Fundamentos de

Cartografia.
(Paulo Araújo
Duarte)
EDUSC, 2006.
 42 Fundamentos de Cartografia Um pouco da história dos mapas 43

nossa nação, embora ainda sob influência das técnicas e do estilo europeu. los (figura 14). Entretanto, a escala já aparece em alguns mapas que
Em 1808, o governo imperial adota medidas visando organizar-se admi- mostram jurisdições geográficas de feudos ou delimitações de
nistrati vamente, criando, desta forma, a Academia da Marinha (A viso propriedades de terras. É certo também que alguns povoados mantinham
de 05/05/1808), o Arqui vo Mili tar (Decreto de 07/04/1808), a Tipografia arquivos nos quais eram guardados os documentos cartográficos.
Régia (Decreto de 13/05/1808) e a Academia de Artilharia e Fortificação
(Carta de Lei de 04/12/1810). Com isso, começa o rompimento da
Cartografia luso-brasileira, surgindo uma Cartografia Imperial, quando
a Academia da Marinha e a Escola de Artilharia e Fortificação ficariam
com a incumbência de preparar os técnicos especialistas que dariam
andamento aos trabalhos de ordem geográfica e cartográfica.
Com a implantação da Imprensa Régia começam os trabalhos de
edição de mapas nacionais, enquanto que o Real Arquivo Militar estaria
responsável pela preservação de nosso acervo, com isso apoiando a
impressão de novos mapas, como foi o Caso da planta da cidade de São
Sebastião do Rio de Janeiro, em 1812.

2.10 Maias e astecas

Apesar de carecer ainda de estudos mais aprofundados, sabe-se

que os povos maias e astecas, no México, possuíam uma rica tradição
cartográfica. Conta-se que Hernán Cortés, explorador espanhol, pelos
idos de 1522, solicitou a Montezuma (imperador asteca) informação sobre
algum local em que seus navios pudessem aportar em segurança. No dia
seguinte, chegou-lhe às mãos um mapa, desenhado num pano, mostrando
Figura 14 - Cenário que consta no manuscrito pré-hispânico conhecido pelo nome de
todo o litoral com seus vários acidentes geográficos. A rapidez com que "códice vindobonense". Maias e astecas possuíam uma rica tradíção cartográfica, que
a informação foi dada a Cortés revela que os astecas mantinham seus acabou por adquirir novas características após a conquista pelos espanhóis.
manuscritos guardados de modo que pudessem vir a ser consultados e Fonte: O CORREIO DA UNESCO, n. 8 (1991)
copiados com relativa facilidade.

Em boa parte dos mapas maias e astecas estudados não foram

encontradas evidências de utilização de escalas, sendo comum o exagero
das dimensões de certos elementos representados, com objeti vo de realçá-

44 Fundamentos de Cartografia
2.11 Árabes
Os árabes também se destacaram no passado, principalmente como
geógrafos, tendo grande importância muitos trabalhos dessa natureza,
especialmente na Idade Média quando o mundo ocidental de influência
cristã foi tomado de um processo retrógrado de tratamento das ciências
em geral.
Percebendo o valor dos conhecimentos antigos, principalmente dos
gregos, e, de modo especial, das obras de Cláudio Ptolomeu, tendo ainda
por objetivo integrá-Ias à cultura muçulmana, os árabes foram
incentivados a elaborar traduções dos tesouros científicos da Antigüidade,
preservando esses conhecimentos e enriquecendo-os com seus próprios
estudos.
Há estudiosos que chegam a afirmar que Bagdá e Damasco se
consti tuíram em verdadeiros pólos do saber durante o período
compreendido entre os séculos VII e XII. É quase certo que se deve aos
árabes a guarda e o enriquecimento dos conhecimentos científicos durante
a Idade Média, bem como seu retorno à Europa posteriormente.
Lembremo-nos de que nesta época, por imposição da Igreja Católica
Romana, as ciências foram abafadas, valendo apenas os conceitos
emitidos por essa religião. As grandes obras de Ptolomeu, por exemplo,
haviam sido proibidas. Tendo sido resgatadas e estudadas pelos árabes,
vieram a ser reintroduzidas mais tarde na Europa. Isto, porém, não
significa que os árabes tenham aceito sem contestação todas as idéias de
Ptolomeu. No século X, por exemplo, o estudioso al-Battani não
concordou que a África e a Ásia estivessem unidas perto da península da
Malásia, conforme pensava Ptolomeu, afirmando então que o Oceano
Índico seria um mar aberto. Outro caso é o de Mohammed Ibn Musa al-
Khwarizmi que, em seu Livro da configuração da Terra, retifica certas
afirmações daquele estudioso grego.
Os árabes, que também estavam envoltos em conquistas territoriais,
sentiram a necessidade de avaliar os recursos das novas terras, bem como
Um pouco da história dos mapas 45
implantar um sistema fiscal e tributário mais eficiente, o que veio
favorecer o desenvolvimento não só da Cartografia, mas também da
Matemática, Astronomia e Geografia.
Outro fator que favoreceu o crescimento dessas ciências foi o
espírito aventureiro desse povo, além das peregrinações que acabavam
transformando-se em valorosas viagens de estudo, comércio e exploração,
o que, em síntese, contribuía imensamente para ampliar e atualizar
principalmente os conhecimentos geográficos.
Além dos nomes j á citados, há outros cartógrafos árabes que também
merecem destaque como Abul Hassan Ali ai-Mas udi (séc. X), que fez
muitas viagens e escreveu diversas obras. Outro nome famoso da
Cartografia árabe é o de al-Idrisi (séc. XII), tendo como um dos principais
trabalhos um atlas do mundo até então conhecido, o qual já continha alguns
mapas coloridos. Este atlas é tido como uma das obras mais importantes
da Cartografia árabe. AI-Idrisi escreveu o Livro sobre agradável excursão
para quem deseja percorrer o mundo, conhecido ainda como o Livro de
Roger. Acontece que o rei Roger II, da Sicília, onde al-Idrisi encontrava-
se instalado em 1154, encomendou-lhe um grande planisfério do mundo
que mostrasse as regiões, países, cidades e outros detalhes de importância
geográfica. Este mapa se perdeu, mas os comentários constam no citado
livro. Os trabalhos de al-Idrisi contribuíram para que mais tarde, no século
XV, exploradores europeus, especialmente.portugueses, empreendessem
suas viagens para novas terras.
Apesar do que foi dito sobre a Cmtografia árabe, alguns historiadores
afirmam que, para surpresa de muitos, a contribuição desse povo para o
desenvolvimento da Cartografia foi pouco significativa, justificando que
eles poderiam ter explorado com maior intensidade seus conhecimentos
geográficos em favor daquela ciência.
Os árabes, embora bons geógrafos e astrônomos, que tanta influência
tiveram nos conhecimentos geográficos e no desenvolvimento da ciência
náutica, foram fracos cartógrafos. É difícil compreender como, apesar
do seu conhecimento das obras de Marino e de Ptolomeu, das suas
46 Fundamentos de Cartografia

composições geográficas e dos itinerários dos seus grandes viajantes, a

Cartografia árabe foi tão extraordinariamente pobre. No dizer de um
historiador moderno, Sir Henry Yule, as cartas dos árabes ficaram sempre
muito aquém dos seus livros (Cortesão, 1960, p.28).

Entretanto, de uma fOlma ou de outra, o fato é que não se pode

negar a importância que os árabes representaram ao recolher e desenvolver
3
a tradição da Antigüidade clássica, muito especialmente ao conservarem
o texto das obras de Ptolomeu durante a Idade Média.
A rede geográfica

Entende-se por rede geográfica (figura 15) o conjunto formado

por paralelos e meridianos, ou seja, pelas linhas de referência que cobrem
o globo terrestre com a finalidade de permitir a localização precisa de
qualquer ponto sobre sua superfície, bem como orientar a confecção de
mapas.

~
 Por Andreas Eberhard
Knobloch e Dieter Lelgemann

No mapa-múndi elaborado por Ptolomeu,

a representaçZío da Europa, Africa e Asia
está distorcida. Novo estudo reabilita o
astrônomo e mostra que as imprecisões se
devem à junçZío de mapas parciais

0111 que ê')Glrid;]o

os gregos c rom,:1l10S conheciam a geografia do
Extremo Oriente? Geotfsicus chineses (~alernães reuniram-se em
2003 juntO 80 rio \X/ti, na cidade de Xi\1l1, leSTe ela China,
observar L1lIl antigo local onde se bzialll n1t~dições ro[Jográficas.
Para os chineses, Xi'an era o início da rot"<1 comercial que, desde a Anrigüi-
dadt, Jjgava o Extre1110 Oriente ãEufupa, OS H.H1L1I10S conheciam Xi'an pelo
nome de Sem i'vletl"l>/Juiis. A cidade é Íamosa pelas C."c'"lvaçôcs das esdtuas de
guerreiros ern terracota: os milhares de soldados d(, ,Hgib foram coloCJelos na
câmara morru;)ria do primeiro imperador chines, QlJ1 ShiHu:,lng (260-210
a.C.), para protegê-ta, O pai eleQin Shi havia organizado no noroeste do país
um exêrciro com o qual seu I1lho conquistou todo o territóri.o da China no
século lU a.C. Teria Qin Shi sabido da existência de Felipe n da ~1acedônia
e A,lexandre, o Grande, seu filho, cuias clmpanh<..ls militares chegaram até
SU3S terras um sé(:ulo antes? Seria a rot~'1 da seda um caminho de transmissão
de conhecimento, além de transporte de mercadoriJs:

As H.FSPOSL\S A E\:'SAS PERGUN'lAS foram fornec:idas pela obra Geografia,

de Cláudio Ptolomeu, astrônomo e matem<Ítico grego que viveu em AlexJ.n-
dria, no norte da Africa, no sécul'o I.Id.C. Esse livro contên1 as coordenadas
geográficas de lTl,lis de 6 mil lugares no ecLÍl1lctlo, ou ';mundo habitado",
segundo os conhecimentos da époCJ. ])entre as informações apresenl:adas
constam não apenas cidades, m~lS t<lmbém acidcrltt's ge,cJgI'áhco, como
montanhas, ilhas (' rios. O mapa abrange, a oeste, desde a lendária ilha de
Tile, na Escandj.n<.1via.até as Ilhas CanáriJs. No Orieme, engloba desde a
China :lté Cingapura.
}·lojeem dia Ptolomeu éconhecído príncipalmel-1LI.:? COlno autor do Alma-
gesto, obra que durante 14 séculos foi a "bíhlia" dos ~lsrrÔnomos. Sua tesc
de que a Terra estava imóvel no centro do Unrverso foi dngma ~lté () século

1482_ Os P0nlOS

aqu' sol, a I'Jml' de 12 \/~mus

SCIENTIFIC AMERICAN 8RASIL 89

88 SCIENTIFIC AMERICAN 3RASIL AGOSTO 2006 www.sciam.com.br
 XVfI, quando Galileu e Newton defini~ dessa fornH, d)u<.:br no trabalho de comprimenu>: (l cúbito (a medida de um meu e outros nlósofos antigos nEio a modelos adequadosl parâmerros
rivamenre a sepultaram, Curiosamente, arqueólogos e historiadores. Em 20114, antebraço) de NipP"r, cidade que foi o tilllwm qualquer dúvida sobre o para a distorção. As duas etapas
na tpoca de Pro]omeu, o modelo helio- essa nlorivação nos levou a reunir 11•.1 Uni- centro religioso do império sumério. Um fornl<'lto esférico da Terra. prcl'jsam ocorrer simultaneamen-
cênrnco jj gozava de mais credihilidade '/erS!d~1dt' Técni,:,."a de I3erJim um exemplar encontra-se hOle no l\!luseu te, e os modelos devem ser, na
que o geocêmnco. imerdiscipJinar composro ele da AntigÜidade Oriental em Istambul, medida do possÍ\rel, simples. Os
Enquanto o Alnh1gesto descrevia i) e historiadores da ciência.
Turquia. Uma estátua do governante EMBOHA Cl SISTEI\-IAde c()orde- modelos mais de correçclo
movimento dos corpos celestes. em \lolta Nos'iJ pe>;quis;J foi norreac!,l por GlIdéia ele Lagash le. 2144-2121 a.c.), ll<.1das tenha sido inventado por di~peflsalTl e resultam
da Terra, a Ceografia inrroc!lIzía concc'i- quatro perguntas: Que unidades de atualmente exposta no NIuseu do LOll- Eratústtnes, [)toJomeu introdu~ dllTtamcnte da comparat;dO entre
tos geográficos re\,(j!ucionéÍrio'i, como compruncnto estaV<1m em uso no tempo as coordenadas de Ptolomeu e as
vre em Paris, apresenta sua unidade ziu J c.sc~lb em graus utilizada
o sistema de coordenadas de laritllde c de Pto!ot11eu e quais foram lltiJizàda:-; na oficial ({ler lato à esquerda), clerivada até hoje, inspirado em 1-·Iip<1rcn ,'8 coordenadas modernas de lugares
longitude em graus, A obra se perdeu confecção dos mapas parciais? Segund,] do cúhiro de Nippur. cll' Niçéia, que viveu no sêculo rI ~ de referência, e de um fator de es-
por muitos séculos e só foi redescober- pergunta: se os métodos disponíveis só Para medir distâncias mais longas, os 'l.C. Pnra Pro!omeu, era fl1n~ün ~ cal~l :1dequ:'ldo.
(";.1 por volta de 1300; um mapa-mLÍndi podiam estabelecer Lttitudes, como entáo gregos recorriam a uma unidade chama- dos Illósofos traduzir os dados ~ A.'isim, usamos as coordenadas
baseado nela estava amplamente difun- se (!l:rtTlllínava longitudes? Tais métodos, da estádio. Seu tamanho é cerca de 600 dos wpógrafos p<.lra coordenadas. ~ 11l()(lerucls de locais conhecidos,
dido

rerrestre
no início
representaç~'io topográfica
da era moderna.

no mapa estc1 considerdvelmeme

Porém,
da superfícil;
a ;1liús,
pois
prccisjo
seriam
os relógios
fucçosamcnte
transportáveis
Ilcccss<.Í.rios para wl mediçJo vi-
imprecisos,
e de alta
vezes maior
unidade
o estádio
que o cúbito
de Gudéia.
variava,
de Nippur
Assim como
dependendo
o cúbito,
da época
ou a

e
Ele descreveu os meios disponíveis
,p<.u:J a rCi.l!izaç.3o dt:ssa
Geografia, Seus (belos
tarefa
abrangem
na !~ como

a:;
Londres, Roma, Atenas,
f\ltTlCl, XÚ1l1 e as rUlnas
lli~l CPersépolis em nossa correção
da Babitô-

distorcie1a. Isso levanta dtívidas sobre <1 riam a ser inventados só no stculo XVIII. RETRATOHIPOTÉTICOde CIJudia Ptolomeu do século XV. Na mão esquerda
lb regiJo, No século III a.C., Eratóstenes cerca de um quarto da superfteie ge()déslca dos dados de Ptolomell.
ele segur<l instrumento astronômico chamado goniômetro
cutografia antiga. Os métodos dos to·· Tet"ccird pergunta; Que proceclimcf1ros de Circne estimou a circunferêncía da do globo, SUO do equador ao Ar- Para conseguirmos realizar essa
pógrafos antigos sertam tão imprecisos geomélricos c'Llt11 empregd<.:los para me- Terra em 252 mil estádios. Dividindo-se rico, e 1800 da Europa ,i Ásia. f\S infor- ce os diferentes valores de latitude e longi- Luefa o .,·-\t/llS, de FJarrington, que resultou
ljlwmo () mapa sugere ou os dados foram dir o terreno na Amigliidade? A11nal, a por 360 obtém-se um grau da superfície maçóes precisas sobre dist;:lnclJs contidas tude para os pontos de início e chegada de do trabalh(l coletivo de 200 historiadores,
di:;torcidos posteriormente? top()gr~1k1 trigunométric.1 por meio de terrestre que correspc)Il(ie a 700 estádios. nessa obra baseiam-se no procedimento uma medição, Somando-se as diferenças arque(')iogos t' f,lóJogos, foi de grande llti-
Sabe-se que Ptolomeu elaborou ~l'U triangllLlç~lo, comum atuJlmente, é lima Se 600 unidades Gudéia equivaliam geodésico da dererminação cio cardo e do de coordenadas obtidas pela medição Iiebdc. Depois de mais de uma década
mapa reunindo vários mapas parciais. inovaç~ío da era moderna. Por último, que a um estádio de Eratóstenes, então, re- decLÍmaJ10 (ver qUildro t{{/ pág. 92). Erarn sucessiva de locais vizinhos, chega-se aos investig:1ndn os ntlmes dados pe10s gregos
Com um procedimento assim, é quase dados sobre <.1circunferênci,l da Terra OLl correndo-se aos ebelos da tabela abaixo, os bematistes (coma dores de passos) que valores de latitude e longitude referentes a e romanos ~lOs locais, o grupo deduziu
illevit~ível que surjam clistorçôes sistem~í~ JS distáncias entre localidades Lmportan- chega-se ~1uma circunferência terrestre se encarregavam da medição dos trajelOs lugares bem distantes do ponto de parti- qlle rnuirns deles correspondiam a cidades
ticas. Descobrir a natureza desses erros tes estavam disponíveis para Prolony'u? de cerca de 40 mil km. atuais ou ruínas. Embora esse trabalho de
e da definiç3.o dos rumos. Esses da. Numa prov<Ívei alusão a Eratóstenes,
permitiria njo investigar a preci- QllC precis:Jmos saber para poder corrigir A precisão desse resultado é impres- acompanhav:JITI ci.1Ll1panhas Ptolomcu relata na Geogrçlfia que "os identificação tenha tido êxito em relação
são d~l antiga, mJS rambém essas in[ormaçóes? sionante. Sem medições de campo exatas, como as de Alexandre, o Grande, antigos" utilizaram um procedimento a muitas localidades européias, do norte
identificar algumas localidades extintas seria impossível conscgui-la. rvlais tarde, equivalente para determinar distâncias da Áfricc1 e do ()r-iente I'v'léclio, o proces-
o astrônomo Cleomedes calculou a cir- pógrafos tinham ,'1. seu em terra e posteriormente calcular a cir- so tornaV;1.-')t: t>astante incerto quando se
EM U\l TRABALHO o histo- cunferência da Terra em 25 miríades de (capt:J.dor de soml"H"<l::;). Esse instrumento cunferência do planeta. tratava do Fxrremo Oriente. Para essas
riador d;1 ciência Rorrbnder, da estádios de Eratóstenes (1 miríade ::= 10 era provavelmente empregado desde o O grau de precisão da topografia na regí6es: tel! nmíro lítiJ o fato de Prolomeu
Uni'versidade de Tübingen, compilou mil) ou 24 mirÍades de estádios gregos. O século VI a.c. por Tales e Anaximandró Antígüidade não é demonstrado apenas ter Geografia não apenas
fornecido na
mais de liSU unidades de medida de geógrafo Estrabão menciona um cálculo de l\lilem para é.l. medição do tempo, e por pejo cálculo da circunferência terrestre os nomes dos lugares, mas descrições
comprimento diferentes, desde ,15 <.b de'Posidônío que resultou em 18 miríades Pítea de ivlassilia (.Marselha) no século IV por Eratóstenes, Os mapas regionais que de terrenos c locais, como as
Antigüidade até o pé inglês. empregado de estádios, dos quais 5"00 equivalem a ,1 as(.;. para dcterminar extensões de terras, consta m na Geografia nossuem, confor- litorclneas c C::omplementamos
:lté hoje. Ccrcllk 30 dess~ls medidas es- grau da superflcie terrestre, Essa eqlliva- Embora as informações sobre o skio- me veriflcamos experimentalmente, uma essas illf()rJll~l(,~ôe,; com dados extraídos
r::'io fUl1dad:1s, cum pequcnas variaçoes, lência (1 o 500 estádios) foi a usada por therol1 sejam muito espars;ls, consegui- margem de erro de aproximadamente 10 de outros manuscritos antigos para oht"er
em ,1pcflas um,l unidade de medida de Pto[omeu. Eratóstenes, Cleomedes, PtoJo- mos reconstruir UlTl deles (uer imagem km. Assim, concluímos que muitas das Ulll resultado Hdedígno.
na pâg. 92), Constatamos, surpresos, que distorções do mapa-l11úndi de Ptolomeu Além do,; erros grosseiros inrroc11.1-

ele alcança o mesmo nível de exatidão dos se devem J. junção de mapas p~Hciais. zidos no momento da cópia dos diver-
seXl:<.1ntes modernos. O skiotherOlI CCll1J1l () objetivo de nossa correção geodé- sus 1l1~lnLlsCt"ltos, idenrificamos outros
Cúbito sumério de Nippur [NP) 518,5 mm ap~]relho de topografia verdadeiramente SiGl foi, primeiramenre, identificar erros aspecros iI11!l()rtantes. Ff:Olvia distol\()es
gcnii:d, que pennitül medir, baseando-se grosseiros introduzidos por copistas Ilas de t'SCIL-.l sl1r"gicbs devido ~1LLtilizaçjo de
Remen do cúbito de Níppur [RN) RN o [20/28) NP 370,4mm
difl'l"l'llttsrllt'didas de estúdio JlOS diver-
110 chamado triúngulo de posição do Sol inform,H,-ôes de Ptolo11lt'u. Em segundo
Unidade de Gudéia (GF) GFo [20/28)RN 264,55 mm (siruado no céu e rendo vértices no p(')lo ILLgar~ tenurnos determinar, recorrendo "os lIlap~lS 1(l(;"lis, UJll1pontnres do lllClpa
celeste, 110 Sol e no zênite), cinco úngulos
Pé osco-úrnbrico OUF o (25/24) GF 275,6 mm
indicativós da posição geográfica de um
ANOR[ASKLElN[BERG é professorde latim e grego antigo da Universidade Humboldt, Berlim, e mem-
Estádio de Eratóstenes local. Entre os trópicos, o aparelho per-
=: 600 unidades de Gudéia 158,(3 m bro da equipe do projeto Geografia da Universidade Técnica de Berlim desde 2004. EBERHARD
Estádio grego 600 pés osco-úmbricos 165,34m
mitia determinar ~llatitud~ quando o sol
::=
KNOBLOCH é professor de história da ciência e de história da técnica da Universidade Técnica de
Estádio de Posidônio I Ptolomeu ::::600 remens do cúbito de Nippur 222,24 m
do llleíu-di~l se encontr~lVa exatamente no
Berlim e da Academia de Ciências de Berlim-Brandemburgo. Ele é presidente da Academia Jnterna-
zênite e n;lo Janç~lv:J sombra, cional de História da Ciência, Paris. D/crER LELGEMANN foi professor de geodésia astronômica e fí"
NO COLODE UMA ESTÁTUAdo príncipe sumério Gudéia de Lagash estéÍ a pbnta de um templo. Nela está desenhada /'\. ropografia com base no cardo e no sira da Universidade Técnica de Berlim até 2004. Quando se élposentar, em breve, dará continuida-
·nidade de medida de comprimento que se tornou conhedda como Unidade de Gudéia
decLlmano, descrit~l por Ptolomeu, fornc- de a suas pesquisas sobre métodos e resultados da matemática aplicad8 na Antigüidade

90 SCJENTIFIC AMERICAN BRASil

AGOSTO 2006 www.5cíam.com.br SCIF.NTIFIC AMERICAN BRASIL 91
 dos quais uivez origindL!os pd() próprio
[}rok1l11ell. UnI projetu c,ob a cuordena-
Na Antigüidade, a técnica de topografia 'A
~:jo de Alfred Sruckt:lberger, do Núcleo
que emprega a determinaçào do cardo e f.". (J
do decúmano era muito difundida. Oponto
de partida A encontra-se à distância S do
'1'>....
I y] ''-.'-.
LI!.':Pesquisa Prulomeu,
de BelTl,l, dediea ..st' atLl;Jlml'ntt
d:! Ullivcrsiebde
a idemi-

ponto de chegada B. O cardo X marca a Mcar esses erros c J comparar as m,lis ele-
distâncía entre norte e sul, e o decúmano
Y a distância entre leste e oeste, de A
até B. Para localizar o ponto A, enconúa- I
.......•
il
...•.....•..
~...."' ,
)"0 c('lpias
sobreVI\·C.l"<lnl,
t.' jmrres~iles da
i\tédia
rCl1HalGln<.!o

c à Renelscenç~l. C:um issu scrj pussível ter

à
que

se a direção do Meridiano local com a

...•....• Llrncl idéia de comu a ubra e~tdv,l <:'lmes
ajuda de um skiotheron. Em seguida, em Oecúmano:::: y
direção a B marcamos um trecho 0, cujas d(-; ')cr copl,H,b n() nnal do século XIII,
l-
componentes t
e 11podem ser facilmente Sul (linha do Meridiano) qUJlldo foi redescoberta. lnicialrnente
medidos. Depois de o trecho 5 ter sido reprOlluzid,ll'Jl] grego ,-Hltigo, <1Ceografia
medido com passadas ou extensões de corda, é fácil calcular o cardo e o decúmano com
surgiu cI'nJ406 em latim, sob o título de
a ajuda da regra de três: X:::.~ (S/o) e Y::: 1) (S/oJ, Esse método não requer a medição de
ângulos. Na figura, a curvatura da Terra não foi levada em conta.
C,"()slI1(Jgrd/id. No ano de 1477, a obra foi
impressa PCL1 primeira vez.
Embor,l o pri meiro l:St01"(,'"o de cor-
[OreI!.L t'.\iStl ..llJ) LcUnbtTIl nf(h pIes dtl.\(lli () IlUP<l b~l:-,Cll1'[l'"lceirclvél do reçjo jti resulte em Ulll mapa surpreen-
nd l.nltllde do litor ..l! none da Ad;llltlco aré .1 (:hln~l. O ~ljl.lSre r"Hllb~'1ll dentemente hom, ele ainda está longe do
lungitul-k do licPI:,-tI do ')ul eb A:,i~l,do
11•.1 fUl s•.ltbLuOI·ill lU direl)o llonc-std, de nível de precisào que os procedimentos
()ultu j\:r"lt.:{) ,ue Clllg'lPUl"d. NIlUl11U':i [de \id~Húril·aeb UHllU d ilha Hirr,-l, lU de mediçáo antigos viabilizavam - o que
dl':>LTt'p,1l1cieh l·egll.1I1di" menor\."" l' Ill) L1· NOCUCg,l) ,l[(' \-krot.\ nu Sudàu. constitui um indiclo de existem dis- descrito no corpo do texto. As diferelv,:Js '."m relação às coordenarias modernas
PARAA ELABORAÇÃO deste mapa foram utilizadas as coordenadas de ('O
Ill<1nhu de (C 1"[;1) ILl~()l:.s ()u, ":Oll1lJ l)C01Tt':U E~sl' t.ltor dl' e"":,li,-I rt'sulrou elll 1l1ll,1 wn.;ües adicionais nas i"fo[lna,;()(s.Para locnlidades contidas na Geografia. Elas foram corl"igidas com base no método acabaram por mostrar-se irrele'!antes

com Í nclicl t: 1::..spcll1ha., em áre:l." de grupo,) (1 Jrn:ç/i() hU,-l U ha~r,HHe p~lra nus bl.er SllS- identi6car disparidades sistenl<.Íticasentrt'
t:'tI1ICO,> ('specín\.:us f)t'lur que Pru!Ol'llCLl eitnbula cl Terr,-l um as coordenadas distorcidas e as moderna.s é necessário realizar anúlises detalhadas provavelmente os copiou de Eratósrenes ou 20 minutos de arco. Assim, gradualmente
Para 1I11l'-lpfIlnelrd. VlSclU de \..~(jnlllm(), [,lltlal1hl) pequellu lit'111JIS. A,s dlSt::1nu,ls de rodo o ·conjunto de dados. do astrônomo I-liparco. essas coordenadas vão sendo incorporadas
t()llUllH)~ c[)mo PUlltO de' p,u[Jda ~lS p~lr,l (i:> IU,L':,lrt:-; elll t'stadlUs, el11 ."1 basume Ao proceder a essa tarefa, é útil cOl1side .. Atualmente, estamos rentando corrigir no sistem,l geogdfico moderno.

dadt:. ll"l.•1l':i lIllpurwme" do t'CUll1t.:'IlU. PIO· (lJrn-:r.d.':l. LUi~lJ!] sldu lIwolulHêl.rlí.l111enrc' rar em separado os desvios de latitude c 10n- 'as distorçõcs na proporção entre naçóes Em países como a Espanha e espccial-
lomeu apresentou ullla lisu des~Js Ude1dl'" di"[(H"cidJ" se rt:.'ll I LOllvtrrilbs ]XlGl bti- gitllde. Na parte grosseiramente disrorcida específicas. Para isso urilizamos o modelo a Índia, a utiliz,1Ção de mTI único
!lO capitulo tln;ll da Ceugrczjil.l; os (belo;.; ruci,: 1:: lunglwdt. De ;.1cordo com medil,."ót.'s referente à Ásia, as inform.1ções sobre lon- de correção mais simples -' um ponto de de correção para ,9país inteiro não
de lll<.ll':i de 30() deld:> '<10 cuntlelvt'l". lllodern<.-h, () Ul() da letra corl"l.:,spondc e1 gitude de localrdades à beira-mar divergem referência e um bror de escala prévio IXl- é sufiCiente, Nesses casos é mais·proveito-
:\ rindo dê tt'ste, re~IIIJ.;Iil1()':- umLI (l. ; 7 J k!ll. CUl\fudu, :~eumsidi.:TM um sislematiczllncnre daquelas do interior. Em seado na relação entre esrádios, Alé]:n do so empregar índices de correção isolados
(urre",<i.o tendo AttlU'l Ull1l0 PUlHU l~t' r,tio [l'ITt'SUT de !,'louroc)) x 6..171 km::;: comparação com cidades do norte, como fator de 500/700, usamos também, des- para cada uma das regiões dus povos lis-
rdel'~IlCla e \l')andc, Lllll t,lwr de t"<aLt -+.5 ~ I h •.l\ l'rJ 1I111J bo,l '",:ollludênCl,-l Xi'an, Samarcanda (no atual Uzbequistelo) pendmdo da região, SOO/525, 500/6üIJ ou t<1düspor Ptolorneu na Geografia.
1I11lfurme Ci.;' )ouroo p~(r,l o e(UI1ll"llll t"l1.rr~ denvJ':i disLll1uas lU T~rrJ e as e ['ama ilnd,a), as localidades do litoral sul até 500/900. Para a correção do conjunto Ainda náo foi POSSlVe! identificar nem
cornu um codu. 11;1(1 lllll v,ilul' ,.de- encontram-se sistematicamente deslocadas do Oriente Médio, englobando do tio Ti- ,1 mera de das mais de 6 mil localidades
E'ltt t.' "obre dl)r,1nC1~1calculadas
lnr'()rlll'H.;(;n d

Jtório, a propo]"l.;;lU l'ntr~ (1 v,t!or de

mas lXIITLr t!us d,tdu\ da Gt'()gr~ltid. em m,li."de 5° para o oeste~ uma diferença gre ~ltéa Índia, a cidade de Xi'an s~rvíll de cujas coo[dcnadas geográficas são forne-
Ulll grJ.LI da CircLlllferellL·ICl lern:':itre ('!li Par~l u iUVl:'~;ldLJr CcistúvelO CO[Ulll- que chega a 500 km. pomo de referência, sendo utilizado o faror cidas por Pwlomeu. Quando nosso pro-
est,--~díos consider,lda pu!' Prulomt:u J bu, PrUlOlllCLi l'I"<l lIHLl cluml·IJade illtPor- " As int"ormaçôes sobre btitllde tambénl o. Inais freqüente de 500/700, Em suma, jeto esrive[ cuncluído, haverá esperança
clkulada por traróstene':i - rc:.pcC[!\ cI- ,;: \Ucl (IJl1\ de tt'r el\lUlltrc1do apresentam erros, embora naquela época diante das coordenadas modernas de deter- renovada de I'"lstrear pelo menos alguns
mente, 500 e 700. Ptolonkll dc'l"l\,f)lI ~i. '.) i... •. lllLllihu l'Ur)[ICilu par,-I <.lllldLll' 1-1'-11',1 elas jj pudessem ser obtidas de modo bas- minados países, as coordenadas d~ Cláudio dess!.:'slll~art's.lndependentemente disso,
maioria (\c suas courdenadas u>ll\-crlL'I'tLI() ,I (Inll,l ptl(J l)lidCl][t' te)I prol.i1\l'IIl1t'lltl' unte conhável e preciso, Pwlomcu fornece Ptolomeu apresemam desajustes uniformes a corrc,,:clu do mapa-lnlíncli já comprovou

l'lll "l.ngulos as llledi',/Je':i di:' di..,clllu;\ 1iltlliUli..I,llb f'c!(JS JLlJO':i dJ CC(lp,I"djiu, cum exatidão as latitudes de Nleroé rSu- nas !arirudes e lon[jitudes que' podemos que c1 prn:is;J1) da topograna dos antigos
c<.,rjdios. 0<., O1;l~J;I" liC,lr.llll dl"[ll!',."ld(l' 1..,;t11l· ·"c ,-]Lll' C()l()llll,() I('\,\\'~l 1'1l1 ':ili,lS dão), AbSUj (Egito), SiracLlsJ, i\1arselha t' empregar como índices para Di- vlnha sendo subestimada. Essa l- uma boa
purqw.: l'k Il<io levou l:.'11l ''-ClIl:'ldLTcH.;,Ú) qlW pl'lt) .\tl,\IH1":i} ;1111 111~lr),1 l()l1l- sua cidade nawl, Alexandria, mas os dados ferenças m,liores apontam par,l eventuais oportun ilbde para reavali"u a Geografia,
,1.', l.\11td,lllt::-; lk ll1l'did,1 de:),,\:) 111t.'d'.y()l·" 1'(1"[(1.1 p,l!"rlr J:,,>.,"l.:':> d~lll()')~'qUt: tt'lllt.'lt' nJerclltes e1 Bizâncio (,,1tllal Ist3Inbul) diver- erros de rranscriçào. Os desvi.os resta me.') I"cc(H111eccndo-a comouma obra-prima de
gem 2° e os dados de C,--1rr,lgo chegam ~l em gera I correspondem a somente dez J C.iâudio jlr(llo!lleu. ~fJ.1
ditnl,llll-' ,\ ll1,liorlil, ..l\JllUl' [Utltl illtlll.\. --111('1',.1'-

C"l"l\',ll'llll",tcH.!I()" LI\.' Lrc1t(),r'~'I\v"' .. -\"~llll [1·'I/lli.1 pelo ter llma discrepjncia de 4(l em relação aos
P()]" l',\(·Jlq,ll> . .ç mil t',.,[,lLiH.l" iljLlJiLplt·) ~ll·, LII·"'''.I lOI·j',· •..:.ill ~llllpk\. loy.t) valolc.') modernos. No caso de Carugo, '''PARA CONHECER MAIS",,'C' '. "I' ~:·~"""':l'(:'l·:';,»I':,',,,,"','" :,~~~,',
qUe' (l (>,udJ() que "Se clci()teJ ,."(Jri'l·'" (HI[ 1',1 ,~I',l" (' f,u)hlt'llld: isso signiticl 111.11desvio de mais de 400 krn
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pOlldl'ri,llJl J lU í--'-I"~llh1\0 cjieui() \jt' [lrl' ,:IT()) c:,1'(l")t'II'I)\ ~k cr:.1I1)(I-](;.l(J. ,11~UI1" --U!llerro cCH1siderávcl para urna costa tão
iOlllc·ll, IILh JPt'!u~ 7, gr~llb liU (~ik."ulo i l~onhecida como a lllccliterrànea. Pto!omcll Ptolemy's Geography: an annotated translatíon of the theoretical chapters. J. Lennart Berggren e
o 5K.IOTHERON [captador de sombras) E:ra utilizL;ldo hast'ou o,; ebdns que apresentou lU Ceo- AJexander Jones, Princeton University Press, 2000.
de Fr;Hó"tene". No 111,11;<1 liL-l)tl>!llll1t:li. 1.)
!','l topografia antiga, ~-1edida,; feitas com esse
llllllldl) p,Hc,i.lllUI:- e\p.dh'lLi( I Pt'!u ~llJhl) instrumento reconstr\lído illcançarclm precisáo <J
grafi·ü lllmw ohra anterior do historiador e Dn the andent determination of the Meridian are length by Eratosthenes of Kyrene. Dieter Lelgernann.

do tjue 1"t:<.tlIIlClltC t:< Nn"s,l Cmlt'l';,\() "1111 rio :-iextante Inademo Estnlbao, que, por Sl1<.l vez, Dísponivel em http://'vvww.flg.net/pub/3thens'papers,·wsllSL''/I':+:;' j _.Lelgernartn.pdf.

92 SCrf:NfIFICAME:K1CAN AGOSTO 2006 www.sciam.com.br SCIENTlFIC AMERICAN BRASil 93