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Professor Gabriel Lopes (atualidades)

Direitos Humanos e Cidadania

Os Direitos Humanos, são um produto da modernidade, especificamente fruto do ciclo das


revoluções burguesas iniciadas no final do século XVII com a Revolução Gloriosa (ocorrida na
Inglaterra) e concretizadas no final do século XVIII com a Revolução Francesa. Nessas revoluções,
que foram uma resposta à Monarquia Absoluta (que centralizava os poderes no rei) surge a ideia de
um conjunto de direitos indissociáveis (inseparáveis) do ser humano, tidos como naturais e
universais. Essas revoluções revindicavam direitos individuais, algo até então inédito na História,
principalmente o direito de comercializar sem as limitações de uma economia regulada pelo Rei e
poder acumular riquezas, até então proibido pela Igreja e consequentemente mal visto pela
sociedade, além do direito a propriedade privada.
A Cidadania, ao contrário dos Direitos Humanos, é concentrada. Se corresponde com a
Cultura (hábitos e atitudes instituídos pelo costume de um grupo) e geralmente se limita a um
território ou um grupo estabelecido. Ser cidadão portanto, implica em estar incluído em uma ordem
jurídica (que pode ser estabelecida por um costume ou um documento, no caso da constituição) e
pelo sentimento de pertencimento a uma nação. A Cidadania quando exercida de forma plena,
garante direitos básicos e invioláveis aos cidadãos. Esses direitos, são divididos em 3 categorias:
Civis, Políticos e Sociais

→ Civis: São os direitos individuais. Compreendem a garantia a vida, liberdade, direito de ir e vir,
liberdade de pensamento, direito a propriedade privada e igualdade perante a lei

→ Políticos: São os direitos que garantem a participação do cidadão no governo e na política.


Permite a realização de manifestações políticas, participação na eleição e candidatura e o direito a
formação de partidos políticos

→ Sociais: Garantem a participação do cidadão na riqueza do Estado. Se traduzem em direito ao


trabalho, salário-mínimo, amparo financeiro (fundo de garantia), além do direito a educação

A Cidadania, no entanto, não se resume exclusivamente aos Direitos. Para que o sujeito seja
considerado cidadão, ele também deve cumprir com os seus deveres fundamentais:

→ Votar para escolher nossos governantes.


→ Cumprir as leis.

→ Respeitar os direitos sociais de outras pessoas.

→ Educar e proteger nossos semelhantes.

→ Proteger a natureza.

→ Proteger o patrimônio público e social do País.

→ Colaborar com as autoridades.

Existem casos em que um direito do cidadão de determinada nação (local), pode coincidir
com um Direito Humano (universal), no entanto, de acordo com as resoluções do direito
internacional, um direito local, nunca pode ser invocado para ferir um Direito Humano. Essa
relação entre os direitos local e internacional, gera uma série de dúvidas, principalmente, porque
existe uma tendência, inclusive muito característica no Brasil, de conotação negativa dos Direitos
Humanos, geralmente associado a defesa de criminosos. Esse tipo de associação, comporta duas
críticas principais:

→ Quando associada à defesa de criminosos, deve observar determinados aspectos: Os ditos


“criminosos” geralmente são sujeitos pobres e que atendem a todas as características de populações
historicamente segregadas (negros, moradores de periferias, sub-educados), ao contrário, por
exemplo, de sujeitos historicamente integrados (ricos ou médios econômicos de pele mais clara,
residentes de áreas mais desenvolvidas). Esses últimos por sua vez, também cometem crimes, mas
possuem um tratamento diferenciado. Portanto, podemos colocar que essa crítica é uma deturpação,
pois identifica como criminosos, apenas uma parte da população

→ Incompatibilidades culturais, já que uma série de “direitos” previstos na Declaração dos Direitos
Humanos são completamente distanciados da nossa realidade, fazendo assim com que caiam na
descrença, além do que, muitas vezes não desejamos que os direitos sejam aplicados da forma como
são “impostos” pela declaração. Esse tipo de pensamento é característico nosso, já que, não somos
convidados ao debate a respeito das leis do país e nem estimulados a refletir a respeito delas nas
instituições educacionais. Essas atitudes são características de países que não prezam pela
cidadania, ou seja, pela participação dos indivíduos na sociedade.

OBS: Devemos observar que, uma vez esclarecidos a respeito dessas contradições da política, não
podemos mais simplesmente aceitar esse posicionamento de alienação, podendo agora discutir e
pensar a respeito de nossa realidade, muito mais do que isso, podemos agir.

Cidadania no Brasil: aspectos Históricos

Estudar a cidadania no Brasil, é entender por que a nossa realidade parece tão distanciada do
que se pretende na nossa constituição, no nosso código de leis. Acredito que todos nós, já nos
perguntamos como é possível que tantas atividades ilegais que nos cercam, sejam consideradas
dessa forma, visto que acontecem de forma tão natural, também já devemos ter nos questionado que
as decisões que são tomadas na Câmara e no Senado, apesar de realizada por sujeitos eleitos pela
população em geral, parecem acontecer de forma tão distanciada da sociedade, enfim, não
entendemos os limites que dividem o legal e o real, o que é sintoma característico da falta de
cidadania. Fica a questão no ar: Em algum momento de nossa História foi possível a cidadania
plena? Seria ela compatível com a democracia ou qualquer outra forma de governo que já tenha
passado em nosso país? Ou no mundo?

Brasil Colonial: Ausência de direito e ausência de poder público

O período colonial aparece na História da cidadania brasileira como o “peso do passado”. O


contato entre os europeus e indígenas é marcado pelo massacre dos autóctones (nativos) brasileiros.
É implantado no Brasil, um sistema econômico para suprir as demandas comerciais européias.
Dentre as consequências dessa política, podemos destacar:

→ O primeiro produto extraído, foi o pau-brasil. Além do grande desmatamento gerado, a mão-de-
obra usada foi indígena, primeiramente paga com produtos de pouco valor para os europeus, como
machadinhos e espelhos (até então desconhecidos pelos índios), demonstrando o baixo valor
atribuído ao trabalho alheio pelos europeus. Logo em seguida, se inicia a escravidão indígena

→ A produção de cana-de-açúcar para o abastecimento europeu, instalou o latifúndio (grande terra)


monocultor (que lavra apenas um produto) baseado na mão-de-obra escrava no Brasil, ou seja, se
consolidava a escravidão no Brasil. A consolidação do escravismo como modo-de-produção, faz
com que a visão pejorativa sobre o negro e também sobre o índio, seja um dos principais motivos
do atraso da nossa cidadania. Contribuiu profundamente para a exclusão social dessas parcelas da
população ainda nos dias de hoje
→ A ausência de escolas e de iniciativa de implantação de um ensino primário pelo governo
português, gerou uma grande taxa de analfabetismo na população em geral Estima-se que até 1872,
apenas 16% da população era alfabetizada, em sua maioria pertencentes a elite. Outro fator foi a
proibição da abertura de universidades no Brasil, sendo a elite letrada encaminhada para as
universidades de Coimbra, como consequência, até o final do período colonial, cerca de apenas
1242 estudantes brasileiros haviam se formado. No mesmo período na América espanhola, cerca de
150.000 estudantes haviam conseguido títulos universitários

→ É no período colonial que se consolida a base das divisões de poder na sociedade brasileira. Os
cargos políticos eram ocupados pela elite (principalmente a elite rural). Essa mesma elite que
circulava nos postos do Judiciário, Legislativo e Executivo, assegurava suas vantagens pessoais
através do poder público

Independência e Império

A independência do Brasil, ocorre sem a participação popular. Assim como no período


colonial, a maioria da população fica excluída dos direitos civis e políticos. O sentimento de
nacionalidade, se manifesta apenas no período final do império, assim como a abolição da
escravidão que ocorre apenas no penúltimo ano do período. Dentre as características da implantação
(ou falta dela) do período, pode-se destacar:

→ Apesar da implantação da primeira constituição e da obtenção do voto (em determinada medida


até bastante amplo), o tipo de identificação cultural e nacional no Brasil, era fragmentado, ou seja,
se dava por regiões. A população não se identificava como brasileira, mas sim como pernambucana,
paraibana, baiana, etc. A tentativa do processo de identificação brasileira, ocorre apenas durante a
guerra do Paraguai (1865), devido a um conjunto de fatores: Luta contra um inimigo externo,
formação de uma liderança política (chefe inspirador), culto ao símbolo nacional (bandeira),
união de voluntários (orgulho)

→ A formação do Estado (país) brasileiro, não parte, portanto da iniciativa da população civil, nem
se dá através da união da nação, mas sim da negociação entre a elite portuguesa, com a Inglaterra e
a elite brasileira

→ Quanto ao voto, apesar da grande parcela a qual foi possibilitado o voto – no Brasil, em 1881
cerca de 50% da população masculina votava, enquanto que em 1770, em Portugal, apenas 9%, na
Itália 2% e na Inglaterra 7% - essa parcela não possuía condições de votar de forma consciente, nas
palavras de José Murilo de Carvalho, um dos principais expoentes do estudo da cidadania no Brasil,
o perfil dos votantes:

Os brasileiros tornados cidadãos pela constituição eram as mesmas pessoas que tinham vivido os três
séculos de colonização nas condições que já foram descritas. Mais de 85% eram analfabetos, incapazes de
ler um jornal, um decreto do governo, um alvará da justiça, uma postura municipal. Entre os analfabetos
incluíam-se muitos dos grandes proprietários rurais, mais de 90% da população viva em áreas rurais, sob o
controle ou a influência dos grandes proprietários. Nas cidades, muitos votantes eram funcionários públicos
controlados pelo governo(…) A maior parte dos cidadãos do novo país não tinha tido prática do exercício
do voto durante a colônia. Certamente, não tinha tido noção do que fosse um governo representativo, do que
significava o ato de escolher alguém como seu representante político.

→ A escravidão que só foi abolida em 1888, também não partiu de iniciativa popular, demonstrando
a falta de amadurecimento de consciência, mas das elites, pressionadas pelos interesses econômicos
internacionais. Acontece que a escravidão foi mantida enquanto prestou aos interesses do
desenvolvimento dos Estados Nacionais europeus e na consolidação da revolução industrial, através
da importação de negros africanos que eram mestre em técnicas de trabalho como ferreiros,
carpinteiros, marceneiros. Consolidada essa etapa do capitalismo, o interesse em uma população
livre, que consumisse e que custasse menos devido ao baixo salário, foi fator predominante na
abolição. O Brasil foi o último país de tradição ocidental a abolir a escravidão.

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