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ORGANIZAÇÃO: UM ESPAÇO

DE NEGOCIAÇÃO

"Maria Ester de Freitas

Organizações são sistemas políticos onde o comportamento de negociação é,


atualmente, uma condição indispensável de sobrevivência.

Organizatíons are polítical systems where the negotiation behaoior is nowadays an


indispensable condition of survival.

PALAVRAS-CHAVE: É comum, nos dias de hoje, verificarmos váveis razões está no fato de que as orga-
Poder organizacional, conflitos
organizacionais, negociação, que as empresas, quando traçam perfis nizações modernas já não podem mais li-
comportamento de negociação. para seus executivos, incluem, entre outros dar com seus conflitos usando apenas o
requisitos, habilidades comunicativas e de rigor da autoridade.
KEVWORDS:
Organizational powet. orga- negociação. Ora, ser comunicativo e nego- À medida que as sociedades se tornam
nizetionst conflicts, negotiation, ciador são traços permanentes do homem. mais abertas; o poder, mais questionável;
negotiation behavior.
Negociar é uma atividade cotidiana. as pessoas, mais reivindicativas, a parti-
Por que, então, as cipação nas
empresas colocam decisões pas-
tanta ênfase nesse sa a ser consi-
aspecto atualmen- derada como
te? Uma das pro- um direito não

'Professora do Departamento
de Administração Geral e He-
cursos Humanos da EAESP/
FGV.

Revista de Administração de Empresas São Paulo, v. 34, n. 5, p. 13·20 Set./O ut. 1994 13
EXECUTIVA

só dos cidadãos, mas também dos mem- cionamento das partes envolvidas no
bros organizacionais. processo;
Temos ainda o fato de que a especiali- desenvolver políticas de longo prazo
zação técnica, anteriormente supervalori- sobre papéis, obrigações e privilégios.
zada, está sendo rediscutida como sendo Um acordo sobre políticas gerais terá im-
insuficiente para dar conta da complexi- plicações sobre as múltiplas decisões es-
dade organizacional. Nesse contexto, a pecíficas;
busca de profissionais mais generalistas, mediar a mudança social que ocorre com
mais flexíveis, mais ágeis e com habilida- a falência de estruturas e padrões tradi-
des diversificadas se impõe como uma cionais, resultante da alteração das cir-
necessidade, num mundo de mudanças cunstâncias, modificação das necessida-
tão aceleradas como o atual. des e transformação das relações entre
O modelo do indivíduo competente, membros e grupos organizacionais. Nes-
porém isolado em seu setor, abre espaço se sentido, podemos entender melhor a
para a equipe multidisciplinar. A reenge- mudança na consideração do papel dos
nharia traduz um novo tipo de estrutura sindicatos brasileiros, isto é, a passagem
organizacional e, portanto, de padrões di- do vilão / agitador / fazedor de greves
ferentes de relações. Os níveis hierárqui- para um interlocutor, que não pode mais
cos são reduzidos verticalmente e unida- ser ignorado no processo decisório das
des de coordenação são criadas horizon- organizações, inclusive o Estado.
talmente. O reagrupamento de cargos, fun-
ções e pessoas para desenvolvimento de
produtos e projetos revaloriza o grupo-ta-
refa e o trabalho coletivo, resultante de um Como um ritual, o processo de nego-
repertório diversificado de conhecimentos ciação é uma atividade planejada, que en-
e habilidades. volve a definição de algumas fases, proce-
Considerando esse quadro e com ele, a dimentos e atores específicos. Trata-se de
elevação do potencial de conflitos, a ca- um processo dinâmico, onde cada parte
pacidade de negociar é vista, não ape- agrega novas informações, altera expecta-
nas como bem-vinda, mas como impres- tivas e modifica comportamentos. E isto é
cindível. verdadeiro seja no espaço da família, nas
Mas, o que é negociar? relações amorosas ou de trabalho.
rr É uma forma de tomar decisão em que duas Antes de iniciar uma negociação, cada
ou mais partes conversam entre si num esfor- ator reúne informações relevantes sobre a
ço de resolver os seus interesses opostos. Elas outra parte e sobre si, faz um diagnóstico
expressam as suas demandas contraditórias e da situação dos envolvidos, define o seu
se movem em direção a um acordo, através de representante e os limites de sua autori-
um processo de fazer concessões e buscar no- dade, estabelece os pontos passíveis de
vas alternativas, que ofereçam maiores benefí- serem negociados e aqueles que devem ser
cios mútuos." 1 mantidos em qualquer resultado, assim
O processo de negociação pode ser vis- como algumas estratégias de ação.
to como uma forma de conflito social, uma Convém relembrarmos que o poder se
vez que envolve a defesa de interesses manifesta de forma relativa, que as partes
opostos, mas também pode ser conside- estão sempre trabalhando com informa-
rado como uma maneira de resolução ções incompletas, que a percepção dos
de conflitos, dado que as raízes doconfli- parceiros/ adversários tem uma grande
to estão sendo expostas/ analisadas e al- influência no processo, que ambas as par-
ternativas estão sendo buscadas/viabili- tes estão avaliando sempre a possibilida-
zadas. de de fazer alianças, que o poder de so-
De acordo com Pruitf'ias funções da ne- brevivência e de incentivos de cada parte
gociação podem ser sumarizadas em: está sempre sendo alterado e reavaliado,
que a coerção é parte integral do processo
1. PRUITT, D. G. Negotiation desenvolver acordos específicos, ou seja, e uma estratégia que pode dificultar o re-
behavior. New York: Academic determinar como as pessoas devem se lacionamento entre as partes no futuro e
Press, 1981.
comportar em certas situações, estabe- que a confiança entre as partes, apesar de
2. Idem, ibidem. lecer procedimentos e fortalecer o rela- difícil, é construída principalmente pelo

14 © 1994, Revista de Administração de Empresas I EAESP / FGV, São Paulo, Brasil.


ORGANIZAÇÃO: UM ESPAÇO ~E NEGqCIAÇÃO

comportamento durante o processo, ou sem pedir nada em troca. Não raro esse
seja, pela atitude de colaboração para a comportamento gera uma sensação da
solução do problema. pessoa ter sido explorada ou ter sido in-
Quando duas ou mais partes sentam em competente ou de ter tomado uma deci-
torno de uma mesa para negociar, signifi- são prematura;
ca que já ocorreram, ainda que de forma marcar firme a posição e não se afastar
preliminar, todas ou algumas dessas con- dela. Tal atitude será respondida com o
dições: revide da outra parte e, assim, um
impasse pode se prolongar e o acordo
acordo sobre a necessidade de negociar; . ou não sairá ou demandará bastante
acordo sobre um conjunto de objetivos e tempo, até que uma das partes comece a
princípios; ceder;
acordo sobre algumas regras de con- barganhar com a outra parte de forma a
duta; elevar o nível de ganhos mútuos ou a
definição de algumas questões e uma reduzir os prejuízos conjuntos. Não va-
pauta; mos esquecer que reduzir prejuízos é
aceitação dos interlocutores representan- também um objetivo sério a ser nego-
tes da outra parte; ciado. As pessoas têm interesse em ga-
acordo sobre a necessidade de se imple- nhar, mas querem garantido aquilo que
mentar conjuntamente as decisões resul- elas já têm. Não esqueçamos que ganhar
tantes do processo. é uma questão de grau, o que significa
que ceder num momento para garantir
À medida que o processo avança, no- uma posição futura é uma alternativa
vas informações são geradas, novos com- que sempre está em consideração.
portamentos são expostos, novas estraté-
gias são utilizadas. A reavaliação da si- A escolha de uma dessas alternativas
tuação é uma parte permanente. Limites pode ser modificada ao longo do proces-
são expandidos e redefinidos. Se a confi- so, contudo, a que nos interessa em parti-
ança entre as partes é presente, a possibi- cular é a de barganhar/negociar.
lidade do uso de táticas como blefes, ame- Dissemos anteriormente que ganhar é
aças ou sabotagem de informações é re- uma questão de grau. Nenhuma das par-
duzida. Existe sempre a possibilidade de tes acredita que conseguirá, ao final do
impasses e rupturas, porém, o relaciona- processo, ter todas as suas questões aten-
mento de confiança traz os adversários de didas. O nível de aspiração inicial, de con-
volta à luz de novas alternativas. quistas que serão perseguidas e de con-
Obviamente nem toda negociação ter- cessões que serão feitas mudará ao longo
mina de maneira madura, pacífica e com- dos trabalhos. É muito comum que cada
prometida com o acordo. O comportamen- parte comece com uma pauta extensa e
to dos parceiros ao longo do jogo é um fa- com limites excessivamente altos ou bai-
tor determinante da qualidade do resulta- xos, a depender do que defendem. Por
do. Traços de personalidade, como agres- exemplo: um sindicato reivindica 90% de
sividade e hostilidade, podem influir e às aumento para a categoria que representa
vezes até inviabilizar a continuidade do e o patrão, seu interlocutor, oferece 12%.
processo. Agressões verbais, chantagem e O resultado ficará longe dos dois extremos,
outras ameaças podem levar uma parte a pois cada parte terá que avaliar as condi-
romper a relação e a recusar-se a fazer ções e as argumentações do outro, como
acordo, isto é, o conflito manifesto não outras informações e alternativas surgirão
pode ser resolvido. Se isto ocorre, pode e serão consideradas. Em geral, o acordo
significar que a parte que se retira tem firmado entre as partes materializa con-
um poder de sobrevivência e incentivos quistas em relação à situação anterior à
maiores que o outro parceiro havia consi- negociação, mas é possível que inabilida-
derado. des políticas levem a um resultado pior,
A rigor, podemos afirmar que existem uma espécie de gol contra. Insistimos na
três alternativas de comportamento com diferença de comportamentos entre os par-
relação a concessões: ceiros que têm um relacionamento futuro
conceder unilateralmente, ou seja, abrir a preservar e aqueles que se envolvem por
mão dos pontos que pretendia ganhar uma condição acidental. Nesse último

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caso, é comum uma ridigez e uma intole- situações mais dolorosas e vergonhosas
rância aos pontos de vista do outro muito em nome de uma irracionalidade que pri-
maiores. vilegia o direito do pai ou da mãe, em de-
trimento dos maiores interessados na
questão. Essas situações também ocorrem
dentro das empresas, principalmente em
Quanto mais se valoriza a capacidade assuntos relacionados à mudança de sia-
de negociação, mais comum é encontrar- tus, como promoções, por exemplo, ou dis-
mos nas livrarias besi-sellers que sugerem puta pela aprovação de projetos.
receitas para o sucesso. Verdadeiras má- Um ponto que deve ser evitado, sob ris-
quinas de fazer dinheiro, esses livros com co de comprometer o futuro, é o famoso
títulos Como ganhar qualquer negociação em "ou tudo ou nada". Nesse sentido, é im-
dez minutos ou Como ganhar todas sem dar portante ter claro que o foco deve ser con-
nada em troca prestam um desserviço ao centrado na resolução do problema e que
leitor, seja ele executivo ou não. as posições podem ser modificadas.
Quando negociar é parte do trabalho Um outro aspecto, em geral esquecido,
diário e envolve pessoas, além de dinhei- é que os negociadores são pessoas e, como
ro, a banalização do assunto é um grande tais, têm emoções, elas se agarram a valo-
equívoco e às vezes um exercício de má- res, têm diferentes backgrounds e pontos de
fé. É sempre possível melhorar a performan- vista. São vulneráveis, ficam zangadas e
ce de um negociador sem cair nas armadi-
lhas da simplificação, dos pacotes irres-
ponsáveis e do psicologismo barato. Um acordo é
Ainda que cada negociação seja Um pro-
cesso único, por envolver pessoas, condi-
produto da vontade
ções, informações, expectativas, níveis de das partes envolvidas,
aspirações e habilidades diferentes, alguns é sinal de um
pontos merecem atenção especial e auxi-
liam na qualidade da decisão que é acor- relacionamento maduro
dada pelas partes. e não uma declaração
Imagine a situação: um casal decide ti-
de guerra.
rar férias. Ela quer ir para o campo, ele,
para a praia. Nenhum dos dois quer ir
sozinho. Quais as alternativas que eles
podem considerar? Quais os resultados deprimidas, hostis, frustradas e se ofen-
que devem ser evitados? dem. Tentar separar a pessoa do proble-
Suponha que cada um concede unila- ma é um exercício árduo, porém necessá-
teralmente, ou seja, ela, de má-vontade, rio, assim como conhecer como essa pes-
abre mão do campo ou ele, da praia. Ou, soa reage. Existem, então, dois aspectos: a
ainda, cada um decide marcar firme a sua substância do problema e o relacionamen-
posição e tentar convencer o outro, sem to envolvido. Perceber a situação do ou-
considerar-lhe o desejo. Quanto mais um tro e se colocar em seu lugar é uma habili-
e outro argumentam sobre a praia ou o dade importantíssima. A visão da outra
campo, mais se identifica com a posição parte e o entendimento da sua situação
assumida e tende a perder de vista que o (empatia) ajudam na busca de alternativas
ponto principal é gozar umas boas férias de solução que sejam possíveis de ser ope-
juntos. Uma situação limite pode levar a racionalizadas conjuntamente. Os ganhos
um impasse tão grande que, para não pre- podem ser mútuos e fortalecerão o rela-
judicar mais ainda o relacionamento, o cionamento e a confiança entre as partes.
casal decide não tirar férias. Ou seja, os Fazer concessões não é sinal de fraque-
dois saem perdendo. za, mas de abertura, de confiança, de com-
Essa não é uma situação tão difícil de prometimento com a busca de solução.
ocorrer no dia-a-dia. Quantos casos conhe- Quando uma parte faz uma concessão, es-
cemos onde o desfecho é baseado em "tudo pera, e até exige, uma reciprocidade. Ne-
bem, nem eu e nem ele"? Os tribunais e as gar essa reciprocidade é entendido como
varas de família estão lotados de proces- má-vontade, abuso ou exploração, poden-
sos, onde os filhos não são poupados das do alterar o comportamento do parceiro

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ORGANIZAÇÃO: UM ESPAÇO DE NEGOCIAÇÃO

para uma posição mais rígida e intransi- tes de que o melhor, naquelas circunstân-
gente. Uma vez feita uma concessão, é tra- cias, é o que foi conseguido. A falta desse
tada como definitiva, isto é, não é renego- convencimento pode fazer com que uma
ciada (não pode ser retirada) naquele mo- parte não se comprometa com o resultado
mento, o que implica a necessidade de e boicote (intencionalmente ou pela apa-
uma análise prévia das suas conseqüências. tia) a implantação do acordo. Lembramos
Um processo de negociação pode ser aqui uma advertência de Maquiavel, so-
emocionalmente muito desgastante. É im- bre ser mais valioso e menos perigoso um
portante se perceber o momento de strcss, adversário declarado, que se posiciona, do
além do qual as partes não conseguem que aquele que permanece neutro, ou, na
mais produzir informações válidas. A rup- versão brasileira, em cima do muro. O não
tura do relacionamento deve ser evitada a favor e nem contra abre -e muito - es-
(exceto quando ela é uma estratégia) e o paço para agendas secretas.
adiamento das discussões deve ser nego-
ciado de forma objetiva. Fazer balanços
parciais, refletir sobre o que se produziu
até o momento, realinhar os planos, bus- Ao longo do desenvolvimento de teori-
car apoios são fases importantes, uma vez as de análise comportamental nas organi-
que surgem muitos imprevistos. zações, deparamo-nos com uma série de
Um acordo é produto da vontade das tipologias, que marcam determinadas épo-
partes envolvidas. Não raro ele pode be- cas. Desde a Hierarquia das Necessidades,
neficiar mais um lado que o outro. É fun- de Maslow, muitas contribuições da Psi-
damental que o ator que se considera mais cologia foram agregadas aos estudos or-
beneficiado pelo acordo não trate a outra ganizacionais, especialmente os voltados
parte como derrotada ou perdedora. O res- à questão da liderança.
peito deve ser mantido, assim como a boa O Grid Gerencial, de Blake e Mouton,
vontade na implementação e relação fu- foi adaptado para vários outros tipos de
tura. Voltamos à questão da confiança e análise, entre eles os de Cultura Organi-
lembramos que confiar é ter a certeza de zacional e Administração de Conflitos e
que o outro lado não explorará intencio- Negociação. A busca de uma "padroniza-
nalmente a nossa fraqueza ou vulnerabi- ção" do ser humano e daquele que "vive"
lidade. Um acordo é sinal de um relacio- nas organizações tem sido uma constante.
namento maduro e não uma declaração de Conquanto essa tentativa de padroniza-
guerra. ção, se levada ao pé da letra, é falaciosa, a
Em toda negociação as partes definem relativização da sua importância e alcan-
previamente quais os limites além dos ce pode traduzir alguma facilidade no en-
quais elas não podem ceder. Esses limites, tendimento de determinadas característi-
ou essa posição-limite é chamada bottom cas humanas e nos levar a apreender al-
linc. É necessário definir, antecipadamen- gumas situações organizacionais de ma-
te, que nada que a outra parte diga ou faça neira mais clara. É nesse sentido que co-
provoque a mudança dessa linha, pois ela mentaremos o trabalho que Kenneth W.
é o suporte da sobrevivência e, portanto, Thomas" desenvolveu a partir do Grid. Ele
inegociável. Aqui, mais uma vez, a ques-
tão da confiança entre as partes exerce um
importante papel, pois se ela não existe,

I
como saber se o outro está ou não está ble-
fando? Como se respeita um limite no qual B
não se confia? a
COMPETE COLABORA
É importante termos em mente que o x
processo de negociação não se encerra tão a
logo as partes cheguem a um acordo. O COMPROMETE

I
que foi acordado deve ser implantado, afi- A
nal uma decisão só tem valor pela ação I EVITA ACOMODA 3. THOMAS, K. W. Conflict and
que provoca. O acordo não é um papel as- t
conflict management. In: DU-
a
sinado, mas decisões que serão executa- NETTE, M. Ied.) Handboak ot
Industrial and Organizatianal
das durante um determinado tempo, o que Baixa Alta Psvctiotoç». Chicago: Rand
requer o convencimento de ambas as par- Mcnally, 1976.

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EXECUTIVA

propõe uma categorização de estilos com- ceiro/ adversário. Às vezes ela é intuitiva,
portamentais de negociadores, que se dis- principalmente nas questões mais subjeti-
tribui em dois eixos: determinação (usa- vas. Essa avaliação perpassa os pontos
mos essa palavra como uma tradução acima colocados, ou seja, o que ganho ou
aproximada para a palavra assertiveness e perco, em que me sustento, qual é meu po-
cooperação), conforme o diagrama 1. der de fogo, até que ponto quero preser-
O grau de determinação, ou seja,a ener- var o relacionamento com o outro lado, se
gia que é investida na disputa e na busca algum dia posso precisar ou não do outro
de solução, é função do poder relativo lado; enfim, se vale a pena" comprar a bri-
(grau de sobrevivência, quantidade e qua- ga". É um fato que essa avaliação repre-
lidade dos incentivos que podem ser ofe- senta um quadro num determinado mo-
recidos ao outro lado, potencialidade de mento, por exemplo: considerar que há
fazer alianças, disponibilidade psicológi- coisas mais importantes para aplicar as
ca) de cada parte, bem como da importân- energias e o desgaste não compensaria ou
cia que é dada ao objeto do conflito, isto é, desviaria a atenção de outras questões
os custos e benefícios. mais relevantes. É um fato também que
O nível de cooperação é resultado da toda questão mal-resolvida tende a apa-
qualidade do relacionamento entre as par- recer no futuro como um antecedente a ser
tes e do grau de interdependência entre considerado.
elas ( o nível em que atingir os resultados Com base nessa tipologia, Kenneth W.
de uma parte depende da outra parte). Thomas e Ralph H. Kilman desenvolve-
De uma maneira mais simples: ram um questionário com pares de respos-
tas para determinadas perguntas, que visa
a identificar os estilos de negociação pre-
Determinação = poder relativo + custos/benefícios
dominantes em executivos. Como todo
Cooperação = qualidade do relacionamento instrumento e toda tipologia, é uma sim-
+ interdependência plificação e um artifício de análise, princi-
palmente se levarmos em conta o fato de
Exemplosdos estilosdispostos na matriz: que as pessoas não agem sempre da mes-
ma forma, o que significa que num dado
quando o que está em jogo é muito im- momento, uma pessoa pode adotar uma
portante para A e ele tem poder relativo postura extremamente competitiva e no
grande, o grau de determinação será outro, desenvolver uma abordagem cola-
grande, ou seja, tenderá a ter um com- borativa. No entanto, trata-se de um ins-
portamento competitivo ou colaborador, trumento interessante por explicitar deter-
dependendo da qualidade do relaciona- minadas características de cada tipo e su-
mento e da interdependência que tiver gerir a existência de uma abordagem pre-
comB; ferencial. Não esqueçamos, contudo, que
quando o assunto é de pouca monta, os o ser humano é muito mais do que qual-
benefícios são menores que os custos da quer modelo (econômico, sociológico,psi-
disputa, e o poder relativo é pequeno, a cológico ou antropológico) possa dar con-
tendência é Evitar ou Acomodar o con- ta e que qualquer catalogação é uma re-
flito numa situação de latência, ou seja, dução das suas potencialidades vistas sob
ele não se manifestará, pois A não vê o ângulo que o pesquisador definiu e pri-
como tirar grande proveito da questão. vilegiou.
Se entrar com firmeza, pode ainda per- Uma outra questão que vem ganhando
der tempo, dinheiro e relações; importância diz respeito à influência dos
quando as duas partes estão mais ou padrões culturais na postura dos negocia-
menos no mesmo nível de Determina- dores. Os japoneses, franceses, norte-ame-
ção e a Cooperação é razoável, porém ricanos e brasileiros negociam da mesma
não boa, a tendência é cada um procu- forma? É esse o ponto! Um trabalho de-
rar reduzir as perdas e garantir um ga- senvolvido pelo sociólogo francês Gilles
nho não máximo, mas satisfatório (Com- Amado e os pesquisadores da Fundação
promete). Dom Cabral, de Belo Horizonte, em 1989,
intitulado Organizatíonal behaviors and cul-
4. AMADO, G., BRASIL, H. V. Or- Dissemos anteriormente que as partes tural context: the Brazilian jeitinho",procu-
ganizational behaviors and cul-
tural context: the Brazi/ian jei- em conflito fazem uma avaliação de cál- ra investigar as raízes histórico-culturais
tinho. Mimeo, 1990. culo sobre a sua situação e a de seu par- que dão forma à maneira como os execu-

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ORGANIZAÇÃO: UM ESPAÇO DE NEGOCIAÇÃO

tivos brasileiros agem, preferencialmente ing, visa a elevar o número de possibili-


numa situação de negociação. Utilizando dades de argumentos e contra-argumen-
quatro categorias - persuasivo, determi- tos. Algo como "se ele disser isso, eu digo
nado, empático e sedutor -, o estudo traz aquilo".
comparações com estilos de norte-ameri- A apresentação da pauta pode ocorrer
canos e europeus. no estilo cobertor, isto é, mostrando-se as
Os brasileiros aparecem como sendo reivindicações de uma vez só, ou via col-
mais abertos, mais cooperativos, mais re- chete/salame, apresentando e garantindo
ceptivos, enquanto o grau de determina- conquistas ponto por ponto.
ção e a capacidade de exercer pressão é tida A autoridade limitada é, em geral, usa-
como fraca. Dos quatro estilos menciona- da para estabelecer um limite (de prazo,
dos, os brasileiros parecem preferir urna preço, percentual) além ou aquém do qual
abordagem mais empática e sedutora, sen- um lado diz não ter condições de decidir
do geralmente pouco objetivos durante o e precisa de aprovação superior. Verdade
processo. Procuram conciliar, envolver, flo- ou blefe, pode ser usada para ganhar tem-
rear, fazer com que todos ganhem sempre po ou forçar o adversário a concordar com
e tendem a evitar confrontos, agressivida- esse limite, dispensando novas consultas
de e hostilidade. e perda de tempo. O parceiro que estiver
Esse trabalho foi utilizado posterior- sob menor pressão de tempo tem uma van-
mente pela empresa Marcondes & Consul- tagem nesse item.
tores Associados, que desenvolveu urna A abstinência ou o silêncio são ruptu-
pesquisa visando a revelar q uern é o ne- ras temporárias na comunicação. Não se
gociador brasileiro. Os resultados foram trata de um simples ato de parar de falar
publicados em diversos números da revis- para ouvir. É não dar importância ao ar-
ta Tendências do 'Irabalho». gumento que está sendo exposto
Um ponto que não deve pelo outro lado. Algo como um sim-
ser negligenciado diz respei- ples no commenis. Implica uma cen-
to às condições físicas e psico- sura ou desdém, ou apenas ignorar
lógicas presentes no proces- para mudar de assunto.
so. O comportamento dos O blefe é uma espécie de teste à
atores é influenciado por rigidez da posição do ou-
variáveis como: o territó- tro. Deve ser usa-
rio escolhido (neutro ou do de forma bas-
não), conforto ambiental, tante cautelosa,
tranqüilidade / interrup- pois pode com-
ções, credibilidade e sim- prometer a conti-
patia dos envolvidos, an- nuidade do proces-
tecedentes do relaciona- so. Se descoberto, que-
mento ou observações so- bra a confiança e pode gerar uma
bre comportamentos anteriores dos envol- ruptura entre os parceiros se entendido
vidos, preparação dos auxiliares ou asses- como chantagem (o que é verdade). Traz a
sores, pressão de tempo para fechar o acor- marca da intimidação ou tom de ameaça.
do, stress pessoal e profissional. A ameaça é a estratégia que deixa clara a
intenção de prejudicar. Ela explicita não
apenas o castigo, mas também o compor-
tamento que é exigido para que o castigo
não seja aplicado.
Todos os parceiros envolvidos num pro- A surpresa é o uso de informações que
cesso de negociação preparam com ante- um lado não espera que o outro tenha co-
cedência suas agendas - explícitas e se- nhecimento ou alianças que tenha conse-
cretas. Definem com a sua equipe algumas guido. Causa grande impacto e pode im-
estratégias e táticas que serão usadas e plicar uma reestruturação da agenda, dos
planejam caminhos alternativos. Descre- argumentos e das táticas usadas até o mo-
veremos algumas das táticas mais comu- mento em que ela ocorre.
mente utilizadas. Acionar o prazo-limite para uma oferta
É comum que os interlocutores façam ou urna concessão condicionada significa 5. TENDÊNCIAS DO TRABA-
urna simulação do que pode ocorrer na reu- urna vantagem adicional para quem o uti- LHO, jul. 1987, dez. 1987, jan.
nião. Esse exercício, chamado brainsiorm- liza. Força o adversário a repensar sobre 1988 e fev.1988.

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ganízacionaís. um enorme mal-estar que
A negociação é aumentava ainda mais-quando algum pes-
quisador tinha a ousadia de fazer pergun-
certamente a alternativa tas diretas sobre o tema. Hoje esse assun-
que guarda maiores to já não é mais um tabu ou pelo menos
possibilidades de reduzir existe uma abertura maior em relação a ele .
.As orgíllÚzações têm aprendido que, para
o stress que os conflitos superar dificuldades, é necessário não ape-
organizacionais nas ideritifiêã-las, masassumi-Ias, Os con-
flitos já não são maistidos como exceções
provocam. ou algo absolutamente improdutivo. To-
dos .nós. que temós alguma corrvivência
as 'conseqüências do Sim e 'q.:o Não com com o universo organízacional, sabemos
uma certa urgência. É um recurso que-não qlle ele não é um clube de anjos, muito
deve ser usado a todo instante sôo risco de
.rmenos de suicidas. As pessoas têm tenta-
estressar desnecessariamente o o:utro'1ado. do aprender com as diferenças, procuran-
Ninguém gost~ da se sentir acuado com do conviver e também extrair algo de útil,
uma proposta /FÉ pegàr 9u.largar ag-ora'< aelas. . .
-, (')balanço e um.recurso integtativo que A valorização atual das habilidades de
permite ª,S partes reâvaliarem o ànaamen~ negociação não significa outra coisa senão
to do processQ e -as <;onqui:stas de cada que agrupo retomou o lugar de honra, que
lado,Em geL~ favorece 0 eS'pir~tGi colabo- os intencâmbios no mundo do trabalho são
rador e reduz às'anímcsídades. Eclaro que. cada'vez mais complexos e que as pessoas
numa situação em.que (I poder relàtívo dos devem encontrar formas de superar as di-
parceiros -seja muito desigual pode ter um nCl!-ldades que a convivência forçada traz.
efeito contrãrio, no sentido de par-ecer que A negOciação é certamente a alternativa
o de maior poder está tdpudiando com a que guarda maiores possibilidades de re-
outra parte. duzir o s-tress que os conflitos organiza-
O bom e o mau sujeitos é um jqgo onde cionais provocam. Voltamos a insistir que
os membros da mesma equipe encenam a maneira como o processo se desenvolve
uma discordância entre si. Q bom se faz é função do que se quer preservar, da con-
aparee-er como mais razoá~el" enqwint~ o ' fiànça.aa reciproctdade e intenção das par-
mal! é o radical. Cria uma a:p-arência'dedis- tes, da postura percebida e da forma como
sensão na própria equipe e aliança com o os argumentos são apresentados. A parte
adversário. Se for detectada pode causar operacional éimportante, mas a qualida-
um grande constrangimento e quebra da de dos resultados a serem alcançados é
confiança, por causa da manipulação re- determinada 'em larga medida pelos com-
conhecida, alem da perd.a de témpo ..~ portamenros assumidos. Nesse sentido",
reforçamos o argumento antes menciona-
CONCLUSÃO do de não existirem receitas prontas que
garantam o sucesso, mas o cuidado coma
ConsictertlínOs:queasorganiz~'ções são, qualidade das informações e a habilidade
por: natureza, um espaço ondeo poder, os emcomunid-las é fundamental, ::J
conflitos e a convivência negQciad<l são
questões rotineiras. Durante muito 'tempo,
a palavra poder causou, !los dirígentes 0:[-

20 Artigo recebido pela Red~çãoda RAE em janeíro/94, avaliado em junho e julho/94, aprovado para publicação em agostof94.

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