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Título II – Normas constitucionais Capitulo I → Estrutura Das Normas Constituintes

p.187-206

78. Os princípios e a sua função ordenadora

O direito não é mero somatório de regras avulsas, produto de atos de vontade, ou mera
concatenação de formas verbais articuladas entre si. O direito é ordenamento; implica
coerência, talvez mais rigorosamente, consistência; projeta sistema; é unidade de sentido, é
valor incorporado em norma. É esse ordenamento, esse conjunto, essa unidade, esse valor
projeta-se ou traduz-se em princípio, logicamente anteriores aos preceitos.

O sistema jurídico tem a sua unidade na solidariedade dialética com que nós, vivemos a
nossa axiológico-social realização.

Não se pode ficar pelas "decisões de conflitos" e de valores singulares, antes se deve
avançar até aos valores fundamentais mais profundos, portanto até aos princípios gerais de
uma ordem jurídica.

Os princípios não se colocam além ou acima do Direito, também eles fazem parte do
complexo ornamental. Não se contrapõem às normas, contrapõem-se tão-somente às regras;
as normas jurídicas é que se dividem normas-princípios e normas-regras;

Se assim se afigura em geral, muito mais tem de ser no âmbito do Direito Constitucional,
tronco de ordem jurídica estatal, todo ele envolvido e penetrado pelos valores jurídicos
fundamentais dominantes na comunidade; sobretudo, tem de ser assim na consideração da
Constituição material como núcleo de princípios e não me regras, preceitos ou disposições.

As regras são aplicáveis no estilo de tudo ou nada dos fatos que preveem; os princípios, ao
invés, não comportam consequências jurídicas que decorre automaticamente; um princípio
não indica tanto a necessidade de uma determinada decisão quanto uma razão para ir num
certo sentido.

Os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível,
dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes; são mandados de otimização que
podem ser cumpridos em diferentes graus. As regras são normas que só podem ser
cumpridas ou não. Se uma regra é válida, então tem de fazer-se exatamente o que ela exige.
As regras contêm determinações no âmbito fáctico e juridicamente possível. A diferença
entre princípios e regras é qualitativa, e não de grau.

A função ordenadora dos princípios revela-se particularmente significativa e forte em


momentos revolucionário.

79. Classificação de princípios constitucionais

Os princípios constitucionais não homogéneos, podem revestir diferente natureza e


configuração.

Classificação de princípios:

Castanheira Neves discrimina os princípios axiológicos jurídicos transcendentes ao estado e


os princípios diretamente constitutivos da particular forma de estado instituída;
Gomes de Canotilho distingue "princípios jurídicos fundamentais e princípios políticos
constitucionalmente conformadores", princípios constitucionais impositivos e princípios
garantia;

Miguel Teixeira de Sousa distingue princípios programáticos, princípios formais e


princípios materiais;

Carlos Blanco de Morais enuncia, por um lado, princípio reitores do Estado e princípios de
ordem política;

Pela nossa parte distinguimos ainda: princípios constitucionais substantivos (princípios


válidos em si mesmos e que espelham os valores básicos a que adere a Constituição
material) e princípios constitucionais adjetivo ou instrumentais (princípios, sobretudo de
alcance técnico, complementares dos primeiros e que enquadram e dinamizam as posições
no seu conjunto). A seguir, subdistinguimos os princípios constitucionais substantivos em
princípio axiológicos fundamentais e princípios políticoconstitucionais. - temos, pois, três
grandes categorias:

1) Princípios axiológicos fundamentais — correspondente aos limites transcendentes do


poder constituinte. Passagem do direito natural para o direito positivo.

2) Princípios política constitucionais — correspondentes aos limites imanentes do poder


constituinte, aos limites específicos da revisão constitucional, próprios e impróprios, e aos
princípios conexos ou derivados de uns e de outros, os quais refletem, como nome indica, as
grandes marcas e direções caracterizadoras de cada Constituição material diante das demais.

3) Princípios constitucionais instrumentais — correspondente a estrutura do sistema


constitucional, e modos de racionalidade e de operacionalidade.

80. Classificação de preâmbulos constitucionais

1. Um preâmbulo não é componente necessário de qualquer Constituição. É tão-somente


um elemento natural de constituições feitas em momentos de rotura histórica ou de
grande transformação política e social. O seu carácter depende dessa circunstância e
dessas intenções, bem como da ideologia a que apela o legislador constituinte.
2. Também a sua forma e a sua extensão aparece extremamente variáveis.
3. O alcance político e literário do preâmbulo evidente em qualquer Constituição. Ele
reflete a opinião pública ou o projeto de que a constituição retira a sua força.
4. O preâmbulo é parte integrante da Constituição, com todas as suas consequências.
Distingue-se apenas pela sua eficácia ou pelo papel que desempenha.
5. O preâmbulo dimana do órgão constituinte, tal como as disposições ou preceitos; É
aprovado nas mesmas condições e o ato de aprovação possui a mesma estrutura e
mesmo sentido jurídico. Tudo quando resulte do exercício do poder constituinte e
conste da Constituição em sentido instrumental, tudo é constituição em sentido formal.
6. Os preâmbulos não podem assimilar-se às declarações de direitos. - Ele não incorpora
preceitos, mas sim princípios.

81. Classificações de normas-regras

1. Entre as classificações gerais de normas-regras – oferecem interesse relevante para o


Direito Constitucional as seguintes: normas permissivas, prescritivas e proibitivas;
normas gerais e normas especiais, dispõem para a generalidade dos casos ou para
situações especiais neles contidas; normas de direito comum e normas de direito
particular, destinam à generalidade das pessoas ou a certas categorias de pessoas em
particular; normas gerias e normas excecionais, correspondem a princípios gerais ou a
exceções a esses princípios; normas substantivas e normas adjetivas, regulam situações,
relações ou instituições sujeitas ao ordenamento jurídico.
2. Como classificações com especialidades no Direito constitucional ou dele específicas,
apontem-se: normas constitucionais materiais ou de fundo, orgânicas ou organizativas e
procedimentais ou de forma; normas constitucionais precetivas e normas constitucionais
programáticas ou diretivas; normas constitucionais exequíveis e não exequíveis por si
mesmas; normas constitucionais a se e normas sobre normas constitucionais.

82. Normas precetivas e normas programáticas

1. Entre normas precetivas e normas programáticas não há uma diferença de natureza ou


de valor. Só existem diferenças de estrutura e de projeção no ordenamento. São,
normas, uma se outras, jurídicas integrantes de uma mesma e única ordem
constitucional.
2. Segundo diferentes orientações doutrinais, as normas programáticas definem-se: por
serem de aplicação diferira, e não de aplicação ou execução imediata; por prescreverem
obrigações de resultado, não obrigações de meios; por conferirem “elasticidade” ao
ordenamento constitucional; por terem como destinatário primacial o legislador; por
terem um conteúdo que depende das opções próprias do legislador ordinário.

83. Normas exequíveis e não exequíveis por si mesmas

1. Entre as normas exequíveis e as não exequíveis o critério distintivo está nas próprias
normas e vem a ser a completude ou incompletude destas.
2. As normas não exequíveis por si mesmas as que nos estamos referindo são normas
prescritivas ou, doutro ângulo, imposições legiferantes.
3. Mas existem a par delas normas não exequíveis por si mesmas em que não se verifica
tal necessidade.

84. Normas precetivas exequíveis, normas precetivas não exequíveis e normas


programáticas

1. Todas as normas exequíveis por si mesmas podem considerar-se precetivas, mas nem
todas as normas precetivas são exequíveis por si mesmas. Em contrapartida, as normas
programáticas são todas normas não exequíveis por si mesmas.

85. A aplicabilidade das normas constitucionais

1. As normas constitucionais devem, tanto quanto possível, ser tomadas como aplicáveis
imediatamente.
2. Aplicáveis: às situações da vida das pessoas como particulares; às relações das pessoas
com o Estado; aos órgãos do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais; às
situações dos titulares desses órgãos.
3. Quanto às normas não exequíveis por si mesmas em especial, também elas têm aplicação
direta: enquanto proíbem a emissão de normas legais contrárias e proíbem a prática de
comportamentos que tendam a impedir a produção de atos por ela impostos e enquanto,
depois de concretizadas através de normas legais, estas não podem ser pura e
simplesmente revogadas, retornando-se ao vazio ou à completa inexequibilidade.

Capitulo II → Interpretação, Integração E Aplicação p.206-228 ∾ Interpretação E


Integração Das Normas Constitucionais

86. A problemática da interpretação constitucional

1. Há sempre que interpretar a Constituição como há sempre que interpretar a lei. Só


através da interpretação se encontra a norma e o sentido da norma. Não é possível
aplicação sem interpretação.
2. A interpretação constitucional não é de natureza diferente da que se opera noutras áreas.
Como toda a interpretação jurídica está estritamente conexa com a aplicação do Direito;
não se destina à enunciação abstrata de conceitos, destina-se à conformação da vida pela
norma.
3. A interpretação constitucional tem de ter em conta condicionalismos e fins políticos
inelutáveis e irredutíveis, mas não pode visar outra coisa que não sejam as normas
jurídicas que lhes correspondem. Tem de olhar para a realidade constitucional, mas tem
de a saber tomar como sujeita ao influxo das normas e não como mera realidade de
facto. Tem de estar atenta aos valores sem dissolver a lei constitucional no subjetivismo
ou na emoção política.

88. As lacunas da Constituição e a sua integração

1. A lei constitucional não regula tudo quanto dela deve ser objeto.
2. Não há uma plenitude ou completude da ordem constitucional como não há uma
plenitude ou completude da ordem jurídica em geral. Há lacunas e há mesmo situações
extrajurídicas por vezes chamadas “lacunas absolutas”. Não serão sempre as mesmas,
poderão reduzir-se ou ser transitórias e depender de circunstâncias em evolução, mas
parecem inevitáveis.
3. As lacunas constitucionais não se confundem com as omissões legislativas, cujo não
preenchimento determina inconstitucionalidade por omissão.
4. As lacunas são situações constitucionalmente relevantes não previstas. As omissões
legislativas reportam-se a situações previstas. As lacunas são detetadas pelo intérprete e
pelos órgãos de aplicação do Direito.
5. O preenchimento de lacunas significa a determinação da regra para aplicação ao caso
concreto e é tarefa do intérprete e do órgão de aplicação.
6. A ausência do prazo para o Presidente da República promulgar as leis de revisão
constitucional é um exemplo paradigmático da lacuna na Constituição.

∾ A aplicação de normas constitucionais no tempo

89. A superveniência das normas constitucionais

1. Trate-se de Constituição nova ou de revisão constitucional, todas as novas normas


constitucionais entram em vigor na mesma data.
2. Os fenómenos jurídicos decorrentes da superveniência de normas constitucionais podem
sintetizar-se do seguinte modo: ação da Constituição nova sobre a anterior; ação de
normas constitucionais novas sobre normas constitucionais anteriores; ação de
Constituição nova sobre normas ordinárias anteriores não desconformes com ela; ação
de normas constitucionais novas sobre normas ordinárias anteriores desconformes.
3. Pode ainda ocorrer: subsistência de normas constitucionais anteriores; subsistência de
normas ordinárias contrárias às novas normas constitucionais; subsistência de normas
constitucionais anteriores, com a força de normas de direito ordinário.
4. Obviamente, as normas constitucionais, como quaisquer normas jurídicas, destinam-se a
valer para o futuro.

90. Direito constitucional novo e Direito constitucional anterior

1. Uma Constituição nova revoga a Constituição anterior. Por definição, não pode haver
senão uma Constituição.
2. Esta revogação é uma revogação global ou de sistema.
3. Em algumas circunstâncias, normas constitucionais anteriores à nova Constituição
podem continuar em vigor nessa qualidade, se bem que a título secundário. É o
fenómeno da receção material.
4. Tendo havido receção material se a constituição que a ópera vem a ser substituída por
outra, as normas constitucionais recebidas cessam necessariamente de vigorar também.
Cessam de vigorar não por revogação verdadeira e própria, mas por caducidade ou por
revogação consequente.
5. Certas normas constitucionais anteriores podem não deixar de vigorar com a entrada em
vigor da nova Constituição, podem passar de categoria de normas constitucionais a
normas de direito ordinário.

91. Direito constitucional novo e Direito ordinário anterior

1. Uma Constituição nova nunca faz tábua rasa do Direito ordinário anterior. Há sempre
fatores de continuidade que sobrelevam os de descontinuidade.
2. O que a superveniência de uma Constituição provoca é novação do Direito ordinário
interno anterior. Como todas e cada uma das normas retiram a sua validade, direta ou
indiretamente, da Constituição, a mudança de Constituição acarreta mudança de
fundamento de validade.
3. Há assim uma nítida diferença entre a situação do Direito constitucional anterior – o qual
cessa com a entrada em vigor da nova Constituição – e a do Direito ordinário anterior –
o qual continua, co novo fundamento da validade.

92. A subsistência do Direito ordinário não contrário à Constituição

1. A subsistência de quaisquer normas ordinárias anteriores à nova Constituição depende


de um único requisito: que não sejam desconformes com ela.
2. Não importa que as leis fossem inconstitucionais material, orgânica ou formalmente
antes da entrada em vigor da Constituição. Importa apenas que não disponham contra
esta.

∾ A aplicação das normas constitucionais no espaço

95. Constituição e território do Estado

1. O postulado geral é a aplicação da Constituição material e formal em todo o território do


Estado, seja qual for a forma que o Estado revista. A cada Estado a sua Constituição.
2. Já fora do território do Estado, mas em território que com o Estado conserve algum
vínculo jurídico específico a situação se apresenta diversa. O modo de encarar a possível
aplicação da Constituição há de depender aqui da natureza bastante variável desse
vínculo e das especialidades a atender.

96. A aplicação das normas constitucionais no estrangeiro

1. A territorialidade da ordem jurídica de cada Estado diz respeito apenas à execução. Não
implica que o Direito de cada Estado regule apenas atos e factos ocorridos no seu
território – pois pode regular atos e factos ocorridos e situações constituídas no
estrangeiro.
2. Segundo o art.º 14º da Constituição, os cidadãos portugueses que se encontrem ou
residam no estrangeiro gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres que não sejam
incomparáveis com a ausência do país.
3. A regra de proteção reporta-se, antes de mais, ao instituto de proteção diplomática dos
cidadãos de qualquer Estado no estrangeiro tal como, tradicionalmente, decorre do
Direito das Gentes.
4. A par de permanência do direitos fundamentais dos portugueses fora do território
português, a Constituição estabelece o princípio da extensão desses direitos aos
estrangeiros em Portugal, se bem que com restrições.
5. No concernente aos titulares de órgãos do Estado, se se encontrarem fora do território
nacional, manterão, em princípio, as situações funcionais contempladas na Constituição,
entendidas, porém, nos termos do Direito internacional.
6. No que toca aos funcionários e agentes do Estado, não deixam eles de, no estrangeiro,
estar adstritos aos seus deveres e responsabilidades constitucionais. É o caso em especial
dos agentes diplomáticos e dos militares.

Parte III Direitos fundamentais

Título I – A problemática dos direitos fundamentais

Capitulo I → Sentidos Dos Direitos Fundamentais p.229-238

98. Direitos fundamentais e direitos do homem

1. Por direitos fundamentais entendemos os direitos ou as posições jurídicas ativas das


pessoas enquanto tais, individual ou institucionalmente consideradas, assentes na
Constituição.
2. Esta noção implica três pressupostos ou condições firmes: → Em primeiro lugar, não há
direitos fundamentais sem reconhecimento de uma esfera própria de autonomia das
pessoas frente ao poder político, não absorvendo este a sociedade em que eles se movem.
→ Em segundo lugar, não há verdadeiros direitos fundamentais sem que as pessoas
estejam em relação imediata com o poder político, beneficiando de um estatuto comum e
não separadas em razão dos grupos ou das instituições a que pertençam; não há direitos
fundamentais sem Estado ou, pelo menos, sem comunidade política integrada; não há
direitos fundamentais sem Estado que os respeite ou que os proteja. → Em terceiro
lugar, não há direitos fundamentais sem Constituição.

99. Os direitos fundamentais na história


1. São bem conhecidas quatro grandes diferenciações de compreensão e extensão dos
direitos das pessoas, as quais revertem em sucessivos períodos de formação.
2. A primeira consiste na distinção entre liberdade dos antigos e liberdade dos modernos, a
maneira de encarar a pessoa na Antiguidade e a maneira de a encarar a partir do
Cristianismo. Para os antigos, a liberdade é, antes de mais, participação na vida da
Cidade; para os modernos, antes de mais, realização da vida pessoal.
3. A segunda refere-se à tutela dos direitos própria da Idade Média e do Estado estamental
e à tutela dos direitos própria do Estado moderno.
4. A terceira contraposição dá-se entre direitos, liberdades e garantias e direitos sociais.
5. A quarta e última distinção prende-se com a proteção interna e a proteção internacional
dos direitos do homem.
6. Em rigor, a primeira e a segunda fase são de pré-história e apenas as seguintes de
história dos direitos fundamentais.

100. Direitos e valores

1. A Constituição portuguesa não ignora valores fundamentais: a dignidade da pessoa


humana e a dignidade social; a solidariedade; a inviolabilidade da vida humana, da
dignidade moral e física das pessoas e da liberdade de consciência, religião e culto; o
desenvolvimento e a realização pessoal; “a maternidade e a paternidade constituem
valores sociais eminentes”; a autonomia pessoal e a tolerância, a compreensão mútua e a
responsabilidade.

Capitulo II → Conceitos Afins E Categorias De Direitos Fundamentais p.238-258

Título II – O atual sistema português dos direitos fundamentais

Capitulo I → A Constituição E Os Direitos Fundamentais p.259-284

112. A Constituição e os direitos fundamentais

1. A Constituição divide os direitos fundamentais em direito, liberdades e garantias e em


direitos económicos, sociais e culturais.
2. A designação complexa direitos, liberdades e garantias não é corrente no estrangeiro. Ela
traduz bem direitos que envolvem direitos de liberdades, garantias, direitos políticos e
outros direitos, num evidente esforço de alargamento. Quanto à designação, direitos
económicos, sociais e culturais, ela corresponde às categorias genéricas dos direitos
sociais.
3. Seja como for, a bifurcação assim aberta dos direitos fundamentais encontra-se em quase
todas as Constituições feitas após a primeira guerra mundial ou, pelo menos, na
legislação ordinária de quase todos os países.

113. A abertura a novos direitos fundamentais

1. Não se depara no texto constitucional um elenco taxativo de direitos fundamentais. Pelo


contrário, a enumeração é uma enumeração aberta, sempre pronta a ser preenchida ou
completada.
2. Porque vivemos, não em Estado liberal, mas sim em Estado social de Direito, os direitos
económicos, sociais e culturais podem e devem ser dilatados ou acrescentados para além
dos que se encontrem declarados.
114. Os deveres da Constituição

1. À larga cópia dos direitos da Constituição de 1976 corresponde uma extensão de deveres
sem paralelo noutras Constituições europeias.
2. Na parte I encontram-se os seguintes deveres: o dever de obediência às leis e às ordens
das autoridades públicas que não ofendam os direitos, liberdades e garantias (art. 21.º, 1ª
parte), os deveres dos cônjuges (art. 36.º, nº3), o dever dos pais de educação e
manutenção dos filhos (art. 36.º, nº5 e 6), o dever de escolaridade básica (art. 74.º nº2,
alínea A), o dever de preservar, defender e valorizar o património cultural (art. 78.º, nº1).
Na parte II: o dever de pagamento de impostos (art. 103.º). Na parte III: o dever de
recenseamento eleitoral (art. 113.º, nº2), o dever de colaboração com a administração
eleitoral (art. 113.º, nº4), o dever de serviço militar ou cívico (art. 276.º, nº2 a 5). ⦁ Dos
deveres distinguem-se outras figuras constantes da Constituição: as restrições, os limites
e os condicionamentos, as proibições, as vedações de atividades, as medidas
compulsivas.
3. Os deveres existem em si mesmo, com maior ou menor autonomia. As restrições, os
limites e os condicionamentos situam-se no regime dos direitos – as restrições afetam o
seu conteúdo; os limites e os condicionamentos afetam o seu exercício.
4. As proibições revestem natureza objetiva. Embora tenham por destinatários também os
cidadãos, não se inserem na sua esfera jurídica. Simplesmente, de fora impedem-nos de
agir ou de adotar este ou aquele comportamento.
5. A imposição de deveres não tem como única contrapartida uma situação ativa ou de
vantagem da parte do Estado ou de outra entidade pública. Tem ou pode ter também uma
face passiva ou de obrigação. Tanto existem incumbências do Estado de organização ou
de procedimento por causa de direitos como por causa de deveres dos cidadãos.
6. De natureza de todo em todo diferente da do dever geral de respeito dos cidadãos uns
para com os outros é a tarefa do Estado de proteção e efetivação dos direitos
fundamentais com concretizações específicas em incumbências variadas quer no
domínio dos direitos sociais.
7. Verdadeiros deveres do Estado: são os de indemnização por ações ou omissões
praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício e que resulte
violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem, por privação de
liberdade contra o disposto na Constituição e na lei e pelos danos sofridos por
condenação criminal injusta; e o dever de esclarecer objetivamente os cidadãos sobre os
atos do Estado e das demais entidades públicas.

117. Estado de Direito

1. Não basta enumerar, definir, explicitar, assegurar só por si direitos fundamentais; é


necessário que a organização do poder político e toda a organização constitucional
estejam orientados para a sua garantia e a sua promoção.
2. É necessário que se não verifique incompatibilidade entre o elemento subjetivo e o
elemento objetivo da Constituição; que os direitos fundamentais tenham um quadro
institucional de desenvolvimento; que se faça através da divisão do poder.
3. Estado de Direito não equivale a Estado sujeito ao Direito, porque não há Estado sem
sujeição ao Direito no duplo sentido de Estado que age segundo processos jurídicos e
que realiza uma ideia de Direito, seja ela qual for. Estado de Direito só existe quando
esses processos se encontram diferenciados por diversos órgãos, de harmonia com um
princípio de divisão do poder, e quando o Estado aceita a sua subordinação a critérios
materiais que o transcendem; só existe quando se dá limitação material do poder
político; e esta equivale a salvaguarda dos direitos fundamentais da pessoa humana.
4. Estado de Direito democrático traduz a confluência de Estado de Direito e democracia.

Capitulo II → O Regime Dos Direitos Fundamentais p.284-323

118. Os grandes princípios constitucionais

1. O regime dos direitos fundamentais consistes num conjunto de princípios


complementados por algumas regras, e deve ser analisado em 3 níveis: regime comum a
todos os direitos fundamentais; regime específico dos direitos, liberdades e garantias e
regime específico dos direitos económicos, sociais e culturais.
2. Princípios comuns a todos os direitos são: o princípio da universalidade, da igualdade, da
proporcionalidade, da proteção da confiança, da eficácia jurídica dos direitos
fundamentais, da tutela jurídica e da responsabilidade civil.
3. Princípios específicos do regime dos direitos, liberdades e garantias: princípio da reserva
de lei, do caráter restritivo das restrições, do caráter excecional da suspensão, da afetação
individual apenas verificados os pressupostos e as garantias da Constituição e da lei, da
autotutela através do direito de resistência e da responsabilidade criminal.
4. Princípios específicos do regime dos direitos económicos, sociais e culturais: princípio
da exigência de efetivação pública, da iniciativa social, da democracia participativa, da
dependência da realidade constitucional e da relativa relevância das condições
económicas dos titulares.

119. Princípios da universalidade

1. O primeiro princípio comum aos direitos fundamentais e também aos demais direitos
existentes na ordem jurídica portuguesa é o da universalidade; todos quantos fazem parte
da comunidade política fazem parte da comunidade jurídica, são titulares dos direitos e
deveres aí consagrados, os direitos fundamentais têm ou podem ter por sujeitos todas as
pessoas integradas na comunidade política, no povo.
2. Todos têm todos os direitos e deveres – princípio da universalidade; todos têm os
mesmos direitos e deveres – princípio da igualdade. O princípio da universalidade diz
respeito aos destinatários das normas, o princípio da igualdade ao seu conteúdo. O
princípio da universalidade apresenta-se essencialmente quantitativo, o da igualdade
essencialmente qualitativo.

121. O princípio da igualdade no Direito positivo português

1. O princípio da igualdade aparecia em todas as Constituições portuguesas anteriores, em


moldes, porém, nem sempre idênticos.
2. A Constituição, no texto inicial, não continha a explicação da igualdade de direitos de
homens e mulheres por tal se entender desnecessário.

122. Sentido da igualdade

1. A análise dos princípios da igualdade tem de assentar em 3 pontos firmes: que a


igualdade não é identidade e igualdade jurídica não é igualdade natural ou naturalística;
que a igualdade significa intenção de racionalidade e, em último, termo, intenção de
justiça e que a igualdade não é uma “ilha”, encontra-se conexa com os outros princípios,
tem de ser entendida no plano global dos valores, critérios e opções da Constituição
material.
2. Privilégios são situações de vantagem não fundadas e discriminações situações de
desvantagem.
3. Não se trata apenas de proibir discriminações, trata-se também de proteger as pessoas
contra discriminações.

124. Princípio da proporcionalidade

1. A ideia de proporcionalidade é conatural às relações entre as pessoas: a reação deve ser


proporcional à ação e a distribuição das coisas deve fazer-se com justiça.
2. O apelo à proporcionalidade surge quando há dois ou mais bens jurídicos carecidos de
realização e sobre os quais, ocorra ou não conflito, tenha de procurar-se o equilíbrio, a
harmonização, a ponderação, a concordância prática.

128. A aplicação imediata dos direitos fundamentais

1. Nem todas as normas sobre direitos, liberdades e garantias são imediatamente


executáveis. Não o são, por exemplo, as relativas às garantias contra a utilização abusiva
de informações de pessoas, à objeção de consciência e até ao próprio direito de sufrágio.
2. O princípio da aplicação imediata não envolve apenas o dever de respeito.

131. A limitação recíproca dos direitos

1. Porque as pessoas convivem na mesma comunidade e ainda porque os direitos


pertencem ao mesmo sistema, os direitos de cada pessoa têm por limites os direitos das
demais pessoas e o conteúdo de cada direito tem por fronteiras o conteúdo de outros
direitos.
2. O dever de respeito entre as pessoas não impede colisões de direitos e também elas
surgem no domínio dos direitos fundamentais.
3. São conflitos de direitos diferentes de pessoas diferentes. Mas, a seu lado, pode haver
conflitos entre direitos iguais de diferentes pessoas. Assim como pode haver conflitos de
direitos da mesma pessoa. E ainda conflitos entre direitos e interesses difusos.
4. Não se encontra na Constituição nenhuma diretriz de solução. Mas as diretrizes
provenientes do Código Civil de 1867 e do Código Civil de 1966 podem ser úteis.

132. A tutela jurídica e acesso ao direito

1. A primeira forma de defesa dos direitos é a que consiste no seu conhecimento. Só quem
tem consciência dos seus direitos consegue usufruir os bens a que eles correspondem e
sabe avaliar as desvantagens e os prejuízos que sofre quando não os pode exercer ou
efetivar ou quando eles são violados ou restringidos.
2. O art. 20.º da Constituição de 1976 assegura a todos “o acesso ao direito”.

133. A tutela jurisdicional dos direitos fundamentais

1. O eficaz funcionamento e o constante aperfeiçoamento da tutela jurisdicional dos


direitos das pessoas são sinais de civilização jurídica.
2. No plano objetivo, o princípio das tutelas jurisdicional envolve: o princípio do
contraditório; o princípio do juiz natural e legal; o princípio da independência dos
tribunais e dos juízes; o princípio da fundamentação das decisões que não sejam de mero
expediente; o respeito pelo caso julgado.
3. E também envolve: a adequada proteção do segredo de justiça e a publicidade das
audiências dos tribunais.
4. Os direitos sociais são também suscetíveis de tutela através dos tribunais, embora em
moldes mais circunscritos do que os dos direitos liberdades e garantias.
5. Manifestações especiais de tutela jurisdicional são: o procedimento judiciário com
prioridade e celeridade para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais; a revisão
de sentenças criminais injustas; a tutela jurisdicional de interesses difusos.
6. Tutela jurisdicional não significa o mesmo que tutela judicial.

Funções do Estado p.135-150

49. As grandes correntes doutrinais acerca da natureza ou essência do Estado

• São 2 os sentidos possíveis de função do Estado:

- como fim, tarefa ou imperativo ou opção de agir, correspondente a certa necessidade coletiva ou
acerta zona da vida social;

- como atividade com características próprias, passagem a ação, modelo de comportamento.

• No 1º sentido: - a função traduz um determinado enlace entre a sociedade e o Estado, assim


como um princípio de legitimação do exercício do poder. A crescente complexidade das funções
assumidas pelo Estado (de garantia da segurança, da justiça e da paz civil à promoção do bem-estar,
da cultura e da defesa do ambiente) decorre do alargamento das necessidades humanas, das
pretensões de intervenção dos governantes e dos meios de que se podem dotar; e é ainda uma
maneira de o Estado ou os governantes em concreto justificarem a sua existência ou a sua
permanência no poder.

- a função não tem apenas que ver com o Estado enquanto poder; tem também que ver com o
Estado enquanto poder, tem também que ver com o Estado enquanto comunidade. Tanto pode ser
prosseguida só pelos seus órgãos e serviços através das chamadas políticas públicas como ser
realizada por grupos e entidades da sociedade civil, em formas vadiares de complementaridade e
subsidiariedade.

- a função traduz-se depois em incumbências quer para a proteção e promoção de direitos


fundamentais quer para conformação de sectores da vida coletiva.

• No 2º sentido: - a função entronca nos atos e atividades que o Estado constantemente vai
desenvolvendo, de harmonia com as regras que o condicionam e conformam; define-se através das
estruturas e das formas desses atos e atividades; e revela-se indissociável da pluralidade de processos
e procedimentos, de sujeitos e de resultados de toda a dinâmica jurídico-pública.

- a função não é outra coisa senão uma manifestação qualificada do poder político, um modo
tipificado de exercício do poder, e carece de ser apreendida numa tríplice perspetiva-material,
formal e orgânica.

- a função é o modo específico como o Estado procura atingir os fins prescritos na Constituição e
na lei, o modo como se desincumbe das imposições que delas recebe.
• Exibe-se ainda um elemento finalístico: diretamente, na função como tarefa; indiretamente, na
função como atividade.

50. A função no sentido de atividade!

• A função no sentido de atividade pode definir-se como um complexo ordenado de atos,


destinados à prossecução de um fim ou de vários fins conexos, por forma própria. Consiste na
atividade que o Estado desenvolve com vista à realização das tarefas e incumbências que lhe cabem.

• Cada função oferece 3 características:

a) é especifica ou diferenciada pelos seus elementos materiais, formais e orgânicos;

b) é duradoura;

c) é globalizada.

• São os fins do Estado que determinam o tipo e a feição das atividades dos seus órgãos e agentes, e
são as normas jurídico-públicas que as qualificam como atividades do Estado.

• Se as funções do Estado dependem das normas que as regem, então todas as funções do Estado
não podem deixar de ser funções jurídicas e todos os atos em que se desdobram atos jurídico-
públicos.

• Não há atividade do Estado à margem do Direito.

• A conceituação do proferido das funções acompanha o desenvolvimento das teorias do Estado e


do Direito público. No entanto, o problema vem de há muito, conexo com os problemas das
características dos fins e dos poderes do Estado.

• Torna-se possível propor algumas verificações:

a) Aparecimento de uma função legislativa, de uma função administrativa ou executiva stricto senso
(sentido restrito) e de uma função jurisdicional, ainda que com diferentes relacionamentos;

b) correlação ou dependência das classificações das orientações teóricas globais perfilhadas pelos
autores;

c) relatividade histórica ou dependência também da experiência histórica e da situação concreta do


Estado;

d) reconhecimento de que se procede a classificação de atos jurídico-públicos.

51. Classificação adotada: funções fundamentais e funções complementares, acessórias e atípicas

• Na esteira da maior parte dos autores, assentamos numa divisão tricotémica das funções do
Estado - função política, administrativa e jurisdicional. E subdistinguimos na la a função legislativa
e ci função governativa ou política stricto sensu consoante se traduza em atos normativos. Para
tanto, consideramos quer critérios materiais quer critérios formais e orgânicos.

• Às funções correspondem os seguintes grandes tipos de atos do Estado:

Funções do Estado: Função política; Função legislativa - Atos de conteúdo normativo - Leis: -
Leis constitucionais - Atos constituintes e leis de revisão constitucional;- Leis infraconstitucionais:
- De eficácia externa - Leis stricto sensu

- De eficácia interna - Regimentos de órgãos políticos

- Função governotivo ou stricto sensu - Atos de conteúdo não normativo - Atos políticos

- Atos do povo ativo:

- Eleições; Referendos (não normativos) - Atos de Direito interno

- Atos dos órgãos governativos:

- Atos políticos stricto sensu ou de governo - Atos de Direito internacional

—> Função administrativa.

- Atos de conteúdo normativo; - Atos externos — Regulamentos; Atos internos - Instruções,


estatutos, regimentos de órgãos administrativos, regulamentos internos de serviços; - Atos de
conteúdo não normativo: - Unilaterais - Atos administrativos, outros atos da Administração ou
Bilaterais - Contratos administrativos

-, Função jurisdicional - Atos jurisdicionais ou sentenças latissimo sensu: Atos de conteúdo


normativo - declarações de inconstitucionalidade e de ilegalidade;- Atos de conteúdo não normativo
- Sentenças medio sensu e decisões interlocutórias

• Verifica-se que no exercício de qualquer das 3 grandes funções do Estado se praticam os atos
normativos. Eles não se reduzem às leis nem sequer aos regulamentos. Para nós, ato normativo é
ato de conteúdo geral, se bem que a generalidade não seja dele exclusiva e se depare no ato
administrativo geral e até em certos atos políticos ou de governo. No ato normativo os destinatários
são indefinidos ou indetermináveis, e recortam-se em abstrato, sem aceção de pessoas. Já no ato
administrativo geral, por mais alargados que sejam os destinatários, eles circunscrevem-se e são
sempre determináveis a posteriori, pois no momento da execução do ato procede-se à sua
individualização, tendo em conta os respetivos interesses mais ou menos diferenciados.

•A generalidade inerente à norma liga-se à não instantaneidade, à repetitividade, a uma dimensão


temporal, a "uma pretensão imanente de duração" a uma "vigência sucessiva". A norma aplica-se a
um número indefinido de vezes a uma pluralidade de pessoas; o ato administrativo geral, uma só
vez. A execução da norma não a esgota, nem a consome, afirma-a; o ato administrativo geral
esgota-se numa única aplicação. A norma envolve a distinção entre o momento da sua emanação e
o momento do seu cumprimento; é um padrão de comportamento e de solução, um quadro de
referência que, estabelecido agora, se projeta no tempo; e, precisamente por isso, uma norma pode
dirigir-se a um único destinatário de cada vez.

• Só o ato legislativo compreende livre iniciativa, livre escolha do objeto, livre conformação do
conteúdo e livre modificabilidade.

52. A função política

• A configuração de cada uma das funções acabadas de esquematizar em qualquer Estado em


particular relaciona-se com a forma (unitária ou complexa) de enlace do povo, poder político e
território e com a ideia de Direito aí dominante, com a sua Constituição. Observam-se, pois,
iniludíveis variações e inflexões de pais para país quanto aos fins e à estrutura dos atos e quanto aos
órgãos competentes para os emanar.
• Se os órgãos administrativos e os jurisdicionais hoje se aproximam, mais ou menos, por toda a
parte, já as instituições políticas são apenas aquelas que a Constituição cria em cada caso, em
sintonia com a forma e o sistema de governo que consagra.

• A problemática dos atos de governo ou atos políticos stricto sensu surgiu, no século XIX, no
âmbito da (não) apreciação de atos do Poder Executivo por órgãos jurisdicionalizados. Eles eram
os atos excluídos dessa apreciação, fosse qual fosse o fundamento apresentado. A doutrina de
Direito constitucional viria a abrir um caminho diferente, de sinal positivo, e que acabaria por
prevalecer: o da distinção entre um poder administrativo e um poder governamental. No século
XX, ir-se-iam afastando ainda mais os dois campos e, ao mesmo tempo, ir-se-iam aproximando os
atos de governo dos atos legislativos. Reconhecemos o risco de, com a associação das funções
legislativa e govemativa, se afetar o sentido mais tradicional de lei.

• A lei não se confunde com o Direito; ela é apenas, em cada instante, uma das suas expressões e o
Direito envolve-a e ultrapassa-a. A função governativa participa dos mesmos valores e do mesmo
enquadramento institucional da função legislativa. Nenhuma das decisões em que se desdobra pode
aperceber-se ou deixar de ser apreciada à sua margem.

53. A função administrativa e a função jurisdicional

• Através da função administrativa realiza-se a prossecução dos interesses públicos


correspondentes às necessidades coletivas prescritas pela Lei, sejam esses interesses da comunidade
política como um todo ou interesses com os quais se conjugam relevantes interesses sociais
diferenciados. Na função jurisdicional define-se o Direito em concreto, perante situações da vida, e,
em abstrato, na apreciação de constitucionalidade e da legalidade de atos jurídicos. Donde:

- O interesse público como causa dos atos da função administrativa; e o cumprimento das normas
jurídicas como causa dos atos da função jurisdicional; Uma postura essencialmente volitiva e
prospetiva da administração; uma postura essencialmente intelectiva e retrospetiva, da jurisdição;Na
função administrativa, o predomínio da componente autoritária, mesmo se tem de se compaginar
com a crescente afirmação de garantias dos administrados e com formas associativas de
organização; e na função jurisdicional a prevalência do principio do contraditório, mesmo se nem
sempre o processo é concebido como processo de partes;A maior liberdade relativa dos órgãos da
função administrativa, com gradações várias no caso do chamado "poder discricionário", ainda que
o princípio da legalidade implique conformidade dos atos com a lei e nunca o interesse público se
lhe possa sobrepor.

• Para se compreender melhor o alcance das duas funções no âmbito do ordenamento jurídico,
importa acrescentar 3 pontos: - não deve tomar-se à letra ou exagerar-se o seu caráter executivo; -
se a lei ordinária não pode conceber-se como mera execução da Constituição, não raro aparece
referida a certas e determinadas normas constitucionais, para as regulamentar ou para as concretizar
e lhes conferir exequibilidade;- se bem que o poder político se ostente de modo mais forte, mais
intenso e mais impressivo na feitura das leis e nas decisões de governo, não deixe de se manifestar
igualmente na função administrativa e na função jurisdicional. A administração apresenta-se como
poder. É o poder do juiz não é um poder nulo ou neutro, muito menos o do juiz constitucional. A
justiça é administrada "em nome do povo", o que significa que o juiz se deve fazer também
intérprete da intenção jurídico-social da comunidade.

Tão-pouco pode ignorar-se a significação política que assumem muitos dos atos tanto da função
administrativa como da função jurisdicional. Isto sem atender às pré-compreensões, conotações ou
implicações metajuridícas a que nunca conseguem subtrair-se os titulares de órgãos de uma e outra
função.

54. Zonas de fronteira e funções complementares, acessórias e atípicas Estado corno pessoa
coletiva

Os atos próprios de cada função devem provir de órgãos correspondentes a essa função. Todavia,
encontram-se algumas inevitáveis zonas cinzentas. Por um lado: A "justiça administrativa", por
meio da qual a Administração pública é chamada a proferir decisões essencialmente baseadas em
critérios de justiça material. Por outro lado: A jurisdição voluntária, que consiste em atos
substancialmente administrativos revestidos de forma judicial; - A fiscalização financeira a cargo
dos Tribunais de Contas, traduzida, por exemplo, em Portugal, no "visto prévio" a atos geradores
de despesas;- A admissão pelos tribunais das candidaturas a titulares de órgãos eletivos;- A
elaboração pelos tribunais de regulamentos internos necessários ao seu bom funcionamento; - Os
atos produzidos ao abrigo das competências administrativas dos presidentes dos tribunais; - Em
geral, os atos de execução pelos tribunais das suas próprias decisões.Por outro lado, ainda:

- A verificação dos poderes dos membros dos Parlamentos pelas próprias câmaras;

- A decisão do Presidente de qualquer das Câmaras, eventualmente com recurso para o Plenário,
sobre a admissão ou rejeição de projetos e propostas de lei tendo em conta a sua conformidade
com a Constituição.

Por significativos que sejam estes atos, não são eles que individualizam as funções do Estado ou
que afetam o núcleo especificador dos órgãos a que são cometidos. Do que se trata é de aproveitar
características, requisitos e garantias formais de certa atividade em nome de outros princípios
politica-constitucionais, ou de proporcionar condições para o cabal exercício de certa função, ou de
praticar atos complementares de atos próprios de certa função e a ela indispensáveis. E,
evidentemente, uma coisa é a função, outra coisa a competência de um órgão, na qual podem entrar
faculdades decorrentes e de funções diversas.

• Cumpre reconhecer que nem todos os atos e atividades do Estado se reconduzem às funções
fundamentais clássicas. É o que sucede com a atividade do Ministério Público, que não se integra na
administração nem na jurisdição (apesar da atividade estruturalmente conexada com a dos
tribunais). O Ministério Público deve colaborar com o tribunal na descoberta da verdade e na
realização do direito, obedecendo em todas as intervenções processuais a critérios de estrita
objetividade. E, dotado de estatuto próprio é de autonomia, serve de anteparo da independência
dos tribunais sem com estes se confundir (Artigo 219 n.2 CRP).

Também a atividade do Provedor de Justiça parece estar fora das funções clássicas, ao receber
queixas por ações ou omissões de poderes públicos, apreciando-as sem poder decisório e dirigindo-
as aos órgãos competentes as recomendações necessárias para prevenir e reparar injustiças. Citem-
se, ainda, as atividades de regulação de certas entidades independentes da Administração: a
Comissão Nacional das Eleições (enquanto assegura a igualdade dos cidadãos eleitores e das
candidaturas), ou a Comissão Nacional para a Proteção de Dados (na medida em que pode emitir
diretivas, assegura o acesso à informação e o exercício do direito de retificação e atualização e
promove códigos de conduta), ou a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (quando emite
diretivas).
• Problema de algum modo ainda de limites - entre a função legislativa e jurisdicional - era, em
Portugal, o da natureza dos assentos do Supremo Tribunal de Justiça (bem como do Tribunal de
Contas).

Capitulo ll --h Atos jurídico-constitucionais p.150-179

12 ATOS JURÍDICOS CONSTITUCIONAIS

55. Atos jurídico-públicos e atos jurídico-constitucionais

Às diversas funções do Estado correspondem diferentes categorias de atos nomeadamente, leis


(constitucionais e ordinárias), atos de governo, eleições e referendos, regulamentos, atos
administrativos, contratos administrativos e outros contratos públicos, atos jurisdicionais ou
sentenças latissimo sensu.

• Todos estes atos integram um conjunto, o dos atos jurídico-públicos - que são os Atos do Estado
no exercício de um poder público e sujeitos a normas de Direito público. A estes atos contrapõem-
se quer os atos de gestão privada quer os atos dos particulares, inclusive os praticados no exercício
ou no âmbito de direitos políticos.

• No conjunto dos atos jurídico-públicos avultam os atos jurídico-constitucionais. Numa definição


formal, os atos jurídico-constitucionais dizem-se os atos cujo estatuto pertence ao Direito
constitucional; os atos regulados por normas da Constituição; ou ainda, os atos provenientes de
órgãos constitucionais e com a sua formação adstrita a normas constitucionais. Em relação à noção
material, não é incorreto reconduzi-los a atos de relevância constitucional.

• Conjugando as noções, ficam como atos jurídico-constitucionais os atos da função política-


legislativa e govemativa. São tais atos os únicos que a Constituição específica e visa disciplinar em
articulação com as competências próprias dos órgãos e dos colégios eleitorais que institui; aqueles
que à Constituição estão direta e imediatamente subordinados; aqueles através dos quais se
projetam as opções político-constitucionais ou a ideia de Direito arrimada na Constituição; aqueles
a respeito dos quais suscitam problemas de inconstitucionalidade. (artigo 119, n.1 CRP).

56. Pressupostos, elementos, requisitos

• Na análise de qualquer ato jurídico-constitucional podem ser considerados pressupostos,


elementos e requisitos. Os pressupostos vêm a ser condições prévias e exteriores ao ato, de que
depende a sua existência ou formação. Os elementos são partes integrantes do ato, definidoras do
seu modo de ser ou da sua estrutura. Os requisitos são os pressupostos e os elementos tomados
não tanto da perspetiva da estrutura quanto dada sua conformidade com a norma jurídica e da
apreciação que esta faz sobre eles.

• O pressuposto mais importante é a competência, que implica as seguintes 3 exigências:

a) Que o ato dimane de um órgão do Estado (ou das regiões autónomas);

b) Que o ato dimane de um órgão competente em razão da matéria;

c) Que o ato dimane de um órgão competente em razão dos outros fatores de competência
(tempo, lugar, pessoas).
• Qualquer ato jurídico é uma manifestação de vontade jurídica relevante, e não há vontade sem
objeto e sem forma. Daí que, igualmente no ato jurídico-constitucional possam ser apontados 3/4
elementos essenciais:

a) A vontade;

b) O objeto (imediato - realidade jurídica sobre a qual o ato incide; mediato - a realidade de facto
que lhe subjaz);

c) O fim (que o órgão prossegue através do ato);

d) A forma, declaração ou exteriorização da vontade.

• A autonomia do terceiro elemento (fim) afigura-se muito relativa devido ao caráter funcional da
vontade, e é sobretudo discutível nos atos normativos.

• Quanto aos requisitos, aparecem no plano dos valores, interesses e finalidades que a ordem
constitucional liga aos pressupostos e aos elementos do ato. Reportam-se tanto à garantia do
interesse público como à proteção dos direitos e interesses dos cidadãos que por ele possam vir a
ser atingidos. Correspondem à apreciação, variável de ato para ato, que a ordem constitucional faz
da presença ou ausência desses pressupostos e elementos, às vezes também em graus variáveis.
Cabe então falar em:

a) Requisitos orgânicos - os que se prendem com a competência;

b) Requisitos materiais - os que se prendem com a vontade e o objeto;

c) Requisitos formais - os que se prendem com a forma.

É possível agrupar os requisitos orgânicos e formais contrapondo-os aos requisitos materiais; e


enquanto estes têm que ver com o sentido é o conteúdo do ato, os primeiros têm que ver com a sua
formação e manifestação. Há ainda 3 categorias de requisitos:

a) Requisitas de qualificação ou requisitos de recondução ou de subsunção do ato em qualquer


dos tipos constitucionais de ato estabelecido;

b) Requisitos de validade ou requisitos de perfeição do ato ou de plena virtuairaaae ae produção dos


seus efeitos jurídicos típicos;

c) Requisitas de regularidade ou requisitos de adequação do ato às regras constitucionais


independentemente da produção dos seus efeitos.

Os primeiros requisitos precedem os restantes. E, assim, a preterição dos requisitos de qualificação


acarreta inexistência jurídica do ato; a dos requisitos de validade invalidade; e a dos requisitos de
regularidade mera irregularidade. Num plano diferente ficam os requisitos de eficácia dos efeitos do
ato, através da obtenção de condições positivas ou da superação de obstáculos.

• Os valores jurídicos do ato jurídico-constitucional ou graus de apreciação ou de assimilação dele


pela ordem constitucional não significam senão diferentes valorações, tomando os requisitos como
critérios de conformidade com a Constituição.

• O conceito abrange a inexistência jurídica, a invalidade e a irregularidade. contudo, a invalidade


desdobra-se classicamente em nulidade e anulabilidade, revestindo configurações mistas, poliédricas
ou atípicas; assim como nada impede que a Constituição venha a considerar feridos de inexistência
jurídica atos que ofendam normas constitucionais de importância elevada.

57. Atos de produção sucessiva, processo, procedimento~

Muitos dos atos jurídico-constitucionais surgem a partir de um iter mais ou menos longo e
multifacetado, são atos complexos de produção sucessiva: antes de mais, as leis e também as
eleições, os referendos e certos atos políticos stricto sensu ou de governo. Cada um destes atos
jurídico-constitucionais analisa-se em:

a) Uma pluralidade de atos simples e até de atos simples e complexos;

b) Atos que se sucedem no tempo ou que se inserem numa sequência temporal;

c) Atos praticados por vários órgãos ou sujeitos ou em que interferem ou podem ser chamados a
interferir diversos órgãos ou sujeitos;

d) Atos relativamente autónomos ou autonomizáveis;

e) Atos interdependentes e coordenados entre si, mesmo se dotados de sentidos discrepantes;

f) Resultado traduzido num ato jurídico complexo que engloba ou substitui os sucessivos atos
parcelares precedentes.

Numa fórmula sintética, a doutrina emprega para os designar as locuções processo e procedimento.
O termo processo acha-se ligado à função jurisdicional. Os tribunais desenvolvem a sua atividade
através de processo. Ao processo corresponde o Direito processual. Não é apenas a função
jurisdicional que implica atos de produção sucessiva, compreende-se que o termo tenha sido
transposto para o âmbito da função administrativa: as decisões administrativas são precedidas de
uma série de formalidades previstas na lei para garantia da prossecução do interesse público e dos
direitos dos administrados. E, a par do processo jurisdicional e do administrativo passou a falar-se
em processo legislativo. Daí a distinção entre processo (em sentido restrito), o processo
jurisdicional, e processo (em sentido amplo), suscetível de abranger qualquer das funções do
Estado.

• Tem-se observado que não são assimiláveis a forma da função jurisdicional e das outras
funções do Estado, em virtude de aquela se dirigir ao cumprimento ou à realização do Direito, com
a consequente necessidade de uma regulamentação mais pormenorizada, densa, precisa, rígida e
ritualizada.

• Rogério Soares escreve que a prática de vários atos ao longo de um certo período, com a
intenção de servirem a produção de um resultado único, pode assumir duas formas bem diferentes.
Uma é aquele em que a gradual produção do ato final se desenvolve segundo uma tramitação, ou
seja, segundo um conjunto de atos necessários e minuciosamente fixados, segundo fórmulas rígidas
de agir; e é para este modo que se usa a expressão processo. Já no procedimento o resultado é um
modelo mais fluido, há um desenvolvimento, uma sucessão que adquire sentido como uma unidade
vista a partir do ato final. E, se o Direito é para o procedimento dos funcionários pressuposto e
limite da sua atuação, para o processo do juiz é o fim primário.

Tende a adotar-se o termo procedimento para descrever a formação dos atos da função
administrativa, bem como a dos atos da função legislativa e da função governativa, deixando a
palavra processo para a função jurisdicional. Por outro lado, realça-se o significado do
procedimento no contexto global do sistema. Para além de uma maior adequação à estrutura
própria da vontade funcional, associa-se-lhe o reforço da transparência e da publicidade das
decisões do Estado. Ele revela-se imprescindível para a participação e a democracia participativa,
quando não para a legitimação dos atos ou do próprio poder. E seria mesmo, doutro prisma, um
instrumento para a conversão da Constituição na ordem dinâmica da comunidade.

Em sintonia com a corrente juspublicística hoje dominante, tenderemos a utilizar a palavra


procedimento. No entanto, não deixaremos de falar em processo, tendo em conta a terminologia
constitucional e por não haver aqui qualquer risco de confusão com o regime do processo inerente
à atividade dos tribunais.

Em Direito administrativo justifica-se bem separar os termos e os conceitos. Já no campo do


Direito constitucional nenhuma dúvida desse género poderia suscitar-se a propósito da formação
das leis ou dos atos políticos. Cada ato inserido no procedimento ou no processo legislativo ou
político tem de ser apreciado, quando à sua validade e à sua regularidade; não há que apreciar só o
resultado final ou o ato em que este se traduz.

Importa distinguir aqui os atos dos órgãos do Estado e os atos do colégio eleitoral ou do povo
ativo - eleição e referendo.

58. Atos tácitos e omissões

Os atos jurídico-constitucionais são, de regra, atos expressos. São muitos raros, em qualquer
Constituição, os atos tácitos. Diferente do ato tácito é o fenómeno da preclusão em que, pelo
decurso do tempo, se esgota ou deixa de poder ser exercido um certo poder.

No ato tácito, a norma presume uma vontade ou liga à não manifestação de vontade certa
consequência. Já na preclusão é a norma que se impõe em face do decurso do tempo, porventura
mesmo inviabilizando uma subsequente manifestação de vontade do órgão: assim, o Presidente da
República, passados 8 dias apoia a receção do diploma para promulgar, já não pode requerer a
fiscalização preventiva da constitucionalidade ou, passados vinte dias, já não poder exercer o veto
político. A vontade é ainda relevante no ato tácito e não na preclusão. Há abstenções que o Direito
trata de outro modo, valorando-as negativamente como comportamentos omissivos ou omissões. E
aqui já não nos encontramos diante de atos jurídico-constitucionais, embora possam elas próprias
provocar a produção de novos atos jurídico-constitucionais.

59. O tempo em Direito constitucional

O tempo desempenha um importantíssimo papel em Direito constitucional: O poder constituinte


material tem a marca do tempo histórico em que se exerce;

- A interpretação evolutiva da Constituição formal, a formação do costume, sobretudo a


sedimentação, o desenvolvimento e a transformação das instituições postulam períodos de tempo
mais ou menos longos; - No tempo se produzem os atos de formação procedimental;

- A aplicação das normas tem uma dimensão de âmbito temporal, produzindo efeitos quer em
relação a normas ordinárias posteriores quer em relação a normas anteriores; A estabilidade
legislativa ou durabilidade razoável das normas que se repercutam em situações jurídicas subjetivas
decorre do princípio da proteção da confiança, imanente ao Estado democrático de Direito; Não
podem ser criados crimes, penas ou mandados de segurança, nem impostos retroativamente;
Também a inconstitucionalidade por omissão só se verifica passado certo tempo após a emanação
da norma constitucional; As Constituições outorgam uma relevância específica ao tempo em
múltiplos domínios quer da estrutura da comunidade política quer da organização do poder - e
aqui com reflexos imediatos sobre atos jurídicos-constitucionais. Basta lembrar as normas sobre
as restrições e suspensão de direitos (art. 18, n.3 e 19.) e sobre não retroatividade da lei penal
(art. 29.) e da lei tributária (art. 103., n.3). Assim como o princípio do sufrágio periódico (art.
10., n.1).

Os prazos constitucionais são de natureza substantiva e são contínuos, não se interno


interrompendo aos domingos, feriado se sábados e fora do funcionamento da Assembleia da
República ou de outro órgão.

ATOS LEGISLATIVOS

60. Aceções de lei

• São múltiplos os sentidos do termo lei em Ciência Jurídica:

a) A lei como norma jurídica, como ordenamento jurídico positivo ou até como Direito;

b) A lei como fonte intencional unilateral de Direito - criação de normas jurídicas por ato de
autoridade dirigido a esse fim - contraposta quer ao costume quer à jurisprudência, quer ainda a
formas convencionais de Direito interno ou de Direito internacional, máxime ao tratado.;

c) A lei como fonte intencional unilateral centralizada ou estatal de Direito - criação do Direito do
Estado por obra de autoridade estatal - contraposta às formas descentralizadas de criação de
Direito, correspondentes aos municípios, a outras comunidades territoriais e às instituições sociais
dotadas de poder normativo, entre as quais as associações públicas e às formas de criação do
Direito próprias de organizações internacionais e de outros sujeitos de Direito internacional;

d) A lei como ato da função legislativa latissimo sensu, independentemente do tempo, do modo,
das regras a que esteja sujeito e dos destinatários, e abrangendo tanto a lei constitucional como a lei
infraconstitucional ou lei ordinária e, nesta, tanto a lei de eficácia predominantemente externa como
interna;

e) A lei como ato da função legislativa lato sensu ou lei ordinária - ato normativo da função política
subordinado à Constituição, tenha eficácia predominantemente externa ou interna;

f) A lei como ato da função legislativa stricto sensu - ato normativo da função política subordinado
à Constituição, tenha eficácia predominantemente externa - ou seja, ato dirigido à comunidade
política e às relações entre órgãos de poder, contrapondo-se aos regimentos das assembleias e de
outros órgãos colegiais e a certas leis meramente organizatórias;

g) A lei como ato legislativo da assembleia política representativa, como lei em sentido nominal
contraposta quer ao decreto com força de lei e ao decreto-lei quer à resolução, ato não normativo
do Parlamento;

h) A lei como ato sob forma de lei, recortado não tanto pelo conteúdo quanto pelo processo de
formação e pela forma finai, implicando essa forma determinada força jurídica - a força de lei - e
havendo diversas formas de lei consoante as tramitações que as leis sigam ou os órgãos que as
editem.

61. A problemática jurídico-política da lei


• A lei como ato da função legislativa constitui um dos temas recorrentes da Ciência juspublicística
e para além desta, da filosofia política e jurídica.

• As mais significativas concepções sobre o Estado e o Direito conduzem a diversos


entendimentos do que seja a lei:

- lei, ordenação da razão (S. TOMÁS DE AQUINO e SUAREZ);

- lei, vontade do soberano (HOBBES);

- lei, garantia da liberdade civil e da propriedade (LOCKE);

- lei ligará à divisão do poder e ao equilíbrio das instituições (MONTESQUIEU);

- lei, expressão da vontade geral (ROUSSEAU);

- lei, vontade racional (KANT);

- lei, instrumento para a utilidade e felicidade geral (BENTHAM);

- lei, manifestação imediata do poder soberano (AUSTIN);

- lei, instrumento do domínio de classe (MARX, ENGELS);

- lei, escalão de normas imediatamente a seguir à Constituição (KELSEN);

- conceito político de lei (SCHMITT).

• A problemática da lei coenvolve a problemática geral do poder. Com o conteúdo da lei


contendem a organização da sociedade e do poder de a governar.

• LOCKE considera o poder legislativo o poder primordial por ser ele que determina as diferentes
formas de governo. ROUSSEAU, embora recusando a separação de poderes, admite a distinção
entre a função legislativa e executiva, sustentando que aquela é a única soberana. Pelo contrário,
MONTESQUIEU pretende limitá-la.

62. A lei na evolução do Estado

• A cada tipo histórico de Estado corresponde uma certa configuração da lei no âmbito das ordens
jurídicos positivas. E em cada uma das grandes fases de desenvolvimento de cada tipo histórico
oferece ainda à lei características incontornáveis. Castanheira Neves fala em historicidade e
condicionalidade da função legislativa, sublinhando a sua referencia específica ao poder político:
pode não ter sido sempre a legislação a forma eminente e mais eficaz da afirmação desse poder,
como o é hoje, mas se, por um lado, ela foi a partir do século XVI "o corolário essencial da
soberania", por outro lado, a cada espécie de poder político corresponde um tipo particular de
legislação.

Sobressai aqui a contraposição entre o período anterior ao iluminismo e à revolução francesa e o


período subsequente. São, no essencial, as mesmas as causas do aparecimento da Constituição
material e formal das metamorfoses da lei. Antes do iluminismo e da revolução francesa, o peso da
lei era relativamente pequeno; lei e Direito objetivo não se confundiam; a autoridade da lei ou era
pressuposta ou estribava-se na legitimidade tradicional do monarca; e era tanto mais respeitada
quanto mais antiga.
• A partir do constitucionalismo, a lei tende a dominar todo ordenamento jurídico estatal e chega a
querer-se reduzir a tarefa dos juristas à sua exegese; as sociedades são agora sociedade movimento,
com múltiplas vicissitudes, não raro revolucionárias, que a lei acompanha nuns casos, e determina,
noutros casos; a lei dar-se-ia estar na disponibilidade do poder; multiplica-se e renova-se sem cessar;
e a sua autoridade é apenas imanente ou parece justificar-se por si mesma.

• A teoria do estado absoluto levará já ao contraste entre razão e vontade nos domínios da criação
da aplicação da lei. Com a modernidade, o conflito passa a ser entre liberdade e soberania popular.
Na vertente liberal, lei implica separação de poderes e primado dos direitos individuais; na
democrática, primado da soberania popular e da sua tradução majoritária; e essa tensão dialética vai
prolongar-se dentro do estado de Direito democrático.

Há diferenças sensíveis entre a lei na época do Estado liberal e a lei nos séculos XX e XXI. No
século XIX, a lei integra-se na visão de uma sociedade de indivíduos livres e iguais, homogénea,
bem estruturada frente ao poder e cujo funcionamento se pauta de acordo com a razão. A lei
assenta na majestade da razão e, por isso, a racionalidade é o seu limite intrínseco, único e
necessário. Aliás, a Constituição não interfere na grande maioria das matérias legais, nem é
entendida como parâmetro de validade da lei.

A sociedade do século XX e XXI não poderia deixar de alterar a posição da lei. O legislador
defronta-se com uma sociedade cada vez mais heterogénea, mutável e confiitual de grupos,
interesses e forças políticas e ideológicas e tem de utilizar a lei para intervenções contingentes nos
mais variados sectores da vida social, económica e cultural. A complexidade torna-se inelutável,
nem sequer se esgota na conhecida dicotomia lei-regra e lei-medida e entremostram-se fluidas as
fronteiras entre legislação e administração.

A dilatação de campos, a especialização por diversos objetivos e procedimentos e a pulverização


decisionista assim como as deficiências da formulação ou de legística formal e a "análise económica
do Direito" não reforçam a autoridade da lei. E a isso acrescem as tendências mais recentes de
descentralização de poderes normativos, de participação e até de contratualização nos
procedimentos e de descodificação, deslegalização e desregulação.

Tudo isto sem esquecer a retração da lei perante o Direito internacional convencional e o Direito
próprio das organizações internacionais ou entidades afins, em especial o Direito da União
Europeia.

• Um ponto de relevo concerne às relações entre lei e Constituição. Com a separação característica
do século XIX, entre Estado e Sociedade, estanques vão ficar também os domínios da Constituição
e da lei: a Constituição ocupa-se da organização política mas deixa à lei o tratamento dos direitos
que declara. E é nos grandes códigos que se encontram as estruturas da sociedade e o sentido de
instituições como a família, o contrato ou a propriedade.

Ao invés, as vicissitudes do século XX não ocorrem sem interferência da Constituição, a qual deixa
de se mostrar aparentemente neutra perante a sociedade para de carregar de intencionalidades
conformadoras e transformadoras. Em vez de se confinar à separação de poderes e à garantia de
direitos individuais a Constituição alarga dramaticamente as matérias sobre que versa e assume
conteúdos diversos e até antagónicos consoante os regimes políticos.

Há uma evolução que se opera em 3 fases:


1) até à primeira guerra mundial e à Constituição de Weimar de 1919; 2) entre esta e as novas
Constituições surgidas após a segunda guerra mundial, mormente a de Borna de 1949; 3) e a seguir
a esta Constituição, como sucede em Portugal e no Brasil com as Constituições de 1976 e 1988.

Em síntese, a mudança de paradigma consiste na passagem da centralidade jurídico-positiva da lei


na primeira fase para a centralídade jurídico-positiva da Constituição na terceira, com um período
intermédio de recondução das normas constitudonais a preceitos programáticos sem aplicação
imediata. E ela torna-se patente é decisiva no quadro dos direitos fundamentais.

63. A lei em sentido material e a lei em sentido formal

A ideia de lei esteve tradicionalmente sempre ligada á de criação ou de revelação do Direito e, de


modo direto ou indireto, a norma, prescrição, regra. Como constitucionalismo o poder legislativo
foi atribuído ao Parlamento- Ao mesmo tempo, tendeu a ser lei todo o ato do Parlamento, desde
que produzido através de procedimento específico e exteriorizado por determinada forma.

A lei em sentido material corresponde a lei como ato da função legislativa e é sempre,
necessariamente, também em sentido formal; A lei em sentido formol pode ou não ser revestida de
conteúdo legislativo. E corrente estabelecer-se correspondência entre Estado liberal e conceito
material de lei e entre a situação do século e o domínio de um conceito meramente formal. Tal
maneira de ver deve ser considerada com algumas reservas;

- Em 1° lugar, a distinção dos dois sentidos remonta já ao século XIX; - Em 2º lugar, não faltam
Autores bem identificados com as conceções do liberalismo e do positivismo jurídico que definem
lei com apelo exclusivamente a elementos formais e ao princípio da sua supremacia frente a
quaisquer outros atos; - Em 3º lugar, além da tese da generalidade, outros entendimentos materiais
da lei tem sido propostos, entre os quais o da regra de direito, o da novidade, o da interferência na
esfera da liberdade e propriedade das pessoas, o da execução imediata ou da concretização da
constituição; - Em 4º lugar, se a abstração enquanto característica da lei vem sendo posta em causa
ou abandonada, sobretudo devido à emergência das leis-medidas, nem por isso a generalidade deixa
de continuar a aparecer, senão como propriedade essencial, como propriedade natural da lei; Em 5º
lugar, se a exigência de generalidade se compagína historicamente com a conquista do princípio da
igualdade perante a lei e se a sua crítica vem a ser formulada hoje com frequência em nome de urna
igualdade efetiva e real, aberta a diferenciações e a discriminações positivas, não menos seguro é
que em Estado social de Direito não há antagonismo entre as duas vertentes; muito pelo contrário,
elas complementam-se numa tensão dialética, em que se interpenetram igualdade e
proporcionalidade.

O fenómeno das leis concretas e gerais não se dá apenas com as leis-medidas. Manifesta-se há
muito com as leis orçamentais, as leis de amnistia e as de declaração de estado de sítio e de outros
estados de exceção.

As leis-medidas estão ligadas a complexidade cada vez maior da vida hodierna e à sua aceleração,
ao alargamento das tarefas do estado e à diversidade de veículos de comunicação entre a sociedade
e o poder. São leis de intervenção em situações concretas para precisos efeitos e que se traduzem
em medidas ou providências dirigidas à resolução deste ou daquele problema em tempo útil; ou, leis
em que a ativo dir-se-ia suplantar a ratio ou a constituiu.

A natureza das leis-medidas é bastante controversa. Alguns falam em desvalorização da lei, em


correspondência com o estado funcional; outros consideram estar aí um fenómeno de
administração do legislativo simétrico da assunção de poderes normativos pelo executivo; outros
realçam aspetos específicos como a decisão, o objeto, o círculo de destinatários, a duração da sua
vigência ou a excecionalidade.

Seja como for, elas não saem do campo da função legislativa, porque alicerçam-se opções políticas
alheias à administração e quando auto exequíveis, não são consuntivas de atos de aplicação às
situações da vida.

Pode haver leis individuais, leis real ou aparentemente individuais. Tudo reside em saber se a razão
de ser da medida concreta e individual que se decreta leva consigo uma intenção de generalidade, se
corresponde a um sentido objetivo ou a um princípio geral, por virtude do qual se alarga o âmbito
da lei de maneira a abranger aquela medida; ou se, pelo contrário, se esgota em si mesma,
desinserida de qualquer novo juízo de valor lega.

Uma coisa é a lei individual ainda reconduzível ao cerne da generalidade, implícita ou


indiretamente; outra coisa o ato administrativo sob forma de lei, simples decisão de um caso
concreto e individual e que deve ser simples aplicação de regra preexistente e só válido se com ela
se conforma. A distinção nem sempre é fácil.

• Lei em sentido material não e apenas enquanto dotada de generalidade. É a lei com um ato da
função política e sujeita imediatamente à Constituição. Sem essa localização, sem a ponderação
prospetiva do interesse geral, sem a visão ampla da comunidade política, sem a discricionariedade
que lhe é inerente, não existe lei,

• A lei é o meio de ação essencial do poder sobre a vida social. Com a lei trata-se de programar e
promover. pelas suas prescrições, uma ordem político-social; trata-se de legitimar e normalizar,
juridicamente, uma política global do Estado. Por isto, os regulamentos não podem ser leis em
sentido material. E tão-pouco o podem ser as declarações de inconstitucionalidade e de ilegalidade
de normas jurídicas com força obrigatória geral; ou o podem ser as sumulas vinculantes.

64. A constituição e a atividade legislativa

A Constituição permite ao legislador escolher o tempo e as circunstâncias da sua intervenção e


determinar ou densificar o seu conteúdo, desde que respeitados os fins, os valores e os critérios
constitucionais.

No piano orgânico-formal é completa vinculação, sob um tríplice aspecto: o dos órgãos, ou das
formas e o da força jurídica. Os órgãos legislativos são sempre órgãos constitucionais; as formas de
lei são apenas as prescritas pela Constituição; e a força de lei a que dela decorre.

Não se defronta aqui só um problema de perfil interno do ordenamento, por a Constituição ser a
norma primária sobre produção jurídica. Defronta-se também um problema de índole política. A
escolha entre um ou mais órgãos como competência legislativa e entre uma ou várias formas de lei,
assim como a fixação da respetiva força jurídica dependem dessas características; enquadram-se na
Constituição material; têm tudo que ver com um princípio da divisão e com o modo de encarar as
relações entre o estado e os cidadãos. Existe, pois, uma verdadeira reserva de Constituição no
domínio das competências legislativas, das formas e da força de lei. A reserva de Constituição vai,
porém, para lá das competências legislativas e pode assumir duas configurações:

Umas vezes, consiste numa reserva de regulamentação, de tal jeito que são as normas
constitucionais que fazem o travejamento da matéria e a recortam perante as outras. Assim, as
formas de exercício da soberania ou do poder político são as previstas na Constituição; o conteúdo
essencial dos direitos do cidadão é o resultante dos preceitos constitucionais e somente são
admissíveis as restrições nestes previstas ou decorrentes dos princípios constitucionais; a vinculação
internacional dos estados e a fiscalização da constitucionalidade fazem-se nos termos da
Constituição.

- Outras vezes, a reserva de Constituição traduz-se numa numeração exaustiva. Entram aqui os
pressupostos da declaração de estado de defesa, do estado de sítio e de estado de emergência; os
poderes do estado ou os órgãos de soberania; os casos de maioria parlamentar qualificada; as
matérias excluídas de legiferação pelo poder executivo, etc; Da reserva de Constituição distingue-se
a reserva de lei; Na reserva de Constituição, esta chama a si certa matéria, conferindo-lhe um
tratamento a nível de normas que apenas podem ser alteradas através dos procedimentos de revisão
e cuja garantia se insere de pleno na garantia da constitucionalidade. Na reserva de Constituição, o
órgão legislativo está sujeito a um princípio heteronomia.

Na reserva de lei a Constituição impõe que tal tarefa caiba à lei, vedando à administração e à
jurisdição qualquer interferência ou qualquer interferência a título principal. Na reserva de lei o
órgão legislativo está sujeito a um princípio de autonomia ou de autoconformação.

A enumeração exaustiva (numerus clausus) ou, doutro prisma, A tipicidade constitucional situa-se
em plano diverso do da tipicidade legal, que não é senão uma reserva qualificada de lei. A reserva de
atos normativos oferece-se nuns casos absoluta e noutros relativa. É absoluta quando se afasta a
presença de quaisquer outros atos ou tipos de atos normativos na matéria. É relativa quando os
critérios ou os fatores de normação ou de decisão caberem não tipo de atos constitucionalmente
eleito, se admite a colaboração subordinada de atos de outra natureza ou de grau inferior.

65. Reserva de lei e princípio da legalidade

A reserva de lei desempenha uma função excludente e, mais do que isso, uma função positiva de
reforço de princípio da legalidade da administração e jurisdição. Numa dimensão menos exigente,
legalidade equivale a não desconformidade da atividade administrativa e jurisdicional com a norma
jurídica, seja qual for; e, num alcance mais significativo, a não desconformidade com a norma
legislativa. Mas aí onde a constituição imponha reserva de lei, legalidade não implica somente
prevalência ou preferência de lei, nem sequer prioridade de lei; traduz-se em sujeição do conteúdo
dos atos administrativos e jurisdicionais aos critérios, aos valores, ao sentido imposto pela lei como
ato legislativo; envolve, senão monopólio normativo, pelo menos fixação primária de sentido
normativo pela lei.

Não tem apenas de não ocorrer contradição com a lei. Tem de haver lei. E é à lei que cabe, por
exemplo, regular uma liberdade, ou considerar ilícito um comportamento das pessoas, ou cominar
uma pena, ou criar um imposto, ou determinar uma forma de intervenção económica do Estado, ou
estabelecer uma incompatibilidade dos titulares de cargos políticos. E perante a lei quaisquer
intervenções de órgãos administrativos ou jurisdicionais só podem dar-se a titulo secundário,
derivado ou executivo, nunca com critérios próprios ou autónomos de decisão.

Em especial, no confronto da administração, a reserva de lei analisa-se no seguinte:

a) proibição de regulamentos autónomos ou independentes

b) produção de deslegalização

c) proibição ou limitação rigorosa do exercício de poder discricionário da administração


d) tratando-se de reserva absoluta de lei, senão impossibilidade de conceitos indeterminados, pelo
menos necessária determinabilidade de lei ou exigência de suficiente densidade das suas normas

• Fundamento e limite da força de lei encontram-se na constituição. E limite vem a ser igualmente
o direito internacional. Por isso, assim como o regulamento, o ato e o contrato administrativo e o
ato jurisdicional se subordinam à lei, esta cede perante a norma constitucional, originária ou
derivada de revisão, e cede perante as normas de direito internacional vinculativas do estado.

Tal como, noutro plano, a lei não prevalece sobre a decisão de inconstitucionalidade

66. Unidade e pluralidade de formas de lei

A lei, que tem um conteúdo típico, apresenta-se igualmente sob uma forma característica. E pode
presumir-se que à forma, sinal da lei, corresponda um conteúdo legislativo. Tanto no
constitucionalismo moderno como em qualquer outro período da história do estado, a lei distingue-
se dos demais atos jurídico-públicos por elementos formais preestabelecidos, que se reportam, uns,
ao seu modo de revelação e, outros, ao seu modo de produção. A forma de lei é uma forma
constitucionalmente definida.

À partida, o legislador constituinte pode optar ou por uma só forma de lei ou por uma pluralidade
de formas: por uma única forma, em virtude da unidade fundamental da função legislativa; por
várias formas, em conexão com a diversidade de fins e sentido possíveis, de competências e de
articulações com outros atos.

O critério predominante vem a ser, por toda a parte, o da competência.

No constitucionalismo moderno, o parlamento é o órgão legislativo estrutural ou funcionalmente


mais adequado. Para além ou independentemente do princípio da separação de poderes, este seu
papel funda-se, simultaneamente, na ideia de que a lei, dirigida a todo o povo, deve ser votada pelos
seus representantes eleitos; na ideia do debate e do compromisso.

A história e o direito comparado mostram que a atribuição de competências legislativas ao


parlamento tem-se feito em termos diferentes em razão de fatores variáveis: a forma de estado, a
forma de governo, o sistema de governo.

No século XX houve que proceder a adaptações e mesmo a atenuações significativas em face das
aceleradas exigências de intervenção nos domínios económicos, sociais e culturais, da cópia de leis
tornadas necessárias ou convenientes e do peso das tecnocracias. E houve por isso que reconhecer
aos governos, explícita ou implicitamente, faculdades legiferantes. A mesma tendência se regista no
século XXI.

• Em grau decrescente de consistência do poder legislativo do parlamento cabe apontar os


seguintes sistemas:

a) competência exclusiva do parlamento

b) competência primária do parlamento e competência complementar do executivo

c) competência exclusiva do parlamento, mas delegação informal no executivo

d) competência originária do parlamento e competência derivada do executivo


e) competência exclusiva do parlamento, mas fixação constitucional da matéria da lei em
contraposição

à de regulamento

f) competência originária e concorrencial do parlamento e do executivo

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