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A Enunciação como um conjunto de problemáticas teóricas

in: Fuchs, C. As problemáticas enunciativas: esboço de uma apresentação histórica e


crítica. Trad. Letícia M. Rezende. São Paulo: Alfa, 1985.

1. Os ancestrais da enunciação

Em cada um dos três domínios do trivium medieval delineiam-se certas problemáticas


de que a enunciação é, com certeza, a herdeira. Em ordem decrescente de importância
temos primeiramente a Retórica, depois a Gramática, e enfim a Lógica, que elaboraram
abordagens enunciativas da linguagem.

1.1. A Retórica - a Enunciação abordada a partir do discurso

Retórica apresenta-se como arte, técnica de produção de discursos persuasivos em


situação cujo modelo é o discurso jurídico

Retórica aristotélica compõe-se de três grandes partes:

 Provas – conceitualização do referente em função da estratégia argumentativa


adotada. Há três ordens de parâmetros:
Orador
Auditório
Tema

 Elocução (Lexis) – verbalização do pensamento – passagem do conceitual ao


lingüístico

 Disposição (Taxis) – encadeamento das partes do discurso

Esta retórica sustenta-se, enquanto princípio, na consideração daquilo que chamamos


hoje “situação de enunciação”

1.1.2. A retórica segundo Aristóteles (pós-aristotélica)

1.1.3. Os herdeiros modernos da retórica

a) as teorias da literatura – estilística, neo-retórica, semiologia, poética ...

b) as teorias do discurso – perspectivas sociolinguística ou ideológico-política -


noções como papel, lugar, imagem, máscara, simulação

c) as teorias da argumentação – mecanismos de persuasão

d) aplicações práticas – técnicas de expressão – arte do resumo, da dissertação


1.2. A Gramática - a Enunciação abordada a partir da língua

1.2.1. A Dêixis

1.2.2. Modalidades

1.3. A Lógica – Enunciação re-descoberta a partir da linguagem

1.3.1. Os postulados anti-enunciativos da lógica

1.3.2. As semânticas intensionais

1.3.3. Os filósofos da linguagem ordinária

2. Enunciação e Pragmática em Linguística contemporânea

2.1. A corrente enunciativa (no sentido estrito)

2.1.1. O processo contínuo de ampliação

2.1.2. A noção de categoria enunciativa

2.2. A corrente pragmática

2.2.1. Campo de estudo

2.2.2. Concepções teóricas

3. A diversidade dos pontos de vista possíveis sobre a enunciação

 A oposição língua e fala


 A concepção de semântica
 O papel do sujeito

3.1 O questionamento da oposição língua/fala

Argumentos que fundamentam esse questionamento:

a) constatação da existência de categorias linguísticas que encontram referentes somente


por meio da instauração discursiva

Exemplo: categorias que remetem à pessoa (eu, ele, nós...), ao espaço (aqui, lá ...) e ao
tempo (agora, então ...)

b) constatação de que o sistema linguístico (língua) se deixa apreender somente pelo seu
emprego. Essa questão se evidencia quando se propõem as funções da linguagem, e
verifica-se que não é possível estabelecer uma função da ordem da língua (referencial,
denotativa) em oposição a outras da ordem do discurso (conativa, emotiva).

A autora afirma que a oposição língua/fala tem de ser superada e não substituída
por novas dicotomias, tais como:

 Língua/Discurso

Plano Semiótico (Língua) e Plano Semântico (Discurso) - Benveniste

Sujeito e enunciação fazem parte do discurso, e se manifesta quando se passa do


estoque estático das unidades isoladas à dinâmica de sua combinatória no interior no
interior da frase.

 Enunciado/Enunciação

O enunciado traduz um “ato” realizado por um sujeito enunciador e “esse ato”


relaciona-se com a situação de enunciação. (Ducrot)

 Língua/Produtos textuais

Os textos são fruto de operações linguístico-cognitivas realizadas por sujeitos


interlocutores em relação de interação, e compõem-se por uma imbricação de marcas
enunciativas. Os produtos textuais (que são insaturáveis) equivalem à língua. (Culioli)

3.2. A concepção da Semântica

A semântica encontra diferentes acepções no quadro enunciativo.

3.2.1. A oposição sentido/significação recobre abordagens bem diferentes e põem em


relação diferentes níveis semânticos:

 Sentido/Referência
 Semântica/Pragmática (situação)
 Conteúdo proposicional/Modalidades e atos de linguagem
 Sentido literal/derivado (posto/pressuposto, dito/implícito/subentendido)

3.2.2. A semântica tem a dimensão da comunicação

Um ponto comum entre os modelos enunciativos é insistir sobre a função comunicativa


da linguagem. Nesse sentido, pode-se afirmar que as teorias enunciativas são herdeiras
da retórica.

A autora afirma que recolocar a semântica no quadro da interação verbal (troca verbal)
“é recusar os modelos que se pretendem exteriores aos sujeitos e neutros em relação à
produção e ao reconhecimento. É afirmar que as operações de construção e reconstrução
de sentido pelo emissor e receptor não são necessariamente reversíveis e que há, por
consequência, lugar para estudar a especificidade dos processos de produção e de
reconhecimento (...) daí um interesse pelos fenômenos como lapsos, ambiguidade,
desvio de sentido, paráfrase etc.”

3.2.3. Enunciação e Teoria do signo (a relação significante/significado)

As relações entre as teorias da enunciação e a teoria do signo não são claras.


A relação entre significante/significado, nos moldes estruturalistas, é questionada pelos
modelos enunciativos em geral, que nem sempre apontam uma resposta satisfatória para
essa questão.
Culioli propõe a noção linguística.

3.3. O papel do sujeito

As teorias enunciativas tentam integrar à análise lingüística o parâmetro “sujeito” e


tratam-no como um sujeito lingüístico, como suporte de operações lingüísticas.
A dificuldade de pensar a diversidade dos sujeitos lingüísticos possíveis, em função da
diversidade das operações lingüísticas de que eles podem ser os suportes, e de pensar a
distinção entre sujeito linguístico e sujeito extra-linguístico é enorme.

3.3.1. Os sujeitos linguísticos:

a) assertor direto/indireto

Exemplo:

João disse-me que Paulo lhe havia dito que você tinha vindo

Eu afirmo que Eu sei que <você tinha vindo>


S° S¹ S²

<João disse que>


< Paulo disse que>


S4

b) sujeito suporte da enunciação/sujeito colocado em cena pela enunciação:


personagens enunciativas: locutor (autor da enunciação) e alocutário (aquele a quem a
palavra é destinada)
personagens ilocutórios: enunciador (responsável pelo ato ilocutório) e destinatário
(objeto desse ato)

3.3.2. Sujeito linguístico e Sujeito extra-linguístico


Nos quadros enunciativos, os autores afirmam que os diferentes sujeitos lingüísticos não
devem ser confundidos com os sujeitos em carne e osso da realidade empírica extra-
lingüística.

A autora chama atenção para uma possível conexão entre as teorias linguísticas da
enunciação e as teorias não-linguísticas da linguagem.

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