Mensagem;
(c) Decreto Legislativo;
(d) Ratificação;
(e) Decreto Presidencial.

3.2.1 – Exposição de Motivos


Desde a assinatura do tratado já é possível a iniciação do processo de internalização.
Assim, dado o consentimento preliminar, cabe ao Ministro das Relações Exteriores remeter ao
Presidente da República uma exposição de motivos, justificando a conveniência e oportunidade
da assinatura do acordo internacional.
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3.2.2 – Mensagem
Com a exposição de motivos, o Presidente deve remeter uma mensagem ao Congresso
Nacional, solicitando a aprovação do legislativo para que o tratado seja ratificado
(consentimento definitivo).

3.2.3 – Decreto Legislativo


Caberá ao CN analisar o tratado em ambas as suas casas, votando o seu texto, primeiro
na CD e depois no SF. Se aprovado, o CN editará um Decreto Legislativo aprovando o tratado.
Vale mencionar, porém, que existe divergência doutrinária quando a necessidade de
intervenção do CN em todo e qualquer processo de internalização de tratado. De efeito, existe
autores que defendem a posição segundo a qual o fato de o constituinte usar as expressões
redundantes e genéricas como “tratados, acordos ou atos internacionais” no art. 49, I da CF,
significa que nada pode ficar de fora do crivo do CN. Noutra banda, uma segunda corrente
afirma que nem tudo demanda a aprovação do CN, vez que a intenção do Constituinte é a de
que a participação da casa legislativa seja necessária apenas no caso de tratados, acordos ou
atos internacionais que “acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio
nacional”.
Esclarecido isto, cite-se que hoje prevalece o entendimento de que não há necessidade
de aprovação do CN nos casos de:
(i) tratados interpretativos;
(ii) tratados complementares;
(iii) modus vivendi, acordo cujo objetivo é o de determinar que as coisas ficarão na situação
jurídica em que se encontram até que um tratado seja elaborado;
(iv) pacto de contrahendo, um pacto preliminar em que as partes se comprometem a firmar um
tratado no futuro.
Esses tratados cuja celebração dispensa a participação do CN é chamado acordo
executivo, derivados da tradição do treaty da Common Law.
Outro ponto importante a se destacar é o de que, muito embora o CN possa realizar
reservas ao texto do tratado – vinculantes ao Executivo no momento da ratificação, ele não pode
determinar emendas, pois trata-se de incumbência do Executivo no momento da negociação do
tratado.
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3.2.4 – Ratificação
Trata-se aqui do ato de consentimento definitivo para a adesão final ao texto do Tratado,
o qual pode ser realizado exclusivamente pelo Presidente da República como manifestação de
soberania nacional.

3.2.5 – Decreto Presidencial


Se com a ratificação, o tratado pode entrar em vigor no âmbito internacional, apenas
com a publicação do Decreto Presidencial é que ele terá vigor na esfera interna.

3.3 – PECULIARIDADES DOS TRATADOS DE DIREITOS HUMANOS


Desde o advento da EC 45/2004 e somente se se tratar de tratados que versem sobre
direitos humanos, é possível que o processo de internalização resulte em uma norma cujo status
seja o mesmo de uma norma constitucional. De fato, segundo a redação do art. 5º, §3º da CF,
se o tratado for aprovado por 3/5 dos membros da CD e do SF em dois turnos de votação em
cada casa, a norma internacional será integrada a ordem jurídica nacional tal como se fosse uma
Emenda á Constituição. Segundo a doutrina, esse rito terá lugar após o processo de
internalização, isto é, após a edição do decreto presidencial, como uma fase adicional.
Neste âmbito, há que se citar a Teoria da Incorporação Automática, segundo a qual
os tratados que versem sobre matéria de direitos humanos não demandam o decreto presidencial
para que tenham vigência no âmbito interno, sendo válido aqui tão logo entre em vigor no
âmbito internacional. Esta tese é defendida, entre outros, por Flávia Piovesan, mas não encontra
eco na jurisprudência dos Tribunais Superiores. Contrariamente, o STF, por ocasião do
julgamento do CR 8279 e da ADI-MC 1480, definiu que todos os tratados demandam o decreto
presidencial para que produzam efeitos na esfera jurídica interna.

3.4 – HIERARQUIA DOS TRATADOS NO DIREITO BRASILEIRO


Conforme os estudos de Kelsen, o ordenamento jurídico como um todo deve ser
compreendido em forma de pirâmide, em que se demonstrará a hierarquia das normas. Desta
feita, o jurista defendia a existência de uma norma hipotética fundamental, superior a todas a
demais, que seria a matéria básica de onde se origina todo o ordenamento jurídico. Seguida
dela, teríamos a Constituição, donde todas as normas legais devem derivar e observar.
Esquematizando, eis a pirâmide kelseniana:
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Considerando isto, o estudo da hierarquia dos tratados internacionais no ordenamento


jurídico brasileiro perpassa pela divisão dos tratados em três categorias:
(a) tratados comuns: são os que tratam de temas corriqueiros e não excepcionais, tão
logo internalizados, assumem status de lei ordinário. Desta forma, havendo de normas,
o processo de antinomia comum às leis deverá ser aplicado, considerando os critérios
da hierarquia, da especialidade e da antiguidade1;
(b) tratados de direitos humanos: nesta senda, segundo o STF, os tratados de direitos
humanos podem ocupar duas posições na ordem jurídica brasileira. De fato, se
incorporados segundo o rito do art. 5º, § 3º da CF, estes tratados serão recebidos na
ordem jurídica nacional sob o manto de Emendas à Constituição. No entanto, no caso

1
Caso célebre de conflito entre a Lei interna brasileira e uma convenção internacional é o que há entre o Código
de Defesa do Consumidor e as Convenções de Montreal e Varsóvia, que vinha sendo tratada no STJ e que hoje
chegou a um deslinde importante de ser mencionado. De fato, o CDC prevê a reparação integral dos danos
perpetrados ao consumidor no âmbito de uma relação de consumo. Em contraponto, as Convenções de Montreal
e Varsóvia impõem limitações quantitativas para a reparação de danos no âmbito de transporte internacional de
pessoas, cargas e bagagens. Neste âmbito, o conflito de leis não foi possível de ser resolvido pelo critério
hierárquico, pois todas as normas são ordinárias. No entanto, se se vislumbrar a questão pelo critério temporal,
prevalece então as Convenções internacionais, visto que a incorporação da última foi realizada em 2005. Pelo
critério da especialidade, as convenções também prevaleceriam em detrimento do CDC. Como se não bastasse, o
art. 178 da CF, há a previsão de que em matéria de aviação internacional, a legislação deve observar as normas
internacionais. Sendo assim, conforme decidiu o STF segundo o rito da repercussão geral (RE 636.331 e o RE
766.618-Ag.), foi fixada a seguinte tese: “Por força do artigo 178 da Constituição Federal, as normas e tratados
internacionais limitadoras da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as
Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor”. Ou seja,
nos casos de danos ocorridos no âmbito de transporte internacional, a indenização deve obedecer aos limites
estabelecidos no bojo das convenções.
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dos tratados que versem sobre direitos humanos que não foram submetidos àquele rito
ou que foram internalizados no período anterior à EC 45/04, estes terão status
supralegal, conforme tese externada no voto do Min. Gilmar Mendes, por ocasião do
julgamento do RE 466.343, de forma que eles se encontram em uma posição acima das
leis mas abaixo da CF.
(c) tratados de direito tributário: o art. 98 do CTN afirma que “os tratados e as
convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão
observados pela que lhes sobrevenha”. Desta forma, graças ao dispositivo, alguns
autores passaram a encampar a tese da supralegalidade também para os tratados
internacionais que versem sobre direito tributário. Esta ideia já foi adotada no STF pelo
Min. Gilmar Mendes no seu voto no julgamento do RE 460.320 (não concluído) e no
STJ, em posicionamento quase consolidado, como é o caso do REsp 1.272.897.

3.5 – DENÚNCIA DE TRATADOS


Discute-se muito se é necessária a intervenção do CN para a declaração de denúncia de
tratado internacional ratificado pelo Brasil, havendo vozes que defendem que, pelo princípio
do paralelismo das formas, se é necessária a autorização do CN para a ratificação do Tratado,
pelos mesmos motivos é imprescindível a atuação da casa legislativa também quando de
eventual retirada do acordo.
No entanto, a posição que vem prevalecendo na prática internacional é a de que não
seria necessária a intervenção do CN. A propósito, a questão vem sendo abordada no
julgamento da ADI 1625 9ainda não concluído), no qual a maioria dos votos vem partilhando
a ideia de que a intervenção do SF seria, sim, necessária.
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SUJEITOS INTERNACIONAIS (Aula 8 - 11)

4 – NOÇÕES PRELIMINARES

4.1 – PERSONALIDADE JURÍDICA INTERNACIONAL


Sujeito jurídico internacional é o que detém personalidade jurídica de direito
internacional, isto é, aquele que detém a aptidão para titularizar direitos e obrigações na ordem
internacional. Segundo a doutrina, são sujeitos de direito internacional:
(i) Estados;
(ii) Organizações Internacionais;
(iii) Beligerantes;
(iv) Insurgentes;
(v) Movimentos de libertação nacional;
(vi) Santa Sé e Estado da Cidade do Vaticano;
(vii) Indivíduos;
(vii) Empresas Transnacionais.

4.2 – SUJEITOS INTERNACIONAIS EM ESPÉCIE

4.2.1 – Estados
Estado é o principal sujeito jurídico de direito internacional. Segundo os doutrinadores
de Teoria Geral de Estado, Estado é o resultado da combinação de três elementos:
(i) Elemento geográfico: território;
(ii) Elemento humano: povo;
(iii) Elemento político: soberania.
Além deste, a Convenção sobre Direitos e Deveres dos Estados – o Tratado de
Montevidéu – prevê ainda um quarto elemento para a caracterização do conceito de Estado: a
capacidade de manter relações com outros Estados e demais sujeitos internacionais.
Como se vê, portanto, o conceito de Estado não se confunde com o que concebe por
Nação – grupo de pessoas unidos por vínculos culturais, linguísticos, religiosos e etc.,
revertendo-se em um aspecto mais antropológico – ou o que a Constituição chamou de Estado-
membro.
Destrinchando os elementos, temos que Povo é o conjunto de pessoas ligadas ao Estado
pelo vínculo político-jurídico que se chama nacionalidade. Não se confunde, assim, com o que
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se concebe por população, pois este é uma denominação mais geográfica, querendo mencionar
o conjunto de pessoas que vivem em determinada região, independentemente de sua
nacionalidade.
A Soberania, por sua vez, por mais que a doutrina divirja a muito tempo quando ao seu
conceito, pode ser concebida como a prerrogativa que o Estado tem de igualdade no plano
internacional frente aos demais Estados e supremacia no plano interno.
Território, por fim, é o espaço geográfico dentro do qual o Estado exerce a sua
soberania. Há que se observar que existe um conceito estrito de território, segundo o qual este
compreende apenas o solo e o subsolo; e o conceito amplo, no qual se adiciona o espaço aéreo,
águas interiores e fronteiriças. Certo é, porém, que dentro deste espaço territorial, o Estado
exerce jurisdição geral (abrangendo todos os poderes e funções) e exclusiva (excluindo todos
os demais Estados). Há que se esclarecer que embaixadas e consulados não são considerados
território dos Estados a que representam, mas, em virtude de Convenções como a de Viena
sobre relações consulares e diplomáticas, são protegidas por algumas inviolabilidades e
prerrogativas.
Ainda sobre o elemento geográfico, há duas teorias que buscam esclarecer a relação
entre Estado e Território:
(a) Teoria do Dominium: a relação entre Estado e território é de direito real. Então o
Estado teria direito de propriedade sobre seu território;
(b) Teoria do Imperium: defende que o poder do Estado é exercido sobre as pessoas, e
não diretamente sobre o território.
Por fim, é de bom tom mencionar as principais causas de perda e aquisição de território
pelos Estados:
(a) Descoberta seguida de ocupação: é a modalidade mais antiga conhecida pela
humanidade, tratando-se do caso em que, descoberta terra nullius (terra de ninguém) ou
terra derelicta (terra abandonada), ela é ocupada e então reivindicada pelo
descobridor/ocupante. Tem como exemplos célebres a América e o caso Palmas (1928);
(b) Cessão: a transferência a título oneroso ou gratuito de terras;
(c) Acessão: acréscimo natural de terras;
(d) Adjudicação: atribuição de um território por uma organização internacional, tal
como aconteceu com Israel, atribuída pela ONU;
(e) Conquista: é a aquisição de um território pelo emprego da força. Atualmente esta
modalidade está proscrita pelo art. 11 da Convenção de Montevidéu.
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4.2.1.1 – Dever de Não-intervenção


Abordado no art. 2, n. 7, da Carta da ONU, o dever de não-intervenção significa que
nenhum Estado tem o direito de intervir em negócios doméstico de outros Estados.
A respeito deste tema, algumas teorias foram criadas. São elas:
(i) Doutrina Monroe: criada pelo ex-Presidente dos EUA, a ideia aqui era a de evitar a
intervenção das potências europeias nas então ex-colônias americanas. Consiste na célebre
frase: “América para os Americanos”.
(ii) Doutrina Drago: criada por um Ministro Argentino, significa que nenhum Estado pode
sofrer intervenção externa com a finalidade de cobrança de dívidas.
(iii) Doutrina da Intervenção Humanitária (responsability to protect – r2p): a revelia da
ONU, a OTAN resolveu intervir na região do Kosovo onde, passando por um período árduo de
guerra, podia se observar claros casos de crimes de guerra e contra a humanidade. Diante deste
precedente é que surge a doutrina de intervenção humanitária, a qual segue dois princípios:
 Todo Estado tem a responsabilidade primária de proteger os direitos humanos de seus
nacionais;
 Subsidiariamente, a comunidade internacional tem o dever de proteger aqueles direitos
no caso de se o Estado não cumprir com aquele dever, com o fim de evitar graves
violações de direitos humanos.

4.2.1.2 – Imunidade Estatal


A ideia da imunidade vem de um antigo direito costumeiro condensado no brocado
latino par in parem non habet iudicium, que quer dizer que entre iguais não há julgamento.
Com isto, se concebe que a imunidade estatal é a prerrogativa que os Estados têm de não serem
julgados e nem executados ou ter seus bens constritos pela Justiça de outros Estados. Deste
conceito, portanto, é possível identificar dois tipos de imunidade: a Imunidade de Jurisdição e
a Imunidade de Execução, para as quais se confere tratamentos jurídicos distintos.
De fato, no que tange à Imunidade de Jurisdição, a jurisprudência do STF em um
primeiro momento lhe conferiu um caráter absoluto, de forma que nenhum ato de Estado
poderia ser alvo de jurisdição estrangeira. Porém, por ocasião do julgamento da Aci 9696 (1989)
mudou de entendimento e seguindo a tendência internacional, o STF passou a distinguir a
atuação dos Estados conforme se verifique ou não exercício da soberania estatal. Sendo assim,
temos:
(a) Atos de Império: atos que os Estados praticam no exercício de sua soberania, em
relação aos quais detém, portanto, absoluta imunidade de jurisdição. Como exemplo de
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atos de império, temos a concessão de visto de ingresso, reconhecimento de


nacionalidade, etc.
(b) Atos de Gestão: são atos que, embora praticados por um ente estatal, poderiam ser
praticados por particulares, casos em que se consideram que eles atuam na esfera do
direito privado. São exemplos as violações às leis do trabalho que ensejam reclamações,
acidentes automobilísticos, etc.
Em atos de guerra, a imunidade também é absoluta, no Brasil, a circunstância foi
abordada no AgRg no RO 129/RJ, tratando do caso da embarcação pesqueira brasileira
Shangrilá que, afundada por um submarino nazista, teve todos os tripulantes mortos por volta
dos anos de 1940. Constatado o ato de guerra, os familiares das vítimas ingressaram com
pedidos de indenização na justiça brasileira em face da República Federal da Alemanha. No
julgamento, porém, o STJ decidiu que, como a atuação se encaixa no conceito de ato de guerra
(portanto reflexo da soberania do país, então em período de guerra declarada), não pode ser
responsabilizado perante a justiça brasileira.
Quanto a Imunidade de Execução ela será absoluta, independente da distinção entre
atos de gestão e atos de império. Sendo assim, mesmo que um Estado estrangeiro seja
condenado pecuniariamente na Justiça brasileira, a dívida será reconhecida, porém, nunca
poderá ser executada. Ou seja, a dívida passa a ser basicamente de ordem moral, vez que o
Estado estrangeiro paga se quiser.
Em sentido contrário, há entendimento no sentido de que, em relação aos bens não
constritos ou vinculados às atividades diplomáticas, consulares ou de embaixada poderiam ser
objeto de penhora para a satisfação dos créditos a que foram condenados, sem que isto
representasse uma violação as disposições das Convenções de Viena. Nesse sentido, temos a
doutrina de Francisco Rezek e, inclusive, o voto do Min. Celso de Melo no bojo do julgamento
da ACO 645-AgR no STF, mas que, infelizmente não foi acolhido pela Corte.
Em qualquer caso, é possível que o Estado estrangeiro faça renúncia a sua imunidade
de jurisdição e/ou de execução. Cabe citar, no entanto, que se um país renuncia a imunidade de
jurisdição por seus atos de império, isto não implica necessariamente a renuncia à imunidade
de execução, para a qual nova declaração deverá ser feita.
Outra observação é a discussão quanto a aplicação desta imunidade nos casos de atos
de gestão que impliquem em graves violações de direitos humanos, caso que vem sendo
discutido com repercussão geral no STF, no ARE 954.858. Inclusive, vale citar que esta
discussão ganha eco no âmbito internacional, vez que já foi analisado pela Corte Internacional
de Justiça o conflito entre Alemanha e Itália, com a intervenção da Grécia, tratando dos atos de
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guerra e as violações aos direitos humanos causados pela Alemanha no período da 2ª Guerra,
notadamente no período da invasão nazista à Itália. Como resultado, sob muitas críticas, a CIJ
decidiu que, mesmo se tratando de atos de império que impliquem em graves violações aos
direitos humanos, a imunidade de jurisdição se mantém.
Por fim, vale explicitar as regras processuais de competência jurisdicional para tais
casos, as quais podem ser esquematizadas da seguinte forma:
Organização Internacional ou Nação
estrangeira versus Estado-Membro, DF, STF (art. 102, I, CF)
União ou Território
Organização Internacional ou Nação Justiça Federal de 1º Grau (art. 109,
estrangeira versus Município ou pessoa II, CF) com Recurso Ordinário para
física domiciliada no Brasil o STJ (art. 105, II, CF)
Lides trabalhistas Justiça do Trabalho (art. 114, CF)
Quanto à questão procedimental, o STJ, no Ag 1118724/RS assentou que, ao receber
uma petição inicial em que o autor postule a condenação de Estado estrangeiro por ato de
império, o juiz não deve imediatamente extinguir a ação. Em contrário, o Juiz deve notificar o
Estado estrangeiro do processo para que decida se irá ou não renunciar a sua imunidade de
jurisdição, deixando claro que este ato é apenas uma comunicação, e não de citação.

4.2.2 – Organizações Internacionais


São entes formados por pela reunião de Estados ou por outras organizações
internacionais. Vale observar que, pela doutrina, costuma-se dizer que a personalidade jurídica
das organizações internacionais é secundária, na medida em que esta aptidão derive da dos
Estados que a compõe. Ademais, cite-se que apenas a partir do Caso Folke Bernadotte2 (1949),
em um parecer da CIJ, é que a personalidade jurídica das OIs passou a ser reconhecida.
Estas OIs são criadas através de um tratado constitutivo (chamado Constituição ou Carta
ou Estatuto), no qual se prevê a existência de órgãos permanentes e objetivos específicos.
Segundo a doutrina, as OI podem ser classificadas do segundo o seguinte esquema:
Universais
Quanto à abrangência
Regionais

2
Tratava-se de um funcionário da ONU que estava em Israel quando foi assassinado. Diante disto, a ONU um
parecer a CIJ para avaliar a possibilidade de a própria OI requerer a reparação pela morte de seu funcionário. Na
ocasião, a CIJ manifestou-se pela existência de personalidade jurídica própria da entidade, distinta dos membros
que a compõe, e, portanto, apta a perseguir os objetivos próprios de sua fundação.
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Gerais
Quanto aos fins
Especiais
Intergovernamentais
Quanto a natureza
Supranacionais
Quanto ao funcionamento das OI, podemos dizer que ela tem membros originários (que
participaram da criação da entidade) e os membros derivados, que ingressam segundo as regras
de admissão previstas no Estatuto. Outra previsão necessária em Estatuto é o que toca às
sanções de suspensão ou expulsão.
Como as OI não têm território próprio, é comum a celebração de um tratado de sede
com algum Estado, momento em que se estabelece a localização da sede da OI. Além da sede,
as OI também tem funcionários próprios, chamados pessoal paradiplomáticos, cujo regimes
jurídicos muitas vezes se assemelha ao dos cônsules, diplomatas e etc. Por sua vez, o
financiamento das OI é feito de várias formas, porém, a mais comum é a cotização entre os
membros.
No que toca à Imunidade das OI, conforme entende o STF (RE 578.543/MT), ela é de
origem convencional pela previsão em tratado, e absoluta, inaplicável a distinção entre atos de
império e atos de gestão.

4.2.3 – Beligerantes
Tratam-se de grupos armados que contestam uma ordem política em vigor. Em geral,
estes grupos recebem esta denominação a partir do momento em que eles ocupam determinado
território e demonstram certo grau de organização, a exemplo do grupo Estado Islâmico hoje e
dos Confederados na época da guerra de secessão americana.
O objetivo aqui é o de permitir que estes grupos tenham a capacidade jurídica de firmar
tratados internacionais, notadamente aqueles que possam resultar no término dos confrontos.
Noutra faceta, a personalidade internacional também permitirá também a responsabilidade
jurídica internacional por crimes de guerra, genocídio e etc.

4.2.4 – Insurgentes
Assim como os beligerantes, os insurgentes são também grupos armados que contestam
uma ordem política em vigor, com a peculiaridade de terem um grau menor de organização e
de importância no cenário internacional.
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4.2.5 – Movimentos de Libertação Nacional


No período das colonialismo, era comum a formação de facções cujo objetivo era liberar
a região do jugo da metrópole, buscando independência. Nesses termos, recentemente houve a
tentativa de libertação da região da Catalunha do restante da Espanha por meio de refendo
popular organizado por um grupo de oposição ao governo central, grupo tal que era considerado
sujeito jurídico internacional.

4.2.6 – Santa Sé e Estado da Cidade do Vaticano


A Santa Sé é o órgão de cúpula da Igreja Católica Apostólica Romana, ao passo em que
a Cidade do Vaticano é um microestado.

4.2.7 – Indivíduos
Há certa polêmica acerca da personalidade jurídica internacional dos indivíduos. Com
base numa concepção mais moderna, considera-se que os indivíduos são sujeitos internacionais
por vários argumentos, dentre os quais destaca-se o fato de que eles já recebem direitos e
obrigações oriundos de normas internacionais. Sem prejuízo, em alguns casos, indivíduos
podem participar de alguns foros internacionais, pois, por exemplo, pessoas físicas podem ser
réus no Tribunal Penal Internacional, tem capacidade postulatória frente algumas Organizações
Internacionais.
Sob o ponto de vista tradicionalista, os indivíduos não seriam sujeitos internacionais
porque não podem celebrar tratado, sem olvidar do fato de que, segundo eles argumentam, a
capacidade postulatória ou a sujeição perante alguns órgãos internacionais advém não de uma
personalidade jurídica internacional, mas sim por uma liberalidade dos Estados a que são
vinculados.

4.2.8 – Empresas Transnacionais


Da mesma forma que foi abordada a personalidade jurídica internacional dos indivíduos,
também se contesta a das empresas transnacionais pelas mesmas razões.
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ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS – ONU (Aula 12)

5 – CONSIDERAÇÕES GERAIS

A ONU sucedeu a antiga Liga das Nações, logo após o fim da 2ª Guerra Mundial, com
o principal fim de sustentar e manter a paz mundial. Neste afã, a Conferência de São Francisco,
em 26 de junho de 1945, criou a OI, indicando por sedes Nova Iorque e Genebra.
Os objetivos da ONU estão presentes na Carta constitutiva, tal qual elenca o art. 1º:
(i) paz e segurança internacionais;
(ii) desenvolver relações amistosas;
(iii) promover cooperação internacional;
(iv) centro organizador para alcançar fins comuns.
Já o art. 2º da Carta da ONU traz alguns princípios a serem observados pela OI:
(i) igualdade jurídica entre os Estados;
(ii) boa-fé;
(iii) solução pacífica das controvérsias;
(iv) proscrição da ameaça e do uso da força3;
(v) assistência mútua;
(vi) não-intervenção.

5.1 – ESTRUTURA ORGANIZACIONAL

Segundo a Carta da ONU, são órgãos permanentes da OI:


(i) Assembleia Geral;
(ii) Conselho de Segurança;
(iii) Conselho Econômico e Social;
(iv) Conselho de Tutela;
(v) Corte Internacional de Justiça;
(vi) Secretaria Geral.

3
Atualmente, a guerra é um recurso ilícito para o direito internacional, podendo apenas ser tolerado em três
situações excepcionais:
(a) legítima defesa, desde que com o emprego de força proporcional e apenas até a intervenção do Conselho de
Segurança da ONU;
(b) ação coercitiva por ordem do Conselho de Segurança da ONU;
(c) movimentos de libertação nacional;
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A Assembleia Geral é o órgão plenário que congrega todos os membros da OI. Nela,
haverá reunião ordinária uma vez por ano, quando se poderá discutir qualquer tema dentro das
finalidades da ONU ou qualquer órgão de sua organização. Nas deliberações, as decisões são
tomadas através de Resoluções, por voto de 2/3 dos membros em questões de importância e nas
demais maioria relativa.
Já o Conselho de Segurança é o órgão responsável por investigas as situações que
possam ameaçar a manutenção da paz e da segurança internacional e avalia-las. Este órgão é
composto por 15 membros, sendo 5 deles permanentes desde a criação da OI (EUA, China,
França, Reino Unido e Rússia) e os demais. Nas deliberações, é necessário o voto de 9 membros
nas questões importantes, aí incluindo os votos afirmativos de todos os membros permanentes,
os quais detém o chamado de poder de veto.
O Conselho Econômico e Social ou ECOSOC, por sua vez, tem por competência fazer
estudos e relatórios sobre assuntos internacionais de caráter econômico, social, cultural,
educacional e conexos para promover a observância dos direitos humanos.
O Conselho de Tutela, por sua natureza, já deveria ter sido extinto da Carta da ONU,
vez que não existem mais países sob tutela. De fato, a competência do órgão era o de administrar
Estados recém-independentes ou a caminho da independência. Historicamente, este órgão tinha
muita importância no período da independência das nações africanas, que saiam do jugo do
imperialismo europeu, momento em que cabia a ONU indicar uma nação que serviria de tutor
a este novo Estado, com o objetivo de facilitar a transição de regime.
A Corte Internacional de Justiça, devido a sua importância, será estudada em capítulo
a parte. Desde já, porém, cabe esclarecer que a CIJ é o órgão jurisdicional da ONU, cujo o
objetivo é o de dirimir conflitos entre sujeitos jurídicos internacionais.
Por fim, a Secretaria Geral nada mais é que o órgão administrativo, burocrática e
operacionais da ONU. O órgão será chefiado pelo Secretário-geral da OI, o mais alto
funcionário e principal representante da ONU.

5.2 – ORGANISMOS ESPECIALIZADOS

Segundo o art. 57 da Carta da ONU, organismos especializados são organizações


internacionais, com personalidade jurídica própria, vinculadas à ONU por meio de tratados e
pela comunhão de símbolos, princípios e missões, o que forma o chamado Sistema das Nações
Unidas.
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Como exemplos destes organismos temos: UNESCO, OMS, UNICEF, OIT, OACI,
FMI, BIRD e OMC.
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RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL (Aula 13 – 14)

6 – CONCEITO, FUNDAMENTO E ELEMENTOS

É o vínculo jurídico que se forma entre a pessoa internacional que causou dano e a outra
que tenha sofrido os seus efeitos, visando a reparação. Cite-se que, apesar de ser o mais comum,
nem sempre a responsabilidade internacional decorre da prática de ato ilícito.
O direito a reparação tem como fundamentos o princípio do pacta sunt servanta que
tem mais a ver com a responsabilização por ato ilícito, e princípio do neminem laedere, uma
máxima do direito aplicável também na ordem jurídica interna.
A responsabilização tem por característica ser institucional, na medida que diz respeito
basicamente a Estados e organizações internacionais, sem prejuízo da possibilidade de incidir
sobre os demais sujeitos internacionais, porém, jamais sobre indivíduos4. Ademais, a
responsabilidade é civil, tendo por fim de indenizar o lesado.
Vale salientar que, embora tenhamos alguns tratados que mencionem a reponsabilidade
civil por casos específicos, não há um diploma que trate de responsabilidade internacional, de
modo que ela tem por fonte principal os costumes. No entanto, a ONU aprovou recentemente
um pré-projeto de tratado sobre responsabilização internacional por atos ilícitos chamado Draft
Articles on Responsibility of States for Internationally Wrogful Acts,
São os elementos essenciais da responsabilidade internacional:
(a) conduta voluntária: para ensejar a responsabilidade, a conduta deve ser intencional,
e não um ato reflexo, podendo ser comissiva ou também omissiva, lembrando que a
conduta não necessariamente deve ser ilícita. Em adendo, vale salientar que não é
necessário aferir aqui o elemento subjetivo, de forma que a responsabilização é objetiva,
como regra;
(b) imputabilidade: trata-se da possibilidade de se atribuir a conduta causadora de dano
ao sujeito internacional. Quando se fala em Estados e Organizações Internacionais, por
exemplo, enquanto entes abstratos, não praticam condutas, mas sim seus agentes. Desta
feita, como regra, apenas ensejarão a responsabilidade internacional os atos praticados
por entes, órgãos ou servidores que estejam a serviço do sujeito internacional.
Excepcionalmente, é possível que atos praticados por particulares também possam

4
Os quais responderão internacionalmente apenas perante o Tribunal Penal Internacional.
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acarretar na responsabilidade internacional do Estado, no caso em que há uma obrigação


específica de vigilância/cuidado para do Estado com relação a estes particulares;
(c) dano: o dano pode ser material ou moral (este último não previsto no Draft da ONU).

6.1 – CLASSIFICAÇÃO

A responsabilização pode ser direta ou indireta, conforme seja a imputabilidade da


conduta. Assim, a responsabilidade direta é aquela cuja conduta seja diretamente imputável ao
sujeito internacional, ao passo que a indireta é a que a responsabilidade decorre de conduta
praticada por um sujeito internacional que se encontra sob tutela ou responsabilidade de outro.
Ademais, a responsabilidade pode decorrer de conduta lícita, tal como ocorre em danos
causados ao meio ambiente e por atividades nucleares, quando ambas estejam em conformidade
com normas e ainda assim ocorre dano. Se o dano advier de conduta ilícita, a responsabilidade
pode ser convencional – se a violação é de norma presente em tratado – ou delituosa chamada
delituosa – se a norma violada é um costume.

6.2 – EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE

Conforme previsão no Draft Articles on Responsibility of States for Internationally


Wrogful Acts, poderá haver a exclusão da responsabilidade civil internacional quando se
constatar:
(i) Consentimento do Estado: neste caso, para que seja considerada a excludente, o
consentimento deve ser válido e a conduta danosa tenha sido praticada dentro dos limites do
consentimento;
(ii) Legítima Defesa (art. 51, da Carta da ONU): é a reação a um ataque armado, devendo ser
proporcional e deve durar apenas até a intervenção do Conselho de Segurança da ONU;
(iii) Contramedidas ou Represálias: são atos ilícitos praticados como resposta a outro ato ilícito,
mais frequentemente visto no Direito do Comércio Internacional. Como exemplo, imagine-se
que determinado Estado imponha ilegalmente barreiras comerciais a outro, que, vendo-se
prejudicado, recorre a OMC. A OI então permite que o Estado prejudicado imponha as mesmas
medidas ao primeiro, sem que com isto seu ato seja ilícito;
(iv) Força Maior: é o fato imprevisível e irresistível que acarreta dano a outro;
(v) Perigo Extremo: é a situação em que o Estado adota uma conduta dano à terceiro de forma
a evitar uma conduta extrem0amente prejudicial a si próprio;
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(vi) Estado de Necessidade: é o sacrifício de bem jurídico de terceiro para a preservação de bem
jurídico próprio ou de terceiro de maior envergadura ou importância.

6.3 – MEIOS DE REPARAÇÃO

A doutrina fala de três modalidades de reparação, quais sejam:


(a) Restituição: é a reparação ao status quo ante;
(b) Indenização: a reparação de natureza pecuniária, diante da impossibilidade de
restituição.
(c) Satisfação: trata-se de uma reparação in natura, podendo ser feito por meio de um
pedido de desculpas, a punição dos funcionários culpados ou o reconhecimento do
caráter ilícito do fato.
O draft da ONU menciona ainda a garantia de não repetição, o que é reproduzido por
alguns autores.

6.4 – PROTEÇÃO DIPLOMÁTICA

É a assunção por um Estado de uma demanda de um nacional seu contra outro Estado.
O exemplo clássico deste instituto é o caso em que uma empresa estrangeira sediada em outro
país é expropriada e, devido a vários fatores, o Estado da nacionalidade da empresa decide
intervir na situação e levar o caso para o âmbito internacional. Apesar do exemplo, a proteção
diplomática pode se operar em qualquer caso.
A intervenção se dará ex officio ou mediante provocação do nacional prejudicado,
sendo, no entanto, um ato discricionário.
Em relação às organizações internacionais, não se fala em proteção diplomática, mas
sim em proteção funcional.
Para que haja a proteção diplomática é necessário que haja o endosso, o ato em que o
Estado assume para si a defesa dos interesses do seu nacional face a outro Estado. Para tanto, é
necessária que seja comprovada não apenas a nacionalidade do interessado, mas também o
esgotamento dos recursos internos.
Saliente-se que o endosso poderá ocorrer também em favor de sujeitos com dupla
nacionalidade, de forma que qualquer um dos dois Estados pode oferecer a proteção
diplomática, desde que não seja um contra o outro, conforme decisão do Tribunal Internacional
de Arbitragem no Caso Canevaro (1912). Ademais, a nacionalidade deve ser contínua, isto é,
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deve ser anterior a violação do direito – evitando, assim, a busca da nacionalidade apenas para
obtenção de proteção diplomática e também efetiva, de forma que a nacionalidade seja
acompanhada de vínculos sociais, econômicos e políticos do indivíduo para com o Estado (CIJ,
Caso Nottebohm, 1955).
Por fim, cabe citar a Doutrina ou Cláusula Calvo uma declaração de renúncia a
proteção diplomática presente em alguns tratados segundo a qual uma empresa apenas pode
procurar a justiça local para resolver seus problemas com o Estado em que está sediada.
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NACIONALIDADE (Aula 15 – 16)

7 – INTRODUÇÃO

Nacionalidade é o vínculo jurídico-político entre um Estado e seus nacionais. Este


conceito não se confunde com o de cidadania – a aptidão para o exercício dos direitos políticos
– e nem o de naturalidade – que se refere ao local de nascimento da pessoa.
É importante que a nacionalidade é um direito humano, conforme dita o art. 15 da
Declaração Universal de Direitos Humanos, no art. 24, §3º do Pacto Internacional de Direitos
Civis e Políticos e no art. 20 da Convenção Americana de Direitos Humanos.
De uma forma geral, há duas espécies de nacionalidade: a originária (atribuída ou
primária) e a derivada (adquirida ou secundária).
A nacionalidade originária é a que decorre de fato ligado ao nascimento da pessoa,
segundo os critérios de verificação, o ius soli (ou direito do solo), o qual ordena a nacionalidade
pelo local do nascimento; o ius sangunis (ou direito de sangue), segundo o qual a nacionalidade
se liga à ascendência da pessoa; ou ainda atendendo a um critério misto.
Por outro lado, a nacionalidade derivada é verificada por critério diverso do
nascimento, os quais foram dos mais diversificados através da história. Atualmente, porém, a
mais comum forma de atribuição de nacionalidade derivada é por meio do procedimento de
naturalização, também sendo comum aquela que se dá em razão de casamento, vínculos
funcionais, transformações territoriais e ainda através da nacionalização unilateral
(Constituição de 1891).

7.1 – NACIONALIDADE ORIGINÀRIA

Voltando os olhos para a CF/88, o art. 12 traz as hipóteses em que se considerará o


indivíduo um brasileiro nato:
(i) os nascidos na RFB, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço
de seu país:
 Trata-se de hipótese em que se leva em conta o critério do ius soli.
 Lembrando que aqui, o território brasileiro é concebido em conceito amplo, abarcando
solo, águas interiores, mar territorial, espaço aéreo e navios ou aeronaves de bandeira
brasileira em solo em espaços neutros.
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 Esta regra é, porém, excepcionada pelo critério do ius sanguinis por vínculo funcional,
importante mencionar que nesta hipótese, ambos os pais são estrangeiros, mas basta um
deles estar a serviço de nação estrangeira para que a nacionalidade brasileira seja
afastada.
 O vínculo funcional dos ascendentes da criança deve ser de natureza pública, não sendo
necessário que seja serviço diplomático.
(ii) os nascidos no estrangeiro, de pai ou mãe brasileira desde que qualquer um deles esteja
a serviço da RFB:
 A hipótese agora é de ius sanguinis impuro, pois basta que apenas um dos pais seja
brasileiro.
 O genitor (o de nacionalidade brasileira) deve estar a serviço do Brasil no exterior.
 O vínculo funcional deve ser de natureza pública em sentido amplo.
(iii) os nascidos no estrangeiro, de pai ou mãe brasileira, desde que registrados em
repartição brasileira competente:
 Trata-se também de hipótese que leva em conta o critério do ius sanguinis impuro, pois
é necessário somente que um dos genitores seja brasileiro.
 O registro do nascimento deve ser feito em repartição consular brasileira.
(iv) os nascidos no estrangeiro, de pai ou mãe brasileira, que venham a residir na RFB e
optem, em qualquer tempo após atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira:
 Leva em conta também o critério do ius sanguinis impuro.
 Aqui a aquisição da condição de brasileiro nata depende de duas iniciativas: a vinda
para o país e a manifestação de opção pela nacionalidade brasileira.
 É o caso que a doutrina denomina de nacionalidade postestativa, pois não comporta
análise de conveniência e oportunidade pela autoridade brasileira quanto a sua
concessão. Com a declaração da nacionalidade, os efeitos serão retroativos desde o
nascimento (Decreto 9.199, arts. 213 a 217).
 Trata-se de ato personalíssimo, o qual deve ser manifestado após a maioridade, através
de procedimento de jurisdição voluntária que deve correr perante a Justiça Federal.
 Entre a residência no Brasil e o atingimento da maioridade, segundo a jurisprudência do
STF (RE 415.957/RS5), o sujeito será considerado brasileiro nato para todos os fins.

5
“1. A partir da maioridade, que a torna possível, a nacionalidade do filho brasileiro, nascido no estrangeiro, mas
residente no País, fica sujeita a condição suspensiva da homologação judicial da opção. 2. Esse condicionamento
suspensivo só vigora a partir da maioridade; antes, desde que residente no País, o menor – mediante o registro
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Porém, após atingida a maioridade, a nacionalidade fica dependente de condição


suspensiva, finda com a homologação judicial da opção.
 Esta hipótese não importa na renúncia de outra nacionalidade.
 Se, enquanto pendente a ação de opção, se houver pedido de extradição, ele deverá ficar
suspenso até a decisão quanto a nacionalidade6.

7.2 – NACIONALIDADE DERIVADA

É a que decorre de fato posterior e não relacionada ao nascimento do indivíduo. O


instituto é trabalhado tanto no art. 12, II da CF, como também no art. 64 da Lei 13.455/2017
(Nova Lei de Migração). No último diploma, o legislador elenca quatro espécies de
naturalização brasileira: a ordinária, a extraordinária, a especial e a provisória.
(i) Naturalização Ordinária (art. 65 da LM):
 Ter capacidade civil segundo a lei brasileira.
 Ter residência fixa em território nacional pelo prazo mínimo de 4 anos, podendo ser
reduzido para 1 ano nos casos relacionados no art. 66.
 Não possuir condenação penal ou sob reabilitação, nos termos da lei.
 Mesmo atendendo aos requisitos o pedido será avaliado pela autoridade nacional e
concedido em ato de natureza discricionária e constitutiva.
(ii) Naturalização Extraordinária (art. 67 da LM):
 Residência no Brasil por mais de 15 anos ininterruptos;
 Ausência de condenação penal.
 A concessão da naturalização aqui é ato vinculado e tem natureza declaratória,
retroagindo até a data do requerimento (STF, RE 264.848/TO).
(iii) Naturalização Especial (art. 68 da LM):
 É chamada especial porque apenas algumas pessoas são legitimadas a requerê-las, sem
prejuízo da observância dos requisitos legais;
 São legitimados:

provisório previsto no art. 32, §2º da Lei de Registros Públicos – se considera brasileiro nato para todos os efeitos.”
(STF, RE 415.957/RS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Julgado em 23/08/05, 1ª Turma).
6
“(...). 2. Extradição e nacionalidade brasileira por opção pendente de homologação judicial: suspensão do
processo extradicional e prisão domiciliar. (...) 5. Pendente a nacionalidade brasileira do extraditando da
homologação judicial ex tunc da opção já manifestada, suspende-se o processo extradicional (CPC, art. 265, IV,
a). (...). (STF, AC-QO 70/RS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Julgado em 25/09/03).
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o Cônjuge ou companheiro, há mais de 5 anos, de integrante do Serviço Exterior


brasileiro em atividade ou pessoa a serviço do Estado brasileiro no exterior;
o Empregado em missão diplomática ou em repartição consular do Brasil por mais
de 10 anos ininterruptos;
 Ter capacidade civil segundo a lei brasileira.
 Comunicar-se em português;
 Não possuir condenação penal ou estar reabilitado, nos termos da Lei.
(iv) Naturalização Provisória (art. 70 da LM):
 Esta hipótese é voltada especialmente para a criança ou adolescente migrante. A
naturalização poderá ser convertida em definitiva se o naturalizando expressamente
assim o requerer no prazo de 2 anos após atingida a maioridade.
 Fixação de residência no Brasil antes de completar 10 anos de idade.
 Requerimento por intermédio de representante legal.
Em termos gerais, segundo os art. 71 e 72 da LM, o processo de naturalização deve ser
iniciado mediante requerimento no Ministério da Justiça. A Polícia Federal ficará responsável
pela realização de um processo de sindicância da vida pregressa do requerente. Assim,
preenchidos os requisitos, o Ministro da Justiça concede a naturalização e publica o ato em
Diário Oficial. Em caso de denegação do pedido, por outro lado, comporta recurso.
O naturalizando pode requerer a tradução ou a adaptação de seu nome à língua portuguesa,
que será associado ao nome anterior.
No prazo de até 1 ano após a concessão da naturalização, deverá o naturalizando comparecer
perante a Justiça Eleitoral para o devido cadastramento.
Cite-se que antes da LM, o processo de naturalização passava ainda pelas mãos do juiz
federal, a quem incumbia tomar compromisso e entregar ao naturalizando um certificado de
naturalização. Hoje, no entanto, esta burocracia não mais existe, de forma que desde a
publicação do ato no DOU, a naturalização já produz efeitos.
Finalizado o processo de naturalização, de acordo com o art. 12, §2º da CF, o brasileiro
naturalizado goza dos mesmos direitos e deveres do brasileiro nato, salvo as distinções que
apenas podem estar prevista no próprio texto constitucional, que são:
(a) Extradição: apenas o brasileiro naturalizado pode ser extraditado, no caso do
cometimento de crime anterior a naturalização ou quando de comprovado envolvimento
com tráfico de entorpecentes (art. 5º, LI e LII da CF);
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(b) Cargos privativos de brasileiro nato (art. 12, §3º da CF)7, os da lista de sucessão da
Presidência ou aqueles cujo exercício envolvam a segurança nacional;
(c) Cancelamento de naturalização, pela prática de atos nocivos aos interesses nacionais
(art. 12, §4º, da CF);
(d) a propriedade de Empresa jornalística e de radiodifusão sonora, de sons e imagens
tem restrições para brasileiros naturalizados (art. 222 da CF).

7.3 – PERDA DE NACIONALIDADE

A CF traz duas hipóteses taxativas e restritivas de perda da nacionalidade:


(i) Perda-sanção: é o cancelamento da naturalização por sentença judicial em virtude da prática
de atividades nocivas aos interesses nacionais (art. 12, §4º, I da CF);
(ii) Perda-mudança: ocorre em razão da aquisição de outra nacionalidade, fora das condições
do art. 12, §4º, II. Assim, o brasileiro nato perderá a nacionalidade, salvo quando:
 Houver o reconhecimento de nacionalidade originária por lei estrangeira;
 A naturalização for imposta pela lei estrangeira para o brasileiro residente no exterior
como condição para o exercício para a sua permanência ou para o exercício de direitos
civis.

7.4 – REAQUISIÇÃO DA NACIONALIDADE

Para aqueles que perderam a nacionalidade brasileira, a reaquisição é possível.


No caso de perda-sanção, decretada em sentença judicial transitada em julgado, a
reaquisição dependerá de provimento positivo no bojo de ação rescisória, conforme entende
José Afonso da Silva.
Já para os casos de perda-mudança, a reaquisição deve ser definida em regulamento (art.
254 do Decreto 9.199/2017). Ali, foram definidas duas formas de reaquisição: (a) através de
requisição, o qual tramitará em rito próprio, semelhante a um pedido de naturalização; (b) por

7
Mnemônico: MP3.COM
Ministros do Supremo Tribunal Federal.
P3 - Presidente e Vice-Presidente da República; Presidente da CD e Presidente do SF.
Carreira diplomática.
Oficial das forças armadas.
Ministro de Estado da Defesa.
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meio de revogação, que é demonstração de que o caso do interessado de que seu caso se encaixa
em uma das exceções do art. 12, §4º, II da CF.

7.5 – ESTATUTO DA IGUALDADE

Conforme o art. 12, §1º da CF “aos portugueses com residência permanente no País, se
houver reciprocidade em favor de brasileiros, serão atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro,
salvo os casos previstos nesta Constituição”. A ideia de reciprocidade, por sua vez, foi
condensada em um acordo internacional, o Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta,
celebrado em Porto Seguro, entre a RFB e a República de Portugal, no ano de 2000.
O Estatuto da Igualdade, então, implica na concessão ao Português dos mesmos direitos
concedidos ao brasileiro, o que não quer dizer que ele terá direitos reservados a brasileiros
natos, pois a própria CF impõe reservas. No entanto, o Tratado não produz efeitos automáticos,
devendo haver requerimento por parte do interessado (STF, Ext. 674), o que não implicará na
perda da outra nacionalidade.
Quem fizer opção a condição de brasileiro equiparado não poderá gozar de duplo gozo
de direitos políticos.
No que tange a extradição, o art. 18 do Tratado prevê que o português optante pelo
regime jurídico previsto no Estatuto da Igualdade não poderá ser extradita, salvo para Portugal,
da mesma forma que o brasileiro optante apenas será extraditado para o Brasil.
Cada país deverá regular a eventual participação do português/brasileiro equiparado no
serviço militar do país, o que atualmente não é admitido no Brasil e, por reciprocidade, nem em
Portugal (art. 19).
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CONDIÇÃO JURÍDICA DOS MIGRANTES E VISITANTES (Aula 17 – 21)

9 – ASPECTOS GERAIS

9.1 – PRINCÍPIOS

A Lei 13.445/2017, a Nova Lei de Migração, estabelece os parâmetros mínimos para o


estabelecimento dos direitos, garantias e deveres dos migrantes e visitantes no Brasil. Neste afã,
a lei menciona um extenso rol de princípios em vista dos quais a política migratória brasileira
é regida:
Art. 3º. A política migratória brasileira rege-se pelos seguintes princípios e diretrizes:
I - universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos humanos;
II - repúdio e prevenção à xenofobia, ao racismo e a quaisquer formas de
discriminação;
III - não criminalização da migração;
IV - não discriminação em razão dos critérios ou dos procedimentos pelos quais a
pessoa foi admitida em território nacional;
V - promoção de entrada regular e de regularização documental;
VI - acolhida humanitária;
VII - desenvolvimento econômico, turístico, social, cultural, esportivo, científico e
tecnológico do Brasil;
VIII - garantia do direito à reunião familiar;
IX - igualdade de tratamento e de oportunidade ao migrante e a seus familiares;
X - inclusão social, laboral e produtiva do migrante por meio de políticas públicas;
XI - acesso igualitário e livre do migrante a serviços, programas e benefícios sociais,
bens públicos, educação, assistência jurídica integral pública, trabalho, moradia,
serviço bancário e seguridade social;
XII - promoção e difusão de direitos, liberdades, garantias e obrigações do migrante;
XIII - diálogo social na formulação, na execução e na avaliação de políticas
migratórias e promoção da participação cidadã do migrante;
XIV - fortalecimento da integração econômica, política, social e cultural dos povos da
América Latina, mediante constituição de espaços de cidadania e de livre circulação
de pessoas;
XV - cooperação internacional com Estados de origem, de trânsito e de destino de
movimentos migratórios, a fim de garantir efetiva proteção aos direitos humanos do
migrante;
XVI - integração e desenvolvimento das regiões de fronteira e articulação de políticas
públicas regionais capazes de garantir efetividade aos direitos do residente fronteiriço;
XVII - proteção integral e atenção ao superior interesse da criança e do adolescente
migrante;
XVIII - observância ao disposto em tratado;
XIX - proteção ao brasileiro no exterior;
XX - migração e desenvolvimento humano no local de origem, como direitos
inalienáveis de todas as pessoas;
XXI - promoção do reconhecimento acadêmico e do exercício profissional no Brasil,
nos termos da lei; e
XXII - repúdio a práticas de expulsão ou de deportação coletivas.

Esta lista, porém, pode ser simplificada e reduzida aos quatro mais importantes, de onde
todos os demais se relacionam:
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(a) prevalência dos direitos humanos;


(b) desburocratização;
(c) cooperação internacional;
(d) soberania nacional.
Contemporizando a questão, vale salientar que anteriormente a temática era regulada
pelo Estatuto do Estrangeiro (Lei 6815/80), aprovada durante o regime militar. Naquele
diploma, o estrangeiro era visto como um sujeito visto com suspeita, como alguém que poderia
importar instabilidade e revolta para o país. Esta visão é, porém, modificada com a nova lei de
migração, com a inserção da prevalência dos direitos humanos como postular maior do novo
sistema. Assim, hoje, o estrangeiro no Brasil é tratado como sujeito de direitos e deveres.

9.2 – DIREITOS DOS MIGRANTES

De pronto, cabe lembrar que o art. 5º, caput, da CF/88 conferiu o direito de igualdade,
a inviolabilidade à vida, liberdade, a segurança e à propriedade não apenas aos brasileiros, mas
também aos estrangeiros residentes no País. Em complemento, ainda que fuja a literalidade do
texto constitucional, uma interpretação ampliativa permite que o mesmo ideal se estenda
também ao estrangeiro não residente, conforme já entendeu o STF (HC 102.041).
Neste âmbito, o art. 4º da LM é relacionado um extenso rol de direitos do migrante,
muito semelhante aos incisos do art. 5º da CF. Destes, o professor destaca a importância de
alguns, informando ter mais probabilidade de cair em provas:
VI - direito de reunião para fins pacíficos;
VII - direito de associação, inclusive sindical, para fins lícitos;

O direito de reunião e de associação ganham destaque nesta nova lei porque era
expressamente vedado no anterior Estatuto do Estrangeiro.
VIII - acesso a serviços públicos de saúde e de assistência social e à previdência social,
nos termos da lei, sem discriminação em razão da nacionalidade e da condição
migratória;

Este deve ser destacado, notadamente em razão da recente decisão do STF (RE 587.970)
que admite a concessão de benefício assistencial ao estrangeiro residente no país.

9.3 – SITUAÇÃO DOCUMENTAL DO MIGRANTE

A princípio, deve-se salientar que em qualquer lugar do mundo, em regra, a entrada de


não-nacionais em um país é um ato de soberania, classificado como discricionário. A única
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exceção a esta situação é o pedido de refúgio, hipótese em que o postulante deve poder ingressar
no país estrangeiro e lá deve permanecer até o julgamento que reconhece ou não a condição de
refugiado.
No Brasil, o não-nacional deve se dirigir ao controle migratório onde preencherá
formulário onde requer a condição de refugiado, entrando no país e ficando sob vigilância até
a resolução da solicitação. Se indeferido o status de refugiado, será providenciada a saída
compulsória do estrangeiro.
Sem a condição de refugiado, o não-nacional deve estar munido de documento de
viagem e visto, como regra. Como documento de viagem, o art. 5º da LM relaciona os seguintes:
Art. 5º. São documentos de viagem:
I - passaporte;
II - laissez-passer;
III - autorização de retorno;
IV - salvo-conduto;
V - carteira de identidade de marítimo;
VI - carteira de matrícula consular;
VII - documento de identidade civil ou documento estrangeiro equivalente, quando
admitidos em tratado8;
VIII - certificado de membro de tripulação de transporte aéreo; e
IX - outros que vierem a ser reconhecidos pelo Estado brasileiro em regulamento.
O visto, por sua vez, é tratado no art. 12 da LM, valendo informar que a posse deste
documento não gera direito de ingresso em outro país, mas mera expectativa de direito:
Art. 12. Ao solicitante que pretenda ingressar ou permanecer em território nacional
poderá ser concedido visto:
I - de visita;
II - temporário;
III - diplomático;
IV - oficial;
V - de cortesia.

9.4 – IMPEDIMENTO DE INGRESSO

Conforme o art. 45, poderá ser impedida de ingressar no País, após entrevista individual
e mediante ato fundamento, aquele:
I - anteriormente expulsa do País, enquanto os efeitos da expulsão vigorarem;
II - condenada ou respondendo a processo por ato de terrorismo ou por crime de
genocídio, crime contra a humanidade, crime de guerra ou crime de agressão, nos
termos definidos pelo Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, de 1998,
promulgado pelo Decreto no 4.388, de 25 de setembro de 2002;
III - condenada ou respondendo a processo em outro país por crime doloso passível
de extradição segundo a lei brasileira;
IV - que tenha o nome incluído em lista de restrições por ordem judicial ou por
compromisso assumido pelo Brasil perante organismo internacional;
V - que apresente documento de viagem que:
a) não seja válido para o Brasil;
b) esteja com o prazo de validade vencido; ou

8
Acordo sobre Documentos de Viagem dos Estados Partes do MERCOSUL e Estados associados.
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c) esteja com rasura ou indício de falsificação;


VI - que não apresente documento de viagem ou documento de identidade, quando
admitido;
VII - cuja razão da viagem não seja condizente com o visto ou com o motivo alegado
para a isenção de visto;
VIII - que tenha, comprovadamente, fraudado documentação ou prestado informação
falsa por ocasião da solicitação de visto; ou
IX - que tenha praticado ato contrário aos princípios e objetivos dispostos na
Constituição Federal.
Parágrafo único. Ninguém será impedido de ingressar no País por motivo de raça,
religião, nacionalidade, pertinência a grupo social ou opinião política.

Impedida de entrar no país, a pessoa deve ser repatriada, a ser estudada oportunamente.

9.5 – CONDIÇÃO JURÍDICA DO MIGRANTE

9.5.1 – Residente Fronteiriço


O art. 1º, §1º, IV da LM define o residente fronteiriço como sendo a pessoa nacional de
país limítrofe ou apátrida que conserva a sua residência em município fronteiriço de país
vizinho.
Para eles, poderá ser concedida, mediante requerimento, autorização para a realização
de atos da vida civil no Brasil, com o fim de facilitar a sua livre circulação (art. 23).

9.5.2 – Apátrida
É aquela pessoa que não é considerada nacional por nenhum Estado, nos termos da sua
legislação e da Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas (1954) ou assim reconhecido pelo
Brasil.
Para estes, regulamento disporá sobre o instituto protetivo especial, consolidado em
processo simplificado de naturalização.
Art. 26. Regulamento disporá sobre instituto protetivo especial do apátrida,
consolidado em processo simplificado de naturalização.
§ 1º O processo de que trata o caput será iniciado tão logo seja reconhecida a situação
de apatridia.
§ 2º Durante a tramitação do processo de reconhecimento da condição de apátrida,
incidem todas as garantias e mecanismos protetivos e de facilitação da inclusão social
relativos à Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas de 1954, promulgada pelo
Decreto nº 4.246, de 22 de maio de 2002, à Convenção relativa ao Estatuto dos
Refugiados, promulgada pelo Decreto no 50.215, de 28 de janeiro de 1961, e à Lei no
9.474, de 22 de julho de 1997.
§ 3º Aplicam-se ao apátrida residente todos os direitos atribuídos ao migrante
relacionados no art. 4o.
§ 4º O reconhecimento da condição de apátrida assegura os direitos e garantias
previstos na Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas, de 1954, promulgada pelo
Decreto no 4.246, de 22 de maio de 2002, bem como outros direitos e garantias
reconhecidos pelo Brasil.
§ 5º O processo de reconhecimento da condição de apátrida tem como objetivo
verificar se o solicitante é considerado nacional pela legislação de algum Estado e
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poderá considerar informações, documentos e declarações prestadas pelo próprio


solicitante e por órgãos e organismos nacionais e internacionais.
§ 6º Reconhecida a condição de apátrida, nos termos do inciso VI do § 1o do art. 1o,
o solicitante será consultado sobre o desejo de adquirir a nacionalidade brasileira.
§ 7º Caso o apátrida opte pela naturalização, a decisão sobre o reconhecimento será
encaminhada ao órgão competente do Poder Executivo para publicação dos atos
necessários à efetivação da naturalização no prazo de 30 (trinta) dias, observado o art.
65.
§ 8º O apátrida reconhecido que não opte pela naturalização imediata terá a
autorização de residência outorgada em caráter definitivo.
§ 9º Caberá recurso contra decisão negativa de reconhecimento da condição de
apátrida.
§ 10. Subsistindo a denegação do reconhecimento da condição de apátrida, é vedada
a devolução do indivíduo para país onde sua vida, integridade pessoal ou liberdade
estejam em risco.
§ 11. Será reconhecido o direito de reunião familiar a partir do reconhecimento da
condição de apátrida.
§ 12. Implica perda da proteção conferida por esta Lei:
I - a renúncia;
II - a prova da falsidade dos fundamentos invocados para o reconhecimento da
condição de apátrida; ou
III - a existência de fatos que, se fossem conhecidos por ocasião do reconhecimento,
teriam ensejado decisão negativa.

9.5.3 – Asilado
O asilo político é a proteção outorgada, por ato discricionário, por um Estado a um não-
nacional por razões de perseguição política (real – não mero temor – e atual) , assim qualificada
pelo asilante, por outro Estado. O instituto é mencionado brevemente na LM, nos seguintes
termos:
Art. 27. O asilo político, que constitui ato discricionário do Estado, poderá ser
diplomático ou territorial e será outorgado como instrumento de proteção à pessoa.
Parágrafo único. Regulamento disporá sobre as condições para a concessão e a
manutenção de asilo.
Art. 28. Não se concederá asilo a quem tenha cometido crime de genocídio, crime
contra a humanidade, crime de guerra ou crime de agressão, nos termos do Estatuto
de Roma do Tribunal Penal Internacional, de 1998, promulgado pelo Decreto no
4.388, de 25 de setembro de 2002.
Art. 29. A saída do asilado do País sem prévia comunicação implica renúncia ao asilo.

Da leitura dos artigos, é de se ver que a Lei menciona a existência de duas modalidades
de Asilo:
(a) Asilo Político Diplomático: Ele nasceu como um costume na América Latina, graças
aos nossos antecedentes com regimes de exceção, mas, hoje, a temática encontra-se
disciplinado em acordos regionais, igualmente concentrados na América Latina. É o que
se dá na embaixada do Estado asilante. Neste caso, ele é encarado como sendo uma fase
que antecede o asilo territorial, perfazendo-se em uma proteção provisória, até que seja
expedido o salvo-conduto para que o sujeito possa deslocar-se em segurança até o
território do Estado asilante.
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(b) Asilo Político Território: o concedido no território do Estado asilante;

Saliente-se que, uma vez sob proteção de asilo político territorial, se o asilado sair do
país sem prévia comunicação ao Estado asilante, isto implicará em renúncia ao asilo.

9.5.4 – Refugiado
Segundo a Convenção de 51, refugiado é a pessoa que, em consequência dos
acontecimentos ocorridos antes de 01/01/1951 e temendo ser perseguida por motivos de raça,
religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua
nacionalidade e que não pode ou, em virtude deste temor, não quer valer-se da proteção deste
país, ou que, se não tem nacionalidade e se encontra fora do país no qual tinha sua residência
habitual em consequência de tais acontecimentos, não pode ou, devido a tal temor, não quer
voltar a ele (art. 1º, A, 2, da Convenção).
É de se ver que a Convenção de 51 tratou o refúgio como sendo um instituto de uso
temporário, pois admitiu que apenas fato anteriores a 01/01/51 poderiam ensejar a sua
instituição. Ademais, outros dispositivos da convenção relatam que apenas haveria refúgio entre
países europeus. Sendo assim, o conceito de refugiado segundo a Convenção de 51 contava
com dois limitadores: um de ordem temporal e outro geográfico.
Em 1967, sobreveio um protocolo para ajustar o conceito estabelecido naquela
convenção, se forma a ampliar o seu alcance. A partir de então, refugiado é aquele que preenche
os seguintes requisitos:
(i) pessoa que sofre perseguição, assim entendido como qualquer ameaça a sua vida ou a
liberdade;
(ii) fundado temor, que é o receio subjetiva e objetivamente aferido;
(iii) extraterritorialidade (alienage), que é a situação daquele que se encontra fora do seu país
de origem ou de residência.
No direito brasileiro, a Lei de Refúgio (lei 9.474/97), o art. 1º trata do conceito do
instituto, trazendo, inclusive, uma ampliação maior ao conceito, permitindo que o refúgio seja
concedido não apenas em caso de fundado temor, mas também “devido a grave e generalizada
violação de direitos humanos”, argumento que está sendo suscitado pelos venezuelanos para
conseguir refúgio no Brasil:
Art. 1º Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que:
I – devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião,
nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de
nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país;
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II - não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência
habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias
descritas no inciso anterior;
III - devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar
seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.

Diante destes conceitos, poderíamos diferenciar os institutos de asilo e refúgio segundo


os seguintes critérios:
 Refúgio é regido por tratados universais, enquanto que o asilo baseia-se no costume
internacional e em tratados regionais na América Latina;
 Refúgio destina-se a vários tipos de perseguição (motivos de raça, religião,
nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas), ao passo que asilo busca acolher o
perseguido por motivos políticos;
 Refúgio pode ser concedido no caso de fundado temor de perseguição, mas o asilo exige
a atualidade da perseguição;
 No refúgio, o solicitante possui direito público subjetivo de ingresso em território
nacional enquanto o pedido é analisado, o que não ocorre com o solicitante de asilo;
 A decisão de concessão de refúgio tem natureza declaratória e vinculada à presença dos
requisitos convencionais e legais, enquanto que no asilo a decisão é constitutiva e
discricionária.
Falando em refúgio, a Convenção de 51 trata do Princípio da Não Devolução, do Não
Rechaço (princípio do non-refoulement), nos seguintes termos:
Art. 33.
1. Nenhum dos Estados Contratantes expulsará ou rechaçará, de maneira alguma, um
refugiado para as fronteiras territoriais em que sua vida ou a sua liberdade seja
ameaçada em virtude da sua raça, da sua religião, da sua nacionalidade, do grupo
social a que pertence ou das suas opiniões políticas.

Considerada como norma de jus cogens, o princípio do non refoulement é também


tratado no art. 22, §8º do Pacto de San José da Costa Rica (CADH), no art. 3º da Convenção da
ONU contra a tortura e no art. 7º, §1º da Lei 9.474/1997. Entretanto, a norma não é absoluta,
uma vez a própria Convenção de 51 trata de uma exceção (art. 33, §2º): quando houver razões
sérias para considerar perigo para a segurança do país onde se encontra, ou que, tendo sido
objeto de uma condenação definitiva por um crime ou delito particularmente grave, constitua
ameaça para a comunidade do dito país.
Na lei brasileira (art. 33 e 34, Lei 9.474/97), o reconhecimento da condição de refugiado
obstará o seguimento de qualquer pedido de extradição baseado nos fatos que fundamentam a
concessão de refúgio, ao passo que a solicitação do refúgio apenas terá o condão de suspender
o procedimento administrativo ou judicial de extradição até a decisão definitiva. Contestado
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perante o STF por violação a separação dos Poderes, a Corte declarou incidentalmente a
constitucionalidade do art. 33 (Ext. 1.008).
No instituto, salta aos olhos o paradigma do caso de Cezari Batiste (Ext.1.085), italiano
.que fugiu para o Brasil, contra quem o país de origem pediu a extradição e que estava sendo
analisada pelo STF. Ocorre que, no curso do procedimento, foi declarada pelo Executivo a
condição de refugiado. A controvérsia que restou foi quanto a possibilidade de controle judicial
do ato vinculado de concessão do refúgio. Na ocasião, o STF decidiu ser possível o controle
jurisdicional e, inclusive, o declarou nulo, permitindo o prosseguimento do processo de
extradição, nos termos do julgado:
EXTRADIÇÃO. Passiva. Refúgio ao extraditando. Concessão no curso do processo,
pelo Ministro da Justiça. Ato vinculado. Não correspondência entre os motivos
declarados e o suporte fático da hipótese legal invocada como causa autorizadora da
concessão de refúgio. Contraste, ademais, com norma legal proibitiva do
reconhecimento dessa condição. Nulidade absoluta pronunciada. Ineficácia jurídica
consequente. (Ext. 1085, Rel. Min Cezar Pelluso, Pleno, Julgado em 16/12/2009).

9.6 – MEDIDAS DE RETIRADA COMPULSÓRIA DO ESTRANGEIRO

Antes da nova LM, estudávamos três medidas de retirada compulsória: a deportação, a


expulsão e a extradição. Hoje, porém, a nova lei manteve a deportação e a expulsão, porém
suprimiu o instituto da extradição – que foi transferido para a parte de cooperação jurídica
internacional, substituindo-o pelo que a norma chamou de repatriação.

9.6.1 – Repatriação
Trata-se de medida administrativa de devolução de pessoa em situação de impedimento
de ingresso ao país de procedência ou de nacionalidade (art. 49). Ou seja, a pessoa chega a
fronteira do país, porém, por força das regras de impedimento de ingresso (art. 45), ele não pode
ingressar de fato em território nacional, devendo voltar de onde veio.
Aqui, por força da prevalência dos direitos humanos, a Defensoria Pública da União
será notificada, preferencialmente por via eletrônica, no caso do §4º do art. 49 ou quando a
repatriação imediata não for possível.
Há casos, porém, que a Lei veda a repatriação, quando, por mais que a pessoa tenha
impedimentos ao ingresso no Brasil, ela não pode também ser repatriada. Assim, em hipóteses
como esta, a permanência no país acaba sendo imperativa. São os casos:
(a) pessoas em situação de refúgio ou apatridia, de fato ou de direito;
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(b) o menor de 18 anos desacompanhado ou separado de sua família, exceto nos casos
em que se demonstrar favorável a garantia dos seus direitos ou para a reintegração a sua
família de origem;
(c) quem necessite de acolhimento humanitário.
(d) quando a medida de devolução for para país ou região que possa representar risco à
vida, à integridade pessoal ou à liberdade da pessoa (art. 49, §4º);
(e) a repatriação coletiva, entendida como sendo aquela que não individualiza a situação
migratória irregular de cada pessoa (art. 61);
(f) quando subsistirem razoes para acreditar que a medida pode colocar em risco a vida
ou a integridade pessoal (art. 62);

9.6.2 – Deportação
É a medida decorrente de procedimento administrativo, consistente na retirada
compulsória de pessoa que se encontre em situação migratória irregular em território nacional
(art. 50). Aqui, diferente da repatriação, o estrangeiro ingressa em território nacional de forma
regular, porém, com o decorrer do tempo ou por circunstância diversa, a sua situação
documental passa a ser irregular e, ainda assim, permanece aqui.
Os procedimentos conducentes à deportação devem respeitar o contraditório e a ampla
defesa, garantida a possibilidade de interposição de recurso com efeito suspensivo (art. 51).
Aqui, também haverá a intervenção da DPU, caso não haja advogado indicado pelo interessado.
Não será admitida a deportação:
(a) nos casos em que a deportação não é admitida pela legislação brasileira – com o fito
de evitar uma extradição de fato ou dissimilada (art. 53);
(b) em face do indivíduo que solicita refúgio no Brasil, à luz do princípio do non
refoulement;
(c) a deportação coletiva, entendida como aquela que não individualiza a situação
migratória de cada pessoa (art. 61);
(d) quando subsistirem razões para acreditar que a medida poderá colocar em risco a
vida ou a integridade pessoal (art. 62).

9.6.3 – Expulsão
Consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante ou visitante do
território nacional, conjugada de impedimento de reingresso por prazo determinado. A nova
LM inova quando estabelece na norma a indicação de um prazo pré-estabelecido para a duração
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da medida, pois, sob o julgo do Estatuto do Estrangeiro, o expulso jamais poderia retornar ao
território nacional, exceto se o decreto de expulsão fosse revogado.
Outra diferença entre os diplomas normativos é que no Estatuto do Estrangeiro as
hipóteses que ensejavam a expulsão era quando o estrangeiro incorria em atividade nociva aos
interesses nacionais, o que era deveras amplo e ensejava abusos. Na nova LM, as hipóteses
estão expressas no art. 54, §1º, demandando a condenação do sujeito por sentença criminal
transitada em julgado relativa a prática de:
(i) crime de genocídio, crime contra a humanidade, crime de guerra, crime de agressão, nos
termos do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional;
(ii) crime comum doloso passível de pena privativa de liberdade, consideradas a gravidade e as
possibilidades de ressocialização em território nacional. Com relação a esta segunda hipótese,
o processamento da expulsão em caso de crime comum não prejudicará a progressão de regime,
o cumprimento da pena, a suspensão condicional do processo, a comutação da pena ou a
concessão de pena alternativa, de induto coletivo ou individual, de anistia ou quaisquer outros
benefícios concedidos em igualdade de condições ao nacional brasileiro (art. 54, §3º).
No procedimento de expulsão serão garantidos os princípios do contraditório e da ampla
defesa, devendo a DPU ser notificada da instauração do processo quando não houver defensor
constituído.
A instauração do procedimento não impede a saída voluntária do estrangeiro do país
(art. 60).
Não será admitida a expulsão quando:
(a) quando a medida acarretar em extradição não admitida pela legislação brasileira (art.
55, I);
(b) quando o expulsando tiver filho brasileiro que esteja sob sua guarda ou dependência
econômica ou socio-afetiva ou tiver pessoa brasileira sob sua tutela (art. 55, II);
(c) quando o expulsando tiver cônjuge ou companheiro residente no Brasil (estrangeiro
ou não), sem discriminação alguma, reconhecido judicial ou legalmente (art. 55, II, b);
(d) quando o expulsando tiver ingressado no país até os 12 anos de idade, residindo
desde então aqui (art. 55, II, c);
(e) quando o expulsando for pessoa maior de 70 anos que resida no país a mais de 10
anos, considerados a gravidade e o fundamento da expulsão (art. 55, II, d);
(f) a expulsão coletiva, assim entendida como aquela que não individualiza a situação
migratória irregular de cada pessoa (art. 61 e art. 22, §9º da CADH);
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(g) quando subsistirem razões para acreditar que a medida poderá colocar em risco a
vida ou a integridade pessoal (art. 62).
(h) do estrangeiro pretendente de refúgio, por força do princípio do non refoulement.

Aula 21

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