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Agradeço primeiramente - e imensamente - à Marina Grinover que
aceitou me acompanhar no processo de realização deste trabalho.
Por todas as orientações e pelas palavras de conforto nos momen-
tos de auto-questionamento.
agradeço
Agradecimento especial à Julia, pelas ótimas ideias sempre, além
de companhia imprescindível nos momentos mais necessários.
Aos meus pais, os grandes culpados por eu ter tido a ideia de estu-
dar arquitetura.
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índice
introdução 12
método de abordagem 15
as hipotéses 37
conclusões 121
bibliografia 129
O presente trabalho reúne algumas inquietações que foram Ou seja, de que forma a concepção arquitetônica, que tem 1. Hipótese é definida, segundo
elaboradas no decorrer da minha formação em arquitetura e urba- como ferramenta primordial o desenho, expressa uma intenção de o dicionario houaiss: “Suposição,
conjectura, pela qual a imaginação
nismo dentro da FAU. percepção e experiência de um espaço?
antecipa o conhecimento, com o
Perceber o espaço é algo que construímos como habitantes Para arquitetos que tem os códigos da representação mapea- fim de explicar ou prever a possível
dele, no entanto passar a interpretá-lo, analisá-lo e produzi-lo traz dos é possível observar um projeto e identificar nele a lógica que realização de um fato e deduzir-lhe
diversos questionamentos sobre como a disciplina conforma esse concebeu os espaços. Para um leigo, o espaço é percebido em si, e as consequencias; pressuposição.
espaço para o outro. a transição entre a concepção e a percepção só é completa se tanto
A aproximação desses questionamentos poderia ser feita de os aspectos funcionais quanto os sensitivos estiverem bem expres-
diversas formas, a partir da própria prática da arquitetura, do debru- sados naquela arquitetura (TSCHUMI, 1977)
çamento acadêmico, das análises das soluções espaciais já existen- É possível olhar para um projeto e perceber, nos espaços
tes, dentre outros. Escolher um desses caminhos como investigação criados, quais as hipóteses arquitetônicas que estavam ali suge-
foi uma opção, e dessa forma o presente trabalho se presta a, a partir ridas? Qual a materialização das ideias funcionais, de uso e expe-
de quatro estudos de caso, descrever, analisar e reconstruir essas riência que se concretizam? Em que contexto e dentro de quais
soluções existentes. referências arquitetônicas o projeto está inserido? Como ele reflete
O conceito de hipótese1 aparece aqui como um entendimen- um ideário e mesmo as contradições de um certo contexto arquite-
to que precede a conformação do espaço em si, é a antecipação tônico? Estas foram algumas das inquietações iniciais feitas para os
das formas que satisfazem uma necessidade futura, transformando projetos a serem estudados.
solicitações funcionais, sociais e subjetivas em um projeto mate- É esse olhar para a arquitetura que se propõe no presen-
rializado (MONTANER, 2017). Não existe apenas uma solução te trabalho: a partir de um levantamento de projetos exemplares
frente à uma determinada demanda, e sim diversas hipóteses de extrair deles suas hipóteses e formas de materialização das ideias.
como esta pode ser suprida. Ideias essas que correspondem tanto a coisas, referente à concretu-
Contextos e períodos históricos diferentes conformam hipó- de e à existência material dos mesmo, quanto às não-coisas, ligadas
teses diferentes, de maneira que os projetos traduzem em si quais primeiramente às apreensões subjetivas do espaço, mas também
ideias eram correntes em determinado contexto, desde social até a como o contexto histórico e político influenciam nos resultados
tecnicamente. espaciais.
É por isso, que cada um dos projetos aqui estudados foram
também nomeados de hipóteses, no sentido que, pra além de A arquitetura se manifesta de muitas formas na cidade, mais
serem um projeto de fato – todos construídos e em uso – refletem ou menos tradicionais, mais ou menos adequadas a uma certa con-
também algumas antecipações de ideias, e é a partir de cada um cepção de projeto que a disciplina tem, e portanto diversos progra-
deles que busco pesquisar e explorar como uma certa concepção mas ou tipologias poderiam ser selecionados para que se discutisse
materializa um espaço, um projeto em si, implantado, abrangendo a conformação de uma ideia arquitetônica. No entanto, é inegável
um certo programa. a importância da discussão habitacional, tanto na construção da
Para tal discussão foi escolhido um tema, e dentro dele al- morfologia do território, como programa, uma vez que é o espaço
guns estudos de caso. mais comum a todos – comum no sentido de reconhecimento de
Parte-se de uma inquietação trazida por uma colocação de lugar, e não somente de vivência conjunta, como no espaço públi-
Bernard Tchumi a respeito das três etapas envolvidas no enten- co - quanto como reconhecimento da importância de discutir como
introdução
dimento de um projeto: a concepção, a percepção e a experiência. se dá o acesso à moradia, e como arquitetos e poder público lidam
com tal demanda. Se a produção do espaço é reflexo da socieda-
“Perceber o espaço arquitetônico de um de (LEFEBVRE, 2001), é de suma importância entender como
edifício é perceber algo-que-foi concebido se produz a habitação no território – que corresponde à 80% das
construções de uma cidade.
(…) O espaço não é simplesmente a pro-
O recorte se faz ainda mais restrito, uma vez que os projetos
jeção tridimensional de uma representa- tratam de habitações coletivas, com financiamento público no Bra-
ção mental, mas é algo que se ouve e que sil, entendendo a importancia de reconhecer as particularidades da
se age.” (TSCHUMI, 1980, p.176) realidade brasileira na produção pública da habitação, do território
e da cidade em geral.
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método de abordagem
parte II • objetos de estudo
em dia em plena sintonia com o adensamento da Paulista, foi o relação com a cidade informal, e como lidar com esses grandes ter-
primeiro edifício vertical dela, acompanhando o desenvolvimento ritórios auto construídos, consolidados e ao mesmo tempo carentes
da região em centralidade, além de inaugurar em São Paulo ideias dentro das cidades, e a segunda é como a construção de habitação
tanto de habitabilidade moderna quanto da linguagem arquitetô- pode colaborar para a conformação de uma urbanidade, desde seu
nica modernista carioca, de referência europeia. Se configura como uso até a seu desenho.
a hipótese do edifício lamina em área central consolidada. Os exemplos selecionados se afastam entre si quanto a tipo-
Em seguida examino o Parque CECAP2, dos arquitetos João logia e contexto, porém se aproximam por outro motivo: são proje-
Batista Vilanova Artigas, Paulo Mendes da Rocha e Fábio Pentea- tos que materializam suas hipóteses de forma singela, sem buscar a
do. Um dos últimos grandes exemplos dos anos 1960, antes que arquitetura espetacular, cada um tem um objetivo e uma estratégia
o modelo de financiamento de habitação popular do BNH3 se e usam de boa técnica para realizá-la. O interesse, por fim, é olhar
instaurasse durante a ditadura. Se o edifício Anchieta expressa a para a arquitetura do cotidiano do morar, que é estruturadora da ci-
estética carioca, o Conjunto Zezinho Magalhães Prado4 traz o ra- dade, seja a cidade formal em que se encontra o edifício Anchieta,
cionalismo paulista próprio dos arquitetos autores do projeto, tanto ou a informal, da Gleba A, ou como propositora de outras formas
na concepção do edifício, quanto em sua implantação - tratados na de vida coletiva, focando em outras demandas, que, apesar de seus
descrição e análise do projeto. problemas, também trazem consigo uma coerência interna.
Inserido em um contexto de consolidação da região metropo-
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01.
EDIFÍCIO ANCHIETA
EDIFÍCIO ISOLADO
ÁREA CENTRAL
MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
02.
PARQUE CECAP
02 CONJUNTO HABITACIONAL
REGIÃO METROPOLITANA
MUNICÍPIO DE GUARULHOS
03
01
04
03.
COPROMO
CONJUNTO HABITACIONAL
REGIÃO METROPOLINA
MUNICÍPIO DE OSASCO
04.
GLABE A, HELIÓPOLIS
EDIFÍCIO EM ÁREA INFORMAL
MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
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Abordar o tema da habitação social no Brasil ultrapassa as desde grandes conjuntos habitacionais até edifícios isolados como 6. A Companhia Metropolitana de
discussões internas da disciplina da arquitetura, no que abrange no caso do edifício Anchieta. As diretrizes dos projetos do IAPI Habitação de São Paulo – COHAB-
SP, criada em 1965, é o orgão que
a estética, a linguagem, os materiais ou mesmo a organização dos se mostraram percursoras e compreenderam diversas questões do opera conforme os programas e
espaços, pois há um nível da discussão diretamente ligado às polí- urbanismo moderno em seus projetos, contando muitas vezes com ações estabelecidos pelo Programa
ticas públicas e à ação do Estado na produção de habitação. equipamentos e obras de infraestrutura em seus conjuntos. Habitacional do Município.
Por serem de financiamento público, cada um desses pro- O Conjunto Zezinho Magalhães é um empreendimento da
7. BONDUKI, N. G. Os Pioneiros da
jetos esteve ligado a uma política ou programa relativo à ação do antiga autarquia8 da Caixa Estadual de Casas para o Povo, CECAP,
Habitação Social - Inventário da
Estado na produção de habitação e sujeito à diversas restrições, seja e foi um dos primeiros geridos pelo orgão, a partir da mudança da Produção Pública no Brasil entre
verba, metragem e programa. Não somente a arquitetura conforma política de habitação com o início da ditadura militar no Brasil. A 1930 e 1964. São Paulo: Editora
uma hipótese da maneira de habitar e morar, mas também há um CECAP incrementou seus projetos a partir da implementação do UNESP, 2014.
nível associado à que o Estado acredita como suprir tal demanda. Banco Nacional da Habitação e do Sistema Financeiro da Habi-
8. Autarquia é definido pelo
Tal nível acaba por influenciar diretamente esses projetos, tação em 1964, passando ai a de fato construir conjuntos habita-
dicionário Houaiss como “Entidade
pois tem impactos sobre as diretrizes frente à demanda habitacio- cionais (PUNTONI, 1997). Os arquitetos Vilanova Artigas, Paulo autônoma, auxiliar e descentralizada
nal. Ao mesmo tempo, tais questões são, e já foram, o maior volume Mendes da rocha, Fábio Penteado - entre outros - que constituí- da administração pública, sujeita
de pesquisa relacionado à habitação coletiva de financiamento pú- ram o Escritório Técnico da CECAP para desenvolver o projeto, à fiscalização e à tutela do Estado,
com patrimônio constituído de
blico, e muitas vezes seus projetos são vistos unicamente por esse foram nomes mais tarde perseguidos na ditadura, mesmo tendo
recursos próprios, e cujo fim é
viés, algo que inclusive contribui para uma ideia de que a moradia realizado tal projeto no início do período. No entanto, representam executar serviços de caráter estatal
popular está atrelada a um certo modelo a ser replicado, e não um a vanguarda moderna da escola paulista, e o projeto do CECAP ou interessantes à coletividade
projeto que demande a mesma qualidade ou investimento discur- Guarulhos foi desenvolvido - em parte - e permaneceu referência
sivo do que habitações coletivas de financiamento privado. nas obras modernistas dos anos 1960. 9. A CDHU - Companhia de
contexto da política pública
Desenvolvimento Habitacional e
Para se traçar um panorama de projetos, como o presente Entre o Parque CECAP e o Conjunto COPROMO, em Osas-
Urbano do Estado de São Paulo
trabalho se propõe, seria válido incluir propostas que focaram seus co, ocorreu um grande período dominado pelos projetos generalis- - empresa do Governo Estadual,
objetivos unicamente na demanda quantitativa, porém, ao fim, de- tas do BNH, que criavam exatamente um modelo de habitação a vinculada à Secretaria da Habitação
cidiu-se que os projetos selecionados seriam aqueles que olharam ser replicado - e que se distanciava de uma pesquisa de indústria (descrição institucional).
também para as demandas qualitativas da habitação, e dão margem e produção de habitação em massa, como no caso do CECAP – e
para a discussão dos valores arquitetônicos intrínsecos a esses pro- buscava unicamente atingir números frente à demanda, além de
jetos, ultrapassando uma discussão unicamente político-econômi- iniciar uma lógica de crescimento das construtoras que produziam
ca. Os projetos tradicionais do BNH ou mesmo diversos conjuntos esses conjuntos.
realizados pela Cohab6 entre 1964 – ao início da ditadura – até o Por um lado, esses conjuntos tiveram um impacto urbano
final dos anos 1980, não tem em si uma hipótese de arquitetura. e marcam até hoje presença no mercado de habitação popular no
Sua hipótese é outra, é a da lógica da produtividade. Brasil. Como mencionado anteriormente, seria válido discuti-lo e
Além disso, publicações sobre o assunto tem crescido e fo- analisar qual o projeto de arquitetura está por trás de tal modelo,
ram referencia tanto para o levantamento dos projetos como para porém seguiu-se buscando hipóteses e estratégias de projeto que
o entendimento do contexto da política pública em que estão in- agregassem outras discussões de projeto e de construção de urba-
seridos. nidade. Por todo esse período – que vai do início da ditadura até
1986, quando foi extinto, sendo incorporado pela Caixa Econômica
O livro “Os pioneiros da habitação social”7 organizado por Federal - a legislação que operava na construção dessas obras dis-
Nabil Bonduki e Ana Paula Koury, levantou o panorama da política sociou a produção de habitação da construção de cidade.
pública de habitação, que vai desde 1930 até 1964, período ini- O COPROMO se insere em uma proposta de financiamento
ciado pelo governo de Getúlio Vargas, em que diversos institutos diferente de todas as demais, e é resultado de uma iniciativa im-
de financiamento de habitação popular são criados, até o início do plementada pela gestão municipal de Luiza Erundina (1989-1992)
período da ditadura militar. Neste panorama inclui-se o Edifício através do Programa Funaps Comunitário. O projeto em Osasco
Anchieta, que faz parte da iniciativa do IAPI (Instituto de Aposen- resulta do rateio entre as famílias, até parte de financiamento pelo
tadoria e Pensões dos Industriários), órgão responsável por grande CDHU9, além da construção por mutirão autogerido pela comuni-
parte da produção de habitação popular do período, que incluiu dade. Na época o USINA e alguns outros escritórios puderam par-
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10. Informação retirada do site ticipar de algumas iniciativas como esta, que demonstram até hoje das pessoas que lá habitam. As “solicitações de projeto” contem- IMAGEM 01
institucional da CDHU: http:// bons resultados em questões econômicas e de fixação da comuni- porâneas demandam uma aproximação para com os desafios sociais Conjunto promovido pelo Programa
www.cdhu.sp.gov.br/web/guest/ Minha Casa Minha Vida em Marabá,
institucional/quem-somos
dade no local. Ela se configura como uma experiência muito menos próprios de agora, seja a de reintegração com território existente PA, que revela a monotonia e
vertical de construção de habitação – no sentido de hierarquia de ou mesmo de lidar com a vacância dos centros urbanos (RUBANO, repetitividade da solução da
11. O Programa Minha Casa Minha decisão, e imposição de uma forma hegemônica e universal. Não 2014). Associando o discurso da disciplina da arquitetura e do urba- habitação própria de tal ação do
Vida é uma iniciativa do Governo se sente uma imposição do desenho do arquiteto tão grande nesse nismo em relação à habitar cidades - e também um entendimento Estado. A foto faz parte do ensaio
Federal fundado em 2009 e visa a fotográfico realizado por Tuca Vieira
projeto quanto por exemplo no CECAP, tornando-se um exemplo de como essa cidade apresenta-se - e à produção e o acesso à essas e apresentado na X Bienal de
promoção de habitação popular em
áreas urbanas e rurais.
da associação entre processo produtivo, financiamento e projeto. moradias. Arquitetura de São Paulo
E atende famílias das faixas de Por fim, dentro de um contexto contemporâneo de finan-
renda de abaixo de 5 mil reais ciamento, o projeto da Gleba A, em Heliópolis, é financiado pela
mensais bruto (faixas 1, 2 e 3) CDHU. “Herdeira” da autarquia do CECAP, a CDHU assumiu o
papel de principal promotora de habitação no estado de São Paulo
e a maior empresa habitacional do Brasil, movimentando cerca de
1 bilhão de reais por ano10. O entendimento da atuação da empresa
passa pela compreensão do desenvolvimento da política habitacio-
nal brasileira nos últimos 50 anos (ROYER, 2002), deixando mar-
cas em sua estrutura institucional.
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A solução de projeto parte de um problema, de uma certa de- cial soma-se uma camada de agentes e condicionantes do projeto
manda programática, a qual o arquiteto usará de um determinado diferentes mesmo das demandas de recursos e tempo da iniciativa
método objetivo para conceber a melhor resposta para tal (MU- privada, de modo que cada política pública acaba por influenciar
NARI, 1998). no desenho desses projetos.
Nesse sentido surge a hipótese de projeto, que antevê, para
aquela demanda, qual a ideia espacial que responde melhor àque- O título do trabalho faz ainda referencia à ideia de “habitar”,
las necessidades colocadas. A hipótese surge não como a solução o que se torna essencial no que o presente trabalho considera na
em si, pois essa será o projeto, mas ela corresponde a uma série de construção de moradia.
valores sociais, urbanos, técnicos e de linguagem que se buscará Henri Lefebvre diferencia o habitat do habitar, entendendo
materializar em um edifício. o primeiro unicamente como suprimento da necessidade de ha-
No caso do problema habitacional tem-se um método ou bitação do indivíduo para sua sobrevivência, em contraposição ao
modelo bem claro. As necessidades programáticas de uma casa são habitar, em que soma-se à apropriação do espaço em si, e como
algo bem definidos na sociedade ocidental que desde a revolução aquele espaço permite um direito à cidade (LEFEBVRE, 2001).
industrial vem projetando a casa operária ou popular urbana – isso Se Lefebvre coloca o direito à cidade como:
sem questionar essas necessidades no mundo contemporâneo ou
se a organização espacial tradicional não reproduz algumas rela- “Significa o direito dos cidadãos – cita-
ções sociais já ultrapassadas. No entanto o programa relacionado à dinos e dos grupos que eles constituem
morar é algo bem consolidado em nossa sociedade.
(sobre a base das relações sociais) de
Confirmamos isso uma vez que todas as demandas coloca-
das pelo poder público para as unidades reproduzem as mesmas figurar sobre todas as redes e circuitos de
necessidades programáticas: uma área social, de convivência con- comunicação, de informação, de troca”
junta, as partes privadas dos quartos e um núcleo de área molhada (LEFEBVRE, 2008, p. 31)
com um banheiro, uma cozinha e uma área de serviço. O edifí-
cio Anchieta foge um pouco ao modelo, uma vez que conta com É válido questionar se o modelo do conjunto habitacional
um quarto unido às áreas molhadas destinado a uma empregada realmente corresponde à esse direito e se configura como um
doméstica. A existência desse cômodo demonstra a destinação a espaço de habitação e não somente de habitat. A cisão entre
uma classe de mais alta renda dentro da classe dos industriários e o conjunto e a cidade tradicional – não histórica, mas a cidade
também quais necessidades e relações estavam incluídas em um heterogênea – distancia seus moradores das redes de troca, e não
apartamento de 1940. faz a manutenção ou a reprodução de novas redes de troca e de
projetar o habitar
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informais e autoconstruídas, vendo como uma possibilidade de ha- A teoria crítica de arquitetura tem emprestado de outras dis-
bitabilidade para as populações que ali se instalam - com a devida ciplinas seus métodos de analise, seja a historia, a arte, a sociologia,
revisão de precariedade que também muitas vezes lhe é própria. ou as contribuições filológicas de estudo de dados sociais ou téc-
Isso surge, em oposição à uma ideia de arquitetura universalizan- nicos (ZEVI, 1996). No entanto a própria produção da arquitetura
te, funcional e racional, imposta hierarquicamente - como ocorre não se faz a partir desses códigos, o que implica em uma distância
muitas vezes nos conjuntos habitacionais. O COPROMO, por mais entre a própria arquitetura e o método de analisa-la.
que seja um conjunto, aparece nessa transição, aproximando a co- Há também uma distância entre o que a arquitetura produz
munidade da produção do espaço, ainda que se configure como um - espaços – e o instrumento que utiliza em seu processo de con-
território de exceção ao tecido urbano. cepção – o desenho. A partir dele, a arquitetura assumiu códigos
Por mais que conformem esse tipo de território, é neces- de representação abstrata dos espaços, representando o volume ar-
sário relativiza-los como ação, entendendo-os exatamente como quitetônico como uma projeção ortogonal das seções horizontais e
as hipóteses que são, entendendo-os como produtos de uma verticais do edifício, ou seja, as plantas e cortes.
concepção de um contexto não apenas arquitetônico, mas fruto de
expectativas do desenvolvimento de habitação por parte do Esta- “Os desenhos arquitetônicos são, na
do. melhor das hipóteses, um modo de traba-
lhar, e de pensar a arquitetura, e que, por
natureza, em geral se referem a algo que
está fora deles (ao contrario dos dese-
a represetação na arquitetura
nhos artísticos que remetem unicamente
a si mesmo, a sua materialidade e proce-
dimentos.)” (TSCHUMI, 1980)
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senta como linguagem analítica dos projetos, é um esforço de, se IMAGEM 03.
Neste exemplar da arte popular
utilizando dos códigos tradicionais da representação arquitetônica
brasileira, de Antonio Poteiro, a
- a projeção ortogonal - uni-la à volumetria dos espaços, como forma paisagem da várzea e do rio, é
de sintetizar esses diversos planos que conformam uma edificação. representada a partir de uma
As linhas da planta também estão associadas à uma dimen- simultaneidade de planos que não
se configuram como nossos olhos
são vertical, e a união das duas qualidades dessas linhas é que per-
captariam tal cena, ao mesmo
mite nos aproximar da materialização delas no espaço. tempo, ainda nos permite entender
A representação utilizada pode ser estranha aos olhos, uma a cena, as diversas posições dos
vez que une duas projeções ortogonais paralelas do espaço - a plan- jogadores de futebol e os barcos
ta e a elevação - adicionando ainda um nível tridimensional. O de- navegando no rio.
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Tais exemplos se tratam da representação arcaicas do espaço, IMAGEM 05.
Referência mundial, o manual de
no entanto, torna-se simbólica da necessidade de apresentar a ar-
dimensões e organização dos
quitetura em geral – entendendo aqui a arquitetura como a cidade espaços realizado pelo arquiteto
em si, os espaços livres e construídos. alemão Ernst Neufert, toma
Ao mesmo tempo, apesar de esforços, sejam eles vernacula- como partida algumas medidas e
proporções que seriam adequadas
res, técnicos ou subversivos, parte da existência de uma obra não
para a habitabilidade de um ser
pode ser representada de nenhuma forma. Seu entendimento em humano no espaço.
totalidade só é conhecido e vivido na experiência direta. Principal-
mente se tratando de habitação, em que o real entendimento do
espaço se da na vivencia cotidiana dele.
30 31
As ferramentas que o arquiteto dispõe para projetar estão IMAGEM 08.
Neste retrato do projeto da Sadat
diretamente associadas aos resultados encontrados. Se fossemos
Rest House, de Hassan Fathy,
mais a fundo em cada um dos projetos, entendendo cada etapa de autoria do próprio arquiteto,
de sua concepção e desenvolvimento seria possível, por exemplo, há, tanto a referência à própria
perceber diferenças em um projeto que partiu do croqui de outro representação do antigo Egito,
IMAGEM 07. quanto a subversão da maneira
que partiu de uma maquete, ou mesmo de um projeto concebido
Mario Botta utiliza da representação tradicional de representação
paralela como discurso de na prancheta de outro realizado em sua totalidade nos softwares arquitetônica. Aqui o arquiteto
linguagem e de projeto. dos computadores. realiza a mesma estratégia de
rebatimento dos planos ortogonais
que conformam o entendimento do
desenho de arquitetura: a planta e
as elevações.
IMAGEM 09.
O cartaz produzido pelo Arquiteto
Alex Wall para o escritório Office
for Metropolitan Architecture do
arquiteto Rem Koolhaas, baseado no
projeto para o concursodso Parc La
Villette também usa da planificação
como forma de subversão do
entendimento tradicional do espaço.
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As representações realizadas - que constam na segunda parte dade pode tanto terminar em si, como no caso do Anchieta, como 12. Citação reproduzida na página
do trabalho - a partir das bases tradicionais dos projetos, ou seja, pode ser reproduzida por toda a gleba do conjunto, como no caso 26 do presente trabalho, relativo à
referência bibliográfica Zevi, 1996,
suas respectivas plantas e cortes, tornam-se o próprio método de do COPROMO. p. 19
aproximação dos projetos. Se a o concepção desses projetos foi rea- • Essa análise, já se aproxima da escala do edifício e com as relações
lizada a partir do desenho, ao refaze-los a partir do modelo eletrôni- espaciais estabelecidas entre ele e sua externalidade. Nesse caso
co – método escolhido para essa reconstrução e posterior síntese já é utilizada a representação proposta, em que os diversos planos
de representação – é possível identificar o raciocínio que existiu ortogonais são justapostos exatamente para propor uma compreen-
em seu desenvolvimento, as modulações, as repetições e a organi- são de como a volumetria interna do pavimento se relaciona com
zação dos ambientes a partir de premissas arquitetônicas. a externa.
Pelo fato dos projetos contidos neste trabalho serem exem-
plares das hipóteses que representam, e comuns no imaginário da Escala da unidade, da porta para dentro. O primeiro módulo do
história da arquitetura e dos arquitetos em geral, o acesso aos de- habitar proposto por cada um dos projetos, a organização da casa,
senhos originais e tradicionais são acessíveis, e portanto, conside- a relação com a circulação e as possibilidades espaciais propostas
rou-se de mais valia a ressignificação dos mesmos, como parte do por cada uma.
estudo, ao invés de apenas reproduzi-los como já se conhece. • A análise da unidade parte da planta, se amplia para o recorte
De toda forma não foram desconsideradas as bases originais de cada ambiente com a tridimensionalidade do plano ortogonal
e as formas de apresentação tradicionais de planta e corte. Cada rebatido e insere a escala humana no trabalho, retomando a fala de
uma das representações está associada a uma forma de compreen- Bruno Zevi12, estabelecendo - baseado nos layouts propostos pelos
são da arquitetura. arquitetos nos projetos originais - um mapa de uso e ações possí-
Duas formas de síntese da representação para posterior aná- veis, a partir da negativação dos cheios e vazios.
lise dos edifícios foram propostas, primeiramente a perspectiva pa-
ralela que associa as projeções ortogonais horizontais e verticais, e A variedade de representações que foram solicitadas para
o diagrama axonométrico, que por mais que também se afaste de compreender os vários níveis de um projeto demonstram em si
uma percepção do observador do espaço, é um código mais comum a complexidade em que um projeto se baseia, de nível urbano à
ao entendimento, e busca demonstrar a tridimensionalidade total unidade habitacional.
pesquisa de linguagem
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quatro hipóteses
hipotese i • edificio anchieta
hipotese ii • parque cecap
hipotese iii • copromo
hipótese iv • gleba A, heliópolis
O edifício Anchieta, obra do escritório MMM Roberto,
de 1941, estréia a verticalização da Avenida paulista através
da construção de habitação promovida pelo IAPI (Instituto de
Aposentadoria e Pensões dos Industriários). Primeiro edifício
vertical da Avenida Paulista, acompanhou o desenvolvimento da
região em centralidade urbana e econômica.
Implantado no que hoje se configura como uma área
extremamente consolidada, o edifício que estava inserido em um
hipótese i • edifício anchieta
escala 1:1000 39
hipótese 01 • edifício anchieta
imagem 10
imagem 11
ANO: 1941
40 41
imagem 12
unidade
pavimento
edifício
pavimentos 12
pavimentos residenciais 11
total de unidades 80
pavimentos uso comercial 2
pavimentos com garagem 1 Apesar da metragem muito acima de uma média das habitações
1 populares, a verticalidade do edifício Anchieta favorece uma
levantamento de dados
total de edifícios 1 O valor de 1200 habitantes por hectare, se comparado com o valor
população total 480 da cidade de São Paulo (73 hab/ha) traz a questão do potencial de
área total construída (m2) 14400 adensamento da cidade, uma vez que expõe o quanto a cidade é
área terreno (m2) 4000 esparsa. Localizado em um dos bairros nobres e centrais, a Bela
ca 3,6 Vista, os dados de densidade populacional também se apresentam
taxa de ocupação 0,6 como um dos mais altos índices entre os bairros de São Paulo.
densidade populacional do projeto (hab/ha) 1200 O levantamento de dados corresponde à expectativa do projeto, e
densidade populacional do entorno (hab/ha) 260 de sua hipótese de referência à Unite D’habitacion modernista, no
que diz respeito ao adensamento populacional da cidade moderna.
43
projeto • concepção arquitetônica
sem escala 45
projeto • concepção arquitetônica
46 sem escala 47
projeto • concepção arquitetônica
48 sem escala 49
volumes construídos: volumes construídos:
descrição • qual urbanidade? lâmina e bloco de garagem lâmina
a
O edifício ocupa um terreno retangular, que cruza a quadra,
lic
gé
an
possibilitando frente para três ruas. Ele se organiza em um
a
id
en
av
embasamento comercial, com frente para a avenida paulista e uma
profundidade de aproximadamente 1/3 do terreno. É onde também
via
se dá um dos acessos de moradores. A transição entre o espaço público du
to
ok av
da rua, e o edifício Anchieta se dá por algumas áreas ajardinadas, que uh
ar
a
ko
en
id
a
pa
conferem um pequeno espaço livre no terreno, a real área de lazer ei ul
ist
a laç
ão
so
livre se concentra na cobertura. da
co
n
sua laje era destinada para um pátio de uso condominial, mas não se
efetivou e acima disso não há nenhuma edificacão, garantindo um
espaço grande entre a torre residencial e os lotes vizinhos.
51
Acima do térreo comercial sobe a torre residencial, com 10
pavimentos. Ela se divide basicamente em três tipos de
apartamentos. Se organizando como a forma mais clássica da
lamina, cada apartamento ocupa a extensão transversal da lamina,
tendo sua fachada principal para a rua e o fundo para a circulação
descrição • unidade espacial
horizontal avarandada.
0 1 5 10
53
descrição • da porta para dentro
55
0 1 5
diagramas • circulação
sem escala 57
diagramas • circulação
58 sem escala 59
O parque CECAP de Guarulhos é uma das últimas experiências
de produção de habitação popular promovida pelo Estado antes
de um longo período marcado pelos projetos do BNH durante a
ditadura militar no Brasil.
A implantação em Guarulhos demonstra o contexto de consolidação
da região metropolitana de São Paulo, e o enfrentamento da questão
habitacional pelo Estado em uma das áreas de maior concentração
de moradia operária.
Projeto dos arquitetos Vilanova Artigas, Paulo Mendes da Rocha e
Fábio Penteado o Conjunto Zezinho Magalhães faz referencia às
hipótese ii • parque CECAP
escala 1:10000 61
hipótese 02 • parque CECAP
imagem 13
imagem 14
ANO: 1967
62 63
imagem 15
unidade
pavimento
edifício
pavimentos 4
pavimentos residenciais 3
total de unidades 60
pavimentos uso comercial 0
pavimentos com garagem 1
pavimentos área comum 1
área total residencial (m2) 3120
área total circulação horizontal (m2) 300 O projeto do CECAP não foi construído em sua integridade, o
área total circulação vertical (m2) 200 conjunto que encontramos hoje é referente à aproximadamente
levantamento de dados
sem escala 67
projeto • concepção arquitetônica
68 escala 1:150 69
13. A citação é extraida da Edição O conjunto não conta apenas com as zonas residenciais, chamadas volumes edificados:
do debate sobre o Conjunto no memorial dos arquitetos de “freguesias”, mas também com edifícios habitacionais
Habitacional Zezinho Magalhães
equipamentos, distribuídos funcionalmente, cada um ocupando e equipamentos públicos
realizado na FAUUSP em 1967.
Desenho no 4, São Paulo, GFAU, a área de uma quadra, em diferentes pontos da gleba em que o
1972. conjunto está implantado. Tais equipamentos estavam inseridos
em um projeto de uso de toda a população da região, para além
do conjunto. A questão habitacional não é enxergada como
única finalidade do morar. Integrado às freguesias e às áreas de
equipamentos tem-se as áreas livres e o sistema viário.
A visão funcionalista organizacional dos espaços da razão áreas não edificadas e livres
modernista fica evidente. Em um debate a respeito do Conjunto
Zezinho Magalhães de 1967, Artigas defende a ideia do urbanismo
“progressista”, aos moldes dos entendimentos modernistas da
época13:
0 1 5 10
73
A unidade volumétrica do edifício é resultado das 5 repetições dos
módulos. Cada módulo, articula duas duplas de unidades, cada
uma das duplas uni-se linerarmente entre si, e são integradas
simetricamente a partir da circulação. A lâmina modernista clássica
também é reconfigurada aqui em duas lâminas conjugadas.
O intervalo criado pelas circulações e pela lamina cria pátios
internos, para onde estão voltadas as aberturas internas das lâminas.
Cada unidade ocupa uma seção transversal da lâmina, permitindo
a ventilação cruzada.
descrição • unidade espacial
0 1 5 10
75
descrição • da porta para dentro
0 1 5
77
diagramas • circulação
sem escala 79
O tipo de canteiro do projeto do COPROMO, o mutirão autogerido
pela comunidade (com mão de obra assalariada de apoio), influencia
na grande racionalidade do desenho do projeto, que por sua vez
que está diretamente relacionada à produção do canteiro – tanto
nos processos produtivos quanto nas atividades relacionadas à
gestão da obra por parte dos mutirantes.
O projeto do COPROMO está intimamente ligado ao seu processo
de produção.
escala 1:2000 81
hipótese 03 • COPROMO
imagem 16
ANO: 1991
82 83
imagem 18
unidade
pavimento
edifício
pavimentos 5
pavimentos residenciais 5
total de unidades 20
pavimentos uso comercial 0
pavimentos com garagem 0
pavimentos área comum 0
área total residencial (m2) 1080
área total circulação horizontal (m2) 85
área total circulação vertical (m2) 47,5
área total uso condominial(m2) 0
Por se tratar de um conjunto foram estabelecidas duas formas de
levantamento de dados
sem escala 87
volumes edificados e
caminhos pavimentados de
pedestres de conexão dos
edifícios
89
14. Existem sim diversas pré-
existências no entorno do terreno
de implantação do conjunto, seja de
morfologia das ocupações vizinhas
ou do sistema viário. No entanto,
ao se fechar em si, o COPROMO,
de certa forma, nega essas pré-
existências e realiza uma ideia
de ocupação que refere-se a ele
mesmo.
sem escala 91
descrição • unidade espacial
0 1 5 10
93
descrição • da porta para dentro
0 1 5
95
A solução estrutural referente a circulação vertical é também um
aspecto inaugural no projeto do COPROMO e dos mutirões auto-
geridos em geral.
sem escala 97
16. Citação do memorial descritivo A proposta para a Gleba A de Heliópolis realizada pelo escritório
do projeto retirado do livro Vigliecca Hector Vigliecca & Associados está inserida não somente numa
& Associados. O terceiro território.
são paulo, 2014. p. 145
tendência contemporânea de produção de habitação social, mas
também estritamente ligada a um histórico de produção do próprio
arquiteto Hector Viggliecca.
escala 1:2000 99
hipótese 04 • gleba A
imagem 20
imagem 19
imagem 21
ANO: 2004
100 101
imagem 22
unidade
pavimento
edifício
pavimentos 4
pavimentos residenciais 3
total de unidades 49
pavimentos uso comercial 0
levantamento de dados
103
17. Citação do memorial descritivo
do projeto retirado do livro Vigliecca
& Associados. O terceiro território.
são paulo, 2014. p. 145
109
Todos os edifícios do projeto da Gleba A tem uma grande adaptação Por fim, a tipologia das esquinas que possui mesmo gabarito dos 19. Zona Especial de Interesse
com o território, ao mesmo tempo que dispõe de uma grande blocos do meio de quadra, porém possuem outros usos no térreo. Social. As ZEIS são divididas
em 5 tipos. No caso, a área de
racionalidade projetual. São inclusive esses outros usos que diferenciam o projeto do implantação se configura como ZEIS
programa comum utilizado nas habitações sociais dentro das 1: “ são áreas caracterizadas pela
Na quadra em questão cada uma das 3 tipologias conta com ações mais recentes da CDHU, que comumente restringiam o uso presença de favelas,
uma unidade tipo – com excessão do edifício laminar que possui residencial aos projetos de habitação social em ZEIS.19 loteamentos irregulares e
empreendimentos habitacionais de
uma tipologia no térreo diferente dos andares superiores. Todas A implantação de uso misto também demonstra um caráter de interesse social, e assentamentos
as tipologias contém um mesmo principio, mesmo contendo criação de urbanidade para o território e não apenas de demanda habitacionais populares,
diferenças: se organizam sempre espelhadas entre si - de forma quantitativa de habitação. Existem 6 salas de comércio e 2 salas habitados predominantemente por
a aproveitarem os acessos da circulação - ocupam toda a seção de medicação, que também cumprem grande função social. população de baixa renda,
onde haja interesse público em
do edifício, permitindo a ventilação cruzada e usam dos mesmo
manter a população moradora
módulos de vedação e de aberturas. Por mais que haja uma variação Os quatro pavimentos superiores são ocupados por uso residencial e promover a regularização fundiária
descrição • edifício, unidade espacial
da organização do programa da unidade habitacional todas contem totalizando 20 unidades, e a circulação vertical se dá por um e urbanística, recuperação
dois quartos, uma área de estar social, um banheiro, uma cozinha edifício anexo que contem os blocos de escada e a circulação ambiental e produção de Habitação
de Interesse Social” como consta
e uma área de serviço (estes sempre unidos, criando um núcleo de horizontal. Existem dois destes edifícios anexos na QUADRA 1,
no Plano Diretor Estratégico de São
áreas molhadas). um em cada esquina. Paulo aprovado em 2014.
111
0 1 5 10
113
descrição • da porta para dentro
0 1 5
115
diagramas • circulação
comparações possíveis
Cada um dos projetos analisados se configuram também
como “formas genéricas” de uma certa hipótese arquitetônica, essa
ideia regeu toda a construção da análise do trabalho. Nenhum dos
projetos é inaugural de uma certa tipologia ou de uma tendência
urbanística, e sim são referencias de seu próprio tempo. Ao mesmo
tempo, tornaram-se exemplares na própria história da arquitetura
reforçando a própria hipótese em que se embasaram.
123
21. MARX, Karl. O capital: O tema da habitação social lança mão de outras áreas do co-
Crítica da economia nhecimento por se inserir em um processo social e da política pú-
política. São Paulo: Nova
Cultural, v. I, p. 70, 1985. apud
blica que extrapola a arquitetura (PETRELLA, 2011). Ao mesmo
PETRELLA, 2011, p.114 tempo, expõe os compromissos dos arquitetos na construção do
território para além da instância privada – que conta normalmente
com mais recursos e mais liberdades criativas.
Os quatro exemplos foram selecionados por contradizerem
uma idéia de que a habitação social corresponde a um modelo, que
replicado, irá suprir a demanda relativa à moradia. Tal solução foi,
por muitas décadas adotada, criando territórios de exceção, guetos
urbanos e afastando parte da população – a mais pobre – das re-
des de troca da cidade, dos acessos à heterogeneidade de usos, de
equipamentos e do transporte. A redução da habitação social a um
mero modelo serve ao lucro das construtoras, e não aos seus mora-
dores ou à cidade como um todo.
Cada um dos estudos de caso sugere uma possível estratégia,
de urbanidade e arquitetura, desenvolvida a partir do desenho e do
projeto, e que resulta de fato em espaços para habitar.
É necessário, no entanto, relativizar os projetos como pro-
dutos de seu contexto histórico, e como resultado de uma vontade
política.
120 m2 52 m2
“(...) se cada uma dessas experiências for
tomada isoladamente, isto é, autonomiza-
das do processo histórico que, de algum
comparações possíveis
125
0 1 5
As comparações possíveis entre os projetos estão, portanto, de habitação coletiva, houve um esforço em determinar métodos 22. Dado retirado do Censo
amparadas nas relações sociais que “produziram” as formas especí- e parâmetros comuns a todos os projetos, tanto no levantamen- Demográfico do IBGE 2010
ficas aqui exemplificadas. Toda crítica, correspondente às “manei- to de dados quanto nas escalas de apresentação de cada um dos
23. Descrição dos objetivos do
ras de habitar” de cada um deles, precisa levar em conta as bases desenhos. No entanto, para a criação de uma base comparativa
projeto segundo a página online
sociais e históricas em que as hipóteses estão embasadas. sistemática, existe a necessidade de equivaler os dados de algum do grupo, que consta no endereço:
O projeto do Conjunto Zezinho Magalhães, por exemplo, modo, e precisar categorias de desenho, escala e apresentação mais https://chc.fau.usp.br/sobre
não é apenas parte de uma vontade política de reprodutibilida- regulares. O grupo é organizado pelos
de em massa, como são, por exemplo, os conjuntos do BNH, do Este esforço mirou-se no exemplo dos Cadernos de Habita- docentes Leandro Medrano e Luiz
Recamán da FAUUSP.
mesmo período ou os do Programa Minha Casa, Minha Vida, mais ção Coletiva. Tal publicação é iniciativa do grupo de pesquisa da
recentes – em que o projeto arquitetônico é destituído de impor- FAUUSP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universida-
tância. Neste exemplar da arquitetura modernista consta um en- de de São Paulo) que “visa a sistematização de informações sobre
tendimento, da época, de como poderia dar-se a democratização as habitações coletivas, que ficarão disponíveis para pesquisadores,
dos espaços de moradia, e como a indústria e a construção a partir órgãos públicos, profissionais e interessados” 23. Faz parte de uma
da pré-fabricação poderiam cooperar para tanto. A crítica aos re- cooperação com a ETSAM-UPM (Escuela Tecnica Superior de
sultados desta hipótese são realizadas a partir de outro contexto Arquitectura de Madrid) que realiza levantamento semelhante a
histórico, em que outras “verdades” estão sugeridas. respeito das habitações coletivas Espanholas.
O projeto conta com uma sistematização de escalas, catego-
Cada um dos exemplares de projetos de habitação coletiva rias de desenhos, além de um extenso e dedicado levantamento
tratados no trabalho são resultado do pensamento arquitetônico. de dados, possibilitando um entendimento técnico de cada um dos
Podemos até questionar sua forma, mas em cada um deles existe edifícios analisados.
uma intenção urbana e arquitetônica ali discutida: A escolha de realizar mais de um estudo de caso neste tra-
balho esteve amparada na intenção de estabelecer um método de
“A boa arquitetura tem caráter emancipa- leitura de projeto e um levantamento, que eventualmente pode-
tório e papel fundamental na promoção ria ser levado adiante, com análises de outras propostas de habita-
ção coletiva ou social. No entanto, exatamente pela existência de
da qualidade de vida e desenvolvimento
um projeto como os Cadernos de Habitação coletiva para tanto, e
humano.” (FERREIRA, 2012, p.30) como decisão pessoal de pesquisa, abdicou-se de certas sistemati-
zações para dar lugar a uma pesquisa de representação a partir do
E de forma concomitante e recíproca, a boa arquitetura tem redesenho e das sínteses descritivas dos projetos.
também compromisso no desenvolvimento da cidade, que por sua A pesquisa de representação desenvolvida permitiu a inves-
vez é a realidade de mais de 80% da população brasileira22, onde tigação dos próprios processos que a disciplina utiliza para a elabo-
se trabalha, se mora, onde se usufrui do lazer e das redes de troca ração de projetos e possibilitou entender a lógica de que se valeu
em geral. cada um dos estudos de caso analisados no que diz respeito à sua
Estudar tais projetos foi uma forma de entender quais “von- concepção.
tades” estão em jogo na produção do território e na criação de
acesso à moradia para parte da população. Também, estudar boa Analisar os modos de habitar, por sua vez, compreende di-
arquitetura, boas soluções espaciais, nos torna capaz, a partir da reções de estudos para além das antecipações de necessidades
distância contextual, de ponderar possíveis decisões de projeto. A materializadas pelos arquitetos. Se aproximar de como as pessoas
partir disso, é possível olhar com mais clareza nosso tempo histó- ocupam de fato os espaços e entender sua apropriação é um campo
rico e nosso território a ser transformado, questionando quais as paralelo, mas que converge à análise de projeto.
demandas – em relação ao habitar – que estamos lidando. Se de fato a arquitetura propõe conscientemente espaços
habitáveis - da unidade habitacional à cidade - tais soluções são
Por outro lado, não no entendimento da construção social, reconhecidas e utilizadas pelas pessoas? As ideias se afastam ou se
política e arquitetônica de cada um dos exemplos, mas no esta- aproximam da vida cotidiana delas? Articular o desenho e o projeto
belecimento de uma base de dados para comparação de projetos à ocupação e experiência nos espaços é um compromisso da arqui-
tetura e sua forma de desenvolvimento.
126 127
IMAGEM 01. Tuca Vieira (fotografia cedida pelo autor) ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura nova: Sérgio Ferro, Flávio
IMAGEM 02. Extraído de: https://bracketsmackdown.com/elements-of- Império e Rodrigo Lefèvre, de Artigas aos mutirões. São Paulo:
Ed. 34, 2002.
design-pdf.html
IMAGEM 03. Reprodução da obra Rio de Janeiro, de autoria de Antonio BARAVELLI, José Eduardo. O Cooperativismo Uruguaio na
Habitação Social de São Paulo: Das cooperativas FUCVAM à
Poteiro, sem data
Associação de Moradia Unidos de Vila Nova Cachoeirinha. 2006.
IMAGEM 04. O jardin de Nebamun, 1400 a.C. Estuque em uma tumba Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo,
de Tebas, 64 x 74,2 cm; Museu Britânico, Londres. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.
IMAGEM 05. NEUFERT, Ernst. A Arte de projetar em arquitetura. São BONDUKI, Nabil. KHOURY, Ana Paula (orgs.). Os pioneiros da
Paulo, Editora Gustavo Gili; Edição: 18ª, 2013. Habitação Social, Vol. I, Vol. II e Vol. III. São Paulo, Editora Unesp,
IMAGEM 06. Increasing disorder in a dining table, Sarah Wigglesworth,
2014.
IMAGEM 12. Leonardo Finotti (fotografia cedida pelo autor) Fontes, 1998.
IMAGEM 13. Arquivo FAUUSP, Arquigrafia, sem data, sem autor
IMAGEM 14. Arquivo FAUUSP, Arquigrafia, sem data, sem autor
PETRELLA, Guilherme Moreira. Das fronteiras do conjunto
ao conjunto das fronteiras. 2009. 372 f. Dissertação (Mestrado)
bibliografia
IMAGEM 15. Arquivo FAUUSP, Arquigrafia, sem data, sem autor – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São
IMAGEM 16. Arquivo Usina CTAH Paulo, São Paulo, 2009.
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IMAGEM 18. Arquivo Usina CTAH conjunto das fronteiras. Pós, São Paulo, V. 18, 2011, p. 114 a 135.
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PUNTONI, Álvaro. Trabalho Programado 2: CECAP Zezinho
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IMAGEM 21. Arquivo Hector Vigliecca & Associados Estrutura Habitacionais Urbanas - Um ensaio de ocupação de
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estudo sobre a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e
Urbano do Estado de São Paulo – CDHU. 2002. 209 f. Dissertação
(Mestrado) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade
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130 131