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1. Introdução
Este ensaio tem por objetivo apresentar as principais ideias do filósofo alemão Ludwig
Andreas Feuerbach a respeito da religião. A religião, especialmente o cristianismo, foi o centro
da atividade intelectual e da “perdição” do ousado filósofo que rompeu com o pensamento de
seu mestre Hegel e transformou a religião num fenômeno antropológico, expressão da natureza
humana.
Considera a religião a essência imediata do ser humano, acreditando assim poder
explicitar os "tesouros escondidos no homem". Reduz atributos divinos da teologia a atributos
humanos da antropologia. Sua filosofia procura transformar a teologia de Hegel em uma
antropologia baseada no mesmo princípio, a unidade do limite e do infinito. Compondo a
esquerda hegeliana, Feuerbach defende a idéia de que para Hegel a religião não é razão, e sim
representação, sendo então redutível ao mito. Esta facção, em um primeiro momento, faz uso
das idéias hegelianas dirigindo-as contra a teologia e a filosofia tradicional. Em uma segunda
etapa, acaba por criticar as abstrações hegelianas em defesa do homem concreto, e a fé cristã
em defesa de uma metafísica imanentista. Distancia-se de Hegel, entre outras coisas, ao eleger
o homem concreto como sua prioridade e não a idéia de humanidade.
2. A Essência do Cristianismo
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Feuerbach, Ludwig. A Essência do Cristianismo. Trad. José da Silva Brandão, 2a. ed., Campinas, Papirus, 1997.
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“O homem se distingue do animal pela consciência.” 2 Em outra passagem afirma:
“Consciência é a característica de um ser perfeito”. 3 O homem tem consciência de si através do
objeto. Ou seja, o outro: o eu e o tu, na visão positivista.
Querer, sentir e pensar são perfeições, essências, realidades... são infinitos, ilimitados. É
ser consciente de si mesmo. É impossível, afirma Feuerbach nos remetendo à Descartes quando
fala que Deus só pode ser um ser perfeitíssimo, ser consciente de uma perfeição como
imperfeição; impossível sentir o sentimento como limitado, impossível pensar o pensamento
como limitado.4
Feuerbach continua na linha cartesiana: “o divino só pode ser conhecido pelo divino”. 6
Isto quer dizer: se não tivéssemos o divino em nós, não poderíamos falar, exprimir ou
experimentar o divino. E o divino não é razão, é sentimento: “a essência divina que o sentimento
percebe é em verdade apenas a essência do sentimento arrebatada e encantada consigo mesma
2
Opus cit. p. 43.
3
Opus cit. P. 48.
4
Opus cit. P. 48.
5
Opus cit. P. 47.
6
Opus cit. P. 51.
2
– o sentimento embriagado de amor e felicidade”. 7 O autor constata que fez-se do sentimento a
parte principal da religião, bem como a essência objetiva dela. “O sentimento é transformado
num órgão do infinito, da essência subjetiva da religião, o objeto da mesma perde seu valor
objetivo”.8 E no objeto religioso a consciência coincide com a consciência de si mesmo, o seu
íntimo. Já num objeto sensorial, a consciência está fora, e no religioso, o objeto está dentro do
próprio homem, sendo sua essência. Assim, amparado em Agostinho que diz que “Deus é mais
próximo, mais íntimo e por isso, mais facilmente reconhecível que as coisas sensoriais e
corporais”,9 Feuerbach resume sua visão antropológica da religião:
Nesse sentido, a religião tornou-se, para Feuerbach, uma idolatria, pois o homem adora a
sua própria essência: “os predicados divinos são qualidades da essência humana” 11 e “na
religião, o homem ao relacionar-se com Deus, relaciona-se com a sua própria essência”. 12
Como vimos, para Feuerbach, o homem é quem cria Deus e não o contrário. Segundo o
autor, a filosofia precisa dar conta deste homem como um todo, e não somente da razão que o
compõe. Deve abraçar a religião, enquanto fato humano, considerando este homem em
comunhão com outros homens, caminho este através do qual ele pode sentir-se livre e infinito.
O autor acredita que somente a religião dá conta do homem em sua totalidade. Feuerbach
sugere que a religião desempenha um importante papel na vida do homem concreto. Para ele, a
consciência que o homem tem de Deus é a consciência que o homem tem de si. Acredita que
para se conhecer um homem, basta conhecer seu Deus, já que na sua concepção, a religião, o
Deus do homem, nada mais é do que a projeção da intimidade da essência do homem. Assim
sendo, para Feuerbach o método da teologia é a antropologia, pois o homem deposita em seu
Deus a sua essência.