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O que deixamos formalmente definido constitui o direito penal em sentido objetivo (Ciência
objetiva do Direito penal). Ao contrário o Direito Penal subjetivo (ius puniendi), é o poder
punitivo do Estado resultante da sua soberana competência para considerar como crimes
certos comportamentos humanos e ligar-lhes sanções específicas. Na realidade o direito
penal objetivo é expressão ou emanação do poder punitivo estadual.
Teorias relativas das finalidades das penas: são teorias que assentam na finalidade, na
teoria dos fins. É necessário compreender que a pena traduz-se num mal para quem sofre.
A pena é entendida como instrumento político-criminal destinado a atuar no mundo,
devido ao seu sentido social-positivo, deve utilizar esse mal individual para alcançar as
suas finalidades de prevenção.
Nas teorias preventivas à que começar por distinguir tanto historicamente, como
segundo o sentido entre as doutrinas da prevenção geral e as doutrinas da prevenção
especial ou individual. Ambas as teorias assentam na conceção da pena como
mecanismo politico-criminal destinado a atuar psiquicamente sobre toda a sociedade,
afastando-a da criminalidade, através da ameaça estatuída pela lei. Esta realidade
apresenta uma dupla perspetiva, por um lado é uma forma de intimidação de outras
pessoas através do sofrimento que com ela se inflige ao delinquente e cujo receio as
conduzirá a não cometerem factos puníveis: prevenção geral negativa. Contudo a pena
pode ser entendida como reforço da confiança por parte da comunidade na validade e
na vigência das normas que tutelam os bens jurídicos, e assim no ordenamento jurídico-
penal, reforçando por esta via os padrões comportamentais adequados (prevenção geral
positiva ou de integração). Esta última assenta na confiança e na aprendizagem.
As teorias relativas são muito mais prezáveis porque ao contrário das teorias absolutas,
estas ligam-se direta e imediatamente à função do direito penal de tutela subsidiária de
bens jurídicos. No entanto as teorias relativas apresentam um défice porque fazem da
pena um instrumento que viola de forma inadmissível a dignidade da pessoa humana.
Isto justifica-se devido a impossibilidade de determinar o quantum da pena necessário
para alcançar tal efeito. Se as penas não surtirem nenhum efeito, fica próxima a tendência
de se usar penas mais severas e desumanas – direito penal de terror, absolutamente
desproporcionais, violando os direitos humanos.
As teorias absolutas não se interessam pelas finalidades das penas, assentam a sua essência
na proporcionalidade da culpa. Segundo aquele principio não há pena sem culpa e a medida
da culpa não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa. Assim há uma proibição
incondicional do excesso; a culpa não é o fundamento da pena, mas constitui o seu
pressuposto e o seu limite inultrapassável.
Neste quadro a legitimação da pena repousa num duplo fundamento: o da prevenção e o da
culpa; isto porque a pena só seria legítima “quando é necessária de um ponto de vista
preventivo, e para além disso é justa.” – é união eclética de elementos heterogéneos. Esta
acumulação na parte em que é exata já encontra plena tradução na ideia de pena, não se
tornando necessário turvar a limpidez da natureza exclusivamente preventiva e de
merecimento da sua aplicação.
O dualismo do sistema
A verdadeira alternativa monismo/dualismo só surge quando se pergunta se o sistema é
um tal acto que permite a aplicação cumulativa ao mesmo agente, pelo mesmo facto, de
uma pena e de uma medida de segurança. Neste sentido pode-se falar num sistema
binário ou sistema de dupla via.
O monismo do sistema
Não tem sentido, argumentar-se, aplicar uma pena estritamente baseada no principio da
culpa, para depois a complementar com uma medida de segurança, que por definição
não está limitada pela culpa e se funda na qualidade “naturalística” da personalidade do
agente como é a da sua perigosidade social. Perante uma solução deste tipo, acrescenta-
se continuar a afirmar o caracter politico constitucional e politico-criminal intocável do
principio da culpa.
c. Perspetiva moral ético-social – Welzel em 1947 disse “sob o ponto de vista moral o
crime é a violação dos deveres ético-sociais elementares. A tarefa social basear-se-ia
no assegurar dos valores sociais. Isto foi uma posição tomada no pós-guerra aquando
dos julgamentos de Nuremberga (ius naturale). Os vencedores julgaram os nazis.
Surgiram os crimes contra a humanidade não tipificados: utilizando os valores
universais há um cometimento de crimes. Considera-se que quem cometeu o crime
violou deveres ético-sociais elementares ou fundamentais. Esta teoria fez carreira
durante muitos anos. Jescheck diz-nos que diz-nos que os valores fundamentais da
ordem social consubstanciam-se em normas ético-sociais que ao direito penal cabe
tutelar. Esta conceção corresponde para além do mais, a uma atitude enraizada no
espirito da generalidade das pessoas, para quem o direito penal constituiria a
tradução no mundo terreno, das noções de pecado e de castigo, vigentes na ordem
religiosa, ou de imoralidade e de censura da consciência vigentes na ordem moral.
Em definitivo esta conceção é inadequada ao pluralismo ético-social das sociedades
contemporâneas, onde em maior ou em menor medida coexistem por vezes de forma
pacífica, por vezes de forma tensa – zonas de consenso e zonas de conflito.
Perspetiva racional-funcional
É relevante do ponto de vista jurídico – os direitos fundamentais são o elo base de
positivação jurídico-constitucional. As condutas contra os interesses constitucionais,
devem ser protegidas pelo Direito Penal através da sua dignidade. Será que é necessário
a intervenção penal em todas as áreas da vida humana? Será que há necessidade de pena
em todas as situações? Desde logo é necessário fazer uma seleção porque nem todos os
delicta in se são protegidos (nem todas as formas de aborto são criminalizadas. Assim a
afetação do bem-jurídico em determinadas situações requer intervenção, noutras não. A
base que está em causa reside na proteção do bem-jurídico. Esta perspetiva teleológico-
funcional atende às finalidades do direito penal – proteção subsidiária dos bens jurídicos.
Mas essa tutela subsidiária dos bens jurídicos dotados de dignidade jurídico-penal. O
crime será a violação de bens jurídicos na perspetiva jurídica teleológico-social. A sede
base é o bem jurídico. A definição de bem-jurídico é a expressão de um interesse, da
pessoa ou da comunidade, na manutenção ou integridade de um certo estado, objeto ou
bem em si mesmo socialmente relevante e por isso juridicamente reconhecido como
valioso.
Definição de bem-jurídico
a. Expressão de um interesse da pessoa ou da comunidade
b. Na manutenção de um certo estado, objeto, ou bem;
c. Socialmente relevante (para permitir a convivência social)
d. E juridicamente reconhecido como valioso.
Delitos acumulativos
Quando se dá um crime aconteceu um facto que violou um ilícito tipificado. Esse facto
que violou o tipo legal de crime, é isoladamente, eticamente relevante. A morte de uma
pessoa preenche todos os requisitos, desde logo porque ela atinge o bem jurídico pessoal
a vida. Esta são as situações normais. Nos delitos acumulativos esta conduta não tem só
de per si, a intervenção jurídico-penal. Isto significa que os delitos acumulados não são
uma conduta isoladamente considerados. Se for só uma pessoa a cometer um crime não
há problema, mas se for considerado em conjunto já é dotado de uma valoração penal,
podendo chegar a noção de dano universal.
Um cidadão que atira lixo para o chão isoladamente essa conduta é relevante, essa
conduta normalmente é considerada como crime ambiental, quando analisada sob um
prisma universal, considerando valores supra-individuais e não a conduta isolada, mas
sim grupal. No mesmo sentido temos o desenvolvimento de Crimes Fiscais e outras áreas
onde se protegem interesses relevantes. Assim há uma expansão do Direito Penal, para
áreas do chamado Direito Penal Simbólico (com cautela).
Mas a consideração dos crimes acumulativos é muito superior, pois protegem-se bens
jurídicos supra-individuais, alicerçados numa dinâmica grupal e universal.
Direito Contraordenacional
Quer o direito penal quer o direito penal são sancionatórios e protegem bens-jurídicos. É o
critério formal que nos permite distinguir penas de contraordenações (DL-433/82 de 27 de
Outubro). No artigo 1.º do Regime Geral das Contraordenações, é contraordenação o facto
típico ilícito punida com uma coima. Ora, os crimes são punidos com penas. O fundamento
da distinção reside no critério material qualitativo – a substância. Este critério salienta que
os crimes são mais graves do que as sanções, assim as diferenças residem na razão
substancial. Salienta-se que o mesmo critério é um elemento qualitativo, isto porque atribui
qualidades a algo que por si não se consubstancia com relevância juridico-penal. Por sua vez
o crime pressupõe uma conduta per si, eticamente relevante (não é necessário que exista uma
norma que diga que matar é errado). Na contraordenação a conduta não é eticamente
relevante – é necessário uma norma positiva para proteger essa conduta, isto porque as
condutas ordenacionais são axiologicamente neutras (ex: leis do trânsito), só passando a ter
relevância jurídica quando são dotadas de ilicitude. O efeito das normas contraordenacionais
reside na estabilidade da sociedade – a imposição de uma ordem aplicando as coimas. Neste
contexto as condutas ordenacionais dependem da imposição externa de uma vontade de
ordenação. Nas condutas criminais esta natureza reside na própria natureza interna do crime
(e os bens associados).
Nos dias que correm há cada vez mais um espaço nebuloso, com a excessiva positivação e
dificuldades em saber realmente que tipo de proteção se consubstanciam determinadas
situações.