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1 A palavra treta é aqui escolhida por seu caráter de tensão e possibilidade de, a partir da treta,
perceberem-se e serem criados novos caminhos. Foi entendida como um guia de leitura na fomentação
dos instrumentos para a análise literária surgidos a partir dela, dos embates, das “polêmicas” – como diz
Lígia Leite no seu subtítulo. Trazendo uma contemporaneidade ao título, escolho a palavra por ser assim
que leio as condições para o nascimento da(s) teoria(s) literária(s), ou a forma como ela(s) é(são)
usualmente narrada(s).
A forma como os fatos são discorridos, no texto, dá a entender que,
independente da validade da contribuição de Lubbok enquanto teoria,
foi a partir da crítica a ele que surgiram muitos outros vieses e formas
de perceber o narrador e o texto literário. A crítica ele, então, foi um
motor para muitos desdobramentos na teoria literária. Embora a
autora tenha escolhido a sistematização de Norman Frieddman, que
será delongada no próximo capítulo, essa faz questão de dar espaço
ao que se seguiu a partir de Lubbok, como importantes também pra
instrumentalizar a análise textual.
Se Lubbok foi alvo de discórdias por ter forjado uma normativa dura
em relação ao narrador-não-interventor e colocado o ponto de vista
em uma forma estática, Forster (1974) considera que a mudança de
ponto de vista dentro do romance pode ser encarada inclusive como
uma vantagem do romance, deixando-o mais verossímil com a
realidade da pessoa humana: que muda de percepção ao longo do
tempo e das situações. Muir, por sua vez, dá mais atenção a que não
seja travada uma disputa pelo “romanesco por excelência”, fazendo
uma sistematização dos diversos romances produzidos a partir da
diferença, não competitiva, em seus enredos. Booth dessacraliza o
lugar colocado do narrador inspirado em Henry James, acredita que o
modo de se contar uma história nada tem a ver com um ideal pré
estabelecido do “melhor”, mas sim com os valores e efeitos que se
quer transmitir e provocar. Defende que o “desaparecimento do
autor” é um mito, tal que esse não se esconde, apenas se mascara.
De Booth advém o conceito de autor implícito, esse manejador de
disfarces que deixa sua marca e avaliações na obra. (DAL FARRA,
1978).
É com a tessitura desses novos conceitos e ruptura dos antigos que
se vai conseguindo delinear uma outra forma de pensar, que não se
preocupa em valorizar ou normatizar, mas sim, entender os recursos
para estabelecer a comunicação mediada pela autonomia do mundo
de ficção criado: a retórica. Booth dá passos em relação a um
pensamento moderno, que logo criaria a materialidade linguística.
ISSO implica resistir a qualquer psicologismo que leve a confundir
FICÇÃO e realidade, personagens e pessoas, autor real e autor
representado num mundo feito de palavras. É uma forma também de
atualizar e de precisar, pela criação de uma categoria intermediária, a
distinção que Kayser já fazia entre o autor e o NARRADOR. O AUTOR
IMPLÍCITO é uma imagem do autor real criada pela escrita, e é ele que
comanda os movimentos do NARRADOR, das personagens, dos
acontecimentos narrados, do tempo cronológico e psicológico, do
espaço e da linguagem em que se narram indiretamente os fatos ou
em que se expressam diretamente as personagens envolvidas na
HISTÓRIA. (LEITE, 2000, P. 19-20)
Referências
ARISTÓTELES. Arte poética. In: —. Arte retórica. Arte poética. São Paulo, Difusão Européia do
Livro, 1964.
DAL FARRA, Maria Lucia. O narrador ensimesmado: o foco narrativo em Vergílio Ferreira.
Editora Ática, 1978.
{divagações durante, abertura de janelas e questões}