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Saúde Mental, Território e Fronteiras

Saúde mental:
- Área muito extensa e complexa do conhecimento.
- Campo (ou área) de conhecimento e de atuação técnica no âmbito das políticas públicas
de saúde → complexo, plural, intersetorial e com transversalidade de saberes.

A saúde mental não se baseia em apenas um tipo de conhecimento, a psiquiatria, nem é


exercida por apenas, ou fundamentalmente, um profissional, o psiquiatra.
Saúde mental é um campo bastante polissêmico e plural na medida em que diz respeito
ao estado mental dos sujeitos e das coletividades que, do mesmo modo, são condições
altamente complexas.
Saúde mental não pode ser reduzida ao estudo e tratamento das doenças mentais.

Uma instituição para loucos, doentes e sãos


Alienismo: pioneiro no estudo do que atualmente se conhece como “transtornos
mentais”.
O hospital foi criado na Idade Média como instituição de caridade. Tinha como objetivo
oferecer abrigo, alimentação e assistência religiosa aos pobres, miseráveis, mendigos,
desabrigados e doentes.
O Hospital Geral foi criado a partir do ano de 1656, pelo Rei de França → não mais
exclusivamente filantrópicos; passaram a cumprir uma função de ordem social e política
mais explícita.

O advento do Hospital Geral foi de fundamental importância para a definição de um novo


“lugar social” para o louco e a loucura na sociedade ocidental, segundo Foucault.

A instituição exercia a prática sistemática e generalizada de isolamento e segregação de


significativos segmentos sociais.
Com o advento do Hospital Geral a internação passou a ser determinada por autoridades
reais e judiciárias.
Com a entrada de médicos que buscavam atuar no sentido de humaniza-lo e adequá-lo
ao novo espírito moderno, o hospital foi medicalizado; foi transformado “na” instituição
médica por excelência.
Foi perdendo cada vez mais suas funções de origem de
caridade e depois de controle social; passou a assumir uma nova finalidade: tratar os
enfermos.
Medicalização O hospital se tornou a principal instituição médica.
do hospital Foi apropriado pela medicina, absorvido por sua
natureza.

A medicina se tornou um saber e uma prática


predominantemente hospitalares.

O processo de medicalização do hospital foi operado, essencialmente, a partir de uma


tecnologia política: a disciplina.
O hospital tornou-se espaço de exame, espaço de tratamento e espaço de reprodução
do saber médico.

Este modelo médico implica em uma relação com a doença enquanto objeto abstrato e
natural, e não com o sujeito da experiência da doença.

Isolamento do mundo exterior → primeiro e mais fundamental princípio terapêutico do


“tratamento moral”.
Se as causas da alienação mental estão presentes no meio social, é
o isolamento que permite afastá-las.
Pinel:
 Elaborou uma primeira nosografia.
 Consolidou o conceito de alienação mental e a profissão do alienista.
 Fundou os primeiros hospitais psiquiátricos.
 Determinou o princípio do isolamento para os alienados.
 Instaurou o primeiro modelo terapêutico nesta área (tratamento moral).

Alienação mental:
- Era conceituada como um distúrbio no âmbito das paixões, capaz de produzir
desarmonia na mente e na possibilidade objetiva de o indivíduo perceber a realidade.
- O conceito nasceu associado à ideia de periculosidade.
- Contribuiu para produzir uma atitude social de medo e discriminação para com as
pessoas identificadas como tais.

O hospital pineliano funcionava como um laboratório, o que fez com que o princípio do
isolamento se associasse à própria produção do conhecimento no campo do alienismo.
O hospital, enquanto instituição disciplinar, seria ele próprio uma instituição terapêutica.
Trabalho terapêutico: meio de reeducação das mentes desregradas e das paixões
incontroláveis; uma das estratégias do tratamento moral.

Principais funções do hospício (Esquirol):


 Garantir a segurança pessoal do louco e de suas famílias. A noção de
 Liberá-los das influências externas. segurança/periculosidade
 Vencer suas resistências pessoais. assume papel de
 Submetê-los a um regime médico. destaque em relação às
 Impor-lhes novos hábitos intelectuais e morais. funções terapêuticas.

Das Psiquiatrias Reformadas às Rupturas com a Psiquiatria

O alienismo foi objeto de muitas críticas → o isolamento e o tratamento moral


representavam paradoxos com os ideais libertários da Revolução Francesa.

Dificuldade em estabelecer os limites entre a loucura e a sanidade + as evidentes funções


sociais cumpridas pelos hospícios na segregação de segmentos marginalizados da
população + as constantes denúncias de violências contra os pacientes internados →
queda dos níveis de credibilidade do hospital psiquiátrico e da própria psiquiatria.

Colônias de alienados: primeira tentativa de resgatar o potencial terapêutico da


instituição psiquiátrica; construídas em grandes áreas agrícolas, onde os alienados
pudessem submeter-se ao trabalho terapêutico.
Logo se tornaram instituições
asilares de recuperação pelo
trabalho.

Experiências de reforma:
 Comunidade Terapêutica e Psicoterapia Institucional → acreditavam que o fracasso
estava na forma de gestão do próprio hospital e que a solução, portanto, seria introduzir
mudanças na instituição.
 Psiquiatria de Setor e Psiquiatria Preventiva → acreditavam que o modelo hospitalar
estava esgotado, e que o mesmo deveria ser tornado obsoleto a partir da construção de
serviços assistenciais que iriam qualificando o cuidado terapêutico, ao mesmo tempo em
que iriam diminuindo a importância e a necessidade do hospital psiquiátrico.
 Antipsiquiatria e Psiquiatria Democrática → o modelo científico psiquiátrico e suas
instituições assistenciais são colocados em xeque.

Comunidade Terapêutica:
- Processo de reformas institucionais que continham em si mesmas uma luta contra a
hierarquização ou verticalidade dos papéis sociais.
- Processo de horizontalidade e democratização das relações, que imprimia em todos os
atores sociais uma verve terapêutica.
- Reuniões para discutir/debater todos os aspectos relacionados à instituição.

Psicoterapia Institucional:
- Primado da escuta polifônica (busca de uma ampliação dos referenciais teóricos); noção
de acolhimento (importância da equipe e da instituição na construção de suporte e
referência para os internos no hospital).
- A noção de “trabalho terapêutico” foi resgatada (possibilidades de participação e de
assunção de responsabilidades por parte dos internos.
- Clube Terapêutico.
- Ateliês ou oficinas de trabalho e arte.
- Transversalidade.

Psiquiatria de Setor:
- Percepção da necessidade de um trabalho externo ao manicômio, da adoção de
medidas de continuidade terapêutica após a alta hospitalar.
- Foram criados centros de saúde mental (CSM) distribuídos nos diferentes “setores”
administrativos das regiões francesas → Regionalização
- Subdivisão do espaço interno do hospital (cada setor em uma enfermaria).
- Acompanhamento pela mesma equipe dentro e fora do hospital.
- Equipe multiprofissional.

Psiquiatria Preventiva (Saúde Mental Comunitária):


- Entendimento de que todas as doenças mentais poderiam ser prevenidas, desde que
detectadas precocemente.
- “Busca de suspeitos”, que deveriam ser encaminhados a um psiquiatra para
investigação diagnóstica.

 Prevenção Primária: intervenção nas condições possíveis de formação da doença


mental.
 Prevenção Secundária: realização de diagnóstico e tratamento precoces da doença
mental.
 Prevenção Terciária: busca da readaptação do paciente à vida social, após a sua
melhora.

- Conceito estratégico: crise.


 Crises evolutivas: relacionadas a processos normais do desenvolvimento físico,
emocional ou social.
 Crises acidentais: precipitadas por alguma perda ou risco.

- Equipes de saúde mental passaram a exercer um papel de consultores comunitários,


identificando e intervindo em crises.
- Conceito de desvio: anormal ou pré-patológico.
- Conceito de desinstitucionalização: conjunto de medidas de desospitalização → foram
criados vários equipamentos extra hospitalares.
- Ocorreu aumento da demanda psiquiátrica nos EUA.

Antipsiquiatria:
- A experiência dita patológica ocorre não no indivíduo enquanto corpo ou mente doente,
mas nas relações estabelecidas entre ele e a sociedade.
- Crítica à adoção pela psiquiatria do modelo de conhecimento das ciências naturais.
- O hospital psiquiátrico radicalizaria as mesmas estruturas opressoras e patogênicas da
organização social.
- Conceito de duplo vínculo.
- Permitir que a pessoa vivencie sua experiência; terapeuta auxilia a vivenciar e a suportar
este processo.

Psiquiatria Democrática:
- Pensamento e prática institucional voltados para a ideia de superação do aparato
manicomial (estrutura física do hospício + conjunto de saberes e práticas).
- Experiência de Trieste → referência para o processo da reforma psiquiátrica brasileira.
- Fechamento de pavilhões ou enfermarias psiquiátricas + criação de serviços e
dispositivos substitutivos ao modelo manicomial.
Visavam tomar o lugar das instituições
psiquiátricas clássicas.
- CSM não funcionavam em mão dupla; atuavam no território, onde eram integralmente
responsáveis pelas questões relativas ao cuidado no campo da saúde mental.
- Inclusão social: cooperativas de trabalho; residências para ex-internos.

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