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MEDICINA DO ESPAÇO PÚBLICO: CRÍTICA AO CONCEITO DE ESPAÇO

PÚBLICO DISCURSIVO E A SUA RECONFIGURAÇÃO BIOMÉDICA

Octávio Cândida Francisca. Doutorando em Filosofia


(Universidade do Porto)

ÍNDICE GERAL [Provisório]


INTRODUÇÃO: Epistemologia para um conceito de espaço público e de medicina do
espaço público
PARTE I
O CONCEITO DE ESPAÇO PÚBLICO DISCURSIVO: ENTRE OS
FUNDAMENTOS SIMBÓLICOS E APORIAS DE UMA CATEGORIA DA
MODERNIDADE
Capítulo I
1. DO CONCEITO DE ESPAÇO PÚBLICO DISCURSIVO AO CIBERESPAÇO
PÚBLICO.
1.1 Conceito de espaço público: modelos e configurações
1.1 O conceito de espaço público: uma discussão teórica
1.3 Modelos de espaço público: o discursivo de Habermas
1.3.1 O modelo discursivo: transformação histórica e dialética do modelo
1.3.1.1 Arendt e Habermas: o espaço público helénico - “Ágora”
1.3.1.2 O espaço público Representativo Feudal
1.3.1.3 O espaço público burguês e suas variantes literárias e política
1.3.1.4 O espaço público pós-burguesa e sua decadência
1.3.1.5 Habermas e o Espaço público discursivo contemporâneo
1.3.2 Espaço público discurso: entre cybercultura
1.3.3 Crítica ao espaço público discursivo: o “disembodiment” do público
Capítulo II
2 MODERNIDADE E CRIAÇÃO DO ESPAÇO DISCURSIVO: SUA GENESIS
CRÍTICO-SIMBÓLICA
2.1 Modern(idade) e criação do «mundo novo»: o espaço simbólico
2.1.1 Husserl: O mundo da vida (lebenswelt) esquecido
2.1.2 Heidegger: do espaço de abertura do ‘ser-no-mundo’ á errância no Ge-stell
2.1.3 A Teoria Crítica: o espaço de abertura como estrutura social ideológica
2.1.4 Habermas: a liberação do poder simbólico da Teoria de Ação Comunicativa
2.1.4.1 Habermas e a missão hedegerriana de certificação da razão tecnocientífica:
virtualidades do topos «opinião pública»
Capítulo III
3. TEORIA DE AÇÃO COMUNICATIVA E A RECONSTRUÇÃO SIMBÓLICA DO
ESPAÇO PÚBLICO
3.1 Fundamentação simbólica do conceito de “Mundo da vida” em Habermas
3.2 Teoria de Ação Comunicativa e sistema simbólico
3.3 (des)colonização sistémica do “mundo da vida”

Capítulo IV
4 APORIAS DA CULTURA SIMBÓLICA NO ESPAÇO PÚBLICO DISCURSIVO
4.1 A persistência do fundamento teológico/metafísico na Teoria de Ação Comunicativa
4.2 Sloterdijk: uma visita ao Parque Nacional Comunicativo
4.3 Lyotard:Dos novos sistemas mediáticos de comunicação inumanas as humanas
PARTE II
1
DA CRÍTICA DAS AUSÊNCIAS DO CORPO NO ESPAÇO PÚBLICO
DISCURSIVO ÁS ALTERNATIVAS BIOTECNOLÓGICAS DE ESPAÇOS
PÚBLICOS CONTEMPORÂNEOS
Capítulo V
5. CRÍTICA AO ESPAÇO PÚBLICO DISCURSIVO PELA AUSÊNCIA CORPO
BIOLÓGICO
5.1 A exclusão do corpo humano na fenomenologia e hermenêutica: O descaso de
Heidegger com a “animalidade”
5.2 A O espaço público discursivo contra o discurso pós-humanista e a biotecnologias
genéticas
Capítulo VI
6. ALTERNATIVAS AO CONCEITO DE ESPAÇO PÚBLICO DISCURSIVO:
NOVAS FORMAS DE SABERES BIOÉTICOS E NOVOS MODELOS DE
ESPAÇOS PÚBLICOS
6.1 Foucault e Sennett: o modelo corpológico e biopolítico
6.2 Sloterdijk e Esposito: o modelo imunológico
6.3 Lyotard: Por um modelo de “espaço público biotecnológico”
6.4 Hottois: O modelo de «espaço público bioético»
PARTE III
PARA UM CONCEITO DE “MEDICINA DO ESPAÇO PÚBLICO” OU
“ESPAÇO PÚBLICO MEDICO”: ENTRE O BIOLÓGICO E O DISCURSIVO
7. Capítulo VII
JUSTIFICAÇÃO DO CONCEITO DE “MEDICINA DO ESPAÇO PÚBLICO”
Capítulo VIII
8. A MEDICINA DO ESPAÇO PÚBLICO ANTIGO
8.1 Medicina divina e as indistinções: o médico e o oráculo
8.1.1 A origem: uma medicina divina mesopotâmica
8.1.2 uma medicina divina da Grécia Arcaica
8.1.3 Esculápio: O médico divino e o vaticínio de um espaço público
8.1.4 Homoiétes do Guerreiro grego: a medicina do público aristocrático
8. 2 Medicina do espaço público democrático da Hélade
8.2.1 Medicina do demos e philosophia: Pitágoras, Xenófanes e Heráclito
8.2.2 A Medicina e política do demos: O projeto de Sólon, Clístenes e Péricles
8.2.3Tragédias e demos: medicina da catarse
8.3. Uma nova medicina pública hipocrática
8.3.1 Hipócrates e o iatro philotheos: A medicina da sabedoria e sabedoria da medicina
8.3.2 Querela da medicina pública grega: Perí Téchnës v.s Perí archaíes ietrikes
8.3.3 Platão: Psicagogia da teoria e inversão da medicina pública
8.4 Galeno: medicina, filosofia e a civitas romana
5.1.5.1 Filosofia e medicina em Galeno: o bom médico é filósofo
5.1.5.2 Galeno: medicina a serviço da cidade
Capítulo IX
9. MEDICINA DO ESPAÇO PÚBLICO DA MODERNIDADE
9.1A Querela da medicina moderna: Iatromecânicos versus Iatroquímicos
9.2 Medicatrix Naturae: A crítica médica da medicina moderna
9.3 Construção do espaço do público moderno: as metáforas da rede pública
9.4 KANT e o espaço comum do público: da medicina do público ao público da medicina
Capítulo X
10. UM CONCEITO DE ESPAÇO PÚBLICO DA BIOMEDICINA
CONTEMPORÂNEA

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Referências Bibliográficas

2
INTRODUÇÃO: EPISTEMOLOGIA PARA UM CONCEITO DE ESPAÇO PÚBLICO
E DE “MEDICINA DO ESPAÇO PÚBLICO”

A raça Humana é um Prometeu dilacerado por abutres

Esculápio

Como “medicina do espaço público” compreendemos como sendo um conceito que analisa as
relações entre a medicina e o espaço público, sabendo que a “medicina” é um tipo de saber, que
é ao mesmo tempo teórico e prático cujo objetivo é buscar a terapia ou a saúde do indivíduo na
relação com a comunidade e a política, ou seja, na mediação entre o Estado e a sociedade
processado a partir das relações e interações intersubjetiva e de «autocura» autónoma dos
indivíduos. O espaço público é um locus da formação política e identitária dos cidadãos, e esta
identidade e autonomia depende de como a medicina enquanto saber explica os domínios do
corpo e da mente e da sua visão sobre a saúde e a doença.
O antigo e o novo espaço público (HABERMAS, 2012; INNERARITY, 2010) que modificou
e ampliou com as transformações tecnológicas e política pede uma reformulação do conceito,
porém baseada nas tecnologias de informação e comunicação em equilíbrio com os novos
conceitos antropológicos proposta pela nova medicina (engenharia genética e biotecnologia).
O conceito de espaço público contemporâneo compreendido por essas teorias de filosofia
política contemporânea resiste a uma estruturação na sociedade tecnológica contemporânea,
pois este obliterou não só as distinções das antigas bases antropológicas e das teorias políticas
entre natureza e artificialidade, público e privada, mas também devido a uma fundamentação
filosófica cujas bases enraíza nos domínios simbólicos impede a emergência de um novo
pensar.
Os modernos conceberam a natureza humana a partir das perceções e das novas descobertas
que os médicos fizeram sobre a doença e o sobre o corpo humano. A filosofia do sujeito e de
autoconsciência moderna desenvolveu como estrutura antropológica proporcionada pela
revolução científica no domínio simbólico e as conceções médicas e biológicas do ser humano
que fundamentaram às teorias contratualistas formataram um novo o espaço público divido
entre as redes do comércio e da imprensa e os conceitos de estado de natureza e animalidade.
Apesar de buscar os fundamentos nos domínios das metáforas biológicas e dos saberes médicos,
os filósofos antigos e modernos estabeleceram um conceito de espaço público, helénico ou
burguês em meio as transformações sociais e crises culturais separando os domínios

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tecnológicos e discursivos dos domínios orgânicos e da vida biológica. Perante a reestruturação
da sociedade contemporânea com as inovações tecnológicas e biotecnológicas e com a
emergência das filosofias desconstrutivistas (Foucault, Derrida) e pós-humanistas (Lyotard,
Hottois, Sloterdijk) que criticam a filosofia da comunicação cujo domínio simbólico impera
sobre as tecnociências, o corpo e a animalidade tem de nos levar a repensar na reconstrução do
conceito de espaço público discursivo apostando no equilíbrio entre natureza e artifício,
animalidade e discursividade.
A genética e a cibercultura devem encontrar as suas metáforas poéticas e conceitos filosóficos
adequados para se poder pensar sobre a emergência do novo conceito de espaço público, que já
não pode ser pensada apenas nos domínios do multiculturalismo e do desenvolvimento dos
media. De um lado uma cultura baseada nas tecnologias de comunicação/informação e das
biotecnologias do domínio da medicina configura a nova condição humana, e de outro uma
tradição humanista do espaço público cujos meios são os livros, a educação clássica e os
recursos simbólicos de uma filosofia e ciência moderna que secularizou os recursos normativos
e as aspirações religiosa do cristianismo no Ocidente. Por um lado, os chamados pós-modernos
(Lyotard) e pós-humanista (Hottois) defendem a emergência dessa nova condição humana, e
por outros defensores da modernidade como Habermas continua a defender uma modernidade
e um processo de racionalização cujo centro de operação são os níveis discursivos e de
argumentação de uma opinião pública situado no espaço público. Também as interpretações
das tecnologias e dos medias tem sido feita no domínio fenomenológico (Heidegger, Castells,
Lévi, Floridi), tal como tem sido o conceito de espaço público discursivo fundamentado a partir
do conceito de “mundo da vida” de Husserl, “tradição” e “interpretação” de Gadamer e Ricoeur.
Uma interpretação que coloca mais em diálogo o simbólico, tecnologias e a vida orgânica é
aquela perspetiva aventada por Lyotard, mas melhor desenvolvida por Hottois quer na crítica
ao simbólico, quer na sua incorporação à tecnociência, mas descurar as alternativas
desenvolvidas por Foucault, Sloterdijk e Esposito sobre uma esfera imunológica. As
interpretações da bioética de Hottois aproxima-se de Simondon que tenta estabelecer uma
relação entre tecnologia e vida biológica e de Canguilhem com o conceito de normal que põe a
medicina num complexo de relações com a técnica, a vida, a política e a sociedade.
Noutro campo da filosofia da medicina vem-se demonstrando, respondendo aos seus críticos
que não deve opor, o objetivo ao subjetivo, o técnico ao humano, o irracional ao irracional, mas
o que deve fazer uma articulação dessas relações com as patologias e situações sociais. O
problema colocado pela filosofia da medicina é que uma medicina do século XIX desenvolveu,
de tal forma que deixou-se render por uma medicina da saúde pública e de tratamento de
doenças aliado progresso do saber tecnocientífico da epidemiologia e da genética que terá
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permitido um controlo sobre o espaço público e os seus indivíduos na modernidade (De la
philosophie de la medicine de Georges Canguilhem: In Revue de Métaphysique et de Morale.
Philosophie de la medicine, n.2. Puf, Junho de 2014).
A medicina moderna e contemporânea estabeleceu-se um liame com espaço público que é
claramente visível nos textos de Foucault e Illich em Nemesis (1975), o que normalmente se
denomina biopolítica e de medicina social, a verdade é que ela é negada por alguns outros
autores1. A relação do individuo - meio ambiente - saúde – doença – espaço social pelo ponto
de vista da medicina e da saúde do público, é sempre considerada como algo complexo que
junta o biológico, o mecânico e o técnico, tornando não só o conceito de saúde, mas também
de homem e sociedade em uma estrutura complexa. A medicina está tanto ligado ao progresso
da ciência (discursivo e cognitivo) e da tecnologia (artefacto e o artístico) que tende cada vez
mais a especialização (racionalização), a instrumentalização (razão técnica) e a comunicação
(razão comunicativa), de modo que esta empreende quer uma tarefa normativa e sistemática
nas suas oposições e contradições e na sua relacionação como a rede da totalidade do bem-estar
público (a cura do corpo biológico e social, o Know how cognitivo e Know that tecnológico
passado e um presente que liga a um futuro aberto antropotécnico). A medicina como estrutura
independente ou não da estrutura da totalidade social ou das suas partes é uma questão que tem
ocupado tanto as ciências sociais, bem como a filosofia em alguns aspetos relacionados com a
sua interelação com a crítica a dominação do espaço público a que se designa “medicalização”.
A medicina como um domínio de pensar e fazer humano que está ligado tanto às diversas
ciências como a diversas artes (BECKINGHAM, 1982; PARKIN, 1987; SELF, 1988;
LAFFERTY, 1997) 2, e está tanto ligado ao bem-estar privado como ao bem-estar público, e

1
Canguilhem faz uma negação da relação implícita do par de conceitos, como ele deixa entrever no
texto “El problema de las regulaciones en el organismo y la sociedad” inserido nos Estudos sobre la
Medicina (2004). Mas Canguilhem apenas empresta esta desconfiança a uma posição muito liberalista
do filósofo inglês Chesterton em What´s Wrong with the World (2008). Embora Canguilhem seja um
dos autores que afirma o campo da Filosofia da medicina e que estabelece nos posteriores ao Normal e
o Patológico uma relação entre medicina, política, técnica e estrutura social, mas acreditamos que quanto
a este ponto, a suspeita política que paira sobre a sua análise deve também a crítica ao coletivismo da A
Sociedade Aberta e os Seus Inimigos de Karl Popper (1966) que acolheu a crítica de Chesterton.
(CANGUILHEM, Georges (2004). Escritos sobre la medicina, 1ª ed.; Buenos Aires: Amorortu;
CHERSTERTON, G.K (2013). Disparates do Mundo, trad. de Maria José Figueiredo, Lisboa: Alêtheia
Editores (edição portuguesa).
2
A medicina por estar entre a ciência e a arte, considera que ela tem um status epistemológico dual, porque são
esses dois ramos de saber que lhe dá a configuração de Episteme. A medicina tem um pé no barco do conhecimento
científico e outro no das humanidades. As humanidades e as tecnologias enformam-lhe a sua essência como praxis
médica. Para alguns autores até mesmo a sua natureza dual explicita referência na divisão das ciências da medicina,
que ora algumas profissões médicas são mais artes e outras serão mais ciências (Beckingham, 1982; Parkin, 1987;
Self, 1988; Lafferty, 1997) (BECKINGHAN CR. Science, the humanities, nursing research and nursing.int Nurs
Rev. 1982) (LAFFERTY, P M. Balancing the curriculum: promoting aesthetic knowledge in nursing, Nurse Educ
Today, 1997) (PARKING CJ. Humanities for the helth professional. AD Nurse. 1987) (SELF DJ. The pedagogy
of two diferente approaches to humanistic medical education: cognitive vs affectiv. Theor Med.1988). A dualidade
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por isso, a questão mais geral da relação entre a ciência, simbólico e a estrutura social e o corpo
biológico com as tecnologias tornam-se mais evidente neste domínio epistemológico que
noutros. É assim que uma epistemologia de complexidade que interliga essas variáveis no
conceito de “medicina de espaço público” pode ir mais além com os conceitos alternativos ao
espaço público de Hottois apresentados a nível da bioética na interligação entre o simbólico, o
biológico e tecnológico ou conceitos de esferas imunológicas apresentado por Sloterdjik ou das
versões de Esposito no Bios.
O motivo fundamental para a pesquisa do conceito de “medicina do espaço público” deve-se
ao facto, de deparamos que o conceito de espaço público discursivo apresentado por Habermas
desde A Mudança Estrutural da Esfera Pública (1962) à Teoria de Ação Comunicativa (TAC)
tem sido criticado em diversas frentes, quer no domínio sociológico (Nancy Fraser, Benhabib,
Howhendahl, Young e Calhoun (1989), Sennett, Goode a partir de Peters (1993, 1999) e Warner
(1993)) e quer no domínio filosófico (Derrida, Lyotard, Sloterdijk e Hottois). A crítica
sociológica tem evidenciado que o espaço público discursivo reproduz as desigualdades sociais
e de género na participação política, e esquecendo que esta crítica depende de uma crítica ao
fundamento filosófico do conceito. A crítica sociológica só é operante se se reconhecer que a
nível de filosofia o fundamento simbólico e discursivo do espaço tem operado como uma
economia de morte da presença viva como afirma Derrida devido ao seu humanismo e
fenómenologismo, mas também fazer predominar ainda uma estrutura ficcional de base
religiosa cristão e do dualismo cartesiano que nega a participação do corpo e da “animalidade”
na sua relação com a artificialidade como tem reconhecido Lyotard, Hottois, Sloterdjik e a
filosofia da medicina. É neste sentido que queremos apresentar neste trabalho divido entre três
partes (uma que aborda o conceito de espaço público discursivo e crítica o seu fundamento
simbólico; uma segunda que fala da ausência do corpo biológico na filosofia que sustenta o
espaço público discursivo para depois demonstrar alternativas ao conceito fundadas
“bioantropotecnicamente”; e por fim um terceiro que fala do conceito de medicina de espaço
público) e subdividido em dez capítulos: Na introdução discutimos a necessidade de uma
espistemologia de complexidade para o conceito e espaço público. 1) No primeiro capítulo
apresentamos o conceito de espaço público discursivo onde o discutimos a sua pertinência em
relação a outros modelos, ao mesmo tempo evidenciamos críticas sociológicas dirigida a
Habermas e Teoria de Ação comunicativa; 2) no segundo, terceiro e quarto capítulos
demonstramos que é possível a partir da modernidade construída simbolicamente, da filosofia
fenomenológica (Husserl e Heidegger), Teoria Crítica (Adorno, Horkheimer, Marcuse e

da praxis médica, faz com que existem casos em que uma outra das expressões “ciência” ou “arte. A Enfermagem
é considerada por alguns autores como sendo “uma das belas artes”
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Habermas) e desconstrutivistas (Nietzsche, Derrida, Foucault, Lyotard) e pós-humanistas
(Sloterdijk) encontrar as origens dos desacertos e aporias de uma fundamentação comunicativa
do espaço público discursivo que exacerba na fundação simbólica; 4) no quinto capítulo
criticamos a forma como o conceito a fundamentação do espaço público tem negligenciado a a
região biológica do ente, a «animalidade» e bem como das tecnociências (biotecnologias e
engenharias genéticas) em detrimento da autocompreensão simbólica como é sustentado por
Habermas em O Futuro da Natureza Humana; 5) no sexto apresentamos algumas alternativas
e complementos ao conceito de espaço público discursivo [(a) «corpológico» ou «biopolíticos»
de Foucault e Sennett; (b) «imunológico» de Sloterdjik e Esposito; (c) «biotecnológico» de
Lyotard e (d) «bioético» de Hottois] por considerar um equilíbrio entre a dimensão discursiva
e simbólica e a região biológica do ente “animalidade”; no sétimo, oitavo, nono e décimo
capítulos apresentamos o nosso modelo a que designamos no início de “medicina do espaço
público” que busca nas origens na Grécia, na era burguesa e filosofia moderna e por fim na
atualidade contemporânea com as questões ligadas a medicina, biotecnologias e espaço público,
podendo estabelecer uma relação entre o simbólico e biológico, o público e o privado, o
artificial e natural.

PARTE I

O CONCEITO DE ESPAÇO PÚBLICO DISCURSIVO: ENTRE OS FUNDAMENTOS


SIMBÓLICOS E APORIAS DE UMA CATEGORIA DA MODERNIDADE

Capítulo I

1. DO CONCEITO DE ESPAÇO PÚBLICO DISCURSIVO AO CIBERESPAÇO

O trabalho teórico de Habermas tem seguido o percurso para a fundamentação filosófica,


sociológica e evolutiva (histórica) do conceito de espaço público discursivo passando pelas
seguintes fases: 1) reconhecimento do espaço público discursivo embrionário na pólis helénica
que faz a distinção entre o espaço da família e o espaço público político; 2) a existência de um
espaço público feudal de representação que deturpou a originária distinção pela relação
neutralidade; 3) o espaço público moderno burguês no século XVIII inspirado no público
discursivo da pólis e constituído por literatos e negociantes reunidos publicamente
contraposição ao Estado; 4) a constatação da degradação do espaço público moderno burguês
no século XIX derivado do paradoxo capitalista e literário que sucumbiu em um “Estado de
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bem-estar-social” caracterizado pela interpenetração entre a sociedade e Estado, o público e o
privado e domínio da comunicação de massa; 5) e por fim, a reformulação da categoria do
espaço público discursivo a partir de uma Teoria de Ação Comunicativa com os olhos postos
nas redes dos movimentos sociais autónomas.
Neste percurso filosófico e sociológico, o que Habermas tem buscado desde Mudança
Estrutural do Esfera Pública (1962) a esta parte é uma categoria de espaço de público
discursivo que se define na dimensão antropológica da mediação simbólico-linguística e
racional entre a natureza e a cultura, fundada na capacidade racional da humanidade para o
domínio da natureza e para construção de um espaço comum de civilidade. A questão principal
que Habermas, herdeiro do Iluminismo e da Teoria Crítica da Escola de Frankfurt, tinha de
enfrentar na defesa desse conceito que orientado para a dimensão simbólica se se poderia ser
comprovada pela validade e facticidade normativa no século XX frente as teorias
antropológicas, jurídicas e políticas funcionalistas rivais e as críticas pós-modernas. A verdade
é que como hegeliano de esquerda e marxiano, Habermas tinha de desenvolver uma teoria de
espaço público estruturado simbolicamente, mas integrando os poderes simbólico-cognitivos
dos sistemas sociais modernos (os sistemas da administração pública, o económico, o jurídico
e da comunicação de massa) o de modo ainda a preservar a razão moderna das críticas dos
neoconservadores (DERRIDA, e dos pós-estruturalistas (FOUCAULT).
Para ele razão filosófica dos modernos tinha ainda que poder estabelecer uma ligação entre os
sistemas simbólicos-discursivos da razão comunicativa e sistemas simbólicos cognitivos da
razão instrumental que separam com a modernidade, ou seja entre os conceitos de «mundo da
vida» e «sistema», cultura e política. Os conceitos de opinião pública e espaço público
explorado em 1962 poderiam para o autor intermediar as duas culturas (Two culture, P.C.
Snow) e as esferas fragmentadas da ciência, da arte e da moral na modernidade.
Após a apresentação da categoria burguesa de espaço público em Transformação da Esfera
Pública Burguesa (1962) e efetuadas as críticas dos pós-modernos e dos sociólogos feministas
e com as mudanças sociais, Habermas redefine, então, o conceito na Teoria de Ação de
Comunicativa (1981) e em Direito e Democracia (1992). Em Direito e Democracia, Habermas
define o conceito de espaço público:

A esfera pública pode ser descrita como uma rede adequada para a comunicação de conteúdos,
tomadas de posição e opiniões; nela os fluxos comunicacionais são filtrados e sintetizados, a
ponto de se condensarem em opiniões públicas enfeixadas em temas específicos. Do mesmo
modo que o mundo da vida tomada globalmente, a esfera pública se reproduz através do agir
comunicativo, implicando apenas o domínio de uma linguagem natural; ela é uma sintonia
com a compreensibilidade geral da prática comunicativa quotidiana (HABERMAS, 1997:91-
92).

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Mas com o advento das tecnologias de comunicação e informação, Habermas que antes
considerava que o poder dos medias entrava em cena para roubar “o princípio da publicidade a
sua inocência” (2012:39) é obrigado á uma nova reformulação ao ver que os meios de
comunicação eletrónica tinham tornado as fronteiras sociais movediças, de tal modo que
passaram a constituir as novas coordenadas elementares do espaço e do tempo histórico do
“mundo da vida”. Habermas começa por pensar que os meios de comunicação de massa
transformaram a presença física das massas num processo de «ubiquidade», porém manteve a
forma de desdiferenciação que atinge o «mundo da vida» nas multiplicidades de papéis, na
pluralização de formas de vida e bem como na individualização dos projetos gerados de forma
eletrónica (HABERMAS, 2012:63).
Para Habermas o desenraizamento provocado pelos meios de comunicação eletrónica do
«mundo da vida «foi “secundado pela construção de pertenças e enraizamentos comunitários
próprios e a igualização dos sujeitos “pela impotência perante uma complexidade sistémica”
(HABERMAS, 2012:63). Mas tarde veio a considerar que a comunicação de massa já não
correspondia à imagem do tipo de face to face communication espontâneo que antes servia de
modelo para a sua teoria de deliberação (HABERMAS, 2015:78). É desta sorte que começa por
considerar que aqueles processos da prática comunicativa e do design institucional da
democracia encontrava-se em liqueficação comunicativa da política nas sociedades complexas
e digitais a partir da interdependência dos três desenvolvimentos sociais, a saber: a) «sociedade
da informação», b) «sociedade em rede» e c) «sociedade dos medias» (HABERMAS, 2015:93).
Para ele, a contínua inovação tecnológica dos medias ao fazer um “revolucionamento dos
métodos de transmissão [e] conduziu à expansão e ao adensamento das redes comunicativas e
a uma maior diferenciação do público de massas” (HABERMAS, 2015:93-94). Contudo, ele
continuava a acreditar que a comunicação de massa que passa pela imprensa e media eletrónicas
carecia ainda de limitações procedimentais própria da ação comunicativa face to face e dos
requisitos de qualidade como o de confronto discursivo. Para Habermas era preciso ver que como
a comunicação de massa tinha estruturado o espaço público de forma diferente na sua derivação
dos processos de alargamento dos espaços sociais da interação simples:
A estrutura espacial abstrata da esfera pública pode ser compreendida como um alargamento dos
espaços sociais que são criados por interações simples entre pessoas presentes. As esferas públicas
nacionais consubstanciam-se em redes percorridas por fluxos comunicativos «selvagens», ou seja,
cruzando-se, todos eles, de forma desorganizada. Estas redes transportam mensagens de diversos
tipos: notícias e reportagens, opiniões e ensaios, relatos e conversações moderadas, cabarés,
espetáculos, filmes, imagens e encenações, em poucas palavras, programas com um carácter de
entretenimento, instrução ou edificação, emissões de conteúdos informativo, formador de opinião
ou dramático. Estas mensagens são produzidas e apresentadas por meios de comunicação (ou
instituições culturais como teatros, museus, bibliotecas, etc.) emitidas por canais locais ou
suprarregionais, recebidas e consumidas por diversos géneros de leitores, ouvintes, espectadores
e assistências, processadas e comentadas por grupos, partidos, campos, subculturas, etc
(HABERMAS, 2015:95).
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Esse processo de alargamento do espaço público político (essa confusão babilónica de vozes) é
acompanhado por um outro processo centrípeto de condensação de «opiniões públicas» a partir
das mensagens políticas. Apesar das mudanças em termos tecnológicos da sociedade, Habermas
continua a definir o espaço público como sendo um espaço em que domina a comunicação
simbólica, apesar de reconhecer que:
a worl wide web parece compensar as fraquezas do carácter anónimo e assimétrico da
comunicação de massas, na medida em que permite uma readmissão de elementos interativos e
deliberativos num diálogo não regulamentado entre parceiros que comunicam entre si de forma
virtual, mas em pé de igualdade. (HABERMAS, 2015:97).

Esse otimismo em relação aos meios eletrónicos para uma reconfiguração do espaço público na
sua assunção positiva da artificialidade das TICs e da multiculturalidade em não lhe permite
escapar as críticas sociológicas recentes sobre esse o domínio do simbólico sobre o corpo do
público.
Goode a partir de Peters (1993, 1999) e Warner (1993) tece algumas críticas ao modelo
habermasiano de espaço público que negligencia o corpo. Para Peters a forma ideal de
copresença de cidadãos em discussão invocado por Habermas da ágora da Grécia antiga é uma
falácia para as modernas sociedades, porque ao estabelecer uma identidade cognitiva entre os
cidadãos e governos atuais é só no sentido de evitar a dimensão estética e representativa. Goode
concorda com Peters ao afirmar que a transparência comunicativa é uma falácia, porque os
conceitos de mediatização e condensação simbólica da verdade ou mediação tecnológica da
comunicação política na democracia contemporânea negam a dimensão estética e discursiva:
Once we discard the fallacy of communicative transparency in a complex world, we see that
mediated and condensed symbols of trust, status and aura will play their part in the democratic
process. But these considerations are always relative. After all, it would be difficult to argue that
any piece of political communication – technologically mediated or otherwise – does not carry
with it an aesthetic or expressive dimension, whether or not that is the intention of the speaker
(GOODE, 2005:49).

A estrutura de comunicação política não carrega a dimensão estética, mesmo que Habermas na
Teoria de Ação de Comunicativa tenha precisado a noção de atos de fala a dimensão expressiva
em simultâneo com as dimensões normativas e cognitivas. Por isso nas estruturas
representativas demanda um certo “curto-circuito” que implica os meios de comunicação e um
parcial deslocamento para as interações cognitivas com símbolos expressivos e emotivos. A
operação de aceitação parcial no abstrato da comunicação discursiva e eletrónica no estilo de
espaço público sem substância, da dimensão estética apenas demonstra a inevitabilidade da
predominância da estetização da política que inerente a estrutura representativa e de mediação
política (GOODE, 2005:49). Para Peters e Good o logocentrismo e o cientismo que Habermas
põe na abertura do espaço público das interações, de modo a fazer o ‘discursive testing’ leva a

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teoria de comunicação a ser contraprodutivo para com as outras formas de interação estética e
corporal onde a criatividade dos cidadãos nas democracias é mais forte que a sobriedade do
discurso racional.
Warner crítica a forma marginal como a narrativa habermasiana do espaço público trata a
questão do corpo. Para ele a ‘razão universal’ do espaço público burguês era exercida como
particularidade dos sujeitos em que discursos públicos tecem uma relação negativa com a
pessoa, de tal modo que o princípio de universalidade tem um sentido utópico e a abstração
pessoal transcende á realidade dos corpos (WARNER, 1993; GOODE, 2005:52). A identidade
corporal é desconsiderada quando os cidadãos dos grupos dominantes nos processos discursivos
abstraem das identidades, como o caso do espaço públicos burguês em que são dominantemente
brancos ou masculinos. Nos processos de “refeudalização” descritos por Habermas os media
visuais também tomam lugar do corpo no centro do espaço público (GOODE, 2005:52). É deste
ponto de vista que para Warner o discurso do anonimato operado espaço público e dos medias
no Ocidente tende-se á virtualização do corpo com as operações de desinteresse e
desencarnação da razão para atingir o bem público. Warner questiona como o reino da leitura,
da publicidade mediática e da iconicidade vindo do ideal racionalista da autoabstração e como
fundamento do espaço público que terá transformado em um desvio patológico para o público
ocidental. O argumento de Warner contra o espaço público ideal habermasiano leva ainda mais
longe a crítica de Fraser que considera que além de pôr contra os “sujeitos minoritários” é contra
o “sujeito privilegiado” que trabalha a abstração (2005:53). Conclui então que a autoabstração
operada no espaço público discursivo é danosa, por constituir uma forma de má-fé na sua ação
de «descorporalização» e «desculturalização». Perante as críticas ao conceito de espaço público
discursivo Peters e Werner, Goode nos recomenda o reconhecimento de que o espaço público
deve ser habitado pelo corpo e palavras, desejos, pensamentos e ideias na sua tensão e
contradição:
We might recognise not only that the public sphere is populated with bodies as well as words,
thoughts and ideas, but also that it is shot through with tensions and contradictions […] The point
is that our model of the public sphere should account for, rather than simply pathologise tout
court, the role of bodies, icons and desire (GOODE, 2005:54-55).

Mas a questão que nos colocamos é porque domina o simbólico sobre a corpo do público – e a
esta questão não basta uma resposta sociológica é preciso buscar na filosofia a razão dessa
“descorporalização” do espaço público.

Capítulo II, III, IV

11
2. MODERNIDADE, CRÍTICAS E APORIAS DO CONCEITO DE ESPAÇO
PÚBLICO DISCURSIVO

O conceito de ação comunicativa move-se entre os domínios de um mundo linguístico não


disponível e outro domínio como semitranscendência que é estruturado através do diálogo
interpretativo e argumentativo de uma opinião pública situada num espaço público conduzido
por textos e vozes dos “melhores argumentadores”. Os melhores argumentos constituem-se
através dos textos filosóficos e científicos escritos, das epístolas, dos documentos religiosos,
das orações de sapiência de figuras de nomeada de uma tradição ocidental cujo a designação
histórica e académica tem sido chamado de humanismo. Esta estrutura dialógica tecida desde
os gregos aos homens das luzes, passando pelos romanos, compõe-se naquilo que se designa de
theoria na fenomenologia. Teoria ou contemplação significa não só o logos que reúne o
comum do saber e da política na ágora grega, mas é também a súmula (symbolum) nos
escolásticos. Teoria é símbolo, no sentido de representação simbólica. O mundo antigo e a
filosofia escolástica desacreditado repassa os símbolos antiteológicos para os domínios das
ciências, das artes e da moral de um mundo moderno secularizado com o desenvolvimento
científico e tecnológico. A confiança no poder de criação dos símbolos racionais e matemáticos
no mundo moderno procede uma cissão do homem com a natureza e o biológico, levado a uma
desnaturalização do homem e uma desumanização da natureza. De Descartes a Leibniz
sustenta-se uma filosofia de modernidade como ficção simbólica com poderes de
criação/fabricação de um «novo mundo» (a cidade e o seu público ligado pelo discurso
simbólico universal), contudo é desde Montaigne que uma dúvida se instalou em relação a essa
separação do homem com o mundo natural e a este mundo.
Husserl crítica esta racionalidade simbólica e volta fundar a teoria na subjetividade e no «mundo
da vida» (Lebenswelt) como tradição. Na continuidade, Heidegger trás o sujeito e o ser para a
historicidade e a quotidianidade como «ser-no-mundo» que mediante a linguagem simbólica e
o pensar na ciência, a arte e normas de ser com abre espaços de clareiras para um habitar,
contudo vaticina o fechamento do espaço de abertura com uma história do ser como Ge-stell
(disposição e armação técnica) que caminha no destino no desocultar da verdade para o fim do
pensar teórico da tradição humanista e da metafísica. Os teóricos de Frankfurt (Adorno,
Horkheimer, Marcuse) ao analisarem a sociedade industrial deparam que esta cultura e tradição
estava perdendo a autenticidade e a transformar-se em indústria cultural e uma ideologia
política, a conduzindo a eclipse e a mitologia da razão. Habermas contra o positivismo
sociológico que propunha a cientificação da opinião pública chamou-nos atenção ao um
interesse emancipatório das ciências hermenêuticas que na modernidade formavam-se através

12
da comunicação diálogo, argumentação e entendimento de um público igualitário que reunia no
espaço público para discussão de temas literárias e politicas contra a prepotência dos poderes
instituídos. Da sua Teoria de Ação Comunicativa, Habermas propõe a distinção entre «ação
comunicativa» e «ação instrumental» a partir da análise de Hegel e sistema sociais e «mundo
da vida» a partir de Parsons, Durkheim, Mead, Husserl e das teorias pragmática de atos de fala.
O espaço público discursivo de Habermas ganha um novo arcabouço teórico de relevo, estando
entre uma teoria de sociedade civil, de modernização social e da modernidade, mas ainda
carregando a velha tradição humanista e simbólica que desde os tempos modernos iniciais
produziram a cissão com o mundo natural e com o corpo biológico.
As mudanças sociais com a fragmentação discursiva e cultural e o desenvolvimento
tecnocientífico levaram com que os filósofos e sociólogos dessa nova condição pós-moderna
criticassem o conceito de racionalidade e de espaço público burguês e discursivo de Habermas.
Os desconstrutivistas (DERRIDA), os pós-estruturalistas (FOUCAULT) e pos-modernistas
(LYOTARD), teóricos pós-coloniais (SPIVAK), feministas (BENHABIB) e pós-humanistas
(SLOTERDJIK) criticam o essencialismo e o poder imperial da modernidade e da razão
comunicativa que enforma a sua teoria e o conceito de espaço público discurso.
Para Foucault, Habermas o mais dileto representante contemporâneo das Luzes, continuava
apenas a pensar num quadro histórico de um humanismo como razão quadricular e nos níveis
de uma comunicação genealógica que não está muito longe do teatro estéril da pragmática
universal (CONWAY, 1999: 61). Para Lyotard que reivindicou uma condição pós-moderna
com a despedida das grandes narrativas comunicacionais pensava que essa teoria permanecia
cega à fragmentação comunicativa e a configuração ciberorgánica do humano (LYOTARD,
1979). Enquanto Derrida via que a razão comunicativa quer na sua voz, na sua escritura e na
literatura e pedagogia conduzia a um falo-logofonocentrismo e a uma forclusão do outro
presente vivo (como animal racional, o género e democracia «por-vir») e da prática política.
As críticas de Foucault e Derrida á razão da comunicação e da cultura humanista conduziram
as críticas dos teóricos pós-coloniais e feministas ao conceito de espaço público. Feminista
como Benhabib afirmava que a mensagem da Strukturwandel der Öffentlichkeit era aporética,
porque a estrutura do espaço público era involutivo naquilo que o autor pressupunha como
sendo transformação estrutural da opinião pública e da comunicação, o processo não era mais
que, a bem dizer, um processo de declínio em direção ao consumo em vez de diálogo livre, sem
constrangimentos e assente no raciocínio individual e nos princípios da legitimidade
democrática de uma sociedade moderna ancorado nas instituições da tradição (BENHABIB,
1996:87-88). Os teóricos pós-coloniais como Spivak na sua Crítica da Razão Pós-colonial via
na cultura humanista e comunicativa da modernidade um imperialismo que se estabeleceu uma
13
oposição binária entre amos e nativos desde a empresa civilizadora do Ocidente (SPIVAK,
1999). O pós-humanismo de Sloterdjik na sua Crítica da Razão Cínica e noutros textos
questionava como uma comunicação que revestida de humanismo e nacionalismo poderia
continuar a produzir um sujeito domesticado e cínicos nos espaços públicos gelados negando a
modernidade a sua antropotecnia e uma esfera climatizada (SLOTERDJIK, 1983; 2000; 2003;
2004).
Habermas em defesa desse programa humanista e racionalista herdeira das Luzes contra-
argumentou contra essas teorias. Habermas, atacando as bases teóricas dessas críticas, por
exemplo associa Foucault a um viés desconstrutivista pertencente á Heidegger e Derrida ou a
Nietzsche via Bataille para afirmar que a crítica do pós-modernismo era uma crítica de uma
razão que imputa à socapa ao todo da história uma teologia era tão convincente como a crítica
da ridícula pretensão de pôr fim a qualquer alienação social (HABERMAS, 2010:334). Para ele
quando os pós-modernos e desconstrutivistas destacam a fragmentação, a cissão, a
marginalização, a diversidade, a diferença, não-identidade e a sensibilidade estão apenas a
renovar os motivos da teoria crítica mais antiga contra as forças do universal abstrato e da
uniformização e, portanto, esse potencial crítico já se encontra endossado na Teoria de Ação
Comunicativa.
A nossa tese é que a herança simbólica discursiva herdada por Habermas, quer da teologia
escolástica, da religião cristã, da filosofia moderna ou quer da fenomenologia e hermenêutica
de Husserl, Heidegger é que impede a Teoria de Ação Comunicativa e o conceito de espaço
público de dar conta do processo de «descoporalização» do público (Derrida) e sua
domesticação (Sloterdijk), porque a persistência isolado do fundamento simbólico ignora a
«animalidade» e o corpo biológico, mesmo com a emergência das biotecnologias e das
neurociências que se vão unindo cada vez mais as tecnologias de comunicação e informação,
trazendo assim para nossa contemporaneidade uma condição uma híbrida.

PARTE II

DA CRÍTICA DAS AUSÊNCIAS DO CORPO NO ESPAÇO PÚBLICO DISCURSIVO ÁS


ALTERNATIVAS BIOTECNOLÓGICAS DE ESPAÇOS PÚBLICOS CONTEMPORÂNEOS

Capítulo V

3. CRÍTICA AO ESPAÇO PÚBLICO DISCURSIVO PELA AUSÊNCIA CORPO


BIOLÓGICO

14
Ardans no artigo Corpo e Identidade na Teoria da Ação Comunicativa de Habermas (2005)
afirma que na Teoria de Ação Comunicativa que postula a intersubjetividade e sustenta a
comunicação interpessoal e a interação social, o corpo é, sem dúvida, o grande ausente. A
consideração de Habermas da história da espécie como auto-reflexão de sujeitos em interação
social vinculado a ideia de intersubjetividade ilesa e sustentada na Teoria de Ação
Comunicativa conformou-se com o eixo ético-ontológico, epistemológico e metodológico que
o diferencia na continuidade com os outros autores da Teoria Crítica. Ao contrário da assunção
de Marcuse da teoria dos impulsos nos anos 60, os esforços de Habermas em Conhecimento e
Interesse (1968) era de “ler” a teoria freudiana como empreendimento autoreflexivo para
eliminar as paixões do espaço público e reenviá-las para os espaços privados. É neste sentido
que Habermas afirma que a razão pública não precisa de corpo, porque a racionalidade do
sujeito de linguagem e ação é incompatível com o sujeito de desejo.
O preço pago pela exclusão do corpo do espaço de comunicação é a negação das raízes
emocionais da racionalidade e dos discursos que desconhecendo o sujeito de enunciação
(GAGNEBIN, 1994) faz com que “a razão vacila no interior de si mesma” (ROUDINESCO,
1999). Habermas ao excluir o corpo da Teoria de Ação Comunicativa acaba por excluir os
vínculos da linguagem e da ação com os factos biológicos e consequentemente, a sua relação
com a vida e a morte. Segundo Ardans:
Se levada a sério nos seus próprios termos (o que Habermas deixa de fazer, pois na TAC de 1981
não retoma seus estudos de 1968), a psicanálise deveria propiciar, em termos de teoria da
sociedade e de psicologia social, uma reformulação de longo alcance, principalmente pela
inclusão, no corpo da teoria da ação comunicativa... do corpo. Pensamos que só por este caminho
poder-se-ia chegar a falar em uma razão destranscendentalizada em sua relação com o agir
comunicativo (Habermas, 2001). Mas para destranscendentalizar a razão haveria que pesquisar
seus vínculos com o escamoteamento da morte em ocidente pois, afinal, uma razão que nega o
corpo está negando a morte (desse corpo, dos corpos) e com isso está, paradoxalmente, negando
a vida (ARDANS, 2005:5).

O nosso corpo e o corpo dos outros e a sua afetabilidade no sentido de Espinosa são negados
por Habermas impedindo que a Teoria Crítica de uma reformulação de longo alcance a fim de
incluir no corpo da teoria de comunicação o corpo biológico como formadora uma razão
descentralizada onde a reprodução social, a transmissão cultural e a socialização constituiriam
uma racionalidade enraizada, finita e plural e não um universalismo descorporalizado. Mas
como já vimos, esta é uma herança própria da filosofia hermenêutica, da fenomenologia de
Husserl e Heidegger e da antropologia filosófica de Ernst Gehlen e Cassirer. Os conceitos de
“mundo da vida”, sistemas, tradição, interpretação, argumentação são conceitos opostos á
“animalidade” e corporalidade biológica. A interpretação habermasiana de Nietzsche vai no
sentido de afirmação do simbólico como instinto de sobrevivência. A noção de corpo em
Habermas é corpo do símbolo. É por esta razão que em Sobre Nietzsche y otros Ensayos (1982,

15
1994), Habermas defende a posição da antropologia filosófica que considera que o
entendimento como meio de aprendizagem coletiva (socialização, personalidade, cultura) é ao
mesmo tempo um meio técnico de libertação do ambiente natural ameaçador e de afirmação da
espécie humana:
El entendimiento es un medio de afirmación propia: está al servicio de la «adaptación» y del
«dominio de la naturaleza». La proyección de mundos simbólicos refleja, por una parte, ilusiones
y fantasías desiderativas que permiten una satisfacción virtual, compensación de fracasos y el
disimulo de debilidades y peligros reales. La red de formas simbólicas que arrojamos sobre la
naturaleza tiene, por otra parte, la función de poner bajo control un medio ambiente amenazador
y asegurar la reproducción de la vida «lejos de los cuernos y agudos colmillos de las fieras»
(HABERMAS, 1994:45).

O entendimento simbólico como processo cognitivo, pedagógico e comunicativo da espécie, é


o meio essencial de «adaptação» e de «domínio da natureza» e para a criação de um mundo
fictício como público que está apoiado no «instinto de criar metáforas». De um lado o
entendimento (o saber cognitivo) está a serviço das necessidades elementares (os instintos), e
de outro possibilita na simulação e substituição fantástica por uma disponibilização técnica um
exercício fático do poder político em vez de um regime de estado de natureza. Essas
maquinações como condição do humano não são percebidas como tais, segundo Habermas,
porque somente na sua ilusão objetivista podem as suas interpretações ser verdadeiras e as suas
ficções de conhecimento conferir segurança (HABERMAS, 1994:45). De um modo geral,
Habermas acredita que o corpo não participa em nada na criação das relações de tradição e
conhecimento como meio de segurança, na constituição dos espaços de convivência social ou
sequer na instituição dos poderes político que estão conectados com os espaços públicos. É por
esta razão que se entendem a resistência de Habermas em relação a emergência contemporânea
das tecnológicas e biotecnologias no seu papel configurador do espaço público. Os domínios
do instinto, do corpo biológico e das biotecnologias que lidam a biomedicina atual e engenharia
genética tendo implicações na configuração quer do espaço privado ou do público em O Futuro
da Natureza Humana, Habermas demonstrou um certo ceticismo em relação as suas
possibilidades na transformação da natureza humana, da convivialidade, do poder político, da
educação, porque a sua Teoria de Ação Comunicativa e o conceito de espaço público está
assento apenas sobre os fundamentos simbólicos. Desta forma a defesa do conceito de espaço
público discursivo está em conflito com outros modelos que têm apresentado o corpo e as
tecnociências, sobretudo nos domínios de fundamentos que os pós-humanos vão buscar a
medicina, bioética e tecnociências e no corpo biológico.

Capítulo VI

16
4. ALTERNATIVAS AO CONCEITO DE ESPAÇO PÚBLICO DISCURSIVO: NOVAS
FORMAS DE SABERES BIOÉTICOS E NOVOS MODELOS DE ESPAÇOS
PÚBLICOS

Para além das críticas feitas ao modelo de formação humanistas esses autores têm apresentado
alternativas para o conceito de espaço público cuja base pedagógica e epistemológica centra nos
esboços de modelo de espaço público. O objetivo desses filósofos é poder ultrapassar às
fragilidades do conceito de espaço público discurso cujo discurso filosófico é ideologicamente
dominante na sua afirmação de “que a humanidade seja exclusivamente pacificada por meio da
linguagem (dialogo, argumentação, discussão, compromisso, educação, aculturação…)
(HOTTOIS [1990]:51). Apresentamos sucintamente os modelos alternativos e complementares
ao espaço público discursivo a que de designamos aqui de: (a) «corpológico» ou «biopolíticos»;
(b) «imunológico» e (c) «biotecnológico e (d) «bioético».

4.1 Foucault e Sennett: o modelo corpológico e biopolítico

Michel Foucault em O nascimento da clínica (1977) e O governo dos vivos (2009) e Richard
Sennett em Carne e Pedra (2003) e O declínio do homem público (1988) partem de um modelo
que relaciona o corpo, os saberes com a política. Em Foucault (1977) a verdade (o saber) da
ciência médica que trata do corpo biológico e o poder da política que ocupa do governo dos
homens e da cidade se conjugam na história moderna para governação do espaço público. Deste
modo, segundo Foucault “governante e governado serão, de qualquer modo, atores e co-atores,
atores simultâneos de uma peça que eles jogam em comum e que é aquela da natureza na sua
verdade (FOUCAULT, 2009:24). Essa relação entre ciências do corpo e as tecnologias do eu e
o poder pode funcionar como “ideologia” de dominação, marginalização e exclusão dos outros
no espaço público discursivo, mas isso pode ser revertido se o saber e a política relacionarem-se
com a experiência sensorial subjetiva dos sujeitos privados que reúnem em um público. O papel
de relacionar as verdades das ciências humanas e o espaço público político quer fazendo
genealogia das dominações ou buscando a verdade é tarefa da chamada biopolítica.
Richard Sennett discípulo de Foucault busca como modelo alternativo de espaço público
discurso o estabelecimento de uma relação entre o saber do discurso e o corpo humano na
cidade, tomando como exemplo a pólis grega em Carne e Pedra (2003). Para ele há uma
coincidência naquela cidade antiga dos gregos entre o corpo nu, liberdade de pensamento e
espaço comum de cidadania:

17
Para o antigo habitante de Atenas, o ato de exibir-se confirmava a sua dignidade de cidadão. A
democracia ateniense dava à liberdade de pensamento a mesma ênfase atribuída à nudez. O
desnudamento coletivo a que se impunham – algo que hoje poderíamos chamar de “compromisso
másculo” – reforçava os laços de cidadania. Os atenienses tomavam essa convenção tão ao pé
da letra que, na Grécia antiga, a paixão erótica e o apego à cidade eram designados pelas mesmas
palavras (SENNETT, 2003:30).

O corpo coletivo nu do grego além de elemento erótico servia de reforço a cidadania helénica
acrescentava a parte hibridez do corpo biológico. Não é apenas a aparição da nudez do corpo
nos espaços artísticos, arquitetónicos e desportivos que nos impressiona nos gregos, mas é
também a sua aparição nos espaços da prática política como nas assembleias e teatros onde se
votavam a vista de todos e o calor do discurso inflamava os auditórios. Para Sennett, “a nudez
simbolizava um povo inteiramente à vontade na sua cidade, expostos e felizes” (2003:31). A
valorização da nudez na cidade decorria da compreensão fisiológica que os gregos tinham do
corpo na sua relação com o espaço público e com as estruturas simbólicas e com as ciências e
as artes. A fisiologia do corpo e seu calor era o elemento central de estruturação da cidade para
que a linguagem grega pudesse unir a ação política. “Esses preceitos fisiológicos estendiam-se
a uso da linguagem. Quando as pessoas ouviam, falavam ou liam, a temperatura de seus corpos
supostamente se elevava, junto com o seu desejo de agir (SENNETT, 2003:31). A palavra e
ação unida pelo calor do corpo tornava-se o componente essencial para o estabelecimento do
espaço comum e da democracia na cidade grega. Mas com o domínio do discurso retórico
racional sobre o corpo e a privatização da vida pública esta conduziu ao declínio do homem
público e a frieza dos saberes racionais.

4.2 Sloterdijk e Esposito: o modelo imunológico

Peter Sloterdijk e Roberto Esposito, embora sob perspetivas diferentes expõem os seus modelos
alternativos a que nós designamos aqui de “espaço público imunológicos” visto que o saber da
imunologia humana é fator preponderante da sua estruturação.
Os espaços públicos são lugares de parto «poético» de alívio vital normal como condição que
representa a função mundo-constituinte ou imunológico, a que Sloterdijk prefere chamar no seu
a priori da «arena de dramático»:
Qué son los escenarios, ya lo sabemos gracias a los modelos legados por el teatro griego y
romano. El fenómeno dramático aparece en las reuniones populares, las aglomeraciones de
masas, los mercados anuales, los lugares de combate y los espacios de ejecución pública. Y de
las arenas, los lugares de sacrificio de polvo y sangre, nos proporcionan una idea las plazas de
toros, los coliseos, los lugares de culto y los estadios desportivos (deberíamos considerar aquí si
los paritorios en las clínicas de obstetrícia pertenecen a esta lista o no). En los escenarios, teatros
y arenas se desarrollan actos simbólicos de apertura del mundo gracias a los cuales los hombres
tienen la sensación de que algo importante está pasando de verdad. En estos campos a priori
escénicos, dramáticos y entendidos como arena pública se perciben aquellos asuntos
18
relacionados con el ir-hacia-adelante como fundamentales y que incorporan el riesgo de la
existencia visible en el espacio de la expresión pública (SLOTERDIJK, 2006:122).

Essas arenas públicas do dramático enquanto espaços onde se incorporam o risco da existência
visível diferenciam dos espaços públicos entendido como arenas de «ocultamento» e do
«desocultamento» como fenómenos pertencentes a uma transcendência discursiva. São arenas
do drama do nascimento e de criação do mundo debaixo de formas simbólicas tremendamente
expressivas, sobretudo, nas grandes civilizações. As arenas não estão conectadas aos sistemas,
porque as culturas não são tanto “sistemas sociais” onde tem lugar partos, mas funcionam como
espaços de urgências e treino onde se tomam iniciativas ou se institui prelúdios para possibilitar
«cuidados». As culturas são fundamentalmente sistema de construção «cenográficas» onde o
público se dramatiza a si mesmo e cujos nervos vitais residem na capacidade de pôr em jogo os
seus processos mediante rememoração dramática. Nesses processos a cultura merma a sua
sensibilidade e faz com que as pessoas abandonem a suas covas dos espaços privadas para criar
o mundo público em que se mantêm em dignidade de consideração perante gestos corporais
que lhes permitem abrir e habitar cenários, teatros e arenas (SLOTERDIJK, 2006:123). Esses
constituem os variadíssimos espaços públicos imunológicos que foram substituídas pelos
espaços públicos frios da racionalidade.
Na Trilogia Esferas (Esfera I – Borbulhas, Esfera II – Globos e Esfera III, Espumas) onde
Sloterdijk conjuga os espaços topológicos, antropológicos, imunológicos e semiológicos
considera que pelas formas «antropotécnicas» do ascetismo interior dos públicos que ao
recorrerem a sua “imunologia geral” deteta o que danifica e viola o que está somatizado ou
institucionalizado nos espaços públicos concêntricos imunológicos, a saber: i) o espaço humano
uterológico do ser-junto como os outros seres no interior de uma microesfera atravessada pela
simpatia, compreensão, amor, amizade, consenso, concórdia de uma communitas que vai do
útero, a vizinhança de pessoas e coisas; ii) o espaço exterior do vivido e habitado onde se
expande o anímico desde ás cidades, ao império até universo infinito e inabitável dos infernos;
iii) os espaços híbridos e elásticos constituído em sua multiplicidade espumática de
microesferas em oposição a esfera absoluta do universalismo do humanistas (SLOTERDIJK,
2004).
Já Roberto Esposito na trilogia Bios, Communitas: Origine e Destino della Communitá (1998)
e Immunitas: Protezione e Negazione della Vita (2002) considera que a atualidade não está a
ser substituído pela ‘grande e velha metáfora biológica da vida’ devido aos seus desvios no
passado. Para ele a “história e natureza, vida e política, entrelaçaram-se, solicitam-se,
violentam-se segundo um ritmo que faz duma ao mesmo tempo matriz e resultado provisória
da outra”. Contudo, é neste momento de crise e de deslegitimação das distinções modernas

19
entre o público e privado, Estado e sociedade, local e global e que a vida se instala no centro
dos processos políticos é o momento certo que se devia reconhecer a «política da vida». Política
da vida consiste em conectar de novo o antigo bios (vida natural e forma de vida) á sociedade
política, porque política é vida. A relação entre o espaço público e vida biológica ou
imunológica da communitas é indiscernível do nascimento, da liberdade, da propriedade e da
nação:
[…] a nação é aquele conjunto territorial, étnico, linguístico cuja identidade espiritual consiste
na relação entre qualquer das suas partes com o todo que a compreende. O nascimento comum
constitui o fio que mantém este corpo idêntico a si próprio ao longo das gerações – aquilo que
liga os filhos aos pais e os vivos aos mortos numa cadeia inquebrável. Esta, na sua continuidade,
constitui ao mesmo tempo o conteúdo biológico e a forma espiritual da autopertença da nação
no seu conjunto indivisível (ESPOSITO, 2010:241-242).

O corpo biológico ou corpo político fazem parte deste único «ventro materno» de
autoconservação da vida no espaço público.

4.3 Lyotard: Por um modelo de “espaço público biotecnológico”

Para Lyotard é preciso começar a entender o ser humano no sentido de sistema-biológico-


informacional em que o simbólico deve ser compreendido na relação com a organização viva
reflexa-automedicinal e como corpo autorregulado. O ser humano como omnívoro é um sistema
regulador de informação em que o simbólico (códigos e regras, semântica e sintaxe) garante-
lhe a independência do imediato e do recursivo (Hofstadter) constituindo-se em uma
autorreferencia que está ligado a estrutura viva.

É em suma uma organização viva, não apenas complexa, eu direi antes replexa. Pode curar-se a
si próprio na qualidade de meio como em medicina, de órgão como numa atividade finalizada, de
objeto como na reflexão (e refiro-me tanto à estética como à especulativa). Pode inclusivamente
abstrair-se de si mesma e ter apenas em conta as suas regras de tratamento como em lógica e
matemática. O limite que se põe a esta recursividade simbólica reside nas necessidades resultantes
do local onde está, seja qual for o nível méta- do seu funcionamento, ou seja, manter
simultaneamente as regulações que asseguram a sua sobrevivência no meio em que se encontra.
Não é exatamente isto o que funde a vossa transcendência na imanência? Ora até aos nossos dias,
este meio é o terrestre. A sobrevivência da organização pensante exige modificações para com
este meio para que aquilo a que chamamos corpo humano se possa perpetuar. Isto é igualmente
verdade para o funcionamento méta- por excelência que é o pensamento filosófico. Para pensar é
preciso pelo menos respirar, comer etc. Será sempre necessário «ganhar a vida» (LYOTARD,
1990:20-21).

O corpo humano é entendido neste sentido como um hardware complexo de um dispositivo


técnico híbrido ligado ao pensamento humano. A linguagem quer simbólica ou tecnológica é um
sistema de complexos de «memórias» (vivas e mortas) que regulam o organismo vivo, ao mesmo
tempo que cria objetos técnicos para a adaptação ao meio natural e social. E num contexto de
sociedade tecnológica, o pensamento artificial da disposição técnica deve estar conjugado ao
dispositivo do corpo natural, porque o organismo vivo é como um ser híbrido:

20
A verdadeira «analogia» requer que a máquina pensamento ou representadora se insira no meio
dos seus «dados» como os olhos se inserem no visual ou a escrita na língua (no sentido mais
amplo). Não basta que estas máquinas simulam pouco mais ou menos os resultados da visão e da
escrita. Trata-se de «dar corpo» ao pensamento artificial de que elas são capazes. E é este corpo,
ao mesmo tempo «natural» e artificial, que será necessário transportar para longe da terra antes
da sua destruição, se o que se pretende é que o pensamento sobrevivente à exploração solar seja
algo diferente do miserável esqueleto binarizado de que se constituía anteriormente (LYOTARD,
1990:25-26).

O problema do saber da formação humanista, segundo Lyotard é pensar em desafiar a


programação tecnocientífica partir de uma dimensão cultural inscrita no simbólico do espaço
público, esquecendo que o espaço de interação e de contacto entre a «inteligência artificial» e a
«inteligência ingénua» são transportados nas línguas ditas «naturais» e fazem parte das máquinas
biológicas. A linguagem que os filósofos têm reputado de racional e comunicacional no espaço
público é o mesmo que está presente na lógica da racionalidade tecnocientífica forçada pela
metafísica da digitalização. Ma tal modelo discursivo é desencarnado:
Segue-se que o espaço público, a Öffentlichkeit deixa, nestas condições, de ser o espaço onde se
sente, se experimenta e se afirma o estado de um espírito oferecido ao acontecimento e onde o
espírito tenta elaborar uma ideia desse próprio espírito, em particular sob o sinal do «novo»
(LYOTARD, 1990:83).

O modelo de espaço público que Lyotard ensaia pode partir da expressão William Burrougts que
afirma, não só que a palavra é carne humana, mas também que a palavra escrita (tecnologia)
encarnada que passa língua viva e que serve de comunicação e intermediação geracional é o que,
de facto, distingue o homem do animal (BURROUGHS, 2010). Esta forma de inscrição da
palavra é feita como tele-grafia, porque as articulações semânticas e fonéticas dão-se na
linguagem como metatécnica do organismo que se instala como «hábito» no espaço público da
intermediação:
A linguagem, em virtude das ditas propriedades, enquanto auto-tekhné indefinida, e porque possui
nela própria uma capacidade infinita de combinações, revela ao mesmo tempo o que existe de
acabado em qualquer inscrição, incluindo a sua. Esta última exige, com efeito, a seleção do que é
inscrito. As próprias estruturas da linguagem são operadoras de exclusão, a qualquer nível,
fonético, semântico, mítico, narrativo, etc… Com a logikè teckhné, a rétoriké tekhnè e a poétiké
tekhnè, os Gregos, Aristóteles, não determinam apenas grupos de regras que se devem seguir nas
artes da argumentação, da persuasão ou do charme; desvendam, ao mesmo tempo, a finitude
dessas utilizações e descobrem, assim, o horizonte infinito do por-dizer, a tarefa infinita de gerar
novas frases e regras. Tarefa a que dávamos então o nome de filosofia, essa palavra engraçada. A
filosofia tornou-se então a instância meta- ou tele-gráfica que disse ser a própria à memória
«ativa», mas esta instância que aparece quase como uma instituição no espaço público e que
apreende denotativamente e põe em questão a cultura de hábitos onde surge (LYOTARD,
1990:60).

O que se deve denominar como «espaço público» é o mundo aberto pelos tekhnologos no ato
de «rememoração» no sentido de habitual crítica dos seus próprios pressupostos. O mundo que
se abre como espaço público se constitui pelo que foi excluído pela sua própria constituição e
pelas estruturas de funcionamento a todos os níveis (LYOTARD, 1990:60).

21
4.4 Hottois: O modelo de «espaço público bioético»

Este mundo técnico em produção começa com um saber que vai desde o uso do vivo para a
manipulação genética, a comunicação e transferência de genes, a burilação de moléculas
complexas, a bioconversão de energias, a criação de máquinas vivas através de biotransítores
para a cibernética, a reprodução humana de clones, o uso de técnicas de híbridos nas espécies
e, finalmente, o registo das patentes dessas invenções como sinal de formação e invenção
técnica. Este modo produção tecnocientífica eleva-nos para uma dimensão tecnobiocosmos que
esbate a diferença entre o natural e o artificial segundo Hottois:

De facto, assiste-se a um esbatimento progressivo da diferença entre “natural” e “artificial” em


proveito de uma característica míxica semi-acontecida, semi-provocada, onde todos os níveis se
integram elementos naturais em conjuntos artificiais e vice-versa. Mais do que um “tecnocosmo”
ou uma “tecnoesfera”, é melhor falar num tecnobiocosmos que se estende à Terra inteira. Esse
esbatimento do natural e do artificial exprime-se agora no facto de tudo ser qualificado como
“produto”, “funcional” e, sobretudo, “sistêmico”: todos os elementos da tecnobiocosmos, desde
moléculas à sociedade, são entendidos como sistemas de inegável complexidade, integrados,
hierarquizados, interligados ([1990]:42).

O esbatimento entre o natural e o artificial aproxima da perfeição de objetos técnicos os que


são naturais, afim de produzir uma unidade real (Simondon) no tecido tecnobiocósmico. O
resultado dessa interação entre o natural e artificial é a autorregulação a partir dos próprios
objetos técnicos ([1990]:42). A cibernética, por exemplo, abole pelo sistema de circulação de
signos a sua relação com a referência, estabelecendo uma intermediação pasmosa e complexa
entre a “plasticidade da natureza” e a “construtividade da tecnociência” ([1990]). A
investigação cibernética cria uma forma de integração recíproca e de simbiose estreita entre o
homem e a prótese, abrindo um campo percetivo, muito mais além da perceção humana natural.
A implementação dos mini-sistemas eletrónicos no cérebro e dos minicomputadores no sistema
nervoso ou próteses finas de prazer, de memória e raciocínio eleva-nos a condição de “homem
simbiótico”, como uma nova identidade, além do simbólico que estabelece na relação com os
outros no espaço público ([1990]:46).

Prospeção manipuladora e reconstrutivista da identidade individual é específica do homem,


transformação e manipulação das fronteiras da existência (da conceção a morte), modificação
tecnocientífica da experiência exterior e de todas as formas de experiência interior… No fim
desse desconto, que resta de intangível na essência natural-cultural do homem? A tecnociência
parece dever afetar todas as pretensas constantes da natureza humana, todas aquelas situações a
que Jaspers chamava limites deixando hiante a plasticidade insondável da espécie e da questão
étnica que se levanta. ([1990]:46).

A relação entre o natural e o artificial através da tecnociência nos conduzirá a identidades


formadas por “cyborgs” ou “próteses” que espelham os saberes formadores interdisciplinares e
cada vez mais complexos, como nesses casos da relação de cooperação epistémica entre a
cibernética e a medicina. “Resumindo, no caso de uma prótese a máquina compensa uma
22
deficiência do organismo humano, enquanto no caso de um cyborg o organismo humano
compensa uma lacuna da máquina (BYRNE, E. Humanisation of Technology, op.cit Hottois,
([1990]:49). E realça-se que a cibernética desde que começou a traduzir o sentido natural em
informação e a medicina a codificar os genes humanos deixou de ser “política-ficção”, “ciência-
ficção” ou deixou de corresponder a uma formação metalinguística do espaço público para se
transformar em «ciberantropologia» do futuro que articula esses saberes: “L’imaginaire
futurologique articule ce champ selon trois vecteurs principaux: l’intervention génétique,
l’intervention bio-chimique, le cyborg. Chacune de ces orientations offre divers degrés
d’exploitation possible” (HOTTOIS, 1979:340). Contudo, esta a articulação de saberes em uma
pedagogia e filosofia do espaço público que dê conta dessa complexidade da cultura
tecnológica, ainda não é possível nesses campos, porque predomina a representação esclerosa
que faz uma dicotomia e desfasagem entre cultura e técnica.

Le déphasage "culture/technique", "représentation traditionnelle de la nature/science opératoire",


etc. entraîne le repli des représentations symboliques désuètes sur elles-mêmes, leur
décrochement ainsi que leur entretien dogmatique et répétition sclérosée par les groupes qui
continuent d'y chercherles repères de l'existence (HOTTOIS, 1999:73).

Os modelos de espaço públicos público alternativos tem em comum o fato pretenderem


relacionar o simbólico com o natural, a artificialidade com o corpo biológicos, mas num caso
ou noutro aproximam como os conceitos de corpo biológico, de “imunológico”, de “biopolítica
e bioética da medicina. É deste modo que vislumbramos uma relação entre espaço público e
medicina quer nessas propostas, mas também por que o discurso filosófico da modernidade
tende cada a tomar como tema as questões médicas e cada vez mais a opinião pública política
tem levado a discussão temas como o aborto, eutanásia, clonagem, engenharia genética e
medicina e tecnologias. Por esta razão propomos um conceito que relaciona espaço público e
medicina.

PARTE III

PARA UM CONCEITO DE “MEDICINA DO ESPAÇO PÚBLICO” OU “ESPAÇO


PÚBLICO MEDICO”: ENTRE O BIOLÓGICO E O DISCURSIVO

Capítulo VII, VIII, IX e X

23
JUSTIFICAÇÃO DO CONCEITO DE MEDICINA DO ESPAÇO PÚBLICO, MEDICINA DO
ESPAÇO PÚBLICO ANTIGO, MODERNO E ESPAÇO PÚBLICO DA MEDICINA
CONTEMPORÂNEA

Como “medicina do espaço público” compreendemos como sendo um conceito que analisa as
relações entre a medicina e o espaço público, sabendo que a “medicina” é um tipo de saber, que
é ao mesmo tempo teórico e prático cujo objetivo é buscar a terapia ou a saúde do indivíduo e
da comunidade e o “espaço público” é um conceito central e mediador entre o Estado e a
sociedade processado a partir das relações e interações intersubjetiva e autónoma dos
indivíduos. O espaço público é um locus da formação política e identitária dos cidadãos, e esta
identidade e autonomia depende de como a medicina enquanto saber explica os domínios do
corpo e da mente, saúde e a doença. É ver que o «corpo político» tem sido imagem e semelhança
ao longo da história da filosofia das metáforas biológicas e médicas. A visão que os homens
têm sobre a saúde e a doença e sobre o corpo biológico determina a forma como agem e
interagem no espaço público, e consequentemente, ela determina a ação política e toda a visão
do mundo e o ethos comunitário.
Cada época tem a sua medicina que dependendo dos progressos técnicos e científicos das
ciências e das artes e a da forma como ela concebe e define a estrutura e saúde do ser humano
abre-se um horizonte da possibilidade de configuração da personalidade, da estruturação das
interações sociais e da construção dos sistemas, bem ou mal fundadas sobre expectativa de
comportamentos sociais derivados da compreensão e ação do corpo e sobre o corpo biológico.
O espaço público é um espaço entreaberto da renovação autónoma da vida política
intergeracional, que só se mantém em nesse horizonte como possibilidade de abertura ético-
política se o campo do saber médico e das perceções sobre o bios conceder aos homens, quer
no sentido privado ou público, a ideia do que significa, sentem e vivem como a saúde, doença
ou proteção imunológica, algo que estabelece o equilíbrio entre a cultura e a “natureza”, entre
o artificial e o natural. Em cada situação histórica as relações entre natureza e cultura e as
relações de convivência pública entre os homens realizou-se e realiza-se mediante as conceções
antropológicas e médicas aliadas a perspetiva política de preservação do corpo individual e do
coletivo. Nenhuma política se estabelece sem uma certa conceção médica ou antropológica do
corpo humana, essa estrutura de finitude, buscando na compreensão simbólica, técnica e
material, formas e autopreservação da vida biológica, mesmo naquelas culturas que se tendem
a autotranscendência.
A relação entre a medicina e a política começa desde as origens homéricas da civilização grega,
passando pela constituição do espaço público da polis helénica onde a filosofia e a medicina
24
hipocrática convergiram-se na explicação racional do bem-estar até a modernidade que através
da anatomia moderna (Harvey) inspirou as redes públicas das cidades burguesas ou uma
medicina experimental que começa com Claude Bernard e evolui para as tecnologias
biomédicas atuais que emergem na configuração das estruturas de personalidade, das interações
do espaço público contemporâneo.
Nos primórdios a civilização grega arcaica teve de enfrentar uma medicina divina da tradição
homérica que se sustentava em um conceito de saúde como fatalidade divina e numa hybris
medicinal da imortalidade que alienou a ação pública através da classe alta dos “aristoi”
contra o “demos”. A emergência da filosofia e da medicina científica hipocrática na Grécia
do século VIII a V a.C possibilitou, por um lado uma crítica a essa medicina divinatório dos
oráculos que retirava a autonomia pública dos gregos e, por outro proporcionara novas bases
para repensar o novo espaço público helénico que havia de fundar na grandeza da liberdade e
saber da pólis ateniense a partir da filosofia grega. De Heráclito a Sócrates, passando pela
escola pitagórica o génio helénico aproveitaram a mudança de paradigma no saber médico
arcaico para o saber científico, no decurso da Escola de Cnides e de Egina á escola
Hipocrática de Cós, e instituíram uma crítica ao status quo do público ainda restrito dos
guerreiros aristocráticos, permitindo desta forma uma democratização social, quer através do
impulso dado as revoluções sociais, as formas de educação cívica nos teatros pelas tragédias,
as de participação política nas assembleias e na praça pública agora regidos pelos princípios
da isonomia, isocracia e isogoria que puderam até o séculos de Péricles fundar uma
democracia vigora. Dos Sofistas a Aristóteles, passando por Platão a filosofia erige a si mesma
como medicina pública em uma metamorfose em que os saberes teóricos (theoria) e práticos
(Péri techné) disputam o papel configuradora do que seja bem público.
Por um certo período que decorre com a queda do império romano até o renascimento
carolíngio, a medicina deixou de ter um papel público relevante, com a exceção das atividades
de Galeno e Avicena ou dos Mosteiros ou emergência das universidades no fim da Idade
Média.
Com a época moderna uma revolução médica terá operado numa primeira fase a troca da
moralidade pela saúde para uma nova estruturação do espaço público. Segundo Sennett as
descobertas de Harvey sobre o fluxo sanguíneo e na sua combinação com os novos ideais
capitalistas sobre o movimento individual na sociedade levou a pensar no problema da
construção de um espaço urbano que pudesse “abrigar os sentidos dos corpos interagentes,
particularmente na cidade dos incansáveis e solitários” (SENNETT, 2003: 215). A medicina
de Harvey terá servido de modelo e paradigma para o planeamento urbano do século XVIII. O
paradigma corrente da medicina, sobre e individualismo mudaria a visão que se tinha sobre as
25
relações entres os corpos e ambiente humano. O espaço público da “cidade que começava a
surgir no século XVIII ajudaria a reprodução desse paradigma num quadro de convivência
social” (SENNETT, 2003: 218). É o médico Ernst Platner em 1700, segundo Sennett que
estabelece a primeira analogia entre a cidade com a nova a anatomia, ou entre a circulação
(sangue e impulso nervoso) com a experiência ambiental. Os modelos médicos modernos terão
influenciado os hábitos, os costumes e a convivência social, mas também influenciaram uma
certa conceção antropológica, política e filosófica que se pode depreender de uma leitura de
Kant quando teoriza a autonomia de interação do público moderno.
Em termo da moral e da política do espaço público como lugar de interdependência e das
relações entre os indivíduos, os modelos médicos de Sydenham, Boheraave, Sthal e os
médicos de Montepellier á volta de Encyclopédie de Diderot serviram a Kant, não só para o
diagnóstico das doenças metafísicas do público moderno, bem como para poder fazer uma
proposta de uma nova terapia baseada numa antropologia e numa Crítica da Razão às paixões,
tal como a conciliação entre o idealismo de Descartes e o empirismo de Hume. Kant, como
médico da civilização ataca a herança do mundo antigo e do cristianismo que na sua doença
que se revestia a moral e a política de uma falsa aparência no espaço público da corte, que
iludido quanto no excesso do simbólico foge da realidade e ataca o naturalismo com a
centralização no excesso da paixão e instinto com o desenvolvimento das ciências naturalista
com as transformações sociopolíticas e tecnológicas de um mundo moderno em mudança
(KANT, De medicina corporis, 2007; Lições sobre antropologia [1775/76], Conflito das
Faculdades, 1993). A moral da corte e os princípios naturalista mantinha o público em uma
dupla ilusão, ora arrastado para o simbólico provocando a alienação mental e fazendo-o
incapaz do uso da razão que já não poderia servir a cidade moderna e as novas relações de
troca e as argumentações racionais dos letrados: Os lunáticos, os melancólicos, os românticos
e hipocondríacos queriam fundar o bem público no amor: “O amor tem em abundância
encantamentos maravilhosos, e a mais refinada arte dos estados antigos consistia em tornar
os seus cidadãos visionários do bem-estar público” (KANT, 2012:109) (KANT, I.
Observações sobre o sentimento do belo e do sublime/ Ensaio sobre as doenças mentais,
Lisboa, Edições 70, 2012). Se um lado o que cede ao simbólico vive numa “fantasmagoria
interiorizada”, de outro os que cedem aos apetites, as paixões naturalistas e biológicas tornam
doentes pela lisonja, pela intruja e escravos que não moraliza nas redes do comércio e das
invenções.
Por isso, a estranha pergunta de Kant sobre se “vivemos agora em uma época esclarecida
[aufgeklärten]”? Por causa, também das questões relacionadas com o paternalismo político
da sua época e com essas doenças do público desequilibrado ele responde que de facto não
26
havia um uso do auto-entendimento em público. Havia sim uma ilusão. Sobre o conceito de
“ilusão pública” no texto Sobre a Ilusão Poética e a Poética da Ilusão apresentado em uma
banca dissertação ele faz a distinção entre a aparência e semelhança (appearance and
semblance) para esclarecer o sentido do uso das metáforas poéticas como o faz das metáforas
biológicas. A partida parece nos conduzir por um outro viés de fundamentação de um público
moderno em termos de justificação auto-transcendental como considerado a crítica kantiana,
por considerar a ilusão simbólica da aparência como saudável (poética da ilusão) em relação
a ilusão doentia (ilusão poética): “[…] Há, com efeito, certas imagens das coisas [rerum
species], mediante as quais a mente joga [ludit], mas não é por elas iludida
[ludificatur]”(KANT, Immanuel, Sobre a ilusão poética e a poética da ilusão, in Estudos
Kantianos, Marília, v. 2, n. 2, p. 291-314, Jul./Dez., 2014). Não é a relevância da “poética da
ilusão” (razão transcendental) ou da “ficção poética” como atende a interpretação
habermasiana de Nietzsche no sentido do domínio do “Espírito absoluto” de Hegel sobre a
natureza, mas sim é o equilíbrio entre as duas naturezas que em Kant está em causa. O que se
deve realçar é que entre as metáforas ficcionais, Kant estabelece então um ponto equilíbrio
entre o corpo biológico e físico (natureza) e a realidade simbólica em que espaço público é do
seu encontro, ou seja, onde se “jogo das aparências como lugar de origem do equilíbrio nas
relações da sociedade civil”. Para estabelecer esse equilíbrio entre o corpo biológico e
sociedade civil, a “poética da ilusão” ou a metáfora médica é o melhor topoi que pode o
expressar como afirma Kant: - “Não vejo nada melhor do que imitar o método dos médicos,
que acreditam serem muito úteis aos doentes quando dão o nome à sua doença.” (KANT,
2012:94). Cabe ao filósofo diagnosticar as doenças que desequilibram a estabilidade e o bem
comum do público quando este afasta do saudável e do verdadeiro e também deve estabelecer
os fundamentos simples para o reequilíbrio para que não haja situações em que “o naturalista
vê cidades na florencite” do lado físico-biológico e que de outro, o “devoto vê nos veios do
mármore a narração da paixão de Cristo”. O espaço público se fundamenta nem tanto no
excesso do simbólico e nem tanto no excesso naturalista, cabe a crítica da razão produzir estes
limites. É na simplicidade destas duas naturezas, a biológica e a simbólica como chamou
atenção Rousseau é que pode produzir o equilíbrio público e bem o comum entre o estado de
natureza, os artifícios técnicos e económico e o estado á moda médica de um novo
hipocratismo daquela época:
A simplicidade e a fragilidade da natureza reclamam e constituem no homem unicamente
noções comuns e uma probidade rude, enquanto constrangimento artificial e exuberância
do estado civil geram aqui e ali tipos engenhosos e espertalhões, mas também intrujões e
tolos, assim como origina a aparência sensata, a qual pode dispensar o entendimento e a
retidão, sempre que o formoso véu, que o decoro estende sobre as deficiências ocultas da
cabeça e do coração, estiver tecido com suficiência espessura (KANT, 2012: 93).

27
Uma forma de tecer com suficiente espessura o véu do público englobando o biológico, o
artifício, a economia, a política é recorrer a “metáfora biológica” ou médica. É neste sentido
que criticámos o conceito de espaço público discursivo de Habermas, porque excede nos
limites no uso das metáforas simbólicas e recusa uma fundamentação do público a partir da
«metáfora biológicas» enquanto possibilidade de estabelecer aquele equilíbrio da
simplicidade da natureza como possibilitou a Kant. O recurso as «metáforas biológicas»
possibilitou a Kant um ponto de encontro em essas realidades que estruturam as redes e teias
do espaço público. A relação que ele estabelece entre a fundamentação do espaço público e
as metáforas biológicas é possível de ser encontrada também na filosofia Transcendental.
Segundo Philonenko, “Kant apóia-se sempre no Handbuch der Naturgeschichte (1782) de
Blumenbach, de onde retira todas suas idéias concretas” para a formulação da sua teoria
crítica. A síntese da filosofia de Kant com base na Filosofia da natureza de Newton e Biologia
evolucionista funcionou como viragem epistemológica, na medida em que serve de base para
fundação da filosofia da consciência, este como base para a nova conceção do público
moderno: “O recurso às metáforas orgânicas, por parte de Kant, testemunha (...) a decisiva
viragem epistêmica, a profunda alteração dos hábitos do pensamento, que se afirma e
expande na filosofia europeia a partir da segunda metade do século xviii” (SANTOS, 1994,
p. p. 406 e 411 apud Ubirajara em rodapé). É assim que no processo de construção de
conhecimento do sujeito transcendental ou sujeito público dessa construção o pressupõe a
matéria da sensível (onde nutre biologicamente o sujeito) e a forma (o lugar da reprodução do
sujeito) e os processos de perceção e aperceção (o desenvolvimento do sujeito) da sua
contínua estruturação e organização. É a medicina da época é fornece a Kant a base para a
compreensão da fisiologia e a terapia do público, do eu comum ou do sujeito transcendental
e a biologia fornece a metáfora não para entender o conceito de “consenso” (consenso
orgânico é original da biologia) e desenvolvimento social da sociedade civil. Sem as
metáforas médicas Kant não poderiam encontrar uma explicação simples e real paras entender
as redes de relações do espaço público moderno a partir da filosofia. A relação entre medicina,
filosofia e espaço torna-se a evidente em Kant, tal como se evidenciou no tempo de
Hipócrates.
Já em Foucault encontramos o conceito de “medicina social” que fornece uma explicação da
relação de proximidade entre a medicina e o espaço público, mas também demonstra como ela
se tornou parte do espaço privado com a especialização médica e excessiva racionalização
filosófica. O conceito de “medicina social” já estabelecido no discurso médico e filosófico pode
ser uma base para a aprofundar algum estudo sobre o possível conceito de “medicina do espaço

28
público” ou para criticar o excesso do simbólico da razão filosófica sobre o biológico ou do
excesso do biológico da medicina sobre o simbólico. A medicina na sua autêntica essência para
este Foucault tem de ser social ou pública e não privatizada:
Em certo sentido, a “medicina social” não existe, porque toda a medicina já é social. A
medicina foi sempre uma prática social e o que não existe é a medicina “não-social”, a
medicina individualista, clínica, do colóquio singular, apenas um mito mediante o qual se
defendeu e justificou certa forma de prática social da medicina: o exercício privado da
profissão (FOUCAULT, 2010:172).

Quando a medicina se tornou privada e profissionalizada na contemporaneidade, ou


essencialmente técnica, assim começamos a ter razões para desconfiar dela e apontar a críticas
como “medicalização” da sociedade, “iatrogénese” social, mercantalização liberal da natureza
humana, utopia de saúde perfeita e exclusão social denunciado e de condicionar o espaço da
democracia denunciados por Foucault (1963) Szasz (2007), Illich (1975), Habermas (2001),
Sfez (1995), Fukuyama (2002), Sontag (1977) Mesmo os pontos de vistas filosóficos sobre os
efeitos da medicina sobre o espaço público apenas reforçam a tese de que existe uma relação
de imbricamento entre os conceitos de medicina e espaço público. E a discussão á volta de
temas relacionados com a medicina e espaço público como os que tem a ver com o aborto, a
engenharia genética, a eutanásia, a cirurgia estética etc… em autores como Sandel (2007),
Dworkin (1993), Habermas, ou do pós-humanismo sobre o corpo, melhoramento e
domesticação, sobre o normal e patológico em Sloterdijk (2000), Kurzweil (2005), Hottois
(1991), Lecourt (2003), Canguilhem (1966) leva-nos ainda afirmar que um conceito de
“medicina do espaço público” impera.
Ainda é possível um conceito de medicina do espaço público pela adaptação do conceito de
espaço público de Habermas da bioética (Beachamps & Childress, Hottois), do free knowledge,
da telopolis (Queraltó, Bustamante, Echeverría, Benkler, Pueles, Molinuevo, Ugart, Rillo), no
campo da medicina e comunicação (Graham Scambler, Pio Abreu) ou através dos conceitos de
relação dialógica médico-paciente (Engelhardt, Michael Balint, Pellegrino, Szasz) e e-paciente
(Salcedo, Ferguson, Getz).
Em relação a estas questões médicas e biológicas emergentes na opinião e espaço público
contemporâneo a maior parte dos autores tem uma posição de intermédia entre o natural e
simbólico. Para Dworkin embora o simbólico religioso-filosófico e a ciência naturalista tem um
papel crucial na formação da opinião pública através dos conflitos, não se pode impor no espaço
público nem os excessos de princípios de fé espiritual ou convicções científicas naturalistas por
que o espaço político e a vida tanto investimento criativo do natural como do humano
(DWORKIN, 1994); Illich considera que a intervenção na medicina no paciente e no ambiente
põe em evidência a medição entre o biológico e simbólico, a doença e o homem, o corpo e a

29
política (ILLICH, 1975). Mas o “normal” é que haja uma mediação entre essas realidades e não
dominação de uma sobre a outra, pois padrão público de normalidade deve ser entendida com
equilíbrio e adaptabilidade entre os meios externos e trabalho que o organismo vivo executa na
relação com as outras (CANGUILHEM, 1966). Para Lecourt as biotecnologias já não nos
permitem persistir na atitude ignorante para essas mediações, porque abrem um caminho para
uma receção crítica e dinâmica, positiva e normativamente enquadrada nas inovações em meio
a um alvoroço teológico-político-mediático do grande medo universal. As biotecnologias vêm
sustentar as crenças, os costumes e instituições não em conceitos abstratos, mais uma
naturalização dos seres humanos contra as abstrações (LECOURT, 2003). Todo o debate
público que se faz referência as questões de sexo, estética corporal, género, participação
política, direitos ao aborto e eutanásia, melhoramento genético, discussões bioéticas, cuidados
paliativos de pacientes, usos de próteses, robótico dizem respeito a uma mediação entre o
biológico e o simbólico cujo liame tem o saber biomédico na contemporaneidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A defesa dessa categoria central das civilizações ocidentais e, atualmente, a das não ocidentais
entre as mudanças estruturais que se veem operando desde da pólis da Antiga Grécia à
tecnopolis e biopolis contemporânea em termos teóricos e práticos no saber simbólico tem na
Teoria de Ação Comunicativa e o no conceito de espaço público discursivo e o seu maior
representante que tem dado conta das suas transformações sociais e estruturais, mas tem
negligenciado a categoria biológica do «ser-animal» e «permanecer-animal» segundo
Sloterdijk, quer pela emergência das TICs e das biotecnologias, mas não tem assumido a crítica
das teorias pós-humanistas a desfasagem entre o natural e o artificial, o biológico e o simbólico.
Habermas, o autor do conceito de espaço público discursivo ainda na Ciência e Técnica como
“Ideologia” (1968) considerava que o efeito das TICs e das biotecnologias tinha um sentido
ideológico de “utopia negativa”, porém ultimamente começou a perceber às possibilidades
concretas que esse tipo de saber biotecnológico tem na reconfiguração da identidade e do espaço
público discursivo, sobretudo em texto como A constelação pós-nacional: Ensaios políticos
(1998), O Futuro da Natureza Humana (2001), Entre Naturalismo e Religião (2005) ou A
atração Tecnocrata (2013). Por esta razão veio a afirmar que este tipo de saber e o discurso
emergente dos pós-humanistas começava-se apenas a interferir sobre modelo de formação da
identidade e de vontade política simbólica enquanto modelo de autocompreensão do público e
era neste sentido, que esta discussão não poderia ficar entregue aos engenheiros genéticos e
cibernéticos ou a estes filósofos segundo ele, influenciados pelo neodarwinismo:
30
a questão filosófica originária sobre a “vida reta” parece ganhar hoje novo fôlego no contexto da
nossa generalidade antropológica. As novas tecnologias impingem-nos um discurso público
acerca do correto entendimento da forma cultural de vida enquanto tal. E os filósofos já não têm,
na verdade, nenhuma boa justificação para deixarem o debate deste tema inteiramente entregue
aos biólogos e aos engenheiros apaixonados por ficção científica (HABERMAS, 2006:55).

Habermas continuava a chamar essas tendências de “fantasia cibernética de uma estabilização


das sociedades” (HABERMAS, 2011:87), ou de “proposta reducionistas das Ciências da
Natureza, mas também especulações adolescentes acerca da inteligência artificial, superior a
nossa, de futuras gerações de robôs” (HABERMAS, 2006:55). Para Habermas considerar o
papel das biotecnologias e as posições naturalistas é levar “até o fim, à maneira de utopia
negativa, as vagas suposições fundamentais da consciência tecnocrática, apontando assim
para uma linha evolutiva que se perfila sob suave dominação da técnica e da ciência como
ideologia” (HABERMAS, 2011:87). Consideramos que o problema de Habermas foi não
perceber que esses autores não negavam e não negam a dimensão do saber simbólico que
formatado o desenvolvimento sociocultural e estruturado sobretudo o espaço público ocidental,
mas apenas estariam a complexificar o conceito com a integração da dimensão do saber
tecnocientífico e da dimensão biológica negada sistematicamente pela metafísica ocidental. A
insistência universalmente apenas no domínio simbólico do espaço público não só impossibilita
de um saber sobre o ser-animal que pode nos pode elevar a uma categoria de “organismo
comunicativo” quer intermediado pelas TICs, as biotecnologias, pela natureza biológica e a
artificialidade. Enquanto se insistir apenas na dimensão simbólica e de formação clássica e não
na hibridez em diálogo e tecnologia, biologia e política, Sloterdjik terá suas razões para dizer
que as humanitatis têm feito apenas fracassar o homem no seu «ser-animal» (Tiersein) e no
«permanecer-animal» (Tierbleiblen):

Pois o fato de que o homem pôde tornar-se o ser que está no mundo tem raízes que se
deixam entrever pelos conceitos profundos da precocidade do nascimento, da neotenia
e da imaturidade animalesca crônica do ser humano. O ser humano poderia até mesmo
ser definido como a criatura que fracassou em seu ser-animal (Tiersein) e em seu
permanecer-animal (Tierbleiblen). Ao fracassar como animal, esse ser indeterminado
tomba para fora de seu ambiente e com isso ganha o mundo no sentido ontológico
(SLOTERDIJK, 2000:34).

É para não continuar a fracassar como «ser animal» é que propomos discutir e demonstramos
historicamente neste trabalho um conceito de «medicina do espaço público» como
complemento do conceito de «espaço público discursivo» poderá fornecer um aparato teórico
quer para compreensão das mudanças e evolução estrutural do conceito e, bem como para
análise das questões emergentes de uma opinião pública de uma sociedade que é cada mais uma
tecnopolis e biopolis.

31
REFERÊNCIAS

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Ripalda. Madrid: Taurus Ediciones.
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