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ARTIGO ARTICLE 323

Violências contra crianças e adolescentes:


análise de quatro anos de notificações feitas ao
Conselho Tutelar na cidade de Ribeirão Preto,
São Paulo, Brasil

Violence against children and adolescents: an


analysis of four years of complaints filed at the
Child Protection Agency in Ribeirão Preto,
São Paulo State, Brazil

Marina Rezende Bazon 1

Abstract Introdução

1Faculdade de Filosofia, Children and adolescents are exposed to numer- O presente artigo constitui parte de uma pesquisa
Ciências e Letras de Ribeirão
Preto, Universidade de São ous situations of violence. The objective of the maior que tem por objeto a violência doméstica
Paulo, Ribeirão Preto, Brasil. current study was to describe such situations contra crianças e adolescentes, buscando esti-
qualitatively and quantitatively, based on data mar sua magnitude, características e distribuição
Correspondência
M. R. Bazon from the Child Protection Agency in Ribeirão a partir de diferentes fontes de informação, como
Departamento de Psicologia Preto, São Paulo State, Brazil, for the years 2000 os Conselhos Tutelares e o setor educacional, em
e Educação, Faculdade de
to 2003, aiming to discuss the classification of diversas cidades da região de Ribeirão Preto, no
Filosofia, Ciências e Letras de
Ribeirão Preto, Universidade complaints filed at the agency according to a interior de São Paulo, Brasil. Neste, atém-se às in-
de São Paulo. conceptual framework for violent acts commit- formações disponibilizadas pelo Conselho Tutelar
Av. Bandeirantes 3900,
ted against children and adolescents that high- e ao Município de Ribeirão Preto, propondo como
Ribeirão Preto, SP
14040-901, Brasil. lights the structural, criminal, and domestic objetivo principal discutir o sistema conceitual de
mbazon@ffclrp.usp.br forms. The study began by tabulating the com- classificação das diferentes violências dirigidas à
plaints, organizing them according to the cat- infância e à adolescência, a partir da descrição e
egories used by the agency itself. The complaints análise qualitativa e quantitativa das notificações
were then regrouped by type of violence. From efetuadas entre os anos de 2000 e 2003.
the total of 7,272 complaints analyzed, 43.4% Tal objetivo se justifica pela necessidade, ain-
were classified as structural violence and 44.1% da premente, de delineamento do fenômeno da
as domestic. Other categories emerged, but were violência e sua divulgação, de modo a suscitar
more difficult to separate, demonstrating ex- e legitimar o debate sobre sua existência e im-
plicitly how the forms of violence are interwo- portância, como sublinham Penna et al. 1, ao
ven, thus corroborating the idea that the deter- constatarem, em seu estudo de revisão, a tímida
minants are both macro and micro-social and produção científica, ao menos na área da Saúde
are sometimes expressed within interpersonal Pública.
relations. No estudo aqui apresentado, considera-se
que a violência contra crianças e adolescentes
Violence; Notice; Child; Adolescent é “todo ato ou omissão cometidos por pais, pa-
rentes, outras pessoas e instituições capazes de
causar danos físico, sexual e/ou psicológico à ví-
tima. Implica de um lado, numa transgressão no
poder/dever de proteção do adulto e da sociedade

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em geral; de outro, numa coisificação da infância. cente – ECA) 9, tal órgão se configura, ainda que
Isto é, numa negação do direito que as crianças e potencialmente, em espaço de convergência de
adolescentes têm de serem tratados como sujeitos informações referentes a um rol variado de situ-
e pessoas em condições especiais de crescimento e ações vividas pelas crianças e adolescentes, no
desenvolvimento” 2 (p. 92). âmbito de um município, considerando-se que
Uma das vertentes para a abordagem desse todos os casos suspeitos e/ou comprovados de
fenômeno está na identificação de suas expres- ameaça ou violação de seus direitos devem ser
sões concretas e formas 3. Assim, é proposto que notificados nessa instância.
se considere, num primeiro plano, a existência de De um total de 13 estudos nacionais encon-
uma violência estrutural, relativa às condições de trados, visando a contribuir com a descrição dos
vida de crianças e adolescentes, geradas a partir casos de violência contra crianças e adolescentes
de decisões histórico-econômicas e sociais, que 8,10,11,12,13,14,15,16,17,18,19,20,21, somente três traba-

tornam vulneráveis seu crescimento e desenvol- lharam com informações dos Conselhos Tutela-
vimento. Agindo essencialmente pela ausência res. A maioria trata informações disponibilizadas
ou precariedade de políticas públicas, sua ex- por serviços de atendimento e/ou encaminha-
pressão mais extremada estaria no trabalho in- mento de vítimas, no âmbito da saúde, enfati-
fantil, no analfabetismo, na presença de crianças zando a violência doméstica, o que aporta maior
e adolescentes em situação de rua, assim como viés para o perfil dos casos analisados e, por con-
na de sua institucionalização 3,4,5,6. seqüência, para a caracterização do fenômeno
Outra forma, denominada violência criminal da violência.
ou infracional, se revela pelas ações fora da lei so- Sabe-se que a estatística que se pode produ-
cialmente reconhecida 4. Esta envolve os indiví- zir com base nos números oficiais representa a
duos como vítimas e/ou agressores e, no caso de “ponta do iceberg” 22, estimando-se que gire em
crianças/adolescentes, remete em questão, qual- torno de 10% a 30% do total de casos 23,24, mes-
quer que seja a posição ocupada, o contexto de mo em países em que notificar é uma ação para
socialização em que se desenvolvem e, em última a qual o cidadão está sensibilizado. Contudo, a
análise, a estrutura social, com suas contradições análise dos dados acumulados pelo Conselho
objetivas e subjetivas, referentes aos valores e às Tutelar pode produzir um conhecimento sobre
normas veiculados. quais situações têm sido reconhecidas e notifica-
A terceira forma é a violência doméstica, mais das, em nossa sociedade, como ameaça ou vio-
facilmente apreensível nas suas quatro principais lação de direitos da infância/adolescência, em
manifestações: a física, a sexual, a psicológica e a que proporções e como elas compõem as classes
negligência. Conforme proposto por Minayo 2, de violência, o que pode promover maior sensi-
com base nas elaborações feitas por Assis 3, Guer- bilização e responsabilização da sociedade com
ra 7 e Deslandes 8, considera-se o abuso físico relação às contingências de vida de crianças e
como o uso da força física contra a criança/ado- adolescentes e para com a proteção deles.
lescente, impingindo-lhe desde a dor até a morte, Assim, com o presente estudo, acredita-se
para disciplinar ou tão somente para expressar poder apreender um universo maior de situa-
desafeto; o sexual como ato ou jogo – de natureza ções concretas relacionadas às formas de violên-
hetero ou homossexual – envolvendo crianças/ cia que afetam infância e juventude brasileiras,
adolescentes, com o objetivo de estimulá-los e e ainda obter elementos para discutir estas si-
obter o estímulo sexual para si ou para outrem; a tuações, em termos de como e quanto elas são
violência psicológica ou emocional remetendo a apreendidas e registradas.
situações em que os adultos sistematicamente os
depreciam ou ameaçam, minando sua auto-esti-
ma ou seu senso de realização, muitas vezes, em O contexto da pesquisa
nome de uma educação rigorosa ou por hostili-
dade; e a negligência como omissões da família Ribeirão Preto, situada no nordeste do Estado de
e da sociedade em prover as necessidades físicas São Paulo, compõe uma região considerada um
e emocionais da criança/adolescente, faltando- dos pólos econômicos do país, caracterizada por
lhes nos cuidados relativos à alimentação, vesti- significativa capitalização do setor agropecuário
menta, saúde e educação, em circunstâncias em e moderno setor industrial. Apesar de, pratica-
que poderiam despendê-los. mente, toda a atividade agrícola da região estar
Com relação à fonte de dados, é preciso fri- fora de seus limites territoriais, Ribeirão Preto é
sar que tomar o Conselho Tutelar como lócus de o centro desse pólo, destino principal dos inves-
informação para o delineamento das formas de timentos ali gerados, constituindo-se na cidade
violência se justifica, pois, levando-se em conta a com a maior rede de prestação de serviços e co-
Lei nº. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adoles- mércio da região 25.

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Ela também se destaca por sua rede de servi- (descreve situações em que há demanda por
ços de saúde, que é bastante articulada à pesqui- atendimento especializado, concernente a do-
sa científica e ao ensino de nível universitário 25. enças e/ou transtornos específicos, não aten-
Tais aspectos devem, contudo, ser ponde- dida no âmbito da rede pública de assistência
rados em face dos indicadores sociais, dentre à saúde); (4) Violência institucional (refere-se
os quais se destaca o Gini, referente ao nível de a situações em que a criança/adolescente é ví-
concentração de renda, pelo qual Ribeirão Preto tima de discriminação e/ou situação vexató-
fica acima da média nacional (0,77 contra 0,61), ria, no contexto de alguma instituição pública
esclarecendo que, quanto mais próxima a um (1) – mais freqüentemente a escola); (5) Certidão de
for a nota, maior a desigualdade entre pobres e nascimento (refere-se a crianças/adolescentes
ricos 25. que não dispõem do documento porque ele não
Por contar com uma população próxima dos foi providenciado ou foi perdido, dificultando
600 mil habitantes 26, a cidade possui três Conse- seu acesso a alguns outros direitos básicos); (6)
lhos Tutelares, instalados desde 1993. Miserabilidade (refere-se a crianças/adolescen-
Em meados de 1997, Conselheiros Tutelares tes – e suas famílias – em situação econômico-
passaram a integrar a Comissão Gestora da Rede social que interfere até mesmo no suprimento
de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente de necessidades básicas, como alimentação e
(RAICA), um sistema organizado no município vestimenta); (7) Assistência social (refere-se,
visando a priorizar o atendimento descentrali- principalmente, à demanda não atendida por
zado e articular as ações entre Secretarias Muni- programas comunitários de atendimento às
cipais e demais recursos, passando, assim, a ter crianças/adolescentes, em atividades de natu-
acesso aos casos identificados e acompanhados reza recreativa e/ou educativa); (8) Drogadição
pelos diferentes serviços da cidade 6. Isso dimi- (refere-se a casos em que crianças/adolescentes
nuiu a pulverização do registro de informações fazem uso de substâncias ilícitas, para os quais
referentes a casos de violência contra crianças e os adultos responsáveis requerem ajuda/trata-
adolescentes, o que confere maior representati- mento); (9) Evasão escolar (descreve situações
vidade às informações aqui tratadas. de ausência reiteradas à escola ou ao abandono
do processo de escolarização); (10) Problemas
de comportamento (refere-se a situações em
Material e método que os responsáveis apresentam queixas relati-
vas à disciplina da criança/adolescente, estando
Tomou-se por base o total de 7.765 notificações estes envolvidos em eventos considerados anti-
feitas aos três Conselhos Tutelares, entre 2000 sociais); (11) Não acesso à convivência familiar
e 2003, constantes em seus “livros de registro”, (descreve situações em que a criança/adoles-
em que, normalmente, são anotados a data da cente se vê desprovida de um responsável legal,
ocorrência, o nome da criança/adolescente, sua em virtude do falecimento do responsável ou de
idade (data de nascimento) e o motivo/razão da circunstâncias como, por exemplo, o aprisiona-
notificação, com base num sistema de categorias mento deste); (12) Convivência familiar inade-
empíricas, implementado pelos próprios conse- quada (refere-se a crianças/adolescentes convi-
lheiros. vendo com drogaditos ou alcoolistas, ou que são
Após o contato com esse material, proce- expostas constantemente a desavenças/brigas
deu-se a uma enquete com os membros dos entre os adultos); (13) Desaparecimento (des-
Conselhos Tutelares no sentido de obter mais creve casos em que se suspeita da fuga da crian-
informações sobre os significados atribuídos às ça/adolescente do lar); (14) Abandono (descre-
categorias normalmente empregadas por eles, ve situações em que os adultos responsáveis,
por ocasião do registro da notificação. freqüentemente a mãe biológica de um bebê,
Em seguida, procedeu-se de modo a conta- abre mão da guarda da criança, disponibilizan-
bilizar as notificações efetuadas em uma ficha do-a para a adoção; em alguns casos, refere-se
preparada para este fim, contendo uma lista a situações em que uma criança foi deixada na
com as vinte categorias originalmente empre- responsabilidade de outro adulto – familiar ou
gadas pelos conselheiros. Essas são sintetizadas não – e “desaparece”, deixando de manter con-
a seguir: (1) Falta de vagas na educação (em cre- tato e de enviar ajuda econômica).
ches, pré-escolas ou no ensino fundamental); As situações claramente relacionadas à vio-
(2) Atendimento especializado na educação lência doméstica são categorizadas de acordo
(descreve situações em que há demanda por com as definições propostas pela Associação Bra-
atendimento especializado, concernente à es- sileira Multiprofissional de Proteção à Infância e
colarização da criança/adolescente, não aten- à Adolescência (ABRAPIA) 27 e compatibilizam-
dida); (3) Atendimento especializado na saúde se com aquelas descritas na introdução deste ar-

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tigo: (15) Negligência; (16) Violência física; (17) Considerando-se as variáveis que perpassam
Violência psicológica e (18) Violência sexual. a decisão de notificar 28, no contexto em estu-
Em alguns casos, no registro, emprega-se do, há a possibilidade de os dados refletirem um
o termo (19) Violência doméstica (co-ocorrên- desgaste crescente da confiança dos cidadãos no
cias), o qual remete a situações caracterizadas sistema de proteção, em sua capacidade de ofe-
por co-ocorrência de algumas das modalidades recer solução para os problemas ali colocados.
de violência doméstica, sem, no entanto, espe- Vale dizer que reação equivalente é observada
cificá-las. mesmo em países que contam com um sistema
Por fim, aparece a categoria (20) Ato infra- de proteção maior e mais consolidado 22,29,30.
cional praticado por criança, referindo-se ao co- Associado a isso, o incremento da subnoti-
metimento de delitos por menores de idade. Em ficação pode também se relacionar à possibili-
termos quantitativos é preciso fazer a distinção, dade de, na dinâmica de trabalho do Conselho
nessa categoria, entre as ocorrências que envol- Tutelar, ter se instalado, após alguns anos de
vem crianças das que envolvem adolescentes, funcionamento, uma espécie de “filtro” pelo qual
considerando-se que o Conselho Tutelar, pela o próprio órgão, diante do volume crescente de
lei 21, é responsável pelo registro e encaminha- ocorrências, seleciona o que registra, deixando
mento de todos os casos conhecidos envolvendo de fazê-lo em alguns casos por não serem estes
os menores de 12 anos, mas só eventualmente é considerados “muito graves” ou “caso de Con-
implicado nos casos envolvendo maiores de 12 selho”. É possível que essa dinâmica encontre
anos. Assim, os números referentes a “ato infra- apoio, para instalar-se, na descrença do próprio
cional” cometido por criança são significativos órgão na capacidade do sistema de resolver todos
enquanto informação oficial, ao passo que os os problemas, o que finda por regular a pressão
que concernem aos adolescentes não denotam exercida pela demanda por programas e serviços
a problemática nem mesmo do ponto de vista no município 31.
oficial, visto que a maior parte destas ocorrências Essa, se verdadeira, certamente retroalimenta
tem seu registro e acompanhamento somente no a dinâmica anterior, referente à subnotificação, e
âmbito judiciário. ambas remetem à certa ineficiência do sistema
Em termos de análise, procedeu-se à reorga- de proteção.
nização das categorias a partir da identificação Nessa direção, vale frisar a existência de so-
da forma de violência em questão, segundo o mente 92 registros, em quatro anos, relativos a
sistema de classificação conceitual apresentado “ato infracional praticado por adolescentes”
– estrutural, infracional ou doméstica –, discu- (com idade entre 12 e 18 anos), sendo 46 de 2000,
tindo seu alcance e limite e também aferindo 17 de 2001, 23 de 2002 e 6 de 2003, contra 2.516,
as suas proporções, em termos de freqüências e 2.433, 2.022 e 2.062 processos, nos respectivos
porcentagens. anos, segundo informações obtidas no Cartório
No que tange à ética, os parâmetros para a da Infância e Juventude da cidade, denotando
realização de investigações envolvendo seres hu- que uma ínfima (e cada vez menor) proporção de
manos, especialmente a Resolução nº. 196/96, do casos de adolescentes em conflito com a lei é no-
Conselho Nacional de Saúde, foram respeitados. tificada ao Conselho Tutelar. Se, por um lado, isso
revela que na óptica do Judiciário as medidas de
proteção da alçada do Conselho Tutelar são pou-
Resultados e discussão co efetivas e/ou pertinentes ante a problemática
do adolescente, por outro lado revela também
Como mencionado, o estudo cobriu um univer- que o Conselho Tutelar não é proativo no sentido
so de 7.765 notificações feitas aos Conselhos Tu- de recuperar a problemática, no contexto de seu
telares de Ribeirão Preto, entre os anos de 2000 trabalho, como mais uma das faces da violência
e 2003, montante este distribuído, ao longo dos que acomete a juventude.
anos, de modo a se perceber redução gradual na Como mencionado, os números do Conselho
freqüência de registros: 2.396 em 2000; 1.947 em Tutelar não representam nem mesmo o dado ofi-
2001; 1.808 em 2002; e 1.614 em 2003. cial relativo ao número de infrações cometidas
Diante da improbabilidade de ter havido, no por adolescentes no município.
período, redução nas taxas de violência contra Portanto, para proceder ao cálculo de fre-
crianças e adolescentes ou redução proporcional qüências e porcentagens, decidiu-se excluir, do
da população infanto-juvenil residindo no muni- montante total, as 92 notificações realizadas
cípio, tal movimento dos números suscita estra- nesta categoria. Além dessas, outras 401 foram
nhamento e faz cogitar o aumento da subnotifi- excluídas porque foram consideradas “indefini-
cação, que, conforme argumentação de Gonçal- das”, uma vez que remetiam a alegações genéri-
ves & Ferreira 28, é uma realidade no Brasil. cas, como a anotação do(s) direito(s) violado(s)

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ou a medida de proteção aplicada, sem referên- Tabela 1


cia a qualquer das vinte categorias listadas.
Distribuição em ordem decrescente, em freqüência e porcentagem das notificações de ame-
Assim, restaram 7.272 notificações distribuí-
aça e/ou violação de direitos de crianças e adolescentes, segundo categorias empregadas
das conforme a Tabela 1.
pelo Conselho Tutelar de Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil, entre os anos 2000 e 2003.
É interessante notar que a maior parte das
categorias é descritiva de eventos, queixas e/ou
dificuldades ali colocados. Somente para de- Categorias de notificação Freqüência %

terminadas situações, sobretudo as de âmbito


doméstico, recorre-se a conceitos como “vio- 1. Falta de vagas na educação 1.060 14,6

lência doméstica”, “violência física”, “violência 2. Negligência 941 12,9

psicológica”, “violência sexual” e “negligência”, 3. Violência física 787 10,8

vinculando, nestes casos, a situação à violência. 4. Evasão escolar 584 8,0

Fora do campo das problemáticas de natureza 5. Problemas de comportamento 554 7,6

interpessoal, envolvendo a instituição familiar, 6. Convivência familiar inadequada 529 7,3

o conceito de violência é aplicado somente à ca- 7. Certidão de nascimento 514 7,1

tegoria 4 (“violência institucional”), que remete 8. Miserabilidade 508 7,0

a situações em que a criança/adolescente é ví- 9. Violência sexual 414 5,7

tima de discriminação e/ou situação vexatória, 10. Abandono 324 4,5

no contexto de alguma instituição pública – mais 11. Violência psicológica 231 3,2

freqüentemente a escola. 12. Drogadição 181 2,5

Ainda que no Conselho Tutelar, por lei, todas 13. Não acesso à convivência familiar 170 2,3

as situações registradas devessem ser pensadas 14. Violência doméstica (co-ocorrências) 165 2,3

como ameaça e/ou violação de direitos 21, aspec- 15. Desaparecimento 139 1,9

to que compõe a definição de violência, percebe- 16. Assistência social 53 0,7

se, no cotidiano do trabalho, tratamento diferen- 17. Atendimento especializado na saúde 49 0,7

ciado das situações que ali chegam, o que finda 18. Ato infracional praticado por criança 30 0,4

por conferir dimensionamento também diferen- 19. Violência institucional 23 0,3

ciado às problemáticas subjacentes. 20. Atendimento especializado na educação 16 0,2

A utilização dos conceitos relacionados à vio- Total 7.272 100,0

lência doméstica refere-se a 2.515 notificações


– aproximadamente, um terço do total (contra
apenas 23 feitas sob a insígnia “violência institu-
cional”, mais propriamente relacionada à violên-
cia estrutural), o que denota concepção relativa- violência, segundo as definições relativas às for-
mente mais consolidada quanto aos direitos e mas estrutural, infracional e doméstica, justifi-
deveres da família para com as crianças/adoles- ca-se também pela necessidade de refletir mais
centes, decorrente, possivelmente, da mobiliza- profundamente sobre a natureza dos problemas
ção produzida pelo investimento persistente que e redimensioná-los, rompendo com uma visão
se observa, no país, em abordar e debater o tema, individualizante e fragmentada deles, agregando
há alguns anos. nuances às categorias empregadas pelo Conse-
Em paralelo, vale sublinhar que as categorias lho Tutelar.
restantes, além da não referência a qualquer for- Iniciando o trabalho pela violência estrutural,
ma de violência, tendem a circunscrever a pro- se a relação de “miserabilidade” com a estrutura
blemática e/ou dificuldade como sendo do(no) sócio-econômica – com a ausência ou a precarie-
indivíduo (no caso, a criança ou o adolescente) dade de políticas públicas suplementares – não
ou da(na) família. Esse quadro propicia uma deixa dúvidas de sua relação com esta forma de
visão dos problemas envolvendo a infância/ju- violência, para outras modalidades tal vinculação
ventude, em que prevalece uma concepção mais aparece de forma menos evidente, requerendo
imediatista e/ou individualizante de sua nature- mais reflexão no sentido de desvelar a ligação.
za e, por conseguinte, de suas soluções. As exce- Esse é o caso da “evasão escolar”. Esse fenô-
ções são as categorias “falta de vagas na educa- meno remete a outros mais complexos, na maior
ção”, “assistência social”, “atendimento especia- parte das vezes conectados entre si, como o bai-
lizado na saúde” e “atendimento especializado xo rendimento escolar, a dificuldade da crian-
na educação”, que remetem a déficits existentes ça em adaptar-se a esse ambiente, e vice-versa,
em instituições públicas e, portanto, expressam bem como sua eventual necessidade de trabalhar
claramente a violência estrutural. para contribuir com o orçamento doméstico 32.
Assim, o esforço em classificar as outras no- Dentro disso, a problemática também deve ser
tificações buscando apreender o fenômeno da compreendida sob a insígnia violência estrutu-

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ral, porque, em última instância, a garantia do duta da criança/adolescente e, considerando-


direito à escolarização é da alçada de uma políti- se que, normalmente, são os próprios adultos
ca educacional ampla que, além da oferta de va- responsáveis que procuram o Conselho Tutelar
gas, deve prever ações no sentido de identificar, trazendo a dificuldade, tais situações também
prevenir e tratar as razões pelas quais crianças e devem ser pensadas como solicitação de ajuda,
jovens deixam de freqüentar a escola. estando, nesse sentido, associada à (não) oferta
O “não acesso à convivência familiar”, en- de programas públicos de apoio e/ou orienta-
quanto situação em que crianças e adolescentes ção às famílias, na tarefa de promover o desen-
se vêem, repentinamente, sem um responsável volvimento psicossocial saudável dos filhos, de
legal, parece, em seu turno, desvelar o intenso socializá-los.
processo de “nuclearização” da família e seu con- Em análise mais aprofundada, há também
seqüente isolamento social, como reflexo de uma de se considerar que essa tarefa tem sido com-
sociabilidade relacionada ao trabalho e à vida partilhada, cada vez mais precocemente, entre a
nos centros urbanos 33. Nesse contexto, a (não) família e outras instituições sociais, não poden-
prática espontânea de acolhimento de crianças do a avaliação do manejo de tal situação – mal
em família substituta, seja esta relacionada à de ou bem-sucedida – ficar atrelada estritamente à
origem ou não, associa-se à organização social competência/responsabilidade parental.
vigente e às (im)possibilidades de estabeleci- No que tange mais propriamente à “drogadi-
mento de redes de apoio social. Alterações na di- ção”, esta também remete a um contexto social
nâmica de funcionamento social, no sentido de mais amplo, em que as drogas estão disponibi-
fomentar a formação e o fortalecimento de redes lizadas às crianças e aos adolescentes, estando
de apoio, requerem políticas sociais consistentes a saúde em um estado de fragilidade, tanto em
e adequadas. Assim, essa categoria também pode sentido amplo, concernente à noção de am-
ser pensada como violência estrutural. biente saudável para a vida e o desenvolvimento
Já o “abandono” parece ser uma problemá- humano, como mais estrito, referente à existên-
tica que se encontra na interface da violência cia e/ou eficiência de políticas sociais de saúde,
estrutural e familiar. A exemplo dos casos de compreendendo programas de assistência pre-
“não acesso à convivência familiar”, o abandono ventivos e/ou curativos, o que demonstra a clara
também reflete o drama de uma criança/adoles- articulação desta problemática com a violência
cente que se vê desprovida do cuidado do adulto estrutural.
que tem responsabilidade legal sobre ela, porém Em última instância, deve-se ainda consi-
tendo ele optado por essa condição, o que, em al- derar que problemas de comportamento infan-
guns casos, envolve a rejeição. Contudo, sabe-se to-juvenis percebidos como problemática que
que em boa parte das vezes o abandono remete ultrapassa os recursos familiares e/ou institucio-
a situações de extrema pobreza da família que, nais disponíveis para a devida socialização das
sem o devido suporte, considera a “doação” da crianças/adolescentes têm sido associados, en-
criança como um ato de proteção 34,35. quanto precursores, a condutas delitivas, com-
Na mesma linha, “problemas de compor- pondo trajetória em que a violência infracional,
tamento” e “drogadição” também parecem ser em termos desenvolvimentais, resulta da intera-
problemáticas que florescem da conjunção entre ção sinérgica entre a estrutural e a familiar 38.
violência familiar e estrutural e que, em alguma No tocante à violência doméstica, para além
medida, podem estar conectados, sendo que am- de suas expressões apreendidas nas categorias
bas remetem a um desenvolvimento psicossocial “negligência”, “violência física”, “violência sexu-
marcado por um conflito em relação ao meio, às al” e “violência psicológica”, parece pertinente
regras e às convenções sociais, ainda que mo- acrescer as categorias “convivência familiar ina-
mentaneamente. dequada” e “desaparecimento”.
De um lado, há de se considerar que proble- Em relação à primeira, considerando-se que
mas dessa natureza freqüentemente se associam ela remeta a situações em que a criança/adoles-
a determinadas práticas educativas, no interior cente seja exposta, como testemunha, a com-
de uma dinâmica familiar propícia. Concernin- portamentos dos adultos, como o uso abusivo
do especificamente os “problemas de comporta- de álcool e outras drogas e a violência conjugal,
mento”, há evidências de sua correlação positiva que, pela carga afetiva que portam, ameaçam ou
com o emprego de métodos coercitivos que, por efetivamente prejudicam seu desenvolvimento
sua vez, dependentemente da intensidade e fre- emocional, esta pode ser considerada uma sub-
qüência, também concorrem para a produção categoria de maus-tratos psicológicos, na linha
dos maus-tratos físicos e/ou psicológicos 36,37. do que já vem sendo feito em alguns países 39.
De outro lado, tais problemas também indicam Cumpre sublinhar que tais considerações con-
dificuldades para o manejo adequado da con- correm para que se amplie a definição de vio-

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lência psicológica normalmente utilizada, cujo A Tabela 2 permite dizer que as três formas
escopo abrange mais estritamente situações em de violência acometem crianças e adolescentes,
que os adultos sistematicamente depreciam ou no Município de Ribeirão Preto, e que o reorde-
ameaçam as crianças/adolescentes, em nome de namento das categorias nas classes de violência
uma educação rigorosa ou por hostilidade. denota com maior clareza a impertinência de
Quanto ao “desaparecimento”, referente às pensar o problema de modo estanque, focali-
situações em que a criança/adolescente foge de zando descritivamente eventos e/ou queixas ou
casa, segundo considerações do próprio Con- priorizando indivíduos e famílias, isoladamente.
selho Tutelar, isto freqüentemente se associa à O resultado resgata a complexidade dos pro-
violência familiar, em que a criança/adolescente blemas relacionados ao fenômeno da violência,
é submetida a múltiplos abusos, colocando o fe- chamando a atenção para o fato de que as situ-
nômeno mais propriamente como uma conse- ações freqüentemente transcendem o ambien-
qüência da violência doméstica. te doméstico, colocando em evidência quão
O resultado desse procedimento de classifi- imbricadas são as formas de violência – apesar
cações segundo as formas de violência é sinte- das diferenças nas manifestações – e o mau de-
tizado na Tabela 2 a seguir, apresentando-se sua sempenho do Estado no tocante ao seu papel de
distribuição, em freqüência e porcentagem. Nele garantir os diretos da infância e juventude.
também se destaca, especificamente em relação Tratando-se especificamente dos problemas
às expressões de violência estrutural, uma subdi- relativos à violência estrutural, destacam-se, em
visão das problemáticas desta esfera no tocante primeiro lugar, falhas relacionadas à política
à natureza da política pública mais diretamente educacional, em que figuram “falta de vagas na
relacionada. educação”, denotando importante demanda não

Tabela 2

Distribuição em freqüência e porcentagem das categorias empregadas pelo Conselho Tutelar de Ribeirão Preto, São Paulo,
Brasil, entre os anos 2000 e 2003, conforme a classificação relativa à forma de violência.

Categorias Freqüência Forma de violência Freqüência %

Educação Estrutural 3.158 43,4


Falta de vagas na educação 1.060
Evasão escolar 584
Violência institucional 23
Atendimento especializado na educação 16
Assistência social
Certidão de nascimento 514
Miserabilidade 508
Não acesso à convivência familiar 170
Assistência social 53
Saúde
Drogadição 181
Atendimento especializado na saúde 49
Problemas de comportamento 554 7,6
Abandono 324 4,6
Negligência 941 Doméstica 3.206 44,1
Violência física 787
Convivência familiar inadequada 529
Violência sexual 414
Violência psicológica 231
Violência doméstica (co-ocorrências) 165
Desaparecimentos 139
Ato infracional praticado por criança Infracional 30 0,4
Total 7.272 100,0

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atendida, especialmente por creches e pré-esco- tundente da conjunção entre a violência domés-
las; a “evasão escolar”; a “violência institucional”; tica e a estrutural, como já mencionado.
e a inexistência de “atendimento especializado No mais, é possível que o fenômeno da vio-
na educação”. lência infracional possua um elo com as situa-
Na seqüência, destacam-se os problemas ções elencadas nas categorias “problemas de
advindos de uma política de assistência social comportamento” e “drogadição”, que remetem a
e de cidadania deficitária. Nesse âmbito, apa- situações em que os adultos responsáveis apre-
recem a falta de “certidão de nascimento”, a sentam queixas relativas à disciplina dos pró-
“miserabilidade”, o “não acesso à convivência prios filhos, estando estes envolvidos em eventos
familiar” e a falta de vaga em programas de “as- considerados anti-sociais. Tal fato, além de re-
sistência social”. Tais categorias denotam, direta dimensionar a magnitude do problema, denota
ou indiretamente, a precariedade sócio-econô- com maior clareza o peso da violência estrutural
mica da qual padecem muitas crianças e adoles- para a produção da infracional, considerando-se
centes, no seio de suas famílias e/ou em famílias que a família ali se apresenta para reclamar uma
substitutas, em um município que compõe uma ajuda para o desempenho de seu papel socializa-
região considerada pólo de desenvolvimento no dor, que deve ser oferecida em serviços públicos
país. específicos.
Outras categorias, como falta de “atendi-
mento especializado na saúde”, “drogadição” e
até mesmo “problemas de comportamento”, de- Considerações finais
nunciam fragilidades específicas nas políticas
de saúde existentes, voltadas às crianças e aos Apesar da ressalva feita por Minayo 4, quanto ao
adolescentes, em uma cidade que reconhecida- fato de os dados sobre violência serem, por na-
mente conta com muitos recursos médico-hos- tureza, problemáticos, provisórios e tentativos,
pitalares. não traduzindo a verdade, a análise das notifica-
No tocante à violência doméstica, em primei- ções feitas ao Conselho Tutelar mostrou-se um
ro lugar, acredita-se ainda enfrentar o desafio de procedimento pertinente ao delineamento des-
dispor de definições amplamente aceitas que te fenômeno tão complexo, passível de orientar
permitam comunicação, comparação e genera- diferentemente o debate na área, ampliando as
lização de observações e resultados entre profis- possibilidades de reflexão sobre as diferentes for-
sionais e investigadores 22,40. Em termos práticos, mas que envolvem crianças e adolescentes, em
existe uma imprecisa delimitação entre os tipos, nossa sociedade.
que concorre para uma dificuldade real em clas- Esse procedimento encorpa a discussão que
sificar os casos, havendo freqüente confusão nos vem sendo travada, concernente à necessidade
termos empregados, conforme atestam alguns de se aprimorar o sistema de registro das noti-
autores 23. ficações, no contexto dos Conselhos Tutelares,
De todo modo, parece óbvio que, para além na linha do proposto, desde 1990, pelo Governo
das problemáticas normalmente associadas à Federal, em termos de padronização, informati-
violência doméstica, no contexto brasileiro, há zação e integração dos dados, de modo a obter-se
um rol mais amplo de situações, com potencial maior qualidade na sua produção e agilidade em
para produzir seqüelas mais ou menos evidentes seu tratamento.
nas crianças/adolescentes, equivalentes às tradi- Entretanto, diferentemente da orientação
cionalmente incluídas pelas definições estritas, adotada pelo Ministério da Justiça, por meio do
que deveriam ser pensadas nesta classe, o que Sistema de Informação para a Infância e Adoles-
concorreria imediatamente para uma conse- cência (SIPIA) 42, pelo qual se enfatiza o direito
qüente ampliação de sua importância quantita- ameaçado/violado, defende-se a necessidade
tiva em nossa sociedade. de dar igual destaque à modalidade de violência
Por fim, considerando-se a violência infra- perpetrada, segundo as conceituações aqui apre-
cional, independentemente dos números, sua sentadas – estrutural, infracional e doméstica –,
relevância está em sublinhar o fato de haver um pelo fato de este modo de classificação desvelar
grupo de crianças muito jovens que desempe- mais rapidamente as situações que envolvem
nham o papel de agentes da violência, sem que, as crianças e os adolescentes, problematizando
na opinião pública, se questione veemente a as diferentes instâncias de responsabilização
sociedade, os contextos de socialização a que (Estado, família e/ou sociedade) e resgatando o
estão submetidas e as práticas institucionais elemento de complexidade que normalmente as
implementadas, incluindo a de profissionais da caracterizam, necessário de ser considerado pa-
saúde e educação 41. É muito provável que essa ra a implementação de ações de enfrentamento
forma de violência seja o resultado mais con- efetivas.

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VIOLÊNCIAS CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES 331

Resumo

As situações de violência a que são expostas crianças e lho Tutelar. Em seguida, elas foram reagrupadas em
adolescentes são numerosas. O objetivo da investiga- termos de modalidade de violência. Do total de 7.272
ção aqui relatada foi descrevê-las qualitativa e quan- notificações analisadas, 43,4% puderam ser classifica-
titativamente com base nas informações disponibili- das como violência estrutural, e 44,1%, como domésti-
zadas pelo Conselho Tutelar, no Município de Ribeirão ca. Outras categorias se apresentaram, contudo, como
Preto, São Paulo, Brasil, entre os anos de 2000 e 2003, mais difíceis à classificação, denotando de modo ex-
visando a discutir as classificações para as notifica- plícito quão imbricadas são as formas de violência, o
ções feitas nesse órgão, segundo o sistema conceitual que corrobora a idéia de que seus determinantes são
de violências dirigidas à infância e à adolescência, pe- de natureza macro e microssocial, sendo expressos,
lo qual são destacadas as formas estrutural, criminal por vezes, no plano das relações interpessoais.
(infracional) e doméstica. A princípio, foi realizada
a contabilidade das notificações, organizando-as se- Violência; Notificação; Criança; Adolescente
gundo as categorias empregadas pelo próprio Conse-

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Recebido em 20/Out/2006
Versão final reapresentada em 15/Ago/2007
Aprovado em 24/Ago/2007

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