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27/09/2017 - 05:00

Política do Fed não muda otimismo com emergentes


Por Sergio Tauhata

Rick Rieder, da BlackRock: desta vez, o Fed "telegrafou" seu plano para o balanço de
maneira "excelente"
Desta vez não houve disparada do dólar, fuga de recursos ou salto dos juros de papéis soberanos nos mercados emergentes
após o Federal Reserve (Fed, banco central americano) confirmar na quarta-feira passada que vai começar a reduzir seu
massivo portfólio de títulos a partir de outubro. Nem pareceu o mesmo Fed que, quatro anos atrás, lançou os mercados
globais em um turbilhão ao anunciar o início do encerramento do programa de compra de ativos, que se efetivou ao longo
de 2014. Na verdade, segundo analistas, os emergentes é que não parecem os mesmos.

Nem o agora duplo aperto da política monetária pelo BC americano, que passa a combinar o enxugamento do portfólio com
a continuidade da subida de juros, vai tirar a atratividade dos mercados emergentes nos próximos anos, diz Gabriela
Santos, estrategista de mercados globais do J.P. Morgan Asset. "Para o investidor estrangeiro, mais importante é olhar o
crescimento dos emergentes, que está se acelerando em relação aos desenvolvidos", considera.

A estrategista chama essa diferença entre as expansões econômicas dos dois grupos de "alfa do crescimento". Conforme
Gabriela, a taxa segue em avanço contínuo com expectativa de refletir por alguns anos a decolagem das nações em
desenvolvimento. "Esse alfa tem levado os investidores a voltar a ver os emergentes com bons olhos, na renda variável,
moedas e renda fixa."

O alfa para os emergentes começou a subir de novo a partir de 2016. Entre 2011 a 2015, a diferença de expansão caiu
continuamente, o que gerou um fluxo de saída de recursos dessas economias.

O Brasil, afirma Gabriela, é o melhor exemplo de alfa em aceleração do grupo: saiu de uma recessão de 3,5% no ano
passado para um provável avanço em 2017. "Os dados de Brasil têm vindo acima do esperado e projetamos uma expansão
[do PIB] perto de 1% neste ano e de 2% em 2018", diz.

Brasil é o melhor exemplo: saiu de uma recessão de 3,5% no ano passado para um provável avanço em
2017

Sonja Gibbs, diretora sênior do Instituto de Finanças Internacionais (IIF, na sigla em inglês), também enxerga sinais
positivos emitidos pelo mundo emergente. Os volumes exportados pelo grupo voltaram ao maior nível em mais de dois
anos, apontou a analista em relatório, como um indicador de fortalecimento desses países.

Dados do IIF mostram ainda que o índice de alocação de recursos por fundos de investimento em emergentes atingiu 14%
do total das carteiras em agosto, de volta para a máxima desde julho de 2015. Um levantamento do IIF, o "Mapa de Calor
das Vulnerabilidades dos Mercados Emergentes", revela um quadro "surpreendentemente verde [sinal de baixa
temperatura]" apesar das deficiências estruturais, afirma Sonja.
De fato, um dos grandes flancos expostos pelos emergentes aos movimentos de política monetária se fechou nos últimos
anos. A equipe da consultoria Capital Economics foi taxativa em relatório: as economias em desenvolvimento não devem
enfrentar grandes problemas com o aperto gradual da política monetária de países avançados devido ao encolhimento
substancial dos déficits em conta corrente nos últimos anos.

"Em vários momentos, entre 2012 e 2014, 9 dos 25 maiores emergentes analisados por nós tinham rombos em conta
corrente [transações de bens, serviços e rendas com o exterior] superiores a 4% do PIB", destaca a consultoria. "Hoje, esse
grupo caiu para apenas dois - Colômbia e Egito."

O Brasil era um dos países com déficit elevado nessa época, situação que mudou significativamente desde 2015. Em 2014, o
país teve um rombo em conta corrente de 4,2% do PIB. O número atingiu o pico de 4,4% em março e abril do período
seguinte. Nos 12 meses até agosto deste ano, porém, o déficit caiu para apenas 0,68% do PIB.

Outro motivo para os estrangeiros não terem alimentado até aqui maiores preocupações com o impacto das ações do Fed
sobre emergentes é que não se espera movimentos bruscos de alta para o dólar ou dos "yields" soberanos. No passado
recente, valorizações muito amplas do câmbio e dos juros nos EUA inspiraram temores em relação à solvência das dívida
nos mercados em desenvolvimento.

A subida da moeda americana, por exemplo, causou estragos nas economias menos avançadas até 2015. O fortalecimento
do dólar levou, de maneira generalizada no bloco, a um aumento da inflação, devido ao encarecimento das importações, e a
uma consequente pressão pelo aperto. Hoje, porém, os emergentes vivem momento semelhante às economias avançadas
com os índices de preços perto das mínimas em muitos anos.

Duas das principais causas para o fortalecimento do dólar foram, justamente, o encerramento do programa de compras de
ativos do Fed e o início do ciclo de aperto pelo banco central americano com a primeira subida de taxa ao longo de quase
uma década em dezembro de 2015. O atual ciclo de normalização monetária do BC dos EUA, no entanto, ocorre em um
cenário global muito diferente do de quatro anos atrás, com retomada do crescimento generalizada, inflação baixa
disseminada para os emergentes e estabilidade nos preços de commodities.

Segundo Gabriela, do J.P. Morgan, "na verdade esperamos uma depreciação do dólar nos próximos anos" mesmo com a
normalização. Isso ocorreria porque o crescimento americano começa a atingir a plenitude e o resto do mundo ainda inicia
o ciclo.

Melhora da comunicação pelo Fed tem ajudado a manter os mercados globais mais estáveis

Os yields globais também se mantêm longe do radar das preocupações. No caso dos Treasuries, Sonja classificou como
"rotineira" a subida dos juros dos títulos do Tesouro americano vista logo após a reunião de política monetária de quarta-
feira, quando o Fed anunciou o processo de redução do balanço. "Os movimentos sugerem uma subida gradual dos yields
nos EUA [durante o processo] e que pode ser bem tolerada pelos mercados acionários", analisa.

É consenso entre analistas que a forma como o Fed conduziu a comunicação sobre a subida de juros ao longo do ano e o
enxugamento do balanço ajudou a manter os mercados estáveis. "A comunicação do Fed neste ano tem sido muito bem
descrita e executada", diz Rick Rieder, executivo-chefe de investimentos de renda fixa da BlackRock.

Para se ter uma ideia da importância dessa evolução, o episódio ocorrido em 2013, conhecido como "taper tantrum",
quando ondas de venda atingiram os mercados de renda fixa globais, é considerado como um erro de comunicação do Fed.
Em 22 de maio de 2013, o então presidente, Ben Bernanke, anunciou que o programa de compra de ativos começaria a
desacelerar até ser encerrado, sem preparar o mercado. O medo se espalhou entre investidores. A taxa do título de dez anos
do Tesouro americano, referência global, subiu de 1,930% em 21 de maio para 3,026% no fim daquele ano.

De acordo com a Capital Economics, os países que mais apanharam no "taper tantrum" foram aqueles com grandes déficits
em conta corrente. Devido a essa característica, naquele momento o Morgan Stanley alcunhou Brasil, Índia, Indonésia,
Turquia e África do Sul de "cinco frágeis".

Desta vez, o Fed "telegrafou" seu plano para o balanço de maneira "excelente", considera Rieder, da BlacRock. "Não
esperamos nada diferente do que um forte compromisso [pelo Fed] com a própria proposta nos próximos meses e anos,
com muito pouca chance de se desviar desse caminho."
O plano revelado pela autoridade prevê redução de US$ 10 bilhões ao mês a partir de outubro até dezembro de 2017. A
partir de janeiro, o limite passa a subir mais US$ 10 bilhões a cada trimestre até atingir US$ 50 bilhões em outubro de
2018. Ao fim do processo, Rieder estima que o balanço passe a ter um tamanho entre US$ 2,8 trilhões e US$ 3 trilhões.

Apesar da aparente indiferença dos investidores em relação ao enxugamento, o processo vai sim impulsionar para cima os
yields. "O efeito disso ainda não está no preço da renda fixa americana", diz Gabriela, do J.P.. A especialista ressalva que se
trata de elevação gradual e longa. "A normalização da política monetária dos EUA é um processo e o efeito nos yields,
também, ao longo dos próximos anos." (Colaborou Sergio Lamucci)

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