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2. Qual a importância da definição deste conceito (aura) para uma teoria da arte
aplicada?
O conceito de aura é fundamental para a Teoria da Aplicada no sentido em des-
perta na História-Critica da Arte uma perspetiva globalizante dos estudos da área que
contribuem para um melhor e mais completo entendimento das obras assim como para
ajuda na definição daquilo que é própria História e da Crítica das Artes.
A habilidade analítica de Walter Benjamin revela-se no modo como clarificou as
relações entre a matéria bruta e o imaginário da produção de bens de consumo. São
valores de longa sobrevivência, que interessam à prática da História e da Crítica das
Artes e que explicam os mecanismos paragonais de gosto e de repulsa, de marginali-
dade e de massificação, de deriva repressiva e de ruptura vanguardística.
O seu contributo inovador é crucial para as novas gerações de historiadores e
críticos de arte da era da globalização aprendem com estas lições oriundas da esfera
da sociologia da arte, a psicologia, a antropologia e a filosofia marxista e que se tornam
de utilidade para a definição da disciplina. A História-Crítica da Arte, ao mostrar utilidade
perene, ao falar das obras em aberto (como as definiu Eco), progrediu de modo signi-
ficativo no contexto de um mundo em globalização. Alargou capacidades de análise,
recentrou interesses regionais, atraiu jovens investigadores, disponibilizou apoio dos
poderes instituídos, redefiniu objectos de estudo no enfoque micro-artístico, amadure-
ceu a visão patrimonialista sem antigas peias auto-menorizadoras, e reforçou esse seu
entendimento (que só ela pode ter…) do discurso da arte como um fenómeno que é
em todas as circunstâncias inesgotável e por isso trans-contemporâneo.
O estudo das obras de arte torna-se mais difícil quando verificamos que as peças
sofreram adições substanciais no decurso da sua existência, ao serem alteradas por
restauros e acrescentos, ou seja, ‘desmemorizadas’ por falta de registo, e ‘desidiolo-
gizadas’ por alteração de funções, integradas (por exemplo) em novos espaços e em
outros contextos artísticos onde o sentido primeiro que presidiu à sua factura foi sujeito
a alterações que levaram à perda inexorável desse mesmo sentido.
Por isso as obras de arte sofrem – alteradas, mudadas de sítio, mal conser-
vadas, desrespeitadas, desmemorizadas, vistas sem ternura ou o mínimo elementar de
atenção... A estas ações chamamos de iconoclastia. À “doutrina” que leva a cabo os
atos iconoclastas chamamos de iconoclasma. É esse o caso de tantos conjuntos artísti-
cos portugueses que sofrem o estado dominante de uma cultura pensante que continua
a arvorar, a par da ignorância, a desonestidade e o preconceito redutor ao olhar para a
própria realidade identitária… Temos como exemplo O Calvário do Mosteiro de Jesus
de Setúbal, atribuído à Oficina de Jorge Afonso, cerca de 1525-30, sofreu um grande
‘repinte correctivo’ no fim do século XVI, por razões de rigorismo tridentino, que impun-
ham o modelo da ‘Stabat Mater’. Tal acto vem já citado na crónica de Soror Leonor de
S. João (1639-44). Com os novos critérios de restauro científico foi possível devolver à
peça a sua estrutura original. Mas também por toda a Europa se assistiu a tantos outros
casos de iconoclastia como, por exemplo, um ato iconoclasta com intuitos de apagar
memórias identitárias incómodas: os Budas gigantes de Barmiyan, no Afeganistão, de-
struídas pelos taliban em 2001.
Existiu sempre da parte dos homens (e continua a existir) – uma deriva icono-
clástica que se manifesta de modo inconsciente e auto-flagelador, destruidor do
«outro», correctivo por razões morais, políticas ou estéticas, de intuito propiciatório, de
esconjuração do medo, de apagamento da memória do «outro», de exegese, de afir-
mação de «cultura superior» ou até de afirmação utópica. Destruír para conservar val-
ores, para afirmar estratégias, para impôr critérios «supremos» ou para atestar o prima-
do de uma iconofilia «superior» porque as imagens fazem o Homem sentir medo e de-
sconforto mas também encanto e adoração (iconofilia - adoração da imagem).
4. Arthur C. Danto:
- conceito de artworld (4 circunstancias para que seja possível haver
esse artworld)
- em que medida o trans-contexto abre novas vias para a análise e frui-
ção das obras de arte?
- como é que o trans-contexto restaura a prática da crítica da arte?
É preciso, dizia Giulio Carlo Argan, saber olhar e ver. História e crítica da arte são
faces da mesma moeda, trata de obras que são sempre contemporâneas aptas para a
fruição integral do e no nosso tempo.
Nós somos fruidores comprometidos. Dedicamos à arte um olhar que anseia por
integralidade. A arte tem essa capacidade extraordinária de assumir dimensão
trans-contemporânea nas infinitas capacidades de suscitar olhares críticos (ontem,
hoje, amanhã), mesmo que a cadência de modas, gostos, valências, critérios de
aferição, imponha bitolas valorativas distintas...
A História da Arte mudou: hoje sabe interrogar, ver, desvendar memórias, desdo-
brar-se em visões globalizantes, percepcionar as obras à luz das suas valências e lim-
ites. A análise assenta num corpo de princípios onde destaco cinco sentidos, con-
statando que, afinal, toda a Arte é Contemporânea - quando é convocada para um ren-
ovado diálogo/confronto de olhares, em que as obras se apresentam na sua funcionali-
dade sempre renovada.
O alargamento dos 'modos de ver' no campo da História da Arte, tal como hoje se
configura e torna operativa, parece delimitar cinco sentidos da pintura, que serão, afinal,
estes:
1. O Sentido da Trans-Contextualidade da Arte, noção sobre a capacidade das
obras, através de um movimento contínuo, renovarem discursos apelativos em novas
situações de recepção e acolhimento;
2. O Sentido da Cripto-História da Arte, noção operativa sobre a vida póstuma das
obras destruídas (ou que nem sequer chegaram a ser criadas) através dos fragmentos
ou indícios que deixaram;
3. O Sentido da Trans-Memória da Arte, noção operativa sobre o poder multiplicado
de nexos na construção das imagens artísticas;
4. O Sentido da Micro-História da Arte, noção operativa sobre o poder de realização
artística fora dos «centros» e em contextos de periferismo mais ou menos atávico;
5. O Sentido da Trans-Contemporaneidade da Arte, noção operativa sobre a
capacidade de actualização das obras de arte face aos sucessivos olhares geracionais.